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O primeiro jornal que circula em Mato Grosso vem da província de Goiás, produzido pela tipografia de Oliveira, que é a pioneira da região Centro-Oeste. As notícias das decisões e atos governamentais chegavam a Mato Grosso diretamente do “Matutina Meyapotense”, que residia onde hoje é a cidade de Pirenópolis.

Dentro do periódico, as notícias de Mato Grosso eram designadas às seções chamadas de “A Província de Mato Grosso” e o “Miscelânia Cuiabanense” (ROCHA, 2017). O Miscelânia era fortemente ligado aos revoltosos da Rusga cuiabana. Esse primeiro envolvimento de um periódico nas movimentações políticas da província, ainda que não produzido em solo mato-grossense, marca o desenrolar do jornalismo no século XIX, ainda que em pequenos fragmentos ou espaços.

O início das atividades jornalísticas mato-grossenses é datado também do período imperial. Segundo Estevão de Mendonça (1975), a chegada de uma tipografia é o que daria abertura ao processo em geral. O então presidente da província, José Antônio Pimenta Bueno, em seu relatório provincial de março de 1837, já descreve a necessidade de uma tipografia no território.

Em 1838, em outro relatório provincial, o mesmo presidente presta contas sobre os valores da aquisição da tipografia, tinta e papel. Custando quase 4,5 mil réis, o material é instalado sob o governo de outro presidente da província, Estevão Rezende, em maio de 1839. O primeiro tipógrafo na província é Francisco José de Melo, ainda em 1839. No mesmo ano, data a circulação do primeiro jornal impresso na Província de Mato Grosso, o “Themis Mato-grossense”, em 14 de agosto (MENDONÇA, 1951).

[...] Feito em duas colunas largas sobre papel almasso, medindo 0,31 x 0,21 centímetros, e circulava às quartas-feiras. Folha destinada à publicação de atos oficiais, e sua assinatura era tomada em casa de João Alves Ferreira e Joaquim de Almeida Falcão, sendo de 880 réis o preço por trimestre e 80 réis por exemplar avulso. (MENDONÇA apud MENDONÇA, 1951, p. 19).

Mesmo de cunho oficial, o “Themis” era comercializado (ZARAMELLA, 2004). No ano seguinte, entretanto, a folha oficial não é mais produzida devido a conflitos dentro da Assembleia Legislativa Provincial, que cortou a verba necessária para a produção.

Mais tarde, em 1842, o jornal foi organizado na tipografia e ressurgiu como “Cuyabano Official”, modificado para “O Cuyabano” um ano depois, circulando por três anos. Por fim, retorna em 1847, como o “Gazeta Cuyabana”, sendo uma ramificação do primeiro periódico mato-grossense.

O “Gazeta Cuyabana” se consolida como um periódico tendo duas publicações por semana, às quartas e aos sábados, com o formato parecido com o seu originário “Themis”. Era dividido entre as seções “Official” e “Não Official”. A primeira tratava de atos e editais do governo da província, a segunda abrangia temas variados, como serviços, segurança, recados e anúncios. Diferenciando-se do “Themis”, o periódico “Gazeta Cuyabana” abria um maior espaço em sua linha editorial (ZARAMELLA apud ROCHA, 2017).

Todos os jornais que surgiram até este momento foram organizados e impressos pela tipografia adquirida pelo governador da província. Logo, era uma tipografia pública. O cenário muda com a venda da tipografia por meio de leilão, tornando-se particular. Na produção privada, surge então o “Echo Cuyabano”. A partir disso, os atos do governo da província, segundo o historiador Rubens de Mendonça (1951), eram colocados nos jornais particulares mediante pagamentos.

Esses primeiros jornais marcam o início da atividade jornalística em Mato Grosso, que, na época, correspondia à província que tinha o território que hoje abrange Mato Grosso do Sul também. Depois do surgimento desses primeiros periódicos, muitos outros aparecem, como mostra a Tabela 1 abaixo, mediante dados e informações de Estevão de Mendonça (1975), Ernani Calháo (1987) e Elizabeth Siqueira (2017). O período é o que corresponde ao tempo do Brasil imperial, 1822 a 1889.

Tabela 1 - Periódicos da Província de Mato Grosso

JORNAL ANO DE ORIGEM LOCAL DE ORIGEM

Themis Matogrossense 1839 Cuiabá

Cuyabano Official 1842 Cuiabá

A Gazeta Cuyabana 1847 Cuiabá

Echo Cuyabano 1848 Cuiabá

Matto-Grosso 1863 Cuiabá

A Voz do Povo 1865 Cuiabá

A Matraca 1867 Cuiabá

Boletim do Matto-Grosso 1867 Cuiabá

O Popular 1868 Cuiabá

A Situação 1868 Cuiabá

O Guaycurú 1870 Cuiabá

O Liberal 1871 Cuiabá

Primeiro de Março 1871 Cuiabá

Filho do Povo 1872 Cuiabá

O Povo - Cuiabá

A República - Cuiabá

Porvir 1877 Cuiabá

A Opinião 1878 Corumbá

O Iniciador 1879 Corumbá

A Província de Matto-Grosso 1879 Cuiabá

Notador 1879 Cuiabá O Corumbaense 1881 Corumbá A Locomotiva 1882 Cuiabá O Pyrilampo 1882 Cuiabá O Argoso 1882 Cuiabá A Brisa 1884 Cuiabá

Anjo da Paz 1885 Cuiabá

O Crepúsculo - Cuiabá

A Liça 1885 Cuiabá

A Tribuna 1886 Cuiabá

A Distracção 1886 Cuiabá

O Atalaia 1887 Cáceres

A Gazeta 1888 Cuiabá

A Juventude 1888 Cuiabá

Oásis 1888 Corumbá

Fonte: Elaboração própria.

