• Nenhum resultado encontrado

3.1 O SURGIMENTO DO MERCOSUL E O SEU PROTAGONISMO NA AMÉRICA

3.1.2 Finalidades do MERCOSUL

Assim como a grande maioria dos blocos regionais, o MERCOSUL, inicialmente, se limitava à busca pelo desenvolvimento econômico de modo que a sua principal finalidade, estabelecida no art. 1º do seu tratado constitutivo, era a formação de um mercado comum, com a retirada de qualquer óbice à livre circulação de bens, serviços e demais fatores produtivos na região. É claro que hoje em dia este objetivo permanece como sendo prioritário mas, por uma própria exigência do movimento de integração regional e em vista da conscientização de que tanto esforço para a constituição e a manutenção do MERCOSUL não pode servir única e exclusivamente a propósitos econômicos, as suas finalidades foram expandidas, tornando-se numa plataforma para a integração nas diversas outras áreas relevantes para os Estados e seus cidadãos.

Praticamente todo o teor do Tratado de Assunção é destinado a normatizar a formação e o funcionamento do mercado comum e os instrumentos necessários para alcançá-lo e a dispor sobre a estrutura provisória do bloco, contendo como anexos o “Programa de Liberação Comercial”, destinado a pontuar as etapas de liberação comercial entre os Estados-membros até alcançar o mercado comum e o “Regime Geral de Origem”, com fins a estabelecer parâmetros para a definição dos produtos originários dos países signatários. Inclusive, o artigo 1º do Tratado de Assunção é destinado a elencar as finalidades a serem alcançadas com a formação do mercado comum. São elas: a livre circulação de bens, serviços e fatores de produção entre os Estados-membros, a fixação de uma tarifa externa comum, a adoção de uma política comercial comum perante terceiros, o estabelecimento de um programa de liberalização comercial, a coordenação de políticas macroeconômicas e a harmonização das legislações internas.

Não se vislumbra qualquer dispositivo no tratado constitutivo destinado a tratar de outro tema que não o econômico-comercial, demonstrando a prioridade econômica do bloco. Mas, logo em seguida, entre o período de 1991 e 1995, várias reuniões foram realizadas no âmbito do MERCOSUL para tratar dos mais variados temas entre eles, ciência, tecnologia e turismo, inclusive, com a participação de ministros dos mais diversos setores69.

69 SOARES FILHO, José. Mercosul: surgimento, estrutura, direitos sociais, relação com a Unasul, perspectivas de sua evolução. Revista CEJ, Brasília, n. 46, p. 21-38, jul./set. 2009, p. 25.

Na medida em que o processo de integração no MERCOSUL foi amadurecendo, tornou-se inevitável agregar novas finalidades inseridas nos mais variados temas. Tornou-se um imperativo que o bloco voltasse os olhos também para os interesses dos cidadãos e não somente dos Estados-membros e, como consequência, observa-se a busca pelo desenvolvimento integrado dos direitos humanos e a imposição para que os Estados observem e respeitem as diretrizes democráticas.

Neste aspecto, com a assinatura do Protocolo de Ouro Preto em 1994, instituindo a estrutura definitiva do MERCOSUL, se vislumbra que o bloco passou a contemplar a dimensão social no processo de integração, sobretudo diante do Foro Consultivo Econômico e Social como órgão do bloco destinado a representar conjuntamente os setores econômicos e sociais.

Um outro avanço significativo concernente à ampliação de temas de interesse para o MERCOSUL ocorreu em 24 de julho de 1998 quando foi firmado o Protocolo de Ushuaia, ficando formalmente estabelecida como condição essencial para o desenvolvimento do processo de integração do MERCOSUL o respeito às instituições democráticas pelos Estado- membros. Sobre o tema, Antonio Martínez Puñal destaca que:

Afortunadamente, los anhelos integracionistas encontraban un inexcusable caldo de cultivo en la democratización llevada a cabo en los cuatro países. Sin esta no tendría sentido hablar de integración. La conciencia de la necesidad de este requisito democrático fue subrayada en diversas ocasiones tanto en el ámbito

doctrinal como en el de las instancias ejecutiva y legislativa.70

A ruptura democrática causada por um dos integrantes tem como última consequência a suspensão dos seus direitos e obrigações perante o bloco, cuja deliberação deve ser feita por consenso dos demais Estados-membros, tratando-se de uma decisão política.

