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Formas Diferenciais

No documento Tensores e o Teorema de Stokes (páginas 62-103)

As formas diferenciais nada mais s˜ao que campos de tensores alternados. Elas generalizam os campos de vetores e ser˜ao nossos integrandos na pr´oxima se¸c˜ao. Defini¸c˜ao 2.7.1. Seja M uma variedade suave sem bordo. Definimos o fibrado k-tensorial covariante de M como

k O M = G p∈M k O (TpM ).

Similarmente podemos definir o fibrado l-tensorial contravariante de M e o fi- brado (k, l)-tensorial misto de M como

O l M = G p∈M O l (TpM ), k O l M = G p∈M k O l (TpM ).

Perceba que os fibrados tangente e cotangente s˜ao casos especiais de fibrados tensoriais: N

1M = T M e

N1

M = T∗M . Focaremos agora nosso interesse em Nk

M (as constru¸c˜oes que faremos, apesar de n˜ao serem de nosso interesse aqui, tamb´em servem para N

lM e

Nk

l M ).

H´a uma proje¸c˜ao natural π : Nk

M → M dada por π(p, ω) = p. Uma se¸c˜ao de Nk

M ´e uma se¸c˜ao da proje¸c˜ao π : Nk

M → M , isto ´e, uma fun¸c˜ao cont´ınua Y : M →Nk

M que, a cada p ∈ M associa Y (p) = Yp ∈NkM e que satisfaz

π ◦ Y = idM.

Uma se¸c˜ao deNk

M ´e suave se Y : M →Nk

M ´e suave.

Defini¸c˜ao 2.7.2. Seja M uma variedade suave sem bordo. Uma se¸c˜ao de Nk M ´e chamada de campo de k-tensores (covariantes) em M . Um campo de k-tensores (covariantes) suave em M ´e uma se¸c˜ao deNk

M suave.

Denotaremos o espa¸co vetorial de todos os campos de k-tensores suaves em M por Tk(M ). Como vimos no Cap´ıtulo 1, dada (dxi) uma base de T

pM , os tensores

da forma dxi1 ⊗ · · · ⊗ dxik, com i

j = 1, . . . , n, formam uma base para Nk(TpM ).

Assim, dadas coordenadas locais (xi), qualquer campo de tensores ξ ∈Nk

M pode ser escrito nessas coordenadas como

ξ = X

i1,...,ik

ξi1...ik dx

i1 ⊗ · · · ⊗ dxik.

As fun¸c˜oes ξi1...ik s˜ao chamadas de fun¸c˜oes componentes de ξ com rela¸c˜ao a (x

i).

Lema 2.7.3. Seja M uma variedade suave sem bordo e ξ : M →Nk

M uma se¸c˜ao deNk

M . S˜ao equivalentes: (1) ξ ´e suave.

(2) Para qualquer carta de coordenadas em M , as fun¸c˜oes componentes de ξ s˜ao suaves.

(3) Seja U ⊂ M aberto. Se Xi, . . . , Xks˜ao campos de vetores suaves em U , a fun¸c˜ao

ξ(X1, . . . , Xk) : U → R dada por

ξ(X1, . . . , Xk)(p) = ξp(X1|p, . . . , Xk|p)

´e suave.

Um campo de 1-tensores nada mais ´e que um campo de covetores. Como um 0-tensor ´e simplesmente um n´umero real, um campo de 0-tensores ´e apenas uma fun¸c˜ao cont´ınua de M em R.

Estamos, agora, em condi¸c˜oes de definir as formas diferenciais:

Defini¸c˜ao 2.7.4. Seja M uma variedade suave de dimens˜ao n sem bordo. Denota- remos o subconjunto de Nk

M dos k-tensores covariantes alternados por

k ^ M = G p∈M k ^ (TpM ).

Defini¸c˜ao 2.7.5. Uma se¸c˜ao de Vk

M ´e chamada de k-forma diferencial em M . Uma k-forma diferencial suave em M ´e uma se¸c˜ao suave de Vk

M . Usaremos a nota¸c˜ao ω ∈ Vk

M . Denotaremos o espa¸co vetorial das k-formas diferenciais suaves em M por Ak(M ). Como vimos no Cap´ıtulo 1, dada (dxi) uma base de Tp∗M , os tensores da forma dxi1∧· · ·∧dxik, com i

1 < · · · < ik, ij ∈ {1, . . . , n},

formam uma base para Vk

(TpM ). Assim, em coordenadas locais (xi), qualquer k-

forma diferencial ω em M pode ser escrita como ω = X

i1<···<ik

ωi1...ik dx

i1 ∧ · · · ∧ dxik.

