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Gênero e Pentecostalismo

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Para se entender a religião e os movimentos que foram aparecendo ao longo dos séculos, é importante não levar em conta somente a doutrina, necessário se faz a participação nos cultos coletivos. Isso significa dizer que o espaço público é o lugar onde as pessoas ganham expressão e também uma história. E foi a partir desta reflexão que pensamos no papel

da mulher dentro das igrejas, hoje, já que por muitos séculos a participação das mulheres na formação da sociedade foi deixada em segundo plano.

Entendemos, então, a partir da visão dos pentecostais que a mulher deve obedecer primeiramente a Deus, e sua submissão ao homem não deve nunca fazê-la infringir a lei de Deus. A submissão a Deus permite às mulheres romperem, em parte, com o machismo tradicional.

Mas este rompimento não é visto como revolucionário, o modelo tradicional ainda existe e consiste no fato de as mulheres assumirem o seu papel de esposa cuidadora, e aos homens de provedor. Ou seja, desempenham papéis diferentes, mas complementares, cabendo ao homem ser o “cabeça da família”.

Vale dizer que ao homem pentecostal cabe a decisão de abandonar a bebida, o bar e os amigos, para se dedicar à sua esposa e aos seus filhos. Dessa forma, “o discurso oficial das igrejas pentecostais tampouco difere daqueles da Igreja Católica e protestantes históricas” (MARIZ, 2010, ON-LINE).

Essa categoria de religiosos - os pentecostais - tem uma maneira particular de agir se comparada às igrejas tradicionais. O seu discurso é direcionado a um público de baixa renda e pouca escolaridade, há maior aceitação com relação à vida moderna e principalmente são mais abertas do que as igrejas tradicionais quanto à aceitação da liderança feminina.

Outra característica bem particular dessas igrejas consiste na crença que o Espírito Santo, uma das pessoas de Deus (da noção da Trindade), no qual se baseia toda a teologia (lógica) pentecostal, age tanto em homens quanto em mulheres. Essa prática “permite que multipliquem lideranças femininas muitas vezes não oficiais e que muitas dessas possam fundar novas igrejas quando se sentem inspiradas a isso” (MARIZ, 2010, ON-LINE).

Podemos citar algumas igrejas pentecostais que possuem mulheres na liderança, por exemplo: Renascer, Ministério Ágape Reconciliação, Igreja Nacional do Senhor Jesus Cristo e Cristo Vive. Mas este ainda é um assunto polêmico, pois a maioria das mulheres que possuem o cargo de pastoras são esposas de pastores, portanto, ficam reduzidas à condição de subordinação e controle de seus maridos, uma vez que eles ocupam cargos hierárquicos iguais ou superiores em suas denominações.

É importante dizer que nem sempre a ascensão da mulher dentro da igreja está ligada às suas reivindicações e aos seus apelos, mas o reduzido número de homens na igreja propicia essa prática. Portanto, é importante examinar os caminhos que levaram esta mulher ao pastorado e de que forma ela se mantém nele.

Machado (2005) nos traz algumas estratégias já identificadas nas igrejas para que houvesse impedimento das mulheres nos espaços de poder:

[...] a revisão na forma de conceber o ministério, que passou a ser um compromisso do casal, e a adoção nos rituais da pregação de sermões em parcerias; atrelar a consagração das mulheres à concepção do ministério do casal foi a fórmula encontrada pelas lideranças de várias denominações para preservar a dependência feminina em relação aos homens. A pregação conjunta também pode ser interpretada como uma forma de enquadrar a participação das mulheres na direção da comunidade religiosa [...] (MACHADO, 2005, p.4).

Há também questionamentos de outros estudiosos com relação ao pastorado da mulher. Nunes (2005, ON-LINE) afirma que “as religiões são um campo de investimento masculino por excelência”. Pela história sabemos que os homens possuem o domínio da produção do que é sagrado. Essa prática é constatada pelos discursos proferidos nas igrejas e pelas práticas religiosas, e aos homens cabem definir as doutrinas e as regras. Nas palavras de Nunes,

[...] as mulheres continuam ausentes dos espaços definidores das crenças e das políticas pastorais e organizacionais das instituições religiosas e o investimento da população feminina nas religiões dás-se no campo da prática religiosa, nos rituais, na transmissão, como guardiãs da memória do grupo religioso (NUNES, 2005, ON-LINE, p.1).

Um dos apontamentos que fizemos no início deste item foi reconhecer o motivo pelo qual a mulher se entrega à prática religiosa. Uma hipótese seria que a escolha pela adesão religiosa pentecostal acontece por motivos diferentes para o homem e para a mulher. As histórias dos homens revelam situações de desemprego, dificuldades financeiras e problemas pessoais na área da saúde, ou seja, quando sua identidade masculina está sendo ameaçada, eles procuram a igreja. Já as mulheres, associam suas escolhas religiosas com as desavenças familiares e as necessidades materiais e espirituais do grupo doméstico, ou seja, as mulheres se sentem responsáveis e guardiãs das almas de todos que integram a família (MACHADO, 2005, p.2).

Notamos por meio dessa explicação que as mulheres buscam muito mais uma experiência com o sagrado e a formação de um vínculo com a comunidade religiosa, isso porque as doutrinas ensinadas pelos pentecostais estimulam que as mulheres recuperem a sua autoestima e a sua autonomia diante de seus maridos e filhos, uma vez que elas se engajam em trabalhos extradomésticos, possibilitando que os seus relacionamentos e sua vida social sejam ampliados.

Esse novo jeito de ser da mulher dá a ela condições de se reconhecer como alguém que independe do marido, dos filhos e da casa, mas que de maneira nenhuma a exclui das obrigações e responsabilidades com o lar e a família. Essa mudança e enfrentamento podem ser vistas quando mulheres estão à frente “evangelizando em praças públicas, realizando trabalhos voluntários em presídios, hospitais e entidades filantrópicas, participando de programas religiosos televisivos, e mais recentemente, dedicando-se à militância política em favor dos candidatos da igreja” (IDEM, 2005, p.3).

Pertencer a uma comunidade e participar ativamente dos trabalhos e da programação da igreja reforça de tal forma a autoestima dessa mulher que a encoraja a buscar a sua própria prosperidade, indo em busca de um trabalho, superando os constrangimentos da cultura tradicional, o que favorece a participação das mulheres na esfera econômica, conforme as palavras de Machado (2005, p.3)

Pesquisas demonstram o crescimento acentuado da participação das mulheres pobres na população economicamente ativa durante os anos de 1990. E esse é fenômeno novo, uma vez que nas décadas anteriores as taxas de representação desse segmento foram significativamente inferiores às das mulheres dos extratos médios e altos da sociedade brasileira. Entre os principais obstáculos enfrentados pelas mulheres pobres no mercado de trabalho, os estudiosos identificam: o baixo nível de escolaridade e qualificação, a ausência de apoio no cuidado com as crianças e na realização das tarefas domésticas e as barreiras culturais para sair em busca de um trabalho remunerado.

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