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3.2 Os jornais

3.2.1 A Gazeta Cuyabana

O jornal “Gazeta Cuyabana” é uma ramificação do primeiro periódico produzido na província de Mato Grosso, o “Themis Matogrossense”, de 1839, impresso na tipografia provincial. Após sair de circulação por conflitos dentro da Assembleia Legislativa Provincial, o “Themis” retorna, em 1842, como “Cuyabano Official”, mais tarde como “O Cuyabano”. Até que em 1847 reaparece como “Gazeta Cuyabana”.

A primeira edição do jornal data de 2 de junho de 1847 (Figura 1). circulava duas vezes por semana: às quartas e aos sábados. É importante lembrar que o jornal era o veículo de comunicação do governo provincial, o órgão oficial.

Figura 1 - A Gazeta Cuyabana, edição nº 1, de 2 de junho de 1847.

Pedro Rocha Jucá entende que o “Gazeta Cuyabana”, diferente de seus antecessores, apresenta mais conteúdos:

Na fase iniciada pelo Themis Matogrossense, e continuada pelo Cuyabano Official e pelo O Cuyabano, a Imprensa Oficial da Província era caracterizada pela transcrição de atas das sessões realizadas na Assembleia Legislativa Provincial e pela publicação de alguns atos oriundos do governo provincial, isto mesmo com acentuados atrasos. Com A Gazeta Cuyabana, houve uma grande mudança. É verdade que os atrasos eram evidentes, mas começou a surgir uma preocupação quanto à atualidade das informações e, pela primeira vez na história da imprensa mato-grossense, publicou-se um editorial, externando a difícil posição do jornal. Por se tratar de um órgão oficial. (JUCÁ, 2009, p. 41).

Tal editorial traz aquilo que o jornal pretendia ao iniciar suas tiragens. Nesta primeira edição, este texto de apresentação veio na capa, numa seção nomeada como “Parte Não Official”. Nas outras edições analisadas, o jornal já não traz mais esta seção. Em um trecho do texto, que é assinado apenas como “Do Redactor”, é citada a palavra jornalismo e suas frases se moldam a partir daquilo que viria a ser assunto a partir de então nas edições.

Não temos por tanto obrigação de mexer-nos com ninguém na arena política, por que não só falta-nos para isso a necessária aptidão, como também por ser-nos inbibido pelas Leis organicas do estabelecimento typographico da Provincia o tratar em seo jornalismo de semelhante objecto: temos pois de nos contentar em satisfazer somente aos leitores com a publicação de algumas boas ideas acerca da litteratura, historia, moral, religião, sciencias, artes e industria, que nos forem transmittidas por pessoas intelligentes, ou que deparar-mos nos autores clássicos, e mesmo em outros jornaes, além das noticias relativas aos melhoramentos, e tranquilidade publica da Corte e mais Provincias do Imperio. (A Gazeta Cuyabana, edição Nº1, de 2 de junho de 1847).

Após deixar claro que aquele periódico não tocaria no vespeiro da política, justamente por ser de caráter oficial, o redator faz referências a outros assuntos que seriam tratados naquelas páginas. Entretanto, as edições analisadas só evidenciam que sobressaiu o caráter oficial do jornal, sendo repleto de trechos de editais e documentos que diziam respeito aos feitos governamentais.

Na capa do jornal, acima do título, com fontes legíveis e grandes, estavam algumas informações: o preço das assinaturas ou do jornal avulso, as datas da partida dos Correios, além das datas que seriam dias santos naquele mês e as fases da lua. Havia possibilidades de assinaturas por ano, semestral, trimestral e edições avulsas, cada uma com seu preço. Também neste quadro de informação já estava o valor dos anúncios que estariam no jornal: cobravam cem réis por linha.

Os espaços nas páginas do jornal eram divididos por tarjas, nas partes limítrofes de margem mais grossa. No decorrer do texto, mais finas. O editorial estava na metade de baixo

da página de capa, na seção designada como “Parte Não Official” e o título do texto se limitou apenas a “Introducção”. A capa era dividida em duas colunas, assim como todo o restante do jornal.