Usaremos como abrevia¸c˜oes, quando n˜ao houver risco de confus˜ao, ωI = ωi1...ik

e dxI = dxi1 ∧ · · · ∧ dxik, ficando claro que I ´e um ´ındice m´ultiplo crescente de

comprimento k com entradas em {1, . . . , n}. Assim, P

I diz que a soma se estende

a todos os poss´ıveis ´ındices m´ultiplos I daquele tipo. Dessa forma, uma k-forma diferencial ω em M pode ser escrita em coordenadas locais como

ω =X

I

ωI dxI.

O resultado an´alogo para formas diferenciais do Lema 1.9.15(3) ´e dxi1 ∧ · · · ∧ dxik  ∂ ∂xj1, . . . , ∂ ∂xjk  = δJI. Portanto as componentes ωI de ω ficam determinadas por

ωI = ω  ∂ ∂xi1, . . . , ∂ ∂xik  .

Exemplo 2.7.6. Exemplos de formas em R3 ao

ξ = sin(xy) dx ∧ dy ζ = x2 dx + y2 dy + z2 dz

Exemplo 2.7.7. Qualquer n-forma em Rn ´e apenas uma fun¸c˜ao de Rn em R cont´ınua, pois existe apenas um ´ındice m´ultiplo crescente de comprimento n com entradas em {1, . . . , n}.

Uma 0-forma ´e tamb´em apenas uma fun¸c˜ao cont´ınua de Rnem R. Uma 1-forma ´e um campo de covetores.

Defini¸c˜ao 2.7.8. Seja M uma variedade suave de dimens˜ao n sem bordo, ω uma k-forma diferencial em M e υ uma l-forma diferencial em M . O produto exterior de ω e υ ´e a (k + l)-forma diferencial

(ω ∧ υ)p = ωp∧ υp

em M .

Se f ´e uma 0-forma, n´os interpretamos o produto f ∧ ω como o produto usual f ω. Definindo A∗(M ) = n M k=0 Ak(M ),

temos que (A∗(M ), +, ∧, ·, R) se torna uma ´algebra graduada associativa anticomu- tativa.

Defini¸c˜ao 2.7.9. Sejam M e N variedades suaves sem bordo, f : M → N suave e ω uma k-forma diferencial em N . Definimos a k-forma diferencial em M , chamada de pullback de ω por f , por

(f∗w)p(X1, . . . , Xk) = wf (p)(f∗X1, . . . , f∗Xk).

Lema 2.7.10. Sejam M e N variedades suaves sem bordo, f : M → N suave, ω uma k-forma diferencial em N e υ uma l-forma diferencial em N . Ent˜ao:

(1) f∗ : Ak(N ) → Ak(M ) ´e linear. (2) f∗(ω ∧ υ) = f∗ω ∧ f∗υ. (3) Em qualquer carta, f∗ X I ωI dxI ! =X I (ωI◦ f ) d(xI ◦ f ).

Este lema nos d´a uma f´ormula para computarmos pullbacks de formas diferen- ciais. Note que podemos us´a-la, em particular, para determinar a express˜ao de uma forma em outra carta de coordenadas.

Exemplo 2.7.11. Seja ω a forma diferencial dx ∧ dy em R2. Encarando a trans-

forma¸c˜ao para coordenadas polares

 x = r cos(θ) y = r sin(θ)

como uma express˜ao para a fun¸c˜ao identidade com rela¸c˜ao a diferentes coordenadas no dom´ınio e na imagem, obtemos

ω = dx ∧ dy

= d(r cos(θ)) ∧ d(r sin(θ))

= (cos(θ) dr − r sin(θ) dθ) ∧ (sin(θ) dr + r cos(θ) dθ) = r cos2(θ) dr ∧ dθ − r sin2(θ) dθ ∧ dr.

Como dθ ∧ dr = −dr ∧ dθ, temos

dx ∧ dy = r dr ∧ dθ.

Perceba a similaridade dessa f´ormula com a f´ormula de mudan¸ca de coordenadas cartesianas para coordenadas polares para integrais duplas. A proposi¸c˜ao seguinte generaliza esse resultado.

Proposi¸c˜ao 2.7.12. Sejam M e N variedades suaves de dimens˜ao n sem bordo, f : M → N suave, (xi) e (yi) coordenadas em abertos U ⊂ M e V ⊂ N respectivamente

e u : V → R suave. Ent˜ao, em U ∩ f−1(V ) vale

f∗(u dy1∧ · · · ∧ dyn) = (u ◦ f ) det(Df ) dx1∧ · · · ∧ dxn, (2.3) onde Df denota a matriz das derivadas parciais de f em coordenadas.

