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Neste capítulo apresentaremos as situações a que estão sujeitos os sentenciados em sua relação com a instituição penitenciária, mais especificamente com a figura do agente penitenciário. Verificaremos desde como se deu a imposição do Estado nas pendengas cotidianas, às ocorrências no interior do ambiente que se tornou a pedra angular dessa imposição estatal, a saber, a prisão. Por fim, exporemos as estratégias de enfrentamento, às ocorrências intramuros, que os sentenciados lançam mão em sua interação com o meio.

A fundamentação teórica que se seguirá tomará como base um grupo de quatro autores que, juntos, nos possibilitam uma ampla visão acerca do mundo do apenado e da violência que, se supõe, pertença também ao seu mundo.

Se isoladamente, a contribuição destes autores se mostra magnífica, considera-se que uma articulação dialogal entre eles, permeada por um olhar acostumado ao meio em questão, possa enriquecer e ampliar o alcance de suas teorias.

Girard com sua brilhante explanação sobre o ciclo interminável da vingança, será abordado como ponto de partida e de chegada de nossa caminhada. Ainda nos auxiliará na compreensão de que os atores estudados, embora se considerem antagônicos, são similares, escondidos em uma dança

mimética na qual, sempre ocupam um lugar de oposição em relação ao outro, mas sempre oscilam entredois momentos: o de agressor e o de agredido.

Foucault, nos esclarecerá, desde a questão histórica das evoluções das penas impostas àqueles que ferem a Lei, passando pelos objetivos implícitos das penas atuais à sua enorme contribuição para o entendimento das estruturas de poder oriundas, não do poder central, constituído, mas, das dinâmicas relacionais cotidianas entre iguais.

Goffman que, com seu estudo sobre Instituições Totais lança luz sobre a, ainda pouco estudada, interface entre grupo de internos e grupo dirigente de instituições fechadas, como nas instituições penitenciárias.

Por fim, articularemos Goffman com Rollo May, na tentativa de esclarecer as estratégias de enfrentamento que cabem àqueles que se encontram em situação de clausura.

Todas essas contribuições serão permeadas pelo, já exposto, conceito de sobrepena que, pela observação do pesquisador, parece ocorrer na vida intramuros e servirá de ponto de convergência para a discussão dos autores acima citados.

A seguir, a questão da relação de sobrepena será articulada à dinâmica da violência que, para cujo entendimento, nos fundamentaremos, como foi dito, em René Girard.

2.1 - A JUSTIÇA E A ÚLTIMA PALAVRA DA VINGANÇA

A violência, segundo GIRARD, “quando não saciada procura e sempre

acaba por encontrar uma vítima alternativa”. (Girard, 1998, p. 13) Uma vez

alcançado este objetivo, seja contra a vítima original, que deflagrou o impulso violento, seja contra uma vítima alternativa, instaura-se ou alimenta-se o ciclo interminável da vingança. Deflagrada a violência, invariavelmente, ela suscita na vítima, principalmente, um desejo de retribuir àquele que lhe infringiu, um ato no sentido oposto.

Quando a violência surge em qualquer ponto da comunidade, tende a se alastrar e a ganhar a totalidade do corpo social, ameaçando desencadear uma verdadeira reação em cadeia, com conseqüências rapidamente fatais em uma sociedade de dimensões reduzidas. A multiplicação de represálias8coloca em jogo a própria existência da sociedade. Por este motivo, onde quer que se encontre, a vingança é estritamente proibida. (Girard, 1998, p. 27)

A cada golpe desferido, outro se impõe gerando uma espécie de ciclo de violência ou de contra-ataques vingativos que tendem à perpetuação. A intensidade dos golpes não possui uma relação explícita de proporcionalidade entre si, já que esta depende de uma série de fatores, como, por exemplo, do filtro perceptivo daqueles que recebem ou desferem o golpe. A subjetividade é que definirá o peso dos golpes desferidos e, conseqüentemente a proporcionalidade do contra-golpe.

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Quão maior for essa sensação de intensidade, mais severa tenderá a ser a sua reação. Além disso, essas forças não se esgotam em si mesmas. Na violência, as ações e reações se perpetuam transformando-se em um “processo infinito e interminável” (Girard, 1998, p. 27). Uma ação gerando uma reação e assim sucessivamente. Cada etapa desse processo, cada reação, é uma face da vingança que se apresenta e que se mostra, portanto, infindável.

