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Lista de Tabelas

BRASIL COLÔMBIA ARAWAK BRASIL COLÔMBIA

2. Formas de Transmissão e de Circulação dos Conhecimentos

2.6 O Kumu e as Políticas de Chefia e de Transmissão dos Conhecimentos

2.6.1 Firmiano e Luís Lana

Acima foram descritos três casos de transmissão de conhecimento entre os kumua. O caso de Firmiano e Luís Lana foi deixado por último com a finalidade de se pensar em que medida a chefia pode se relacionar com a transmissão de conhecimentos. As circunstâncias que envolvem a transmissão de conhecimentos e o exercício da chefia devem ser lidos com base na descrição de Goldman sobre o chefe. Todo papel de liderança, quer seja o de chefe de uma comunidade quer o mestre de um ritual é ocupado por membros da alta hierarquia ou pelo irmão mais velho, pois são reconhecidos como fonte exclusiva de poderes vitais. Como representantes de seus ancestrais, são

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O argumento apresentado abaixo procura demonstrar a associação entre o conhecimento e o papel da chefia. Contudo, durante o trabalho em campo, não devotei recursos para pesquisar sobre o sentido local de poder. Apenas durante a escrita da tese que as informações apresentadas a seguir foram tomando forma e percebi o rico material que tinha em mãos e que deveria, mesmo assim, incorporá-lo. No entanto, a pesquisa de campo mostrou-se insuficiente para elaborar a questão do poder e principalmente, perceber a visão dos kumua sobre o assunto. Agradeço à Beatriz Perrone-Moisés e ao Pedro Augusto Lolli por chamar atenção de que há certo desequilíbrio na análise entre a relação poder e o conhecimento e a necessidade de maior investigação etnográfica sobre a categoria indígena do poder.

161 responsáveis por fomentar o desenvolvimento pessoal e coletivo e por infundir em suas comunidades as forças vitais que remontam ao passado mítico (Goldman, 2004:97). Mas, primeiramente será relatada um pouco da história de Luís Gomes Lana. Deixemos que o próprio Luís se apresente:

Nasci na comunidade São João Batista (Warú Serakarũ), situada no rio Tiquié, afluente do rio Uaupés, no Amazonas em 20 de fevereiro de 1945. Pertenço ao clã Kehíripõrã (filhos dos desenhos dos sonhos), descendente do ancestral mítico Boreka. Quando completei seis anos meu avô, Tõrãmũ Kẽhíri, me levou para pescar e me mostrou os limites do rio. Ele disse: “quando você for grande obedeça aos limites estabelecidos pelos seus irmãos maiores, os

Tukano, que nos cederam esta terra.” Com estas palavras em mente,

cresci amando a minha terra e com a responsabilidade de cuidar dela. Meu avô também me disse que eu deveria procurar uma mulher, me casar e ter filhos, pois quando crescesse seria chefe de minha comunidade. Essas palavras me acompanharam durante toda a vida e pesaram quando tive de fazer decisões importantes.

Luís obteve seus conhecimentos através de seu pai, Firmiano. De acordo com Luís, a formação do kumu requer que o iniciante se predisponha a passar por um complexo e longo processo de aprendizado, mas no seu caso, este processo tornou-se mais longo ao ser interrompido pelos anos em que passou no internato salesiano de Parí-Cachoeira. Todavia, assim como a maioria dos demais kumua de sua época, a formação inicial de Luís começou antes mesmo de ir para o internato. Para preparar seu corpo a fim de receber os ensinamentos, Luís fora ensinado a cheirar pimenta para estimular a sua inteligência e para lhe dar mais disposição mental para aprender naquela idade. Havia restrições também. Desde pequeno, quando começou a se alimentar, seu avô já queria lhe ensinar o que lhe era possível aprender. Assim, seus pais cuidavam da sua dieta com toda atenção. Ele não comia nada de assado e frituras – nem mesmo a fumaça de alimentos preparados dessa forma chegava perto de Luís. Em seu cardápio não entravam cotia, arraia e jacaré. Luís ainda relembra que tinha que tomar banho ainda de madrugada, pois “para os Desana, o banho tem a finalidade de dar força, energia para a vida e atua contra o envelhecimento”.47

47 Segundo Luís nos tempos dos antepassados, os homens tomavam banho à uma da madrugada. Ouviam os grilos que cantavam à uma hora e isso marcava o começo do dia.