Em 20 de dezembro de 2011 um novo compromisso democrático, conhecido como Protocolo de Montevidéu ou Ushuaia II, foi firmado não somente pelos Estados-membros do MERCOSUL, mas também pelos seguintes Estados associados: Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Peru e Venezuela (que à época ainda não detinha o status de membro efetivo). Trata-se de uma reiteração da necessidade de observância das instituições democráticas, porém, desta vez, com a participação dos Estados associados. O documento dispõe que a ameaça ou violação à ordem democrática pode ensejar sanções de ordem política, diplomática e/ou econômica. Infelizmente, apesar do Protocolo ter sido assinado pelos presidentes dos respectivos países, o mesmo não se encontra vigente pois dependente da aprovação legislativa

70 PUNÃL, Antonio Martínez. El sistema institucional del Mercosur: de la intergubernamentalidad hacia la

de todos países envolvidos que até agora não ocorreu. A necessidade de aprovação legislativa dos atos emanados do MERCOSUL é, inclusive, um dos grandes entraves que dificulta o seu progresso diante do seu caráter burocrático e demorado que, certamente, seria eliminado se instituída a supranacionalidade. De todo modo, apesar do Protocolo de Montevidéu permanecer pendente de aprovação, a sua existência, aliada à existência do Protocolo de Ushuaia, demonstra que o compromisso democrático é um tema sensível e relevante ao MERCOSUL.

José Soares Filho destaca outros temas que passaram a ser matérias de grande valor para o MERCOSUL, entre eles:

1. Cooperação e assistência jurisdicional em matéria civil, comercial, trabalhista e administrativa, estabelecidos no Protocolo de Las Lenas, de 1992;

2. Medidas cautelares com o fim de impedir a irreparabilidade de dano em relação às pessoas, bens e obrigações (Protocolo de Medidas Cautelares de 1994);

3. O direito do consumidor e da concorrência (Protocolo de Santa Maria sobre Jurisdição Internacional em Matéria de Relações de Consumo, de 1966, e o Protocolo de Defesa da Concorrência do Mercosul);

4. Educação e cultura (Protocolo de Integração Cultural para Favorecer o Enriquecimento e a Difusão de Expressões Culturais e Artísticas do Mercosul, de 1996, e o Protocolo de Integração Educacional para Prosseguimento de Estudos de Pós-Graduação nas Universidades dos Países do Mercosul, de 1996);

5. Meio ambiente (Acordos sobre Cooperação em Matéria Ambiental celebrados entre Brasil e a Argentina em 1997 e entre o Brasil e o Uruguai em 1997) (...)71 O desenvolvimento do MERCOSUL, no sentido de alcançar outros temas que não os relacionados à integração econômica, demonstra que o mesmo suscita a necessidade cada vez mais evidente de se estabelecer um sistema supranacional em seu âmbito, visando conceder- lhe maior independência e autonomia em relação aos Estados-membros, para que possa tomar decisões concernentes a estes temas de sua competência, de observância obrigatória pelos Estados-membros. A adoção do caráter supranacional fortalecerá o MERCOSUL, sem que com isso menospreze a soberania de cada um dos seus integrantes, e facilitará o seu avanço em direção à formação de um mercado comum e mais adiante, à criação de um espaço comunitário, com competência para expedir normas desafetadas dos interesses de cada Estado.

71 SOARES FILHO, José. Mercosul: surgimento, estrutura, direitos sociais, relação com a Unasul, perspectivas de sua evolução. Revista CEJ, Brasília, n. 46, p. 21-38, jul./set. 2009, p. 30.

3.1.3 O papel do MERCOSUL como vetor de convergência dos demais processos de