Demonstra¸c˜ao: Como, para cada p ∈ M , Vn

(TpM ) ´e gerado por dx1∧ · · · ∧ dxn,

´e suficiente mostrar que ambos os lados de (2.3) d˜ao o mesmo resultado quando calculados em (∂/∂x1, . . . , ∂/∂xn). Pelo Lema 2.7.10,

f∗(u dy1∧ · · · ∧ dyn) = (u ◦ f ) df1∧ · · · ∧ dfn.

Pela Proposi¸c˜ao 1.10.3, temos df1∧ · · · ∧ dfn  ∂ ∂x1, . . . , ∂ ∂xn  = det  dfj  ∂ ∂xi  = det ∂f j ∂xi  .

Portanto, o lado esquerdo da equa¸c˜ao 2.3 ´e (u ◦ f ) det(Df ) quando aplicado em (∂/∂x1, . . . , ∂/∂xn).

Por outro lado, o lado direito tamb´em ´e (u ◦ f ) det(Df ), pois dx1∧ · · · ∧ dxn  ∂ ∂x1, . . . , ∂ ∂xn  = 1. 

Corol´ario 2.7.13. Se (U, (xi)) e ( eU , (˜xj)) s˜ao cartas com U ∩ ( eU ) 6= ∅, em U ∩ ( eU )

vale d˜x1∧ · · · ∧ d˜xn = det ∂ ˜x j ∂xi  dx1∧ · · · ∧ dxn.

Veremos agora que para qualquer variedade suave M existe um operador dife- rencial d : Ak(M ) → Ak+1(M ) tal que d(dw) = 0 para toda ω.

Defini¸c˜ao 2.7.14. Seja M uma variedade suave e (U, (xi)) uma carta de coorde-

nadas de M . Definimos d : Ak(U ) → Ak+1(U ), chamado de k-´esima diferencial

exterior em M , por d X J ωJ dxJ ! =X J dωJ ∧ dxJ, (2.4) ondeP

JωJ dxJ ´e a representa¸c˜ao em coordenadas de ω com rela¸c˜ao a (xi) e dωJ ´e

a diferencial de ωJ.

O teorema a seguir mostra que d est´a bem definido e que essa defini¸c˜ao ´e in- dependente de escolha de coordenadas. A demonstra¸c˜ao deste teorema pode ser encontrada em [5].

Teorema 2.7.15. Seja M uma variedade suave. Ent˜ao, para cada k ≥ 0, h´a um ´

unico operador linear

d : Ak(M ) → Ak+1(M ) satisfazendo:

(1) Se f : M → R ´e uma fun¸c˜ao suave (uma 0-forma), ent˜ao df ´e a diferencial de f definida por

df (X) = Xf. (2) Se ω ∈ Ak(M ) e υ ∈ Al(M ), ent˜ao

d(ω ∧ υ) = dω ∧ υ + (−1)k dυ ∧ ω. (3) d ◦ d = 0.

(4) Para toda carta de coordenadas (U, (xi)) de M , d ´e dado por (2.4).

(5) Se ω = ω0 em um aberto U ∈ M , ent˜ao dω = dω0 em U . (6) Se U ⊂ M ´e aberto, ent˜ao d(ω|U) = (dω)|U.

Exemplo 2.7.16. Em R3, qualquer 1-forma suave pode ser escrita como

ω = P dx + Q dy + R dz, onde P, Q, R : R3 → R s˜ao fun¸c˜oes suaves. Temos

dω = dP ∧ dx + dQ ∧ dy + dR ∧ dz =  ∂P ∂x dx + ∂P ∂y dy + ∂P ∂z dy  ∧ dx + ∂Q ∂x dx + ∂Q ∂y dy + ∂Q ∂z dy  ∧ dy + ∂R ∂x dx + ∂R ∂y dy + ∂R ∂z dy  ∧ dz =  ∂Q ∂x − ∂P ∂y  dx ∧ dy + ∂R ∂x − ∂P ∂z  dx ∧ dz + ∂Q ∂y − ∂R ∂z  dy ∧ dz.

O pr´oximo lema indica como d se comporta em rela¸c˜ao a pullbacks:

Lema 2.7.17. Sejam M e N variedades suaves e f : M → N suave. Ent˜ao, para toda ω ∈ Ak(N ),

f∗(dω) = d(f∗ω).