162 Aos nove anos, porém, o padre italiano João Marquese mandou um recado ao seu pai, requerendo a entrega de seu filho ao internato em Parí- Cachoeira. No recado, João Marquese deixou claro que se Luís não fosse entregue, Firmiano não se beneficiaria do escambo com a missão salesiana. Na mesma missão salesiana de Parí-Cachoeira, onde tudo aconteceu há mais de 50 anos, Luís me relatou:

Quando entrei no internato, nem meu avô nem meu pai estavam felizes. Eles queriam dar prosseguimento a minha educação de kumu. Mas o padre que estava aqui, mandou chamar meu pai. Ele ameaçou meu pai. Se meu pai não me entregasse no internato, o padre não compraria farinha, fruta, galinha da gente e aí nós não teríamos roupa, sabão, sal, redes. Disse a mesma coisa ao meu avô, caso ele não destruísse a sua maloca. [...]

Quando cheguei, vim só com a roupa do corpo. Meu pai disse que ele não tinha roupa, nem rede, embora em sua comunidade tivesse uma rede de 30 fios. O padre resolveu abrir a dispensa e mostrou para a minha mãe e pediu para que ela escolhesse a rede que quisesse, assim, como toalha, roupa de cama, cinco camisas e algumas calças.

Meu professor era um padre salesiano, italiano. Ele dava aula de religião. Durante o curso sempre criticava a minha cultura, dizendo que era ensino dos demônios. Eu acreditava porque naquela época da minha vida, ainda não sabia direito o que era benzimento. O padre

falava assim: “Vossos antepassados, vossos avós, hoje estão no

inferno”. A história do inferno pareceu interessante para todo mundo. Depois da morte do kumua ou do pajé, a alma destes vão para lugares diferentes das pessoas comuns. Com a doutrina católica, todos nos encontraremos no mesmo lugar após a morte. Por isso, os velhos adotaram o catolicismo. Era uma forma de todos estarem reunidos com suas famílias quando morrerem. “Agora vocês estão aqui. São cristãos, foram batizados, estão numa nova fase. Vocês têm que mudar a cultura de vocês - pajé, benzimento e nem mesmo a maloca. Parem de falar a língua de vocês. A língua de nosso país, o Brasil, é o português.” Éramos obrigados a falar em português. Se alguém ouvisse um aluno falando qualquer língua indígena, mesmo no intervalo, era colocado de castigo por duas horas, de frente para a parede sem poder se mexer.

Logo depois de mudar-se para o internato, ainda com nove anos de idade, Luís passou a comer coisas que antes não comia devido à dieta relacionada com seu treinamento. Seu corpo, de repente, ficou muito inchado e Luís foi levado para a enfermaria do internato. Seus pais e seu avô foram chamados. Luís conta que quando seu avô o viu naquele estado, começou a chorar. Sabia que não era doença, mas que seu corpo estava reagindo devido à infração de Luís as regras

163 alimentares. Era necessário realizar um benzimento que retirasse seus conhecimentos de seu corpo para que Luís melhorasse. “O bem que ele havia colocado em mim no passado, agora se transformava em mal”, lamenta Luís. Juntamente com seus conhecimentos, Luís reclama que foram embora os poderes que havia recebido através do preparo de tantos anos. Sobre a ação de seu avô, Luís explica o que aconteceu com seu corpo.

Mas, ele deixou uma parte pequena, que não foi retirada para eu poder no futuro compreender estas coisas que aprendi por escutar o meu pai. Fiquei apenas com uma parte da capacidade de aprender após esse problema de saúde. Por exemplo, não tenho o poder de visão de fazer caapi. Pois, este poder meu avô retirou de mim. Esse poder poderia ser colocado de novo através de outro benzimento, mas seria necessário passar por todo o processo de restrições novamente. Não havia condições de fazer isso no internato. Se isto não tivesse acontecido, poderia ter me tornado um kumu mais poderoso. [...] O que dá poder para o kumu são estas restrições. Ainda com um misto de mágoa e desgosto, Luís relembra as dificuldades da vida no internato e ao mesmo tempo, confessa que foi uma vida que lhe trouxe certos benefícios que contribuíram para a sua futura vida política e como escritor.