Parece que sempre chega um momento no qual só é possível opor- se à violência com uma outra violência; nesta ocasião, pouco importa ter sucesso ou fracassar, pois é sempre ela que ganha. (...) Assemelha-se a uma chama que devora tudo o que se possa lançar contra ela para abatê-la. (Girard, 1998, p. 45)

Nas culturas primitivas ou assim chamadas, a violência quando deflagrada, tendia ao extermínio da comunidade ou das comunidades permeadas por ela. Uma vez que a chama da vingança se recairia sobre o último agente da violência, como vimos, de modo infinito. Como sempre haverá um último ator violento e sua vocação para ser depositário de outro ato violento contra si, a comunidade tendia ao extermínio.

Neste aspecto, como em muitos outros, Girard comunga do pensamento freudiano (1927):

Quando a civilização formulou o mandamento de que o homem não deve matar o próximo a quem odeia (...) isso foi claramente efetuado no interesse da existência comunal do homem, que (...) não seria praticável, pois o assassino atrairia para si a vingança dos parentes do morto (...) e o homicídio continuaria a ser praticado de modo infindável e o resultado final seria que os homens se exterminariam mutuamente. (Freud, 1927, p. 54)

Na história da humanidade, porém, foram sendo criadas formas que se supunham cada vez mais adequadas ao arrefecimento ou à extinção da violência e seu ciclo inesgotável.

Girard cita-nos algumas dessas estratégias. Elas compreendem desde o sacrifício de animais na tentativa de aplacar a ira divina frente a uma falha humana à expiação de uma vítima alternativa, semelhante o suficiente do autor do ato violento mas diferente o bastante para não se configurar um ato de vingança e possibilitando assim, encerrar o temível ciclo.

Nos dias de hoje, e em nossa sociedade, segundo Girard, não vivemos sob este temor, pois lançamos mão do mais adequado meio de barrar o ciclo interminável da vingança disponível, a saber, o sistema judiciário. Ainda que não vivamos em um mundo destituído de vingança, Girard nos diz que em nossos dias este ciclo rumo ao fim absoluto inexiste. A razão desse

privilégio (...) é o sistema judiciário que afasta a ameaça da vingança. Ele não a suprime, mas limita-a efetivamente a uma represália única, cujo exercício é confiado a uma autoridade soberana e especializada em seu domínio. As decisões da autoridade judiciária afirmam-se como a

última palavra9 da vingança. (Girard, 1998, p. 28)

Essa represália se manifesta em muitos operadores, por intermédio de muitas operações e provoca reações diversas de submissão, confronto, revolta e castigo

Contraditoriamente, Girard não diferencia a atuação judicial da vingança. Segundo ele,

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não há, no sistema penal, nenhum princípio de justiça realmente diferente do princípio de vingança” Embora não haja nenhuma diferença ele concebe que as vinganças podem ser sociais e pessoais e a vingança judicial se enquadraria na segunda. Afastando o pessoal ele rompe com o processo e “o perigo da escalada é afastado. (Girard, 1998, p. 28)

Em outras palavras, quando vemos, não raras vezes na mídia vítimas ou parentes de vítimas indignados, com expressões tensas, clamando por justiça, nada mais pedem que vingança. A presença do Estado enquanto mediador e executor da justiça causa na vítima, e em seus iguais, um sentimento de conforto, similar àquele experimentado após o ato vingativo. Mas no agressor punido a reação pode ser diversa.

Dependendo do indivíduo, do crime cometido e da sua capacidade de introjeção da Lei, ele pode situar a ação judiciária sobre ele num amplo espectro que pode variar da injustiça extrema por considerar excessivo peso da pena à insignificância da pena frente ao ato cometido, passando obviamente, pela sensação de justiça, quando a ação jurídica se mostra adequada, aos olhos do infrator, no que se refere à intensidade e proporcionalidade da pena recebida.

O que se mostra como mais comum, pela experiência do convívio que o pesquisador teve com a população carcerária, é a sentença provocar no sentenciado penitenciário a sensação de injustiça, seja ela moderada ou extrema. Entretanto, o sentenciado padrão é o de estarem sob uma pena desproporcional, maior que o crime cometido.

