• Nenhum resultado encontrado

Capítulo 2 Importância da formação inicial de professores

2.5 Formação inicial de professores em Angola

Desde a sua independência em 1975, após longos anos de colonização Angola passou a implementar uma série de reformas e aprovação de leis que pretendiam colocar o país na rota do desenvolvimento. Assim, em 1977 e na base da consideração da lei constitucional que consagra a educação como um direito de todos independentemente de sexo, raça ou crença religiosa, foi aprovado o Novo Sistema Nacional de Educação e Ensino. Este sistema de ensino cuja implementação se iniciou em 1978, tinha como base os seguintes princípios gerais:

(i) Igualdade de oportunidades no acesso e continuação dos estudos, (ii) Gratuidade do ensino em todos os níveis;

(iii) Aperfeiçoamento constante do pessoal docente.

O Sistema Nacional de Educação e Ensino era constituído por quatro subsistemas de ensino, nomeadamente o Ensino geral de base, que era composto por oito classes sendo as quatro primeiras de caracter obrigatório, o Ensino pré-universitário composto por seis semestres, o Ensino médio composto por quatro anos e que compreendia os ramos técnico e normal e o Ensino superior. De acordo com Flores & Cardoso (2009), o maior impacto tangível do Novo Sistema de Educação traduziu-se na grande afluência da população às escolas, pois, se em 1974 estudavam cerca de meio milhão de angolanos, em 1980 esse número superava os 1,8 milhões.

Apesar de ter alcançado a independência em 1975, Angola continuou a viver num clima de guerra civil que trouxe consigo graves consequências a todos os níveis. A destruição de grande parte das infraestruturas, fábricas, barragens e escolas, o êxodo das populações das zonas rurais que procuravam condições de segurança e se concentravam nas grandes cidades como Lubango, Benguela e Luanda, a necessária mobilização da força de trabalho jovem para as tarefas de defesa da pátria e a pouca mobilidade dentro do território nacional fizeram com que as condições socio económicas se fossem degradando arrastando nesse precipício a Educação. Diminuiu cada vez mais a capacidade de absorção escolar, aumentando assustadoramente as taxas de analfabetismo. De tal forma que em 1995, o número de pessoas iletradas estimava-se em 4 milhões, sendo que destes 2,5 milhões eram mulheres (Flores & Cardoso, 2009).

Em 2001, a Assembleia Nacional da República de Angola aprovou a Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei 13/ 01 de 31 de dezembro). Este documento define o Sistema de Educação que se estrutura em seis subsistemas de ensino, a saber:

78

(ii) Sistema de ensino geral – composto pelos níveis de ensino primário, com seis classes (obrigatório) e nível de ensino secundário que integra dois ciclos de 3 anos cada.

(iii) Subsistema de ensino técnico-profissional

(iv) Subsistema de formação de professores – Integra os níveis Médio Normal, com quatro anos de duração e Superior Pedagógico, com até seis anos de duração. (v) Subsistema de formação de adultos

(vi) Subsistema de ensino superior

Como se pode verificar, o subsistema de formação de professores inclui a formação média normal, desenvolvida em Escolas Normais e hoje designadas como Escolas de Formação de Professores (ensino secundário) e a formação superior pedagógica, desenvolvida em Institutos e Escolas Superiores de Ciências de Educação ou também ISCED. Isto significa que o subsistema de formação de professores desenvolve-se, quer a nível do ensino secundário, quer a nível do ensino superior. Portanto qualquer análise sobre este processo deverá ter sempre em conta o nível de formação em que o mesmo se desenvolve, pois, como seria de esperar, embora os objetivos sociais possam ter alguma convergência, os beneficiários finais serão de certa forma diferentes.