Demonstra¸c˜ao: Como d ´e local (Teorema 2.7.15), segue que se o resultado ´e v´alido para uma vizinhan¸ca de cada ponto, ele ´e v´alido em M . Em coordenadas locais ω pode ser escrita como uma soma de termos de tipo g dxi1∧ · · · ∧ dxik, portanto, por

linearidade, ´e suficiente mostrar que o resultado vale para uma termo deste tipo. Temos f∗d(g dxi1 ∧ · · · ∧ dxik) = f(dg ∧ dxi1 ∧ · · · ∧ dxik) = d(g ◦ f ) ∧ (dxi1 ◦ f ) ∧ · · · ∧ (dxik ◦ f ), enquanto que df∗(g dxi1 ∧ · · · ∧ dxik) = d((g ◦ f )(dxi1 ◦ f ) ∧ · · · ∧ (dxik◦ f )) = d(g ◦ f ) ∧ (dxi1 ◦ f ) ∧ · · · ∧ (dxik◦ f ), e o resultado segue. 

2.8

Orienta¸c˜oes

Grosso modo, uma orienta¸c˜ao para uma reta ´e escolher um sentido “preferido” nela. Declaramos assim que uma base orientada para tal reta consiste de um vetor que aponta para o sentido escolhido. J´a uma base ordenada “preferida” para R2 consiste de vetores cuja rota¸c˜ao do primeiro vetor at´e o segundo ´e uma rota¸c˜ao no sentido anti-hor´ario.

Nessa se¸c˜ao n´os formalizamos e generalizamos esse conceito.

Defini¸c˜ao 2.8.1. Seja E um espa¸co vetorial de dimens˜ao finita n ≥ 1. Dizemos que duas bases ordenadas (ei), (˜ei) de E tˆem a mesma orienta¸c˜ao se

det(Bij) > 0,

onde (Bij) ´e a matriz mudan¸ca de base de (˜ei) para (ei).

Se (ei) ´e uma base de E, denotamos [ei] a classe de todas as bases (˜ei) tais

que (ei) e (˜ei) tˆem a mesma orienta¸c˜ao. Se dim(E) ≥ 1, uma orienta¸c˜ao em E ´e

uma classe [ei], para alguma base (ei) escolhida. Uma dupla (E, [ei]) ´e chamada de

espa¸co vetorial orientado, e, se (ei) ∈ [ei], ent˜ao (ei) ´e dita positivamente orientada.

Qualquer base que n˜ao perten¸ca `a orienta¸c˜ao dada ´e dita negativamente orientada. Caso dim(E) = 0, uma orienta¸c˜ao para E ´e simplesmente uma escolha entre +1 ou −1.

Exemplo 2.8.2. Seja n > 0. A orienta¸c˜ao [e1, . . . , en] de Rn determinada pela

base canˆonica (e1, . . . , en) ´e chamada de orienta¸c˜ao canˆonica de Rn. A orienta¸c˜ao

H´a uma importante rela¸c˜ao entre orienta¸c˜oes e tensores alternados, como mostra a proposi¸c˜ao a seguir.

Proposi¸c˜ao 2.8.3. Seja E um espa¸co vetorial de dimens˜ao finita n ≥ 1 e f ∈ Vn

(E), f 6= 0. O conjunto das bases ordenadas (ei) de E tais que f (e1, . . . , en) > 0

´e uma orienta¸c˜ao em E.

Demonstra¸c˜ao: Basta notar que, se f ´e n˜ao nula, como vimos na Se¸c˜ao 1.11, f ´e

um m´ultiplo do determinante. 

Se E ´e um espa¸co vetorial orientado e f ∈ Vn

(E) ´e um tensor que determina a orienta¸c˜ao em E, dizemos que f ´e um tensor positivamente orientado. O tensor dx1 ∧ · · · ∧ dxn, por exemplo, ´e um tensor positivamente orientado de Rn com a

orienta¸c˜ao canˆonica.

Vejamos agora como se generaliza a no¸c˜ao de orienta¸c˜ao para variedades. Seja M uma variedade suave sem bordo. Uma orienta¸c˜ao pontual em M ´e a escolha de uma orienta¸c˜ao para cada TpM . Note, por´em, que este n˜ao ´e um

conceito muito ´util, visto que a orienta¸c˜ao em pontos em uma vizinhan¸ca pode n˜ao ter nenhuma rela¸c˜ao. Para haver alguma rela¸c˜ao entre uma orienta¸c˜ao e a estrutura suave precisamos de uma condi¸c˜ao extra.

Se ´e dada uma orienta¸c˜ao pontual em M , dizemos que um referencial local (η1, . . . , ηn) para M ´e positivamente orientado se, para todo p ∈ U , (η1|p, . . . , ηn|p)

´e uma base positivamente orientada de TpM . Um referencial local negativamente

orientado ´e definido analogamente.

Uma orienta¸c˜ao pontual em M ´e dita cont´ınua se cada ponto p ∈ M est´a contido no dom´ınio de um referencial local positivamente orientado.

