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3.2 ESTRUTURA E ORGANIZAÇÃO DO MERCOSUL

3.2.3 O Parlamento do MERCOSUL

Vozes contrárias à implementação de um parlamento no MERCOSUL se ergueram com o argumento de que a sua constituição seria contrária às finalidades econômicas originárias do MERCOSUL. O ex-presidente uruguaio Luis Alberto Lacalle de Herrera, um dos opositores à criação de um parlamento, pondera:

Tanto pelos documentos assinados quanto pela vontade do governo uruguaio evidencia-se claramente que a finalidade exclusiva da nova organização era a de fomentar o comércio entre os sócios. Convém recordar estes aspectos no momento atual, quando um dos desvios mais notórios e prejudiciais do Mercosul é o de pretender dar-lhe conteúdo político.102

E, mais adiante, prossegue:

Fica claro e fora de qualquer discussão que os países concordaram em criar uma organização exclusivamente econômica e comercial e que os órgãos e instituições que se estabeleciam naquele momento assim como os que fossem estabelecidos nas etapas seguintes, eram instrumentais para a realização de metas originais.

Por outro lado e do ponto de vista político, de nossa parte jamais teríamos apoiado e nem levado adiante uma negociação que resultasse em menosprezo da independência política de nosso país.

Esse é, portanto, o Mercosul que fundamento. Qualquer outra interpretação é alheia à letra e ao espírito do acordo.103

Este pensamento se mostra prejudicial à persecução da integração regional, uma vez que pretende restringir os objetivos do bloco regional, determinando que o mesmo deve se destinar somente ao fomento do comércio entre os seus membros. Em que pese este ter sido a finalidade principal quando da assinatura do Tratado de Assunção, o MERCOSUL já se expandiu para muito além da sua forma originária e hoje não é possível concebê-lo como um bloco destinado meramente a fins econômicos. O MERCOSUL adotou um perfil político e

102 HERRERA, Luis Alberto Lacalle de. Mercosul: projeto e perspectivas. Diplomacia, estratégia e política, Brasília, n. 6, p. 193-201, abril/jun. 2007, p. 194.

103 HERRERA, Luis Alberto Lacalle de. Mercosul: projeto e perspectivas. Diplomacia, estratégia e política, Brasília, n. 6, p. 193-201, abril/jun. 2007, p. 195.

social, visando desenvolver e integrar a região em diversas áreas distintas, entre eles, o meio ambiente, a segurança pública, a infraestrutura, a saúde, o sistema judiciário etc.

Da mesma forma, acreditar que a instituição de um parlamento no bloco mercosulino pode afetar ou diminuir a independência dos países-membros é um equívoco já que, conforme visto alhures, a noção clássica de soberania já não tem mais espaço na realidade atual, sendo que a existência de um parlamento se mostra imprescindível para aprofundar o processo de integração regional.

E é justamente com vistas a fortalecer essa integração regional é que o Parlamento do MERCOSUL, inobstante não ter sido previsto no Tratado de Assunção nem no Protocolo de Ouro Preto, já é uma realidade, tendo sido instituído através do seu Protocolo Constitutivo assinado em 09/12/2005 e tendo estabelecido a sua sede em Montevidéu. No início do documento, em um dos “considerandos”, fica clarividente que a criação do Parlamento tem como desígnio primordial aproximar o cidadão do MERCOSUL, lhe concedendo representatividade para que a sua voz possa ser ouvida no bloco. Eis o seu teor:

CONSCIENTES de que a instalação do Parlamento do MERCOSUL, com uma adequada representação dos interesses dos cidadãos dos Estados Partes, significará uma contribuição à qualidade e equilíbrio institucional do MERCOSUL, criando um espaço comum que reflita o pluralismo e as diversidades da região, e que contribua para a democracia, a participação, a representatividade, a transparência e a legitimidade social no desenvolvimento do processo de integração e de suas normas.104

O órgão parlamentar do MERCOSUL se consubstancia, assim, num instrumento com vistas a conceder um tom democrático ao bloco, dotando-o de maior legitimidade e transparência, representando os povos dos Estados-membros. Com fins a corroborar essa sua finalidade, o Protocolo Constitutivo estabelece em seu artigo 1º que os seus integrantes serão eleitos mediante sufrágio universal, direto e secreto. Na prática, devido à burocracia interna do Brasil e do Uruguai para tornar viável o quanto estabelecido no dispositivo supra, apenas Paraguai e Argentina possuem parlamentares mercosulinos eleitos pela via direta, sendo que os dois primeiros procederam à eleição indireta de seus representantes para o Parlamento do MERCOSUL. Já existe projeto de lei no Brasil para que os representantes parlamentares brasileiros possam ser eleitos pela via direta, mas o tema ainda não foi debatido no plenário da

104 MINISTÉRIO DE RELAÇÕES EXTERIORES DA REPÚBLICA DO PARAGUAI. Protocolo Constitutivo

do Parlamento do Mercosul. Disponível em: <http://www.mre.gov.py/tratados/public_web/DetallesTratado. aspx?id=+ctyDJzNVM+Iex/9bLc6cw==&em=lc4aLYHVB0dF+kNrtEvsmZ96BovjLlz0mcrZruYPcn8=>. Acesso em 24 maio 2018.

Câmara dos Deputados em que pese tramitar em regime de urgência.105 De qualquer forma, a eleição indireta de membros do Parlamento não desnatura o seu caráter democrático e participativo.

Como representantes dos povos do MERCOSUL, conforme disposto no art. 2º do Tratado constitutivo, o seu Parlamento deve trabalhar com vistas à promoção da democracia, da liberdade, da paz, do desenvolvimento sustentável e da participação da sociedade civil no processo de integração regional, visando a consolidação e a ampliação do MERCOSUL, através da elaboração de pareceres, recomendações e projetos de normas a serem encaminhados ao Conselho do Mercado Comum.

Em 2010, foram estabelecidos os critérios para a representação proporcional no Parlamento e foi ratificada a necessidade de convocação de eleições diretas para a definição dos representantes dos países membros no foro, reforçando a institucionalidade do MERCOSUL.

Apesar do Parlamento do MERCOSUL estar destituído do caráter supranacional, para o autor Renato L. R. Marques, “tendência é que, assim como na Europa, a nova instituição venha a desempenhar um papel crescentemente importante e que passe, em algum momento no futuro, a dispor de competência para adotar normas com caráter decisório (pelo menos em algumas matérias)”106. Assim, conclui-se que a criação do Parlamento se mostra como um passo

fundamental em direção à formação de um mercado comum. E, para além disso, ele traz a esperança de que o espaço comunitário possa ser enxergado como uma possibilidade a ser concretizado num futuro próximo dentro do MERCOSUL, aprofundando cada vez mais o processo de integração na região