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HIPÓTESES E PROCEDIMENTOS

No documento marcada e referenciação (páginas 33-38)

QUESTÕES DE PESQUISA E PROCEDIMENTOS

METODOLÓGICOS

O universo não tem anverso nem reverso O universo não tem anverso nem reverso O universo não tem anverso nem reverso Não tem uro externo nem tem centro secreto Você está dentro, não haverás nunca uma porta. Não espere que o rigor de seu caminho, desse caminho que teimosamente se bifurca em outro

que obstinadamente se bifurca em outro, não espere que ele tenha fim. (Jorge Luís Borges)

2.1 Delimitação do universo

Nossa pesquisa procede a uma releitura crítica da teoria da heterogeneidade enunciativa, instituída por Authier-Revuz (1982). Travamos uma discussão em torno do esquema proposto pela autora, com vistas a repensar a discretização das modalidades de heterogeneidade constitutiva, a saber, a constitutiva, em oposição à mostrada, podendo, esta última, ser do tipo marcada ou não-marcada, com vistas a cumprir nosso desiderato precípuo, qual seja, o de incluir fenômenos de natureza não estritamente formal entre os fatos de linguagem tidos como marcados, ampliando, assim, o leque de marcações para os casos de mostração.

Para argumentar em favor dessa ―abertura‖ para que procedimentos de natureza (mais) sócio-cognitiva sejam alocados no âmbito do localizável, recorremos a processos de referenciação que desempenham papel de eficientes marcadores discursivos, sem que, para tanto, precisem vir acompanhados de indicadores formais que denunciem marcação.

Nossos esforços vão em direção à tentativa de conferir autonomia a certas marcas linguísticas que, inseridas em contextos específicos, promovem a marcação da alteridade no fio discursivo. Mais especificamente, tentaremos analisar que processos de continuidades referenciais anafóricos (sobretudo as anáforas indiretas) e dêiticos apresentam estatuto de marcadores, assim como aqueles ditos formais. Incluiremos, também, o processo de recategorização como categoria de análise, já que pode estar condensada nos processos supra,

quando entendida como uma transformação cognitiva do referente. Processos intertextuais por alusão e o discurso indireto livre também encontraram lugar em nossas considerações.

2.2 Questões de pesquisa

Esta pesquisa está assentada no pressuposto de que é possível haver marcação explícita da presença da voz do outro no fio discursivo sem que, para tanto, esta tenha que vir indicada por vias prototípicas (aspas, itálico, negrito, discurso direto, mudança de fonte).

Partimos dessa linha de raciocínio para fazermos os seguintes questionamentos:

a) Que marcas linguísticas promovem a mostração do outro no fio discursivo sem que haja uma marcação prototípica (aspas, itálico, negrito mudança de fonte, discurso direto) dessa alteridade?

b) Que heterogeneidades são intertextuais?

c) Que processos referenciais evidenciam casos de intertextualidade?

d) Que processos de referenciação podem evidenciar fatos de heterogeneidade?

e) Nas heterogeneidades não-intertextuais, em que casos os processos referenciais podem constituir marcas?

A partir desses questionamentos, propomos as seguintes hipóteses:

Hipótese básica:

É possível reconhecer outras possibilidades de mostração-marcação da alteridade no fio discursivo, a partir de diferentes fenômenos de intertextualidade e de estratégias de referenciação.

Hipóteses secundárias:

a) Dentre as marcas tipicamente consideradas como marcações de explicitude da alteridade no fio discursivo, estão as que assinalam a intertextualidade por co-presença da citação, como verbos dicendi e equivalentes, dois pontos, aspas, itálicos, negrito, indicação da fonte;

b) A intertextualidade por alusão é a que mais claramente se estabelece por um processo de referenciação, classificado na literatura como anáfora indireta;

c) Os demais tipos de heterogeneidade discursiva que são intertextuais não se descrevem por um processo referencial específico, mas podem ser reconhecidos com a ajuda de introduções referenciais, em primeiro lugar, mas também de anafóricos e dêiticos;

d) Nas heterogeneidades não-intertextuais, os seguintes processos referenciais podem constituir marcas: 1) anáforas diretas e indiretas, que podem constituir mecanismos de marcação de vozes distintas no discurso; 2) recategorização homologada por expressão de introduções referenciais, que pode também constituir um mecanismo de marcação de alteridade no fio discursivo; 3) dêiticos de tempo e de espaço, que podem indicar a existência de discurso indireto livre e, dessa forma, marcar alternância de vozes entre narrador e personagem;