A vida no internato era muito rígida. Mas, foi uma vida boa para mim. Quando cheguei aqui tinha muito medo, me negava a falar em público. Os padres me obrigavam a declamar poesias escritas por eles nas festas. Aos poucos, criei coragem para falar, para dizer o que pensava. Esta educação rígida me ajudou a assumir as tarefas com responsabilidade. Mas, o mais importante foi aprender a ler e a escrever. Sem isso, não poderia ter publicado os meus trabalhos. Os padres tinham uma grande preocupação naquela época: formar um padre indígena. Luís relata que ele era um dos candidatos. Por ser um bom aluno e por falar bem em público, os padres estavam pensando em investir mais esforços na formação de Luís. Eis o plano que lhe fora prometido pelos salesianos.

Disseram que se eu fizesse isso, chegaria até a ter a honra de falar com o Papa! Como me saí bem nos estudos e também porque consegui aprender a falar bem em público, me escolheram para me formar padre. Quando acabei o ensino primário, fui designado como assistente, cuidando dos outros alunos. Depois disso, iria ser enviado à Manaus para cursar o ensino médio no Colégio Dom Bosco. Depois, iria para Belém do Pará para estudar filosofia por três anos.

164 Depois iria para São Paulo para estudar teologia por três anos.

“Terminado, vai entrar no diaconato em Parí-Cachoeira,

acompanhando o padre nas cerimônias por um ano. Daí será marcado o dia da sua ordenação ocasião em que seria consagrado padre. Como primeiro padre indígena, você vai para Roma conhecer o

Papa!”

Luís Lana conta que vibrou diante das possibilidades apresentadas pelos padres. Ficava imaginando o dia em que poderia celebrar a missa em latim, como o padre fazia em sua época. Tamanho o amor pela língua, Luís ainda consegue, sem titubear, fazer a oração do Pai Nosso inteira em latim. Esta oração cantada nos ofícios da igreja o fascinava de tal forma que Luís ficava sonhando com o dia em que estaria no púlpito conduzindo a missa. Contudo, o caminho escolhido por Luís foi outro.

Luís passou seis anos no internato, onde cursou o que hoje é chamado de ensino fundamental. No entanto, paralelamente à educação que recebia dos padres salesianos, Luís passou a receber o treinamento para se tornar kumu. Este treinamento começou aos doze anos quando todos os alunos, uma vez por ano, entravam no período de férias que começava em novembro e terminava apenas em fevereiro do ano seguinte. Durante este extenso período, os alunos voltavam para as comunidades de seus pais e Luís era submetido aos ensinos de seu pai e de seu avô sobre a mitologia e os benzimentos. Firmiano contava os benzimentos e Luís tentava memorizar. A seguir, Firmiano fazia uma prova para ver se Luís havia decorado.

Luís explica como era a vida entre os salesianos e a época em que entrava de férias.

No internato a vida começava de manhã. Às seis horas o assistente batia palmas para acordar os alunos chamando em latim. Os alunos levantavam, formavam uma fila e iam até a beira do rio pra se lavar. Voltavam ao dormitório para se trocar. Tocava o sino três vezes para se prepararem para a missa. Após a missa, voltavam para o dormitório para se trocar para o trabalho. Iam para o refeitório tomar café da manhã, que não tinha café, era só um mingau. Os mais velhos iam para a olaria fabricar tijolos. Os menores trabalhavam na horta. Às nove e meia batia o sino para um intervalo. Geralmente era uma fruta com farinha e chibé. Depois se juntavam numa classe pra estudar matemática, geografia, ciência, português, organização social