Na outra região da província, o que hoje é o estado de Mato Grosso do Sul, os primeiros periódicos surgem na cidade de Corumbá, após os eventos da Guerra do Paraguai. Mais para o fim do período imperial, surgem também na cidade de Cáceres outros periódicos. Cuiabá, Corumbá e Cáceres eram os centros comerciais e populacionais da província, sobretudo pelo poder político e pela presença de portos, facilitando a comunicação.

A tipografia particular deu à província o primeiro jornal de oposição ao governo, em 1859, o “Imprensa de Cuyabá”. O jornal se colocava como político, mercantil e literário (ZARAMELLA, 2004). Era encabeçado por João de Souza Neves e pelo Padre Ernesto Camilo Barreto.

Esse jornal marca definitivamente o período da imprensa oposicionista ao governo, tanto assim, que suas pesadas críticas à administração custou a demissão do Presidente da Província, Antônio Pedro de Alencastro. Outro aspecto interessante era a publicação de anúncios, inclusive de compra e venda de escravos, aluguel de imóveis, venda de bilhetes de espetáculos teatrais etc. Historiadores destacam também a contribuição histórica a Mato Grosso desse periódico, uma vez que ele noticiou vários aspectos do conflito que ficou conhecido como a Guerra da Tríplice aliança, que envolveu Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai. (ROCHA, 2017, p. 10).

Além da importância por ser oposição, o “Imprensa de Cuyabá” também é caracterizado pelas mudanças editoriais que trouxe ao cenário jornalístico de Mato Grosso, possibilitando o surgimento de outros jornais de oposição ao governo provincial. De acordo com Danusa Andrade (2016) e Sônia Zaramella (2004), a oposição do “Imprensa” resultou na demissão do governador da província, mas não sem antes ter seus responsáveis presos.

A cena da prisão do Padre Ernesto é narrada por Rubens de Mendonça, contando que o então governador, Antônio Pedro de Alencastro, decreta a prisão do sacerdote, que era responsável pelo periódico, dentro da igreja enquanto celebrava uma missa.

O Padre, calmo resignado, não deu grande importância a isso, subiu ao púlpito, cumpriu seu sagrado ministério, e ao descer dirigiu-se ao Sr. Bispo, acompanhou-o até a casa deste; de lá saindo encontrou o oficial que o esperava e que de novo lhe

intimou a ordem. Voltando ao Sr. Bispo, deu-lhe o Padre parte do ocorrido e lhe declarou que ia sujeitar-se à prisão. (MENDONÇA, 1951, p. 27).

Acerca da linha editorial de cada jornal mato-grossense surgido na época, Mendonça (1951) traz à tona relatos de expedicionistas que viajavam para a província. Um deles era o alemão Karl Von Den Steinen.

Ele relata que os jornais vigentes na época em que esteve em Mato Grosso, mais para o fim do império, travavam batalhas por defenderem interesses políticos.

Não traziam mais do que política partidária, acontecimentos locais, notícias várias, injúrias pessoais e poesias. Durante nossa estadia nada continha referente ao além mar ou sequer ao Paraguai. (STEINEN apud MENDONÇA, 1951, p. 22).

Steinen também relata que predominavam nas páginas dos periódicos mato-grossenses as brigas entre os redatores, construindo, de certa forma, uma rivalidade entre os jornais. Ele ainda relata que o que ligava o leitor aos jornais era a possibilidade daquele aparecer em suas páginas, por meio de recados ou saudações do editor (JUCÁ, 2009).

A ordem gráfica dos jornais obedecia aos estilos que encobriam toda a extensão do Brasil, sem muitas mudanças consideráveis. Alguns periódicos optavam por delimitar sua linha editorial apenas em política, enquanto outros já eram abertos a mais assuntos, como os acontecimentos diários, sobretudo os mais curiosos, folhetins, anúncios e recados. Havia também em grande parte deles serviço de catálogo de preços, tanto de alimentos quanto outros materiais. Os assuntos eram mais relacionados a Cuiabá e à parte norte da província, e menos ao que hoje é o Mato Grosso do Sul e sua região.

Mendonça (1951) discorre que assim era a imprensa não só na província de Mato Grosso, mas em todo o império: era cheia de particularidades e completamente carregada da subjetividade daquele que relatava.

Dados os contextos políticos e jornalísticos em âmbito nacional e mato-grossense, o capítulo seguinte, que encerra este estudo, trará uma análise dos primeiros jornais produzidos e veiculados no Estado de Mato Grosso.

CAPÍTULO III

ANÁLISE DOS JORNAIS OITOCENTISTAS MATO-GROSSENSES: O

CASO D’A GAZETA CUYABANA, O LIBERAL E A SITUAÇÃO

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