A Formação de professores para a Educação das Relações Raciais e Étnicas e para o ensino de História e Cultura da África e Afro-brasileira.

Em uma pesquisa, referente a questão racial e a formação dos professores, Pinto (2002) constatou que raramente os estudos relativos à formação de professores no Brasil incorporavam as categorias raça, etnia, preconceito e discriminação em suas reflexões. Em sua pesquisa, a autora analisa artigos que tratam da atuação e formação do professor em revistas especializadas em educação com o objetivo de verificar em que medida questões étnico-raciais e seus desdobramentos se inserem nessas reflexões.

Esta pesquisa evidencia que, até o ano de 2002, a presente questão era marginal e invisível tanto no campo da educação em geral, como da formação dos professores em particular; contudo, a partir do início de década de 2000 e com a aprovação da Lei Federal nº 10.639/2003, tal situação mudou de forma significativa, mesmo que num ritmo lento diante das demandas surgidas. Nosso estudo evidencia um quadro geral desta evolução.

A formação de professores tornou-se um dos principais focos das políticas públicas governamentais, das ações dos órgãos e instituições educacionais na Educação Básica e superior. Neste contexto, a formação continuada tem sido o “remédio receitado” para resolver o problema dos milhões de professores que não tiveram acesso a uma educação positiva para o tratamento das questões raciais e étnicas, bem como para o reconhecimento e valorização da História e Cultura da África e Afro-brasileira, e dos descendentes dos africanos e suas diásporas no cotidiano das escolas.

Nos primeiros anos, após a promulgação da Lei Federal nº 10.639/2003, a mobilização dos setores, comprometidos com a luta antirracista e com a implementação das políticas afirmativas de promoção e valorização da igualdade racial, foi para desenvolver as ações necessárias à implementação da lei, principalmente, no campo da formação de professores e da produção de materiais didáticos.

A implementação do disposto na Lei Federal nº 10.639/2003 e suas disposições correlatas, que visam a Educação para as Relações Étnico-raciais e o Ensino de História e Cultura da África e Afro-brasileira, tem sido objeto de discussões acaloradas intra e extramuros das instituições, sejam na gestão e planejamento dos diferentes sistemas de ensino, sejam nas instituições escolares responsáveis pela implementação, gestão e execução do ensino.

Os temas que permeiam estes debates são vários: a reorganização das propostas curriculares dos sistemas de ensino e das unidades escolares; o fomento, elaboração e desenvolvimento de pesquisas científicas; a revisão e produção dos livros didáticos e de outros materiais didáticos de suporte às atividades de ensino, etc.

Contudo, a questão da formação dos professores assumiu o protagonismo tanto das ações governamentais dos órgãos de governo e dos diferentes níveis de ensino, como das diversas instituições, tanto da Educação Básica quanto do ensino superior, dentre as quais, as universidades públicas.

Esta formação dos professores, para a implementação do disposto na Lei Federal nº 10.639/2003 e suas disposições correlatas, tem sido reclamadas:

Pelas organizações do movimento negro e outras organizações não governamentais de promoção da igualdade racial e de combate ao racismo;

Pelos professores da Educação Básica e suas entidades representativas, dentre as quais, os sindicatos de professores das diferentes redes de ensino, que desde a década de 1980, vem multiplicando os espaços de debates da luta antirracista no seu interior; Pelos grupos organizados nas instituições de ensino superior, em especial, pelos

Núcleos de Estudos Afro-brasileiros – NEABs;

Por diversos setores da sociedade civil organizada, por ativistas da luta antirracista, por intelectuais e pesquisadores oriundos de diferentes estratos sociais.

Não é mais possível a omissão e a indiferença das instituições públicas e privadas que são as responsáveis pela organização, gestão e execução das propostas de ensino.