Agora temos condi¸c˜oes de definir orienta¸c˜oes em uma variedade:

Defini¸c˜ao 2.8.4. Seja M uma variedade suave sem bordo. Uma orienta¸c˜ao em M ´e uma orienta¸c˜ao pontual cont´ınua em M . Uma variedade suave com uma orienta¸c˜ao escolhida ´e chamada de variedade orientada, e dizemos que uma variedade M ´e orient´avel se existe uma orienta¸c˜ao para M .

Se M tem dimens˜ao 0, uma orienta¸c˜ao em M ´e simplesmente associa¸c˜ao de +1 ou −1 a cada um de seus pontos. Logo, toda variedade de dimens˜ao 0 ´e orient´avel. Seja (U, ϕ) uma carta de coordenadas de uma variedade suave sem bordo M . Dizemos que (U, ϕ) ´e positivamente orientada se o referencial local (∂/∂xi) ´e posi-

tivamente orientado. Caso contr´ario, (U, ϕ) ´e negativamente orientada.

Defini¸c˜ao 2.8.5. Uma cole¸c˜ao de cartas de coordenadas {(Uα, ϕα)} ´e dita consis-

tentemente orientada se, para qualquer α, β,

det(D(ϕβ◦ ϕ−1α )) > 0

em ϕα(Uα∩ Uβ), sendo que D(ϕβ ◦ ϕ−1α ) denota a matriz das derivadas parciais de

ϕβ ◦ ϕ−1α em coordenadas.

As duas proposi¸c˜oes seguintes nos fornecem modos mais pr´aticos para especificar orienta¸c˜oes em variedades.

Proposi¸c˜ao 2.8.6. Seja M uma variedade suave de dimens˜ao n > 0 sem bordo. Dada uma cobertura aberta de M por cartas de coordenadas consistentemente orien- tadas {(Uα, ϕα)}, h´a uma ´unica orienta¸c˜ao em M tal que cada carta de coordenadas

(Uα, ϕα) ´e positivamente orientada.

Demonstra¸c˜ao: Seja {(Uα, ϕα)} uma cobertura aberta de M por cartas de coor-

denadas consistentemente orientadas. Para qualquer p ∈ M , a condi¸c˜ao de con- sistˆencia implica que a matriz mudan¸ca de base entre as bases determinadas por duas quaisquer cartas tem determinante positivo. Assim, as bases para quaisquer cartas contendo p determinam a mesma orienta¸c˜ao em TpM . Fica, ent˜ao, definida

uma orienta¸c˜ao pontual em M .

Cada p ∈ M est´a contido no dom´ınio de pelo menos uma carta de coordenadas, e o referencial local correspondente ´e positivamente orientado por defini¸c˜ao, portanto tal orienta¸c˜ao pontual ´e cont´ınua.  Proposi¸c˜ao 2.8.7. Seja M uma variedade suave de dimens˜ao n > 0 sem bordo. Qualquer n-forma ω ∈ An(M ), ω(p) 6= 0 ∀p ∈ M , determina uma ´unica orienta¸c˜ao em M tal que ω ´e positivamente orientada em cada ponto de M .

Demonstra¸c˜ao: A n-forma ω define, pela Proposi¸c˜ao 2.8.3, uma orienta¸c˜ao pontual em M . Precisamos mostrar que esta ´e cont´ınua.

Sejam (xi) coordenadas locais em um dom´ınio conexo U ⊂ M . Em U , ω se

escreve como

ω = f dx1∧ · · · ∧ dxn,

para alguma fun¸c˜ao cont´ınua f . Como ω ´e n˜ao nula, f ´e n˜ao nula, e segue que ω  ∂ ∂x1, . . . , ∂ ∂xn  = f 6= 0

em todo ponto de U . Como U ´e conexo, conclu´ımos que essa express˜ao ´e sempre positiva ou sempre negativa em U e, portanto, a carta de coordenadas ´e positiva- mente orientada ou negativamente orientada. Caso seja negativamente orientada, substitu´ımos xi por −xi, obtendo uma nova carta, para a qual o referencial local ´e

positivamente orientado. Assim a orienta¸c˜ao pontual definida por ω ´e cont´ınua.  Devido a esta ´ultima proposi¸c˜ao, qualquer n-forma que n˜ao se anula em uma variedade suave de dimens˜ao n ´e chamada de forma de orienta¸c˜ao. Se M ´e uma variedade orientada e ω ´e a forma que determina a orienta¸c˜ao de M , dizemos que ω ´e positivamente orientada. Verifica-se que, se ω e ξ s˜ao duas formas positivamente orientadas em M , ent˜ao ω = f ξ, para alguma fun¸c˜ao f : M → R suave estritamente positiva.