Assim, o Estado, por meio de seu aparato judicial transforma a vingança pessoal em vingança pública, apoiando-se na premissa de que o

ataque a um membro da sociedade é um ataque à própria sociedade. Da mesma forma que outrora, o ataque a uma lei era percebido pelo rei, como veremos a seguir, uma agressão a própria coroa e à autoridade real.

Para Foucault (1999), o surgimento do judiciário expressa o “poder

público: árbitro ao mesmo tempo neutro e autoritário, encarregado de resolver “justamente” os litígios e de assegurar “autoritariamente” a ordem pública.”

(Foucault, 1999, p.43)

O êxito do sistema judiciário para Girard, está no seu mérito de tornar distante para nós o ciclo interminável da vingança a partir da sentença proferida que se faz presente como o último ato punitivo ou vingativo, pois, contra o qual não é possível um novo revide. Este se apresenta como um ato impessoal e de impossível personificação por seu caráter institucional. Assim, a vingança perderia seu fio condutor, o objeto no qual se derramar.

A sentença esconde o seu autor tal qual o capuz esconde o carrasco, mas de forma ainda mais eficaz, pois agora, transforma este em muitos. Ele é de agora em diante, toda a estrutura judiciária que, por sua vez, representa toda a sociedade. Ela substitui a última parte magoada da escalada da violência e se vinga por ela.

Essa transformação possibilita um corte ou uma barreira naquele ciclo interminável da vingança. Ela confunde aos seus atores, pois lhes tira a clareza do “ser-objeto” alvo do próximo ataque, do próximo passo da escalada vingativa. Uma vingança pessoal clarifica o próximo elo da corrente a ser maculado. Porém, ao se impor, o Estado entra como uma entidade sem rosto a

tomar uma atitude contra aquele que, segundo sua ótica, cometeu o primeiro golpe violento em direção ao outro, à vitima.

Assim, o sujeito da ação violenta, agora submetido a um poder amorfo, sem face, se vê sem um novo objeto claro ou específico ao qual poderia se remeter numa tentativa de vingança. Para Girard o sistema judiciário deve “oferecer a estas vítimas (não vingadas) uma satisfação rigorosamente

avaliada, apaziguando seu desejo de vingança sem despertá-lo em outra parte. (...) trata-se de preservar a segurança do grupo eliminando a vingança” (

Girard, 1998, p. 34).

Assim, a proporcionalidade deve guiar essa ação judicial. Uma punição muito mais ou muito menos violenta que a ação original, continuaria a proporcionar aos atores envolvidos, a vítima e seu algoz, a mesma sensação de insatisfação ou de injustiça. Sendo excessiva ou branda, a vingança social não seria bem sucedida, já que no primeiro caso o infrator, agora vítima da ação judiciária, se sentiria excessivamente penalizado e, conseqüentemente, injustiçado. No último caso, a vítima, ora defendida pelo judiciário poderia continuar a se sentir injustiçado, tão maior era a sua expectativa de uma punição mais severa.

Embora amenize a sede vingativa da vingança, a ação judiciária é sempre insuficiente para conter a sensação de injustiça, pois, a vítima tende a não se sentir satisfeita visto que já fora lesada e que esta não cessa com a punição ao agressor. Para a vítima, o ato agressivo recebido tem um caráter de continuidade enquanto a ação judiciária aos seus olhos se mostra instantânea, ou seja, ela termina no momento de proferida a sentença. Isso somado à

impossibilidade de reparação daquilo que sofrera, tende a manter na vítima a sensação de injustiça.

Da mesma forma, embora no sentido oposto, aos olhos do agressor, a ação judiciária é igualmente injusta. O ato criminoso, para o agressor, tende a ter um caráter imediato e instantâneo, oposto à sensação que permanece para o agredido. Mas a pena que nele se recai é intensamente vivida. Ao contrário da vítima que ouve a sentença, o agressor (agora também vítima) vive em seu cotidiano as imposições e restrições legais. Ele tende agora, a se sentir injustiçado ante a infinitude vivenciada da pena em comparação à finitude de seu ato.

