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HIPERESPECIALIZAÇÃO E INTERDISCIPLINARIDADE

1. CONHECIMENTO, DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA E TERMINOLOGIA

1.1.3. HIPERESPECIALIZAÇÃO E INTERDISCIPLINARIDADE

Muitas ideias nascem nas fronteiras e nas zonas incertas e (…) grandes descobertas ou teorias nasceram de maneira frequentemente indisciplinar (Morin, 2001b:492).

O conhecimento caracteriza-se, como vimos, pelo processo, mas também pelo produto resultante da tentativa de apreensão do objecto pelo sujeito. Cada objecto constitui, porém, apenas uma parcela do todo contínuo e complexo que é a realidade. De facto, para a compreender e para sobre ela agir, a fim de satisfazer as suas necessidades e de, de algum modo, a controlar, o ser humano

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tem vindo a fragmentar a realidade numa quase infinita multiplicidade de fenómenos e de objectos, sobre os quais vai produzindo conhecimento. Para Castro, esta divisão da realidade tem por objectivo melhor aprofundar cada aspecto em estudo: “a imobilização e a separação dos eventos e dos objectos uns dos outros é um puro percurso do pensamento para poder penetrar mais fundo no conhecimento de cada aspecto que se encara” (Castro, 1964:149). Tal facto suscita uma diversidade de áreas de conhecimento, por vezes com objectos de estudo idênticos, perspectivados sob diferentes pontos de vista. De acordo com Sager, o conhecimento constitui, de facto, um contínuo convencionalmente dividido em áreas do conhecimento ou disciplinas:

In practice no individual or group of individuals possesses the whole structure of a community’s knowledge; conventionally, we divide knowledge up into subject areas, or disciplines, which is equivalent to defining subspaces of the knowledge space (1990:16).

Desde a Antiguidade que o ser humano tem sentido a necessidade de classificar o seu conhecimento sobre a realidade. A classificação das ciências, porém, é mais recente. A ciência moderna, assente num modelo de racionalidade, desenvolveu-se a partir do século XVII e as várias classificações, que entretanto foram surgindo, tiveram como objectivo sistematizar e organizar o conhecimento. Apesar de múltiplas, as classificações têm todas, de acordo com Mora, uma característica comum – a sua caducidade. Este facto deve-se ao carácter dinâmico e mutável do conhecimento, de que já habíamos falado: “las ciencias están continuamente en formación; ciertos territorios límites dan lugar con frecuencia a ciencias nuevas; ciertas ciencias pueden insertarse en dos o más casilleros, etc, etc.” (Mora, 1984:500).

No contexto actual de expansão e desenvolvimento científico e tecnológico, duas grandes tendências se manifestam na estrutura do conhecimento: uma tendência de natureza vertical, ou seja, uma crescente hiperespecialização, fruto da fragmentação do conhecimento; e uma tendência maioritariamente horizontal de interdisciplinaridade.

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O conhecimento científico moderno aprofunda-se por via da especialização. Surgem, crescentemente, novas áreas de estudo que vêm ocupar espaços ainda pouco explorados da esfera do conhecimento, conduzindo à reestruturação das classificações existentes. Muitas destas conquistas decorrem de uma longa disputa, de um jogo de poder, entre a nova disciplina e as áreas já estabelecidas e com maior história e tradição. Consequentemente, assomam também novas terminologias que, ao denominar o seu objecto de estudo, contribuem também para a afirmação e para a legitimidade da recém criada ciência:

La constitution d’une terminologie propre marque dans toute science l’avènement ou le développement d’une conceptualisation nouvelle, et par là elle signale un moment décisif de son histoire. On pourrait même dire que l’histoire propre d’une science se résume en celle de ses termes propres. Une science ne commence d’exister ou ne peut s’imposer que dans la mesure où elle fait exister et où elle impose ses concepts dans leur dénomination. Elle n’a pas d’autre moyen d’établir sa légitimité que de spécifier en le dénommant son objet… (Benveniste, 1966:247).

Quanto mais restrito for o objecto sob o qual o conhecimento incide, tanto mais rigoroso o será. Porém, como afirma Santos, “nisso reside, aliás, o que hoje se reconhece ser o dilema básico da ciência moderna: o seu rigor aumenta na proporção directa da arbitrariedade com que espartilha o real” (1993:46).

A parcelização e a ramificação que se vem acentuando nas várias áreas do conhecimento resultam da necessidade de focalização num objecto de estudo específico, segundo fundamentos teóricos e metodologias próprios e adequados. Dada a extensão e complexidade de cada área, é, pois, dificilmente exequível para o ser humano conhecer pormenorizadamente cada um dos seus ramos: “é de resto esta situação que em grande medida explica as especializações, seguidas de subespecializações e outras, num processo de ‘semiparidade’ que cria, por outro lado, dificuldades ao trabalho científico” (Castro, 1975:33). A hiperespecialização advém, essencialmente, de uma necessidade pragmática da comunidade científica de gestão do conhecimento e de divisão científica do trabalho em benefício da produtividade e do seu aprofundamento. No contexto

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educativo, o estabelecimento de fronteiras e limites apresenta-se, de igual modo, como indispensável à didactização e à leccionação dos conteúdos.

