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Função docente e o ensino de Física

A Física representa uma ciência altamente estruturada. Em consequência, ensinar uma disciplina de características peculiares que abrange ideias abstratas de diferentes campos do conhecimento não é fácil (Robilotta & Babichak, 1997; Gleiser, 2000). Uma das grandes dificuldades encontradas por professores de Física é ade- quar o conteúdo aos interesses e necessidades dos alunos. Estudos (Nardi, 1998) têm mostrado que tanto o livro didático quanto as aulas de Física enfocam a resolução de exercícios. De modo geral, desenvolve-se uma grande preocupação com o vestibular e uma rara abordagem do processo histórico relacionado aos temas estu- dados. Apesar do interesse de muitos estudantes em ingressar em uma universidade, apenas resolver exercícios distancia-se de uma aprendizagem significativa. Fazer com que os alunos atribuam sentidos aos conceitos e à linguagem matemática da Física continua sendo um problema para os professores. Inclusive entre os alunos que conseguem um relativo sucesso na solução algébrica dos exer- cícios, o entendimento dos conceitos, de modo a se tornarem ins- trumentos de compreensão da realidade, continua distante. Segundo as Orientações Curriculares para o Ensino Médio:

esses problemas são de tal modo idealizados que podem ser resol- vidos com a mera aplicação de fórmulas, bastando ao aluno saber

qual expressão usar e substituir os dados presentes no enunciado do problema. Essas práticas não asseguram a competência inves- tigativa, visto que não promovem a reflexão e a construção do co- nhecimento. (Brasil, 2006, p.54)

Os professores que concebem suas aulas em torno da resolução de exercícios e problemas de Física tornam o ensino maçante para os jovens, que acabam perdendo o interesse pela disciplina. Nesse contexto, Gleiser (2000) adverte-nos:

É muito comum, no ensino de ciência, omitir a parte mais essencial, que é justamente o fascínio que leva um cientista a dedicar toda uma vida ao estudo da natureza. Sem esse elemento, ciência vira um exercício intelectual destituído de paixão, uma mera repetição de conceitos e fórmulas. (p.5)

Além disso, é sabido que o número de aulas de Física nas es- colas é reduzido. Normalmente, as turmas do ensino médio têm duas aulas semanais e o conteúdo de Física é extenso. É necessário priorizar o mais importante para o conhecimento científico e tecno- lógico dos alunos, privilegiando a construção de um olhar inves- tigativo sobre os fenômenos, relacionados à Ciência Física, que ocorrem no mundo (São Paulo, 2008).

A Física é apresentada nos livros didáticos como uma ciência pronta e acabada, e isso gera uma grande discussão entre pesquisa- dores (Nardi, 1998). É sensível a falta de um embasamento teórico e científico que torne o conteúdo de Física mais atrativo para os alunos e que apresente a ciência como algo que está em constante mutação.

A Física percebida enquanto construção histórica, como atividade social humana, emerge da cultura e leva à compreensão de que modelos explicativos não são únicos nem finais, tendo se sucedido ao longo dos tempos, [...] o surgimento de teorias físicas mantém

uma relação complexa com o contexto social em que ocorreram. (Brasil, 1999, p.235)

Para tornar o conteúdo de Física mais interessante para o aluno, é importante apresentar o processo que levou o cientista àquela descoberta, ancorado no contexto histórico-cultural da época. Apesar das duas breves aulas semanais, é possível resgatar a his- tória da ciência e mostrar ao aluno a evolução científica da época e como ela acontece até os dias atuais. Esse resgate aproxima o aluno do cientista, deixando de lado o estereótipo do cientista como um ser fora de série. Dessa forma, possibilitaremos um aprendizado mais rico, dado que, como afirma Menezes (2008, p.1), “[...] os jo- vens aprendem ciências quando se interessam por elas, e não se in- teressam por elas simplesmente porque têm de aprender”.

Além disso, é imprescindível trazer o conteúdo para o coti- diano do aluno através da contextualização, sempre que possível. Sabemos que há alguns temas que são difíceis de ser imaginados no dia a dia do aluno. Ainda assim, é importante abordar essas informações, de forma que o aluno possa, ao menos, imaginar e fazer uma abstração sobre o que o professor está transmitindo sobre o assunto e se atualizar. Segundo os Parâmetros Curricu- lares Nacionais (PCN) para o Ensino Médio, é necessário: “tratar os conteúdos de ensino de modo contextualizado, aproveitando sempre as relações entre conteúdos e contexto para dar significado ao aprendido, estimular o protagonismo do aluno e estimulá-lo a ter autonomia intelectual” (Brasil, 1999, p.87).

É imprescindível considerar o mundo vivencial dos alunos, sua realidade próxima ou distante, os objetos e os fenômenos com que eles efetivamente lidam ou os problemas e as indagações que movem sua curiosidade. (Gaspar, 2004, p.9)

Os PCN esclarecem que o objetivo mais amplo no ensino de Fí- sica é fazer com que os jovens adquiram competências e aprendam

a lidar com situações do dia a dia em que presenciam fenômenos relacionados à ciência.

A Física deve apresentar-se, portanto, como um conjunto de com- petências específicas que permitam perceber e lidar com os fenô- menos naturais e tecnológicos, presentes tanto no cotidiano mais imediato quanto na compreensão do universo distante, a partir de princípios, leis e modelos por ela construídos. Isso implica, também, na introdução à linguagem própria da Física, que faz uso de conceitos e terminologia bem definidos, além de suas formas de expressão, que envolvem, muitas vezes, tabelas, gráficos ou rela- ções matemáticas. (Brasil, 2002, p.2)

A sala de aula apresenta novos desafios todos os dias. Para se sobressair, o professor precisa repensar sua prática docente. Aguiar Jr. (2010) ressalta cinco quesitos para superar esses desafios:

1. Promover e sustentar engajamento dos estudantes nas tarefas es- colares; 2. Re-significar conteúdos escolares; 3. Construir um currí- culo composto por atividades; 4. Estabelecer interações dis cursi vas produtivas, com participação dos estudantes; 5. Lidar com diver- sidade cultural, motivações, ritmos e habilidades dos estudantes. (p.241)

A partir desse comportamento docente e dos interesses dos alunos será possível que eles adquiram competências necessárias para a vida, que vão muito além da técnica e dos conteúdos trans- mitidos em sala de aula.