A outra seção, a maior, era nomeada de “Parte Official”. Trazia pura e simplesmente trechos das ações governamentais, como uma espécie de carta entre representantes da província e os responsáveis da Coroa. Nesta primeira edição, as cartas foram divididas por ministérios, do Império e da Guerra, ocupando uma página. Há uma subseção de título “Província de Mato Grosso”, que continha convocações e convites para eventos oficiais, como a posse do presidente da província, mesmo esta tendo acontecido antes da data de saída do jornal, e trechos de cartas e resumos das decisões do próprio presidente. Esta seção ocupa meia coluna e avança para mais uma página.

Encerrando o jornal, havia a última seção chamada “Repartição da Polícia”, que ocupava apenas um terço de uma coluna, assinada pelo chefe da polícia da capital. Nesta primeira edição, esta seção somente comunicou que a cidade estava em sua perfeita normalidade, sem ocorrências. O jornal, que apresentava quatro páginas e era todo diagramado em duas colunas, encerra-se sempre com “Cuyaba - Na Typographia provincial - 1847”, referenciando sua origem (Figura 2).

Mediante o conhecimento e entendimento da imprensa brasileira neste período oitocentista, percebe-se que o “Gazeta Cuyabana” não fazia nada além do que muitos outros jornais brasileiros da época, limitando-se à propaganda dos feitos governamentais e promoções políticas de certas figuras, o que não deixa de ser uma característica, já que era de cunho oficial

Figura 2 - A Gazeta Cuyabana, edição nº 1, de 2 de junho de 1847.

A linguagem utilizada pelo “Gazeta Cuyabana” era sempre dotada de formalidade, cheia de pronomes de tratamentos, atendendo aos padrões da época. Por ser de cunho oficial, era sempre mantida. Apesar da forma culta na escrita, Pedro Jucá (2009, p. 41) defende que o “Gazeta” tinha uma forma mais simples que seus antecessores “Themis”, “Cuyabano Official” e “O Cuyabano”. Foi circulado quando João Crispiniano Soares era o presidente de província de Mato Grosso.

A edição 15, ainda de 1847, mas de julho, diferencia-se por não mais ter a editoria denominada como “Parte Não Official”. O jornal continua tendo quatro páginas e sendo todo planejado em duas colunas, o mesmo se repete nas outras duas edições analisadas. Nesta edição de julho de 1847, a parte que trata dos assuntos ligados à Corte e ao governo da província continua. De modo especial, o “Expediente da Presidência” traz uma memória das comemorações e celebrações do dia da coroação de Pedro I, recordado em toda a extensão do país. No texto, que está dentro da “Parte Official”, o presidente da província convoca a população para rezarem o “Te Deum”, tradicional oração de ação de graças católica, na Igreja do Bom Jesus, a Matriz.

Nesta mesma edição, houve o caso de um comunicado por parte da presidência da província acerca da circulação de algumas notas falsas de dinheiro dentro da cidade (Figura 3). Para esclarecer a situação, o governo reservou mais de meia página explicando o ocorrido e deixando claro que já teria resolvido. Por meio de atos como estes, ficava-se sabendo o que ocorria na cidade, mas sempre pelo olhar oficial da administração pública.

Figura 3 - A Gazeta Cuyabana, edição nº 15, de 31 de julho de 1847.

Percebe-se que o governo provincial utilizava o meio impresso para a comunicação com a população. Mesmo explicitando mais conteúdo de ordem burocrática, a informação estava contida, ou parte dela, visto que o jornal era redigido pelo próprio poder público, cabendo a ele escolher o que veicularia.

As duas edições analisadas do ano seguinte trazem consigo a mesma forma que a do ano anterior: sempre quatro páginas, todo o texto dividido em duas colunas. Uma pequena diferença se encontra na capa, com aquelas informações complementares, como preços, saída dos Correios, dias santos e fases da lua, que subiram mais para a margem superior da página (Figura 4). Das quatro edições analisadas, essa foi a única mudança gráfica identificada.

Figura 4 - A Gazeta Cuyabana, edição nº 29, de 19 de julho de 1848.