As diferentes especialidades médicas reconhecidas em contexto nacional retratam fielmente a actual tendência: no sítio Web da Ordem dos Médicos estão listadas 47 especialidades e 8 subespecialidades em Medicina1. Sob esta questão da fragmentação e disciplinarização do conhecimento, Santos apresenta um ponto de vista bastante crítico, afirmando, a título exemplificativo, que a Medicina tem verificado que a hiperespecialização do saber médico transformou o doente numa quadrícula sem sentido, quando, efectivamente, não se trata apenas a parte, mas sim o todo (1993:46). As tentativas de reverter esta situação conduzem, porém, à sua reprodução: “criam-se novas disciplinas para resolver os problemas produzidos pelas antigas e por essa via reproduz-se o mesmo modelo de cientificidade” (Santos, 1993:47). O médico de família, cuja especialidade é denominada Medicina Geral e Familiar, surgiu, efectivamente, para reunir o conhecimento espartilhado pelas várias especialidades, de modo a fornecer aos pacientes um cuidado total e não parcial. Todavia, esta traduz-se em mais uma especialização ao lado das demais, constituindo, muitas das vezes, apenas o ponto de partida para a consulta de outras especialidades.

Para Santos, a parcelização arbitrária do conhecimento faz do cientista um ignorante especializado (1993:46). A sua visão do mundo passa a estar condicionada e a circunscrever-se ao corpo de conhecimento que possui. O conhecimento transforma-se, então, numa visão do real artificialmente dividida por áreas do conhecimento e especializações: “ser profissional implica, como regra, um saber especializado, por vezes obsessivamente verticalizado” (Demo, 1997:83). A edificação de claustros não é, pois, desejável ao avanço científico, dado que a realidade é constituída por um todo complexo e interactivo, a percepção da qual pode ser deformada pelo excessivo aprofundamento da parte. A necessidade de especialistas é inquestionável; fundamentais são, pois, especialistas abertos ao diálogo com outras comunidades, integrando, mesmo,

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comunidades heterogéneas: “há que olhar para o lado para ver outras coisas, ocultas a um observador rigidamente disciplinar. Por outras palavras, a ciência é um processo que exige um olhar transversal” (Pombo, 2006:9).

Nos últimos tempos temos vindo, efectivamente, a assistir a uma tendência, de igual forma, interdisciplinar, que se manifenta em diferentes áreas do saber, das artes às ciências. Novos campos de estudo e novos projectos têm surgido, caracterizados por uma interacção que tanto une áreas conexas – como a Dança à Literatura – como domínios, à partida, mais díspares – como a Biologia à Informática.

Abordagens interdisciplinares, resultantes da crescente consciencialização da interdependência e da interacção dos vários fenómenos e objectos que constituem a realidade, levam-nos a falar de complexidade. Nesta linha de conta,

ser complexo e ser complicado são duas expressões que não se podem

confundir: “se o complicado continua, exactamente, a ser o oposto do simples, o que não basta para compreender a sua homogeneidade, a complexidade não se pode pensar propriamente sem admitir a sua heterogeneidade constitutiva e a natureza plural” (Ardoino, 2001:484).

Desvendar as leis simples que regem o real, apesar do aparente caos, era, de acordo com Morin, o grande objectivo do conhecimento científico até ao início do século XX. Este ideal seria atingido por meio de quatro princípios: a ordem que “contém tudo o que é estável, tudo o que é constante, tudo o que é regular, tudo o que é cíclico”; a separação que “conduz ao princípio de especialização, que adquiriu uma extensão extraordinária para a organização das disciplinas e se afirmou fecundo para inúmeras descobertas”; a redução em que “o conhecimento das unidades permite conhecer os conjuntos de que são componentes”; e o princípio da validade absoluta da Lógica Clássica que “dava um valor de verdade quase absoluta à indução, absoluta à dedução e quanto à qual toda a contradição deveria ser eliminada” (Morin, 2001b:491-492).

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Hoje, segundo Morin, o desafio da complexidade abala estes princípios. Para o autor, a complexidade considera o jogo dialógico entre a ordem, a desordem e a organização que caracterizam o nosso mundo. A complexidade do real tem como consequência a complexidade do conhecimento: “tal como a complexidade reconhece a parte da desordem e do imprevisto em todas as coisas, também reconhece uma parte inevitável de incerteza no conhecimento. É o fim do saber absoluto e total” (2001b:495).