Outrora, iniciativas de formação de professores para a implementação do disposto na referida lei e suas disposições legais correlatas, seja na esfera da formação inicial, na esfera da formação continuada, ou mesmo da educação popular e social, tem sido empreendidas por diferentes órgãos e instituições, mesmo que, ainda, de forma tímida e esporádica; por isso, insuficientes para dar conta da demanda com vistas a esse tipo de formação.

As Instituições de Ensino Superior estão sendo pressionadas interna e externamente pelos órgãos e entidades da sociedade civil e do poder judiciário, para que reestruturem seus currículos com vistas a contemplar a lei, para que promovam a contratação de professores para a implementação de suas normatizações, bem como para que tomem as demais providências em relação ao assunto. Contudo, ainda existe uma resistência destas instituições associadas à carência de especialistas disponíveis no mercado em algumas subáreas específicas.

As unidades escolares e os sistemas de ensino de Educação Básica estão sendo pressionados internamente, principalmente pelos professores, e externamente pela sociedade civil e jurídica, em particular, pelo movimento negro e pelos órgãos do Ministério Público Federal e Estadual.

O tema chegou à pesquisa científica. Já são centenas de teses de doutorado e dissertações50 de mestrado produzidas que, se seguirem o ritmo de crescimento dos últimos

50 _{Na fase inicial deste trabalho, almejávamos o desenvolvimento de um capítulo específico sobre um estado da} arte acerca do tema da nossa investigação. Realizamos uma pesquisa junto ao Banco de Teses e Dissertações da CAPES, no qual identificamos aproximadamente mais de duas dezenas de dissertações de mestrado e próximo de uma centena de teses de doutorado; consolidados num relatório de pesquisa de 256 páginas, divididos por subtemas específicos. Percebemos, no andamento da investigação, que este material constituía-se em fonte para

anos, em menos de uma década atingirão o patamar de milhares. As dissertações de Pós- graduação lato sensu, no que pese a falta de indexador, somente pelos números de formandos nas iniciativas financiadas pelo Ministério da Educação, já passa dos milhares (PAULA, 2012b; BRASIL, 2009).

As bolsas de pesquisa científica distribuídas nas categorias são: bolsas de extensão, iniciação científica, mestrado e doutorado, somente nos programas como UNIAFRO/MEC, PIBIC/AF/CNPq, Programas de Bolsa da Fundação FORD e bolsas para cotistas das universidades públicas e, também, aprovadas em programas como o PROUNI (BRASIL, 2009).

A temática e os sujeitos/objetos de que trata a Lei Federal nº 10.639/2003 adentraram as instituições de ensino superior e, agora, pressionam pelo ingresso nos programas de mestrado, doutorado e níveis superiores. O efeito da lei produziu impactos significativos na Educação Básica e no ensino superior, com vistas a inserirem a obrigatoriedade de mudanças dos currículos escolares, na organização didático-pedagógica, nas concepções que permeiam as políticas públicas e nas práticas pedagógicas no interior das instituições. As temáticas que permeiam a lei estão postas na pauta dos programas de pesquisa científica, de formação de recursos humanos em nível superior, e de formação de professores para a Educação Básica e superior.

Completado o ciclo destas ações de formação inicial e continuada de professores com foco na aplicação da lei, muitas são as ações de pesquisas que tem se debruçado sobre a avaliação e análise da eficácia das ações realizadas com vistas ao disposto na legislação.

Neste capítulo, abordaremos estas iniciativas a partir de produções científicas em forma de teses de doutorado e dissertações de mestrado produzidas na área; as ações realizadas no âmbito da cidade de Uberlândia, MG; os principais atores envolvidos e a ação destes no contexto local; com vistas a situar sob o ponto de vista teórico e prático, a nossa pesquisa.

uma tese de doutorado a parte desta e que não caberia no texto da tese, motivo pelos quais, aproveitamos parte do relatório relativo aos trabalhos sobre formação continuada de professores e prosseguimos rumo da pesquisa sem o restante dos dados.

4.2. As pesquisas científicas sobre formação de professores para a implementação do