As massas quando reconhecem em alguém um inimigo, quando decidem castigar esse inimigo – ou reeducá-lo – não se referem a uma idéia universal abstrata de justiça, referem-se somente à sua própria experiência, à dos danos que sofreram, da maneira como foram lesadas, como foram oprimidas. (Foucault, 1999, p. 45)

Dessa maneira, o sistema judiciário mostra-se por um lado como o fim do ciclo interminável da vingança pois, apesar de ser, ele próprio, uma vingança, aquele sobre o qual seu peso se abate, não tem como se vingar, por ser a este impossível identificar em quem se deve dirigir, de forma justa e apropriada, a sua represália e, por outro, como um dos possíveis alimentos da vingança. Aquele que fora outrora atingido, delega ao Estado o ato violento que lhe caberia com a inexistência deste.

Girard permites-nos ver a multiplicação das represálias, mas não foca a reação do punido, do agressor punido, e as conseqüências a que este está sujeito sob esta última palavra da vingança.

Se enfocarmos o ponto escuro da teoria girardiana poderemos perceber que, agora, o agressor punido, está sob uma outra lei. As regras da vida intramuros que se encontram à margem da Lei. Uma regra que impõe ao apenado uma série de punições não descritas originalmente. A proporcionalidade legal pretendida se perde e o risco de uma pena excessiva se instaura. Com ele, a sensação de injustiça renasce, se fora apagada, e possibilita a manutenção da mobilização para o contra-golpe naquele que lhe impôs a sanção extra, o agente penitenciário, ou contra uma vítima alternativa, no seu retorno ao convívio social.

A pena sobrepenada, neste contexto, pode reascender a chama que já se julgava extinta da vingança. A sobrepena é como o oxigênio que alimenta o fogo e que encontra morada no sentimento de injustiça experimentado pelo apenado que descobre na prisão um sofrimento inesperado: a sobrepena.

2.2 – A RELAÇÃO COM O OUTRO E O ANIQUILAMENTO

Nesta seção, vamos ressaltar o processo de migração do antagonismo para o mimetismo na relação Agente Penitenciário/ Sentenciado e como este processo promove o aniquilamento do indivíduo. Para tanto, permaneceremos amparados por René Girard.

Como já vimos, a violência deflagrada, tende à perpetuação pela sucessão alternativa de golpes entre o agressor e a vítima que passam a assumir os papéis, um do outro a cada golpe desferido. Girard nos aponta que

cada golpe, seja ele físico ou verbal, objetiva o aniquilamento do outro, a vitória no embate. Cada ataque, demanda um certo tempo de reação antes da contrapartida. Neste tempo, o agredido tenta reunir “seus espíritos” a fim de preparar o contra-ataque, ao mesmo tempo em que, aquele que desferiu o golpe, julga, pela ausência de resposta imediata, que seu objetivo fora alcançado, ou seja, vencera o embate. Assim, a cada golpe, o golpeador sente, ao menos por instantes, o sabor da vitória. Este sabor traz uma fascinação cujo objeto causador é a própria violência.

Os ataques sucessivos entre quaisquer antagonistas, têm em comum esse prazer associado ao golpe que se julga derradeiro e a alternância agressiva. Embora os antagonistas julguem a si mesmos visceralmente diferentes, motivo que lhes faz acentuar os ataques mútuos, vistos de fora, essa relação se parece muito mais convergente que divergente. Os atores nunca realizam o mesmo papel simultaneamente, estão sempre em lados opostos, porém, como estão sempre invertendo os papéis, eles se mostram recíprocos e similares, pois

(...) quanto mais golpes se precipitam, mais se torna claro que não há a menor diferença entre aqueles que os desferem, alternadamente. Tudo é idêntico para ambos, não somente o desejo, a violência e a estratégia, mas também as vitórias e as derrotas alternadas(...) em toda parte se encontra a mesma ciclotimia. (Girard, 1998, p. 198)

Os antagonistas não conseguem perceber a similaridade pois, segundo Girard, “vivem cada um dos momentos não recíprocos de forma (...)

demasiadamente intensa para conseguir dominar a relação” (Girard, 1998, p. 198).