165 e política do Brasil (era a que eu gostava mais). Era uma disciplina por dia. Depois vinha o almoço. Atrás do internato havia um pátio e podíamos brincar um pouco. À tarde voltávamos para a classe para mais aula. Depois havia mais um intervalo para um lanche. Voltávamos ao trabalho. Depois banho. Às cinco era o jantar. Depois da janta havia mais intervalo para brincar, jogar bola. À noite voltamos para a igreja para catecismo. Depois voltávamos para a classe para estudar. Às oito horas, tinha a oração da noite. Já deitado na cama, o assistente do padre lia algum texto em voz alta como a vida de Dom Bosco ou de outro santo. Não podíamos falar nada, tínhamos que ficar em silêncio o tempo todo e depois da leitura, tínhamos que dormir.

A seguir Luís contrasta o modo de vida da missão salesiana com os meses de férias que passava em casa.

Quando voltava para casa nas férias, escutava os ensinamentos de meu pai sobre as histórias e os benzimentos. Levantava cedo e ele me ensinava benzimento para dor de cabeça, benzimento para dor de barriga, benzimentos quando alguém tinha pesadelo, benzimento par defesa. Tinha que levantar cedo para tomar banho de madrugada a partir do primeiro canto do galo. Para saber se estava tomando banho mesmo, meu pai me obrigava a bater com os braços na água. Aí ele podia ter certeza que estava me banhando. Quando voltava do rio, sentava perto do fogo para me aquecer. Meu pai se aproximava e começava a me contar os benzimentos e as histórias. Eu me sentia bem quando ouvia as historias. Meu pai fazia questão de ensinar os benzimentos e falar da história que contava a origem da doença e o seu personagem. Ensinou que o papel do kumu ao realizar uma cura ou mesmo prevenção é desarmar o agente para que não ataque. Todo benzimento tem um agente que ataca. Por exemplo, meu pai me explicou que no momento do parto, vários agentes que podem atacar causando doença ao bebê e à sua família. O nascimento do bebê é algo que causa raiva de alguns seres. Por exemplo, o calango tem flechas (como mostra a sua cauda) que podem atingir a mulher quando ela sai para urinar. Essa flecha tem veneno e causa doença. Assim, o kumu coloca o calango sentado no banco, na casa dele, lhe oferece ipadu e caxiri e vira para outro lado para ele não ver. Depois o kumu protege o local com as esteiras. Outro agente que pode causar dano ao ser humano são os pássaros, que ao cantarem podem atacar. O kumu desarma o pássaro. Faz o mesmo com a borboleta que voa perto da casa da família.

Luís continua explicando que o aprendizado dos benzimentos segue uma ordem que parte dos mais simples (mais curtos). Já os mais complexos e que envolvem uso de mais conhecimentos e habilidades, como o de parto, nominação e do coração, são transmitidos mais tarde. Mas, devido aos anos de internato, estes benzimentos lhe foram ensinados apenas depois de casado. Luís fornece mais detalhes sobre seu treinamento durante este período.

166 Meu treinamento não incluiu o consumo de caapi. Tomavam no passado para limpar o estomago e vomitar. Não passei pelo ritual de iniciação dos antigos. Nem mesmo meu pai, apenas meu avô. Passei apenas pelas dietas. É por isso que os kumua do passado eram poderosos. Passavam por uma iniciação muito rígida que não existe mais. Tinha açoites, levantar cedo, jejuar, limpar o estomago vomitando. Todos passavam por isso, mesmo os que não seriam

kumu, pajé ou bayá. Depois da iniciação de todos, aqueles que

escolheriam essas funções especiais no futuro, continuariam com o treinamento.

De volta ao internato em Parí-Cachoeira, um dia, o padre-diretor chamou os pais de Luís para lhes explicar o convite que havia feito sobre seguir a carreira de padre. A sua mãe disse que não poderia falar nada a respeito, somente seu pai. Firmiano, por sua vez, não aceitou a proposta e explicou em desana, pois não falava português, que Luís era o primogênito, iria casar e permanecer com ele em sua comunidade. Seria herdeiro do seu patrimônio. O padre argumentou, falando apenas em português para Luís que esta era “a sua vocação, o dom dado a ele por Deus. Esta vocação era inspirada pelo espírito santo”.