2.3 Procedimentos metodológicos

2.3.1 Etapas do trabalho

1. Na primeira etapa deste trabalho, procedemos a uma leitura exaustiva da literatura, nas diferentes vertentes dos estudos da enunciação que trata, direta ou indiretamente, do assunto, para que pudéssemos travar uma discussão rigorosa acerca dos mecanismos de que dispõem os sujeitos da enunciação para marcar a ―alteração‖ de seu discurso. Nesse primeiro momento, encampamos nossa pesquisa na Linguística da Enunciação, mas também em pressupostos da Linguística do Texto;

2. Posteriormente, descrevemos as categorias de análise em torno das quais visualizamos os fenômenos que queremos que sejam tratados como se mostrando na materialidade linguística como marcados: os fenômenos intertextuais e os processos de referenciação;

3. Feito isso, partimos para a identificação das heterogeneidades textuais e intertextuais em textos de gêneros variados (não trabalhos exatamente com um corpus, senão apenas com um exemplário);

4. Identificamos, então, as marcas de referenciação que enxergamos nas intertextualidades e quais os processos referenciais especificamente que funcionavam como mostradores de heterogeneidade marcada no fio discursivo;

5. O passo seguinte foi a definição dos textos para análise. Para demonstrar o que estamos defendendo, não nos utilizamos de textos de um gênero específico, uma vez que objetivamos investigar tão-somente estratégias ―alternativas‖ de marcação. Não é pretensão nossa, pois, atrelar tais possibilidades marcativas a um gênero específico, nem à predominância desta ou daquela sequência textual; focalizamos o fenômeno independentemente do gênero em que ele se manifeste ou da sequência em que esteja inserido; mais exatamente, não fizemos uma associação direta, porque a relação entre os gêneros e sequências e o fenômeno estudado existe: uns vão ser mais propensos a certos tipos de intertextualidade e de processos referenciais do que outros, fato do qual não iremos nos ocupar. Será, portanto, convocado um exemplário de vinte textos pertencentes a gêneros variados, com vistas a respaldar materialmente o intento que orienta o empreendimento desta pesquisa: comprovar textualmente que é possível haver marcação sem, necessariamente, indicá-la pelas vias formalmente já aceitas;

6. O exemplário da análise reúne 20 textos cujos gêneros se alternam entre artigo de opinião, crônica, conto, nota de coluna, poema, relatório e soneto. Ancoramos nossas considerações nas seguintes categorias:

a) Analisamos a dêixis de memória, identificando as marcas que ela promoveu e de que forma essas marcas se mostram textualmente, num ponto específico da cadeia do dizer, ao interlocutor;

b) Analisamos, a partir das dêixis de espaço e de tempo, as marcas de heterogeneidade que promoveram na superfície textual e de que forma essas marcas se mostram textualmente, produzindo uma opacificação local no fio discursivo, ao interlocutor;

c) Utilizamos a recategorização como critério de análise para demonstrar que tipo de marca tal fenômeno promove na materialidade linguística e de que maneira essa marca se mostra concretamente, em um ponto específico da cadeia do dizer, ao interlocutor;

d) Utilizamos o discurso indireto livre como critério de análise para demonstrar que tipo de marca promove no fio discursivo e de que maneira essa marca se mostra ao interlocutor;

e) Partimos da intertextualidade por alusão para demonstrar a natureza da marca que promove no fio discursivo e de que maneira essa marca se mostra, por meio de procedimentos de remissão indireta e em pontos específicos da materialidade linguística, ao interlocutor.

Em nossa análise, demonstramos, a partir de elementos textuais, como um fato de heterogeneidade se mostra por meio das categorias analíticas que elegemos para legitimar a proposta maior de nossa empresa: a de incluir, entre as marcas que opacificam um ponto específico da cadeia do discurso, processos referencias de natureza anafórica e dêitica.

No documento marcada e referenciação (páginas 33-38)

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