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CAPÍTULO I – Investigação dos mecanismos moleculares associados à tolerância a

3. Os genes mais induzidos em resposta ao tratamento indicam potenciais proteínas de

Além das alterações metabólicas associadas à resposta ao tratamento, foram investigados outros mecanismos que desempenham papel potencialmente importante na resposta do fungo à droga. A análise dos genes diferencialmente expressos revelou que 209 genes são induzidos em todos os quatro pontos do tempo em resposta ao tratamento com a droga (Figura 7). Estes genes apresentam resposta robusta ao tratamento com azoxistrobina e provavelmente, desempenham funções centrais na resposta do fungo ao fungicida.

Como ponto de partida, dentre os 209 genes que se encontram diferencialmente induzidos em todos os pontos do tempo, foram analisados os 30 genes com os maiores valores de fold change. A Tabela 8 revela os 30 genes com os valores de indução mais altos no experimento.

Tabela 8 – Relação dos 30 genes com maiores valores de fold change do experimento – Dentre os 209 genes

que se encontram diferencialmente induzidos em todos os pontos do tempo, foram analisados os 30 genes com os maiores valores de fold change. Os valores de fold change dos genes induzidas (e FDR≤0.01) encontram-se destacados em negrito.

A análise dos genes que compõe a lista da tabela 8 revela a indução de uma ampla gama de fatores que funcionam como mecanismos citoprotetores. O fungo expressa uma grande variedade de genes que mitigam os efeitos tóxicos da inibição da cadeia respiratória mitocondrial, o que compreende proteínas relacionadas à proteção contra estresse oxidativo (glutationa-S-transferases e peroxidases), à resistência ao estresse (por exemplo,

drogas). As principais classes de genes potencialmente envolvidos na resposta do fungo aos efeitos tóxicos da droga são discutidas na sequência.

3.1. M. perniciosa ativa mecanismos de resposta a estresse oxidativo diante do tratamento com azoxistrobina

Alguns estudos indicam especificamente que o tratamento com azoxistrobina induz uma condição de estresse oxidativo no fungo (Avila-Adame & Köller, 2002; Kaneko & Ishii, 2009). De maneira geral, diante do desacoplamento de qualquer um dos complexos da cadeia respiratória principal o dano por estresse oxidativo é aumentado significativamente (Joseph-Horne, Hollomon, & Wood, 2001).

Em concordância, a análise da Tabela 8 revela que em resposta ao tratamento com este fungicida, M. perniciosa expressa uma grande variedade de genes que mitigam os efeitos tóxicos da inibição da cadeia respiratória principal mitocondrial, dentre eles, a geração de espécies reativas de oxigênio (ROS – reactive oxygen species). Em níveis elevados, ROS são nocivos para a célula e levam à degeneração de várias estruturas celulares e funções metabólicas, culminando na morte celular (Marí & Cederbaum, 2001).

Entre esses sistemas antioxidantes, a análise do transcriptoma de M. perniciosa revelou indução da expressão de glutationa-s-transferases (GSTs) (por exemplo, o gene MP03402). Estas proteínas pertencem a uma família de enzimas multifuncionais de detoxificação que têm papel principalmente na catálise da conjugação de compostos xenobióticos à glutationa (Dowd, Buckley, & Sheehan, 1997). Esta conjugação produz compostos que são geralmente menos reativos e mais solúveis (Veal, Toone, Jones, & Morgan, 2002). As GSTs desempenham um papel importante na proteção da célula contra o estresse oxidativo, justamente por diminuir a toxicidade de moléculas produzidas pela reação dos ROS com componentes da célula (Veal et al., 2002).

Ainda em relação à proteção contra o estresse oxidativo, foi detectada a indução de uma carotenoid cleavage dioxygenase (MP05227) e uma retinol dehydrogenase (MP03412). Oxigenases de carotenóides são enzimas que catalisam a clivagem de β-caroteno, formando duas moléculas de retinal (Estrada, 2009). Apesar dos carotenóides não são metabólitos essenciais para fungos, essas moléculas podem fornecer proteção contra o estresse oxidativo, agindo como scavengers de radicais livres (Estrada, 2009).

Genes envolvidos na biossíntese de carotenóides têm sido identificados em diferentes fungos. Estrada et al. (2009) investigaram a biossíntese de carotenóides no fungo

Ustilago maydis, o agente causador da "ferrugem do milho". Curiosamente, a biossíntese de

carotenóides não havia sido um foco de atenção neste fungo devido à ausência de pigmentação típica. No entanto, a caracterização de uma carotenoid cleavage oxygenase em

Fusarium fujikuroi (Prado-Cabrero, Scherzinger, & Avalos, 2007) estimulou novas

investigações sobre esta via biossintética em U. maydis. Os dados mostraram que U. maydis acumula uma quantidade moderada de β-caroteno, que serve principalmente como precursor do retinal (Estrada, 2009). Tendo em vista a identificação de um gene codificante de uma oxigenase de carotenóides altamente expresso em M. perniciosa, a caracterização da via de biossíntese de carotenóides pode vir a ser alvo de uma investigação mais aprofundada, uma vez que seu papel na resposta ao fungicida pode ser relevante.