Note, ainda, que o resultado da Proposi¸c˜ao 2.8.7 continua v´alido para variedades de dimens˜ao 0 se convencionarmos que ω atribui a orienta¸c˜ao +1 aos pontos nos quais ela ´e positiva e −1 aos pontos nos quais ela ´e negativa.

Defini¸c˜ao 2.8.8. Sejam M e N variedades orientadas de dimens˜ao positiva e f : U ⊂ M → V ⊂ N um difeomorfismo local. Dizemos que f preserva orienta¸c˜ao se, para cada p ∈ U , f∗ leva bases positivamente orientadas de TpM em bases

Analogamente, dizemos que f reverte orienta¸c˜ao se f∗ leva bases positivamente

orientadas de TpM em bases negativamente orientadas de Tf (p)N .

Uma orienta¸c˜ao em uma variedade suave com bordo pode ser definida exatamente como fizemos para variedades suaves sem bordo. Como j´a vimos, bordo de uma variedade suave M de dimens˜ao n com bordo, quando n˜ao vazio, ´e uma variedade suave de dimens˜ao n − 1 sem bordo. Quando munimos M de uma orienta¸c˜ao, esta induz uma orienta¸c˜ao em ∂M , chamada de orienta¸c˜ao induzida no bordo. Vejamos como isso ocorre:

Seja M uma variedade suave de dimens˜ao n com bordo. Ent˜ao, por defini¸c˜ao, para todo p ∈ ∂M existe uma carta de coordenadas (U, ϕ) tal que p ∈ U e que ϕ(U ∩ ∂M ) = ϕ(U ) ∩ ∂Hn. Seja p ∈ ∂M e (U, (xi)) uma carta de coordenadas com p ∈ U . Dizemos que um vetor

N = n X i=1 Ni ∂ ∂xi p

em TpM aponta para dentro se a componente Nn de N ´e positiva. Analogamente,

dizemos que N aponta para fora se Nn< 0.

Defini¸c˜ao 2.8.9. Um campo de vetores sobre ∂M ´e uma fun¸c˜ao cont´ınua N : ∂M → T M tal que N (p) = Np ∈ TpM

Note a diferen¸ca entre um campo de vetores sobre ∂M e um campo de vetores em ∂M (este ´ultimo deveria satisfazer Np ∈ Tp∂M para todo p ∈ ∂M ). Dizemos

que um campo de vetores N sobre ∂M aponta para fora se Np aponta para fora,

para cada p ∈ ∂M .

Lema 2.8.10. Seja M uma variedade suave com bordo. Existe um campo suave de vetores que aponta para fora sobre ∂M .

Demonstra¸c˜ao: Sejam (Uα, ϕα) cartas de coordenadas em M tais que cole¸c˜ao {Uα}

´e uma cobertura de uma vizinhan¸ca de ∂M . Em cada uma dessas cartas, Nα = − ∂ ∂xn ∂M ∩Uα

´e um campo suave de vetores sobre ∂M ∩ Uα que aponta para fora. Tome {ψα}

uma parti¸c˜ao da unidade com rela¸c˜ao `a cobertura {Uα ∩ ∂M } de ∂M e defina N

um campo suave de vetores sobre ∂M por N =X

α

ψαNα.

Precisamos mostrar que N aponta para fora. Sejam (y1, . . . , yn) coordenadas locais

em uma vizinhan¸ca de p ∈ ∂M . Como cada Nα aponta para fora, vale dyn(Nα) < 0.

Portanto

dyn(Np) =

X

α

pois cada termo da soma acima ´e estritamente negativo e pelo menos um deles ´e

n˜ao nulo. 

Dada uma n-forma de orienta¸c˜ao ω em M , a existˆencia de um campo de vetores que aponta para fora N sobre ∂M nos permite definir uma (n − 1)-forma iNω em

M , chamada de contra¸c˜ao de ω com rela¸c˜ao a N e dada por  iNω(Y1, . . . , Yn)  p =ω(N, Y1, . . . , Yn)  p

tal que iNω|∂M ´e uma forma de orienta¸c˜ao em ∂M . Mais precisamente, temos a

proposi¸c˜ao seguinte:

Proposi¸c˜ao 2.8.11. Seja M uma variedade orientada com bordo. Ent˜ao ∂M ´e orient´avel, e a orienta¸c˜ao determinada por qualquer campo suave de vetores sobre ∂M que aponta para fora ´e independente da escolha desse campo.

`

A orienta¸c˜ao da proposi¸c˜ao acima damos o nome de orienta¸c˜ao induzida no bordo.

Exemplo 2.8.12. Seja Hn munido da orienta¸c˜ao canˆonica. Vamos determinar a

orienta¸c˜ao induzida em ∂Hn.