Os princípios da separação, da especialização e da segmentação tornam- -se, assim, insuficientes nesta nova linha de pensamento: “se queremos um conhecimento pertinente, precisamos de religar, contextualizar, globalizar as nossas informações e os nossos saberes, portanto de procurar um conhecimento complexo” (Morin, 2001b:497). Reconhecer a complexidade e a pluralidade, implica, portanto, religar o conhecimento, incrementando a interdisciplinaridade. Por esta razão Demo afirma que “a razão maior da interdisciplinaridade está em que nenhum problema importante é especial; é apenas complexo” (1997:113).

Para o autor, a interdisciplinaridade é, por si, exigente, porque pretende ser suficientemente abrangente e profunda: “a interdisciplinaridade quer um relativo milagre: horizontalizar a verticalização, para que a visão complexa também seja profunda, e verticalizar a horizontalização para que a visão profunda também seja complexa” (Demo, 1997:88). Deste modo, definimos interdisciplinaridade, recorrendo às palavras de Demo: “pode-se definir a interdisciplinaridade como a arte do aprofundamento com sentido de abrangência, para dar conta, ao mesmo tempo, da particularidade e da complexidade do real” (1997:88-89).

Esta, segundo o autor, só será atingida através do estabelecimento de relações dialógicas entre comunidades científicas de diferentes áreas de especialidade, caracterizadas por um trabalho conjunto, articulado e integrado de métodos e de conteúdos, que visa um enriquecimento cognitivo do conhecimento acerca do real. Uma área interdisciplinar comporta uma visão complexificada do seu objecto de estudo. Não pode, porém, ser considerada reducionista, nem ser

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reduzida à soma das partes que a constituem, ou nas quais se baseia: “a interdisciplinaridade é o princípio da máxima exploração das potencialidades de cada ciência, da compreensão e exploração de seus limites, mas, acima de tudo, é o princípio da diversidade e da criatividade” (Etges, 1993:79). Para haver interdisciplinaridade é necessário, efectivamente, haver disciplinas.

Definir interdisciplinaridade comporta, obrigatoriamente, definir os termos que lhe estão próximos, a saber, multidisciplinaridade, pluridisciplinaridade e

transdisciplinaridade. Estes termos, classificados de forma gradativa por muitos

autores, visam representar o nível de colaboração e de integração entre disciplinas. Porém, o recurso aos mesmos suscita, por vezes, alguma confusão e ambiguidade.

Segundo Demo, uma abordagem multidisciplinar não implica integração, mas apenas adição de teorias, de métodos e de esforços, face a um problema comum a várias áreas, sem que haja uma modificação ou enriquecimento de cada uma delas. Esta abordagem indica uma acumulação e não, propriamente, uma incorporação de conhecimento:

Se tomássemos o exemplo de um livro, poderíamos dizer que um livro multidisciplinar é aquele que reúne a contribuição de vários autores, mas cada um faz seu texto em separado. O fato de estarem juntos num só livro já denota um ambiente de conjugação de esforços num mesmo espaço, mas a convergência não se realiza por completo (Demo, 1997:114).

Menezes e Santos diferenciam ainda multidisciplinaridade de pluridisciplinaridade. Para as autoras, a pluridisciplinaridade tem origem na tentativa de estabelecer relações entre disciplinas próximas, geralmente pertencentes a uma mesma grande área do conhecimento. Nesta perspectiva, agrupar-se-ia a Sociologia e a Economia no seio das Ciências Sociais, por exemplo. Enquanto que a multidisciplinaridade apresenta disciplinas sobrepostas, a pluridisciplinaridade manifesta, para Menezes e Santos, disciplinas justapostas e agrupadas:

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A multidisciplinaridade difere-se da pluridisciplinaridade porque esta, apesar de também considerar um sistema de disciplinas de um só nível, possui disciplinas justapostas situadas geralmente ao mesmo nível hierárquico e agrupadas de modo a fazer aparecer as relações existentes entre elas (2001-2004).

Esse esforço de estabelecimento de relações entre as disciplinas, em que ainda não existe evidente interacção, nem uma modificação interna de cada parte, daria origem à interdisciplinaridade. Demo confirma esta tese assegurando que o que faz a interdisciplinaridade não é, efectivamente, a justaposição de textos, mas a construção de um texto único, a várias mãos (1997:114).

Se a interdisciplinaridade tem em conta o diálogo entre disciplinas, a transdisciplinaridade, num estágio mais avançado, aspira à eliminação e superação das fronteiras entre estas. Para Demo, a transdisciplinaridade pode, no entanto, erradamente pressupor a desfiguração das especialidades no intercâmbio entre as disciplinas (1997:114).

Pombo, anunciando uma falta de estabilidade do conceito, um abuso e uma banalização do – segundo a autora, já gasto – termo interdisciplinaridade, apresenta uma