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Guerra ao dinheiro

No documento livro-a-febre-do-ouro.pdf (páginas 125-131)

Além das guerras cambiais e das guerras financeiras, também há a guerra ao dinheiro nos Estados Unidos. Esse ataque ao direito de usar dinheiro livremente é outro motivo para considerar uma alocação em ouro físico em épocas de incerteza econômica.

Há muitos motivos bons e legítimos para se ter dinheiro. Pode estar em seu tipo de negócio ou você pode desejar dinheiro para emergências. Se você vive onde eu vivo, na Costa Leste do Estados Unidos, está vulnerável a furações que podem acabar com a energia por dias ou semanas (como no caso do Furacão Sandy). Quando a força acaba, os caixas eletrônicos e os leitores de cartão de crédito não funcionam. É bom ter um pouco de dinheiro para ocasiões como essas.

Apesar disso, estamos testemunhando uma movimentação acelerada em direção a moedas digitais ou à chamada sociedade sem dinheiro. As pessoas dizem, “E daí? É conveniente tudo ser digital.” Concordo. Eu utilizo cartões de crédito e de débito, PayPal e Apple Pay assim como milhares de americanos. Mas a tendência digital tem implicações importantes.

Um sistema completamente digital prepara a economia para taxas de juros negativas. O governo pode tentar forçar as pessoas a gastar dinheiro confiscando parte de tudo o que ficar no banco sob o pretexto de uma taxa de juro negativa. Em vez de o banco lhe pagar juros, ele tira os juros de sua conta. Dinheiro é uma maneira fácil de derrotar as taxas de juros negativas. Qualquer um com dinheiro pode ter a mesma quantidade ao final de um período e não estaria sujeito às taxas de juros negativas. Eliminar o dinheiro e forçar as pessoas a um

sistema completamente digital é o primeiro passo em direção aos juros negativos. Economistas proeminentes, como Larry Summers e Kenneth Rogoff, propuseram tais passos.

A guerra ao dinheiro foi lançada ostensivamente para perseguir traficantes e terroristas. O governo sempre dirá: “Não estamos contra os cidadãos. Estamos apenas tentando capturar os traficantes, os terroristas, os sonegadores, entre outros. É por isso que não permitimos que as pessoas tenham dinheiro”. O problema é que cidadãos que obedecem às leis são supostos traficantes, terroristas e sonegadores assim que expressam preferência por dinheiro. O cenário está pronto.

A guerra ao dinheiro é reminiscente do que aconteceu com o ouro no início do século 20, entre 1900 e 1914. Nos Estados Unidos, em 1901, por exemplo, quem fazia uma compra poderia pôr a mão no bolso, pegar uma moeda de ouro no valor de 20 dólares ou uma de prata no valor de um dólar. Quando eu era criança, as moedas de 25 centavos e de dez centavos eram de prata. Foi apenas na década de 1960 que o governo rebaixou as moedas de prata adicionando cobre, zinco e outras ligas.

Como o governo fez com que as pessoas abrissem mão de suas moedas de ouro? Os bancos retiraram as moedas de circulação vagarosamente (como o dinheiro está sendo retirado de circulação hoje), derretiam-nas e as reformulavam em barras de 400 onças. Ninguém vai andar com uma barra de 400 onças no bolso. Então, os bancos disseram às pessoas: “Tudo bem, você pode ter ouro, mas não vai ser na forma de moedas. Será na forma dessas barras. Aliás, essas barras são muito caras”. Isso significa que você precisava de muito dinheiro para ter uma só barra e que você não poderia levá-la para lugar nenhum. Você teria de deixá-la no cofre do banco.

É um processo gradual, e as pessoas não perceberam a substituição das moedas de ouro pelo papel-moeda porque o papel parecia mais conveniente (como o meio digital parece mais conveniente hoje). Os bancos criaram essas barras de ouro de 400 onças e se livraram das moedas de ouro. Quando o ouro se tornou ilegal em 1933, não havia ouro em circulação. Era relativamente fácil confiscar as barras de ouro nos cofres dos bancos utilizando ordens executivas.

O mesmo processo ocorre hoje. As pessoas estão aceitando substitutos digitais para o papel-moeda porque é mais conveniente. Só mais tarde, quando o papel-moeda estiver completamente fora de circulação, o governo começará a confiscar a riqueza digital. Não haverá alternativa ao dinheiro. As pessoas só perceberão quando for tarde demais.

Todo o processo de mudar das moedas de ouro para papel lastreado em ouro, depois para papel fiduciário e, posteriormente, para dinheiro digital levou cerca de cem anos. Cada passo do processo faz com que seja muito mais fácil para que o governo confisque sua riqueza.

Agora o ciclo está completo. Eu descrevi a guerra ao ouro na primeira metade do século 20. No século 21, estamos vivendo uma guerra ao dinheiro. Ironicamente, a solução para a guerra ao dinheiro é voltar ao ouro, porque o ouro é legal mais uma vez. Entre 1933 e 1975, a propriedade de ouro era ilegal nos Estados Unidos (e continua sendo em muitos países). Mas o ouro agora é uma forma legal de ter dinheiro. É possível comprar grandes barras de 400 onças, de um quilo (que são muito mais convenientes do que as de 400 onças) e moedas de ouro. A Casa da Moeda dos Estados Unidos vende moedas de ouro de uma onça do tipo American Gold Eagle e American Buffalo. As duas contêm uma onça de ouro puro, mas a Eagle adiciona uma liga para durabilidade.