Para melhor compreensão do que foi dito acima, deve-se explicar que a formação de professores é desenvolvida pelos ISCED (escolas de formação de professores à nível da licenciatura), pelos IMNE (Institutos médios normais de educação, hoje designados por EFP) mas também pelo Magistério primário. Destas três instituições, o ISCED, cujos formados terminam o curso graduados com a licenciatura, é a que tem como missão formar professores que se destinam às escolas do II ciclo do ensino secundário (da 7ª a 13ª classe), cabendo às outras a formação de professores para os níveis de ensino mais baixos.

Dada a sua vocação e a situação atual de Angola em termos de quadros qualificados e diferenciados para desenvolver com a qualidade necessária o processo de ensino – aprendizagem, os ISCED adquirem um importância e responsabilidade estratégicas, principalmente no que diz respeito ao ensino superior. Apesar de estar vocacionado apenas para as escolas do 2º ciclo, a escassez de quadros faz com os melhores graduados do ISCED sejam frequentemente captados para a docência, quer no próprio ISCED, quer nas diversas instituições de ensino superior publicas ou privadas existentes em cada região académica.

Deste modo, a formação de professores, e nos ISCED em particular, adquire um significado ainda maior pelo efeito dominó que poderá causar. Na opinião de Quitembo (2010), o desenvolvimento inadequado da formação de professores repercute-se negativamente em todo

79

o Sistema de Educação, e consequentemente, no desenvolvimento do país, uma vez que os professores garantem a preparação adequada dos indivíduos para o seu ingresso nas mais variadas instituições de formação profissional

Ao abordar a problemática da formação de professores no contexto angolano, Flores & Cardoso (2009) apontam alguns aspetos que no seu entender representam limitações desse processo.

Uma primeira nota diz respeito à forma como o formando se apropria, no âmbito do currículo da formação inicial, dos conteúdos científicos que precisa de dominar com vista à sua qualificação profissional. Na opinião das autoras, o domínio destes conteúdos é absolutamente necessário, mas a forma como eles são trabalhados no processo de ensino-aprendizagem não tem sido diferenciada (Flores & Cardoso, 2009)

Uma segunda nota refere-se à forma não adequada como a formação de professores tem sido abordada em relação ao conhecimento que tem sido encarado como um produto ou algo que se transmite e não como um processo de construção. A pedagogia dos cursos de formação docente tem sido marcada por uma forte tendência para a exposição, para a transmissão de informações, pelo professor, numa simples cadeia de repetições e reproduções (Flores & Cardoso, 2009).

Outra limitação é que, de acordo com Flores & Cardoso (2009), no atual modelo de curso de Licenciatura em Pedagogia e Psicologia, o licenciado recebe apenas alguns elementos teóricos e técnicos, cumprindo poucas horas de estágio tornando-a pouco significativa. As autoras argumentam que não são suficientemente desenvolvidas, no decorrer da formação do educador, atividades de prática de docência no âmbito das disciplinas, nem processos experimentais de produção do saber científico, nem de outras modalidades de práticas intrínsecas à profissão, ficando a sua aprendizagem condicionada por uma abordagem curricular mais tradicional, devido ao reduzido tempo, pois os ditos semestres na realidade não o são, ficando de fora muitos aspetos como filosóficos, históricos, sociológicos e antropológicos da educação por se trabalhar convenientemente (Flores & Cardoso, 2009).

Uma outra lacuna que Flores & Cardoso (2009) apontam ao currículo dos cursos de formação docente nos Institutos Superiores de Ciências da Educação, é a de que estes não potenciam o desenvolvimento da necessária sensibilidade e competências face ao contexto sócio – cultural em que o formando, ou seja, o futuro- professor, exercerá a sua atividade. O curso não lhe fornece espaços para conhecer, com o devido rigor, profundidade e criticidade, as condições

80

histórico – sociais do processo educacional concreto em que vai atuar, o que acaba por levar a que a sua prática docente se torna meramente técnica e mecânica (Flores & Cardoso, 2009).