Firmiano deixou que Luís resolvesse o seu próprio destino. Ele tinha apenas treze anos e estava fascinado com a igreja. Mas, ao mesmo tempo encontrava-se num conflito, pois já se sentia responsável pelo futuro de sua comunidade. Além disso, sabia que os padres não se casam e não têm filhos, mas Luís já queria ter a sua própria família, vontade, relembra, alimentada pelas conversas de seu avô quando criança.

O que estava em jogo era a sucessão da chefia na comunidade São João. Luís Lana era o filho mais velho e tanto seu avô como seu pai esperavam que ele assumisse essa posição quando crescesse. Esse desejo fora incutido em Luís e mesmo desejoso de seguir a carreira apresentada pelos padres, as palavras de seu avô ainda ressoavam em sua mente. Sabendo dessas coisas, a mãe de Luís em vez de responder à pergunta do padre, disse que cabia ao pai de Luís tomar a decisão. Mas, por ora, Luís resolveu permanecer no internato.

167 Um dia, alguns colegas de Luís foram acusados de mexer com umas meninas e foram expulsos do internato. O padre que os expulsou mandou que Luís fizesse o trabalho de limpeza dos banheiros dos alunos. Mas, Luís se negou dizendo que tinha suficiente trabalho na alfaiataria e este era o trabalho dos meninos que haviam sido expulsos. Com esta resposta, o padre ameaçou expulsar Luís como havia feito com seus colegas. Luís se recusou novamente e o padre o mandou embora do internato. Luís é homem que não aceita desaforo e imediatamente deixou o internato. Parecia que este seria o momento em que Luís poderia retornar à formação interrompida pela vida no internato. Mas, não foi o que aconteceu. Nesta época, Luís tinha 14 anos e dois anos mais tarde já estava trabalhando na Colômbia. Luís relata as motivações que o levaram a deixar sua comunidade novamente.

Saí da casa porque era jovem e gostava de roupas bonitas, rádios, vitrolas e coisas que só podia comprar na Colômbia. Na missão em Parí-Cachoeira só tinha os uniformes feios do internato que pareciam camisolas. Não tinha roupas modernas. Do rio Tiquié fui de voadeira até o rio Papuri e de lá para Mitú. Em Mitú trabalhei como servente de construção. Fiquei lá por duas semanas. Na terceira semana fui para a Missão San José del Guaviare. Trabalhei um ano com os padres ajudando na criação de gado e na plantação de cacau.

A história de Luís é rica em detalhes e não há espaço aqui para relatar tudo. Entretanto, dois eventos fizeram com que Luís refletisse sobre a sua posição de chefe em sua comunidade. Enquanto trabalhava para os padres, um grupo de Corripaco (da família linguística Arawak) veio visitar seus parentes, mas no caminho, um deles faleceu. Seu corpo foi enrolado em folhas de bananeira e continuaram a viagem trazendo o corpo até chegarem em San José del Guaviare. Havia apenas o cemitério católico. Contudo, os padres não permitiram que o corripaco fosse enterrado, pois a maioria dos Corripaco não é católica, mas evangélica. O corpo que já estava em um estado avançado de decomposição, foi enterrado em uma cova fora do cemitério. Este evento fez com que as palavras de seu avô ressoassem em sua mente quando ele o incentivou aos seis anos a prezar e a cuidar de sua comunidade. Depois, Luís foi

168 derrubar árvores para uma empresa que construía uma estrada ligando a região à cidade de Bogotá. Um dia, Luís ficou muito doente.

Senti uma dor forte na cabeça, febre e muito cansaço. No terceiro dia, não conseguia mais sair da rede. Achei que ia morrer sozinho. Quando meus colegas saíram para o trabalho na rodovia, tive uma visão. Nela meu pai aparecia fazendo um benzimento e soprou o cigarro no meu rosto, defumando meus olhos e meus ouvidos. Ele

disse: “você conhece esse benzimento que te ensinei e deve fazer em si mesmo para se curar”. Pensei um pouco e me lembrei do

benzimento que meu pai havia me ensinado numa manhã após voltar