Note que ∂Hn pode ser identificado com Rn−1 via a correspondˆencia

(x1, . . . , xn−1, 0) 7→ (x1, . . . , xn−1).

Como o campo de vetores −∂/∂xn sobre ∂Hn aponta para fora, o referencial das

coordenadas padr˜ao para Rn−1 ser´a positivamente orientado para ∂Hn se, e somente

se, [−∂/∂xn, ∂/∂x1, . . . , ∂/∂xn−1] ´e a orienta¸c˜ao canˆonica de Rn. Temos  − ∂ ∂xn, ∂ ∂x1, . . . , ∂ ∂xn−1  = −  ∂ ∂xn, ∂ ∂x1, . . . , ∂ ∂xn−1  = (−1)n  ∂ ∂x1, . . . , ∂ ∂xn  .

Portanto, a orienta¸c˜ao induzida em ∂Hn ´e igual `a orienta¸c˜ao canˆonica em Rn−1 se

n ´e par e ´e a orienta¸c˜ao oposta a esta se n ´e ´ımpar. Em particular, as coordenadas padr˜ao em ∂Hn ao positivamente orientadas se, e somente se, n ´e par.

2.9

Integra¸c˜ao

Nesta se¸c˜ao veremos como integrar n-formas diferenciais em variedades suaves de dimens˜ao n e demonstraremos o Teorema de Stokes em variedades.

Defini¸c˜ao 2.9.1. Seja D ⊂ Rn um dom´ınio de integra¸c˜ao compacto e ω uma n-

forma diferencial em D. Definimos a integral de ω em D como Z D ω = Z D f, onde f : Rn→ R ´e a fun¸c˜ao cont´ınua tal que

A defini¸c˜ao acima por ser escrita, de forma mais sugestiva, como Z D ω = Z D f dx1∧ · · · ∧ dxn= Z D f dx1. . . dxn.

Defini¸c˜ao 2.9.2. Seja U ⊂ Rn aberto. Definimos o suporte de uma n-forma dife-

rencial em U por

supp(ω) ={x ∈ U | ω(x) 6= 0}. Se supp(ω) ´e compacto, dizemos que ω tem suporte compacto.

Para que possamos definir a integral em U de uma n-forma diferencial com suporte compacto, precisamos do seguinte lema:

Lema 2.9.3. Sejam K ⊂ U ⊂ Rntais que U ´e aberto e K ´e compacto. Ent˜ao existe

um dom´ınio de integra¸c˜ao D tal que K ⊂ D ⊂ U . Assim podemos definir:

Defini¸c˜ao 2.9.4. Seja U ⊂ Rn aberto e ω uma n-forma diferencial em U com

suporte compacto. Definimos a integral de ω em U por Z U ω = Z D ω,

onde D ´e qualquer dom´ınio de integra¸c˜ao tal que supp(ω) ⊂ D ⊂ U .

De forma similar, se V ⊂ Hn ´e aberto, e ω ´e uma n-forma diferencial em V com suporte compacto, definimos

Z V ω = Z D∩Hn ω,

onde D ´e qualquer dom´ınio de integra¸c˜ao tal que supp(ω) ⊂ D ⊂ V .

Proposi¸c˜ao 2.9.5. Sejam D, E ⊂ Rn dom´ınios de integra¸c˜ao compactos e seja

ω ´e uma n-forma diferencial em E. Se g : D → E ´e uma fun¸c˜ao suave tal que g : int(D) → int(E) ´e um difeomorfismo que preserva ou reverte orienta¸c˜ao, ent˜ao

Z E ω =          Z D g∗ω se g preserva orienta¸c˜ao − Z D g∗ω se g reverte orienta¸c˜ao

Demonstra¸c˜ao: Sejam (x1, . . . , xn) e (y1, . . . , yn) as coordenadas padr˜ao em D e E respectivamente e suponha que g preserva orienta¸c˜ao. Escrevendo ω = f dy1∧ · · · ∧ dyn, pela formula de mudan¸ca de vari´aveis (Teorema 3.4.24) e pela f´ormula

Z E ω = Z E f = Z D (f ◦ g)| det(Dg)| = Z D (f ◦ g)(det(Dg)) = Z D (f ◦ g)(det(Dg)) dx1∧ · · · ∧ dxn = Z D g∗ω.

Se g reverte orienta¸c˜ao, a menos do sinal negativo, que neste caso surge pois | det(Dg)| = − det(Dg), o c´alculo ´e an´alogo.  Corol´ario 2.9.6. Sejam U, V ⊂ Rn abertos, g : U → V um difeomorfismo que

preserva orienta¸c˜ao e ω ´e uma n-forma diferencial em V com suporte compacto. Ent˜ao Z V ω = Z U g∗ω.