Uma outra grande lacuna no processo de formação de professores nos Institutos Superiores de Ciências da Educação em Angola, prende-se com a opção dos cursos pós-laborais, chamando-se atenção para a sua avaliação. Se quisermos ver o papel do professor, como interventor social de excelência (Burity, 2009 citado por Flores & Cardoso, 2009), leva-nos a refletir sobre essa modalidade, tendo em vista a necessidade de desenvolvermos da melhor forma os nossos recursos humanos (Flores & Cardoso, 2009).

Independentemente do contexto considerado, a situação económica atual faz com que os orçamentos aprovados e atribuídos às Universidades públicas sejam ainda insuficientes para uma gestão ótima e para a aquisição de equipamentos técnicos necessários e adequados às necessidades – da atualização pedagógica e estratégica do docente. É o que se passa também em Angola4, em que os órgãos de gestão da universidade e os professores em particular têm de fazer

um grande esforço para otimizar os escassos recursos e meios de que dispõem para acompanhar as exigências atuais da sociedade.

Angola é um país recém-saído de uma guerra civil de longos anos, uma guerra que trouxe consigo um enorme atraso social, económico e tecnológico. Os números referentes ao analfabetismo, à saúde pública, desemprego e pobreza, são ainda assustadores apesar dos esforços que o estado e o governo têm vindo a desencadear para os melhorar. Neste contexto, o acesso da população em geral às novas tecnologias é bastante limitado, por um lado, pelas precárias condições económicas da maioria da população (o salário mínimo ronda os 65 euros), e por outro lado, pelo fraco desenvolvimento tecnológico e ausência de infraestruturas. Esta situação é particularmente visível no setor do ensino em geral, e nas universidades, em particular. A grande maioria dos estudantes (e dos professores) quando chegam ao ensino superior não tem experiência no uso das novas tecnologias. É comum ver estudantes no 1º ano sem qualquer afinidade com o computador. Vários esforços têm vindo a ser desencadeados para minimizar esta situação, destacando-se entre eles o projeto de Agregação Pedagógica da Universidade Agostinho Neto (UAN)5 onde se inclui um módulo de informática que pretende preparar os professores da UAN para o uso dos computadores e alguns pacotes de software (inclui navegação

4 A República de Angola é um país da África Austral, com uma área de 1.246.700 km2 e uma população estimada (segundo o

censo efetuado em 2014) em cerca de 25 milhões de habitantes. Com diversas línguas nacionais, tem como língua oficial o Português, na qual se faz também o processo de ensino e aprendizagem formal.

5 A Universidade Agostinho Neto (UAN) foi até 2009 a única universidade pública em Angola, altura em que, por um projeto de

descentralização e de ramificação do ensino superior, se criaram 4 regiões académicas e as respetivas universidades publicas regionais. Benguela está incluída na II região académica.

81

e uso da Internet) na preparação e utilização nas aulas. No que respeita aos Institutos de Ciências de Educação em Angola, Cardoso (2006) considera que estes não escapam às exigências de formação impostas pela sociedade atual, no que diz respeito à formação e desenvolvimento de competências e de capacidades intelectuais requeridas face ao desenvolvimento da ciência e das tecnologias, bem como a formação de professores cada vez mais competentes, reflexivos, críticos e investigadores que possam levar a cabo um processo de ensino e aprendizagem construtivo e eficaz.

Toda esta situação obriga-nos a uma análise e reflexão cuidadosa e atenta, de formas a tirar algumas conclusões que nos possam orientar na direção a seguir para adequar quer a nossa escola, quer a nossa sociedade às necessidades atuais. A reforma do sistema de educação com a assunção de politicas proativas e favoráveis à integração correta das TIC, a necessária adequação dos currículos escolares para melhor aproveitamento das potencialidades das tecnologias, mas sobretudo a estruturação dos cursos de formação inicial de professores de formas a preparar quadros diferenciados com competências adequados para utilizar as TIC nas suas aulas, por um lado, mas também para orientar os estudantes e gerir a sua formação e estimula-los a usar essas tecnologias no sua formação e na sua futura pratica profissional.

83