Mas, quando não estamos implicados nesta relação tornamo-nos capazes de perceber a tal semelhança. “Do interior do sistema, só há

diferenças; de fora, pelo contrário, Só há identidade. De dentro não se vê a identidade, e de fora não se vê a diferença”. (Girard, 1998, p. 199) ou seja,

para aqueles que se agridem, a diferença se impõe, o que motiva, ainda mais, novos golpes ao antagonista. Ou seja, para aqueles que se agridem a diferença se impõe, o que motiva, ainda mais, novos golpes ao antagonista. Mas para quem assiste ao embate, só se percebe as semelhanças. A sucessão de golpes desferidos iguala-os, pois o agora agredido atacará ao agressor, completando a mimeze, já que o infringido de agora será o algoz de amanhã.

E para Girard, pela perspectiva extraconflito, quando não há mais diferença alguma, os antagonistas tornam-se duplos, e estes, por sua violência recíproca, são sempre monstruosos. “O duplo monstruoso surge ali onde, nas

etapas precedentes, encontravam-se um “Outro” e um “Eu”, sempre separados pela diferença oscilante.” (Girard, 1998: 206)

Transportando estes conceitos para dentro da instituição penitenciária, podemos compreender as interações entre presos e agentes penitenciários, como os antagonistas descritos acima.

Quando os sujeitos encontram-se nestes papéis, agente penitenciário e o sentenciado, percebem-se com divergências viscerais. Sempre se mantêm sob vigília constante e, via de regra, tentam impor ao outro o respeito pelas vias que se mostrarem mais pertinentes à ocasião. Por estarem tomados pela

situação não percebem o já citado mimetismo que envolve a ambos, as sucessivas alternâncias de agressões e resistências recíprocas.

Estes dois atores se relacionam compulsoriamente. Digo isto pois o sentenciado não quer estar preso e o agente penitenciário ainda que tenha escolhido essa profissão, em sua maioria, se pudesse, atuaria em atividades cujo contato com os sentenciados seria muito reduzido ou inexistente. Há funções de agentes penitenciários que não obrigam a esse contato. Alguns que possuem alguma habilidade específica, cursos por exemplo, são aproveitados em áreas afins dentro da penitenciária. Agentes que passaram por situações limite como a de terem sido reféns em rebeliões, após a resolução do conflito, são remanejados para atividades que lhes afastam do convívio direto com os presos.

O agente penitenciário como membro da sociedade, tem uma série de preconceitos acerca do sentenciado. Estes, apontam para uma diferença de papéis que cada um exerce dentro do ambiente prisional. A chegada de novos apenados à penitenciária se dá concomitantemente com o conhecimento, ou reconhecimento de sua história, ou para ser mais preciso, das histórias de seu(s) crime(s). Quanto mais cruéis e aberrantes se desenham estas, ao olhar social, maiores serão as fantasias e as recomendações acerca de seu autor.

“Olhavam-me, olhavam-me nos olhos, buscando ver a crueldade que os

repórteres sensacionalistas os induziam a acreditar que existia dentro de mim.”

(Mendes, 2001, p. 274)

O sentenciado chega à prisão com a visão prévia do que lhe aguarda. As histórias próprias ou de outras pessoas com passagens anteriores em

prisões, as histórias com outros agentes do judiciário como policiais civis e militares, lhe desenha ou sugere um futuro do qual deve se precaver, pois o sofrimento se anuncia aos seus olhos.

O ambiente prisional, penitenciário, como no caso em questão, é o local onde se dá o encontro desses dois preconceituosos olhares, dessas duas visões particulares da realidade.

Este “set perceptivo” (Abbagnano, 1982) a penitenciária, é o local no qual esses preconceitos se verticalizam. É onde a relação ocorre e dela tende a surgir o enraizamento, a cristalização e a certificação daqueles conteúdos que outrora eram preconceitos e agora se fazem conceito após a verificação e a ratificação das expectativas e nas experiências.

O set, segundo Abbagnano, é o lugar onde as percepções são guiadas no sentido de confirmar aquilo que esperamos que nele ocorra. Em outras palavras, se percebe aquilo que se crê, pode acontecer. Essa antevisão á apurada pelo set ou refutada por ele.

Para Rohrer e Sherif quanto maior e mais fortes forem essas antevisões ou hipóteses, maior a probabilidade dela se confirmar no set e menor a gama de eventos e indícios que são utilizadas para confirmá-las. Por outro lado,

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