É prudente ter dinheiro além de ouro, mas fazer isso está cada vez mais difícil. Você pode começar indo a seu banco e pedir US$ 5.000 em dinheiro. Não é ilegal, mas você terá de apresentar algum tipo de identificação, assinar alguns documentos, responder perguntas e preencher alguns formulários para o governo – provavelmente um formulário SAR (Suspicious Activity Report). Valores acima de US$ 10.000 exigem o preenchimento do formulário CTR (Currency Transaction Report). Há uma rede de notificações automatizada por trás dos formulários SAR e CTR, casos que chamam atenção são direcionados para o U.S. Financial Crimes Enforcement Network (FinCEN), localizado no norte da Virgínia, próximo a agências de inteligência. Se você pedir dinheiro, será tratado como um traficante pelo banco, mesmo que não seja um.

Provavelmente é tarde demais para ter muito dinheiro. A guerra ao dinheiro está quase no fim, e o governo venceu. Mas ainda não é tarde demais para o ouro, que mantém seu valor como uma reserva física de riqueza e não é afetado pela digitalização de outras formas de dinheiro.

Retração

Outra prova da resiliência do ouro, mesmo após declínios significativos de preço entre 2011 e 2015, é o clássico padrão de operações de commodities conhecido como retração.

No inverno de 2015, passei alguns dias na República Dominicana com Jim Rogers, o renomado investidor, trader de commodities e cofundador do Quantum Fund com seu então parceiro George Soros.

Poucos investidores viram tantos ciclos bull e bear em tantos mercados quanto Jim. Quando nos conhecemos, o ouro custava cerca

de US$ 1.200 por onça; mais tarde caiu para a faixa de US$ 1.050 por onça. Jim me disse que manteria o ouro que já tinha, mas não acumularia mais, caso o preço continuasse a US$ 1.200. Ele estava esperando pelo que descreveu como “uma retração de 50%” e disse que seria o sinal para considerar comprar mais. Essa abordagem técnica não alterou nossa visão fundamental de que o ouro subiria muito – talvez até a US$ 10.000 por onça. A ideia de retração tinha a ver com oportunidades de operação de curto prazo e pontos de entrada para novos investimentos em vez de com a defesa fundamental do ouro.

Por exemplo, se o ouro formasse uma base de US$ 200 por onça, o que fez no final da década de 1990, e depois subisse para US$ 1.900 por onça, o que ocorreu em agosto de 2011, uma retração de 50% faria com que o ouro chegasse a US$ 1.050 por onça, o ponto médio entre US$ 200 e US$ 1.900. Jim me disse que nunca tinha visto uma commodity subir de uma base baixa para uma alta tão grande sem uma retração de 50% no meio do caminho. O ponto principal para Jim Rogers foi começar a adicionar ao seu portfólio de ouro quando ele estava a US$ 1.050.

Esse tipo de variação de preços ou volatilidade não é incomum, mas a previsão de longo prazo não mudou porque os fundamentos econômicos e a matemática monetária são as mesmas. Ouro em um mundo que perde confiança em papel-moeda valerá pelo menos US$ 10.000 por onça, talvez mais, porque um preço mais alto é necessário para restaurar a confiança em um eventual pânico sem causar deflação. Se você acredita que uma situação de pânico não será provável no futuro ou que a confiança no papel-moeda será mantida indefinidamente, talvez ouro não seja o tipo de dinheiro para você. A história nos mostra que pânicos e perda de confiança são apenas uma questão de tempo. Nessas circunstâncias, o ouro é a reserva de valor mais segura.

Apesar das preocupações do investidor em relação às retrações, o que não é surpreendente, o ouro ainda tem um ótimo histórico medido em dólares, alta de 450% desde 1999 e de 3.000% desde 1971, no momento em que escrevo este livro.

Um perigo para pequenos investidores é que, conforme chegamos mais próximos do ponto em que o ouro sobe acentuadamente, pode ficar cada vez mais difícil conseguir ouro físico. Eu não duvido que bancos centrais, fundos soberanos e grandes fundos de hedge consigam um pouco de ouro por esse preço. Mas posso ver uma época em que as casas da moeda vão parar de enviar, em que pequenos negociantes ficarão com encomendas demais e que você não conseguirá comprar ouro nas quantidades que deseja independentemente do preço. Por isso, é uma boa ideia ter uma alocação de ouro agora, para que você não fique fora quando o preço começar a subir de forma descontrolada e desordenada.

Conclusão Como um investidor do século 21, não quero que toda a minha riqueza seja digital. Eu quero que parte da minha riqueza seja tangível, como o ouro. É impossível “hackear” ouro, você não pode deletá-lo digitalmente ou apagá-lo de qualquer forma, e você não pode infectá-lo com um vírus de computador, porque ele é físico.

Por causa da turbulência que afeta o sistema monetário internacional por meio das guerras cambiais, das guerras ciberfinanceiras e da guerra ao dinheiro, minha previsão para o ouro continua sendo que ele vai rumar para um preço muito maior em dólar num futuro não muito distante. As circunstâncias econômicas e as condições que apoiam essa análise não mudaram. A resiliência do ouro em um período de tumulto foi provada diversas vezes.

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