Usando os resultados sobre integra¸c˜ao de n-formas diferenciais em Rn coleta-

dos acima, vamos agora definir integra¸c˜ao de n-formas diferenciais em variedades orientadas.

Se M ´e uma variedade orientada de dimens˜ao n ≥ 1 sem bordo e ω ´e uma n- forma diferencial em M com suporte compacto e contido no dom´ınio de uma ´unica carta de coordenadas (U, ϕ) de M , definimos a integral de ω em M como

Z M ω = Z ϕ(U ) (ϕ−1)∗ω.

Note que (ϕ−1)∗ω ´e uma n-forma diferencial com suporte compacto e contido em ϕ(U ) ⊂ Rn.

Proposi¸c˜ao 2.9.7. Seja M ´e uma variedade orientada de dimens˜ao n ≥ 1 sem bordo e ω ´e uma n-forma diferencial em M com suporte compacto e contido no dom´ınio de uma ´unica carta de coordenadas orientada (U, ϕ) de M . Ent˜ao

Z

M

ω

n˜ao depende da escolha da carta de coordenadas (U, ϕ).

Demonstra¸c˜ao: Seja ( eU ,ϕ) outra carta de coordenadas orientada tal que supp(ω) ⊂e e

U . Comoϕ◦ϕe −1 : ϕ(U ∩ eU ) →ϕ(U ∩ ee U ) ´e um difeomorfismo que preserva orienta¸c˜ao, pelo Corol´ario 2.9.6,

Z e ϕ( eU ) (ϕe−1)∗ω = Z e ϕ(U ∩ eU ) (ϕe−1)∗ω = Z e ϕ(U ∩ eU ) (ϕ ◦ ϕe −1)∗(ϕe−1)∗ω = Z e ϕ(U ∩ eU ) (ϕ−1)∗(ϕ)e ∗(ϕe−1)∗ω = Z ϕ(U ) (ϕ−1)∗ω.

Ent˜ao as duas defini¸c˜oes de RMω coincidem.  Se M ´e uma variedade orientada de dimens˜ao n ≥ 1 com bordo e ω uma n-forma diferencial em M com suporte compacto e contido no dom´ınio de uma ´unica carta de coordenadas de M , a defini¸c˜ao de RMω ´e a mesma, exceto que integraremos em abertos de Hn. O resultado da Proposi¸c˜ao 2.9.7 acima tamb´em continua v´alido com

essa altera¸c˜ao.

Para definirmos a integral de uma n-forma diferencial em uma variedade ori- entada M de dimens˜ao n, usamos a defini¸c˜ao para esse caso especial que vimos, juntamente com uma parti¸c˜ao da unidade.

Defini¸c˜ao 2.9.8. Seja M uma variedade orientada de dimens˜ao n ≥ 1 com bordo e ω uma n-forma diferencial em M com suporte compacto. Seja {(Ui, ϕi)} uma co-

bertura finita de supp(ω) por cartas de coordenadas orientadas e {ψi} uma parti¸c˜ao

suave da unidade com rela¸c˜ao `a {(Ui, ϕi)}. Definimos a integral de ω em M como

Z M ω =X i Z M ψiω.

Como supp(ψiω) ⊂ Ui´e compacto, cada termo da soma acima est´a bem definido.

Lema 2.9.9. A defini¸c˜ao de R

Mω dada acima n˜ao depende da escolha das cartas

de coordenadas nem da parti¸c˜ao da unidade.

Demonstra¸c˜ao: Seja {( eUj,ϕej)} uma outra cole¸c˜ao de cartas de coordenadas orien- tadas cujos dom´ınios formam uma cobertura finita de supp(ω) e { eψj} uma parti¸c˜ao

suave da unidade com rela¸c˜ao `a {( eUj,ϕej)}. Temos, para cada i, Z M ψiω = Z M X j e ψj ! ψiω = X j Z M e ψjψiω. Somando em i, X i Z M ψiω = X i,j Z m e ψjψiω.

Cada termo nesta ´ultima soma ´e a integral de uma n-forma diferencial com su- porte compacto e contido no dom´ınio de uma ´unica carta de coordenadas que, pela Proposi¸c˜ao 2.9.7, est´a bem definida. O mesmo argumento mostra que

X j Z M e ψjω = X i,j Z m e ψjψiω.

Portanto ambos os casos fornecem o mesmo valor para RMω.  Se M tem dimens˜ao 0, definimos a integral de uma 0-forma diferencial (ou seja, uma fun¸c˜ao f : M → R) em M por

Z

M

f = X

p∈M

onde a escolha de ± ´e de acordo com a orienta¸c˜ao em cada p ∈ M . Como f tem

No documento Tensores e o Teorema de Stokes (páginas 62-103)

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