Joseph-Horne et al. (2001) discutem que há sempre um background de stress oxidativo nas células, no entanto, o nível de estresse que pode ser tolerado sem comprometimento da viabilidade celular dependerá do estado metabólico celular. A ação da azoxistrobina culmina na expressão de vários sistemas enzimáticos com potencial antioxidante. Essa resposta ao estresse desencadeado pela geração de ROS confere à célula proteção contra compostos tóxicos derivados de oxigênio reativo (Pusztahelyi et al., 2011).

A capacidade do fungo em atenuar o estresse oxidativo através do aumento da expressão destes mecanismos de detoxificação pode desempenhar um papel importante na sobrevivência do patógeno. Ainda neste sentido, um elemento central envolvido na resposta à inibição da cadeia respiratória é a indução da proteína oxidase alternativa (MpAOX). Estudos com diferentes espécies de fungo demonstraram que a AOX é induzida por uma variedade de tratamentos usualmente rotulados como “estressantes” (Magnani et

al., 2008). Além disso, as espécies reativas de oxigênio (ROS), particularmente o peróxido de

hidrogênio, parecem ser um importante gatilho na indução da expressão da AOX (Magnani

et al., 2008). Uma evidência de que a atividade da AOX pode proteger a mitocôndria contra

o estresse oxidativo foi encontrada no fungo Ustilago maydis. Neste patógeno, quando a AOX é inibida há aumento da produção de H2O2 (Sierra-Campos, Velázquez, Matuz-Mares,

Villavicencio-Queijeiro, & Pardo, 2009).

Como observado na tabela 8, a enzima MpAOX figura entre os 30 genes com maior indução no experimento. A expressão robusta deste gene corrobora seu potencial papel

central na sobrevivência do fungo em resposta a droga, tanto como fator que permite a flexibilidade metabólica diante da inibição da cadeia respiratória principal, quanto como fator citoprotetor que previne formação de espécies reativas de oxigênio.

3.2. Expressão de mecanismos citoprotetores em resposta ao tratamento com azoxistrobina

Ainda na listagem mostrada na tabela 8, observa-se a presença de genes relacionados à resposta ao estímulo químico por composto exógeno. Uma das classes de proteínas mais representadas nessa seleção são os citocromos P450. Além da síntese de uma gama de metabólitos secundários, citocromos P450 podem aumentar o potencial de desintoxicação dos fungos através da catálise da conversão de compostos xenobióticos em produtos que podem ser facilmente excretados (Denison & Whitlock, 1995). Curiosamente, a familia dos citocromos P450 é expandida em M. perniciosa (Mondego et al., 2008) sugerindo um alto potencial de detoxificação neste fungo.

Outro mecanismo geral de resposta a compostos tóxicos exógenos que foi revelado pela análise de RNA-seq são os transportadores transmembrana. Em particular, destacam-se as “proteínas de resistência a benomil-metotrexato” (MP16169 e MP16557), que são bombas de efluxo pertencetes à família MFS (major facilitator superfamily) de transportadores. Bombas de efluxo como estas são caracterizadas como mecanismos de resistência a múltiplas drogas, uma vez que têm baixo nível de especificidade de substrato e promovem proteção contra uma ampla gama de compostos tóxicos. Estes transportadores bombeiam compostos tóxicos para fora da célula, evitando o acúmulo letal de drogas e permitem assim a sobrevivência do patógeno (Fernández-Ortuño et al., 2008).

Além dos mecanismos de resposta ao estresse, entre os genes com maiores valores de fold change (Tabela 8) foi identificado um fator de transcrição (MP06790). A identificação e caracterização desta classe de proteínas tem particular importância, uma vez que pode regular um conjunto de genes ou vias inteiras comprometidas neste tipo de resposta ao estresse.

Por último, observa-se que genes codificantes de proteínas com anotação "no hit" também se encontram induzidos. Essas proteínas tem similaridade de sequência primária extremamente baixa com qualquer outra proteína conhecida fora do gênero

Moniliophthora. Genes com esta anotação podem ser interessantes justamente pelo

potencial em revelar mecanismos envolvidos na resistência específicos ao gênero ou à espécie.

Cada uma das quatro classes supracitadas foi analisada a fundo. Os tópicos seguintes apresentam mais detalhes sobre os membros dessas classes de genes que responderam a tratamento com azoxistrobina.