Fonte: Arquivo Público de Mato Grosso.

Na edição 7 do ano de 1848, que circulou em fevereiro, a seção “Parte Official” não apresenta nenhuma mudança com relação aos trechos de ações governamentais, chamando a atenção para um diálogo entre os responsáveis dos municípios da província. Na seção “Repartição da Polícia”, diferenciando-se da outra edição analisada, o chefe da polícia faz um resumo dos casos do último mês. O título “Extracto das ocurrencias do mez de janeiro hontem findo” explica bem o que pretendia (Figura 5).

Figura 5 - A Gazeta Cuyabana, edição nº 7, de 12 de fevereiro de 1848.

Fonte: Arquivo Público de Mato Grosso.

No corpo do texto havia resumos de casos criminais ou outros procedimentos feitos pela polícia ocorridos em determinados dias. Nesta edição, os textos relatam as atividades de expedição de passaportes, o caso de uma menina que havia desaparecido e ações de corpo de delito em uma senhora que havia sofrido violência por parte de um soldado. Sem nada a mais, a seção é encerrada e assinada pela Secretaria de Polícia de Mato Grosso, representada por Manoel de Souza Canavarro.

Nos casos policiais identificados nas edições do jornal, havia apenas o simples resumo dos fatos. O redator não agiu, como nos próximos jornais, comentando ou adjetivando determinadas ações. É de se pensar que apesar das ocorrências, e mesmo quando não as havia, como o caso da edição de junho de 1847, havia o interesse do governo provincial de mostrar que a região estava na sua mais perfeita ou possível ordem.

Essas foram as partes mais ricas de informações encontradas nas edições analisadas do “Gazeta Cuyabana”. Por ela, é possível entender algumas questões pertinentes que envolviam a segurança pública, o cotidiano da cidade e a própria sociedade. Muito provavelmente, publicar o resumo do departamento de polícia não tinha suas questões jornalísticas como prioridades, mas é inegável que aquele pequeno quadro de informações se transforma em fonte de notícias.

Em uma edição de julho de 1848 (Figura 4), o último ano de circulação do Gazeta Cuyabana, o jornal continua sem nenhuma reformulação gráfica, utilizando os mesmos elementos para compor sua visualização. A “Parte Não Official”, que outrora tinha abrigado o editorial na primeira edição do jornal, não mais retornou, restando à “Parte Official” a maioria do encargo do corpo de texto. Nesta edição, o jornal apresenta muitos valores correspondentes a despesas do governo provincial, incluindo gastos com aquisição de escravos e da tipografia.

Destaca-se também uma editoria de nome “Annuncio”, que abrigava apenas um pequeno texto que era um comunicado de ordem pública. Tempos depois, em agosto do mesmo ano, o vice-presidente da província comunica a venda da tipografia provincial, iniciando uma crise com a Assembleia Legislativa Provincial. Dessa forma, a produção e circulação do jornal era findada.

O terceiro jornal oficial da província de Mato Grosso, “A Gazeta Cuyabana”, circulou pouco mais de um ano. Nos seus 33 centímetros de altura e 21 centímetros de largura, comportava em suas duas colunas as decisões, atos e resoluções da Coroa e do governo local (Figura 6).

Figura 6 - A Gazeta Cuyabana, edição nº7, de 12 de fevereiro de 1848.

Fonte: Arquivo Público de Mato Grosso.

Noticiava por meio de comunicados e relatórios de ocorrências. Apesar de ser o primeiro a ter um editorial, não havia inovações em assuntos ou formatos e gêneros. Apenas cumpria com o que prometia: ser porta-voz da administração pública, tendo seu símbolo máximo o brasão do próprio império (Figura 7).

Figura 7 - A Gazeta Cuyabana, edição nº 7, de 12 de fevereiro de 1848.

Fonte: Arquivo Público de Mato Grosso.

Com a venda da tipografia provincial, os jornais de cunho oficial deixaram de existir, tendo então o governo que pagar alguns dos espaços nos jornais privados que começaram a circular a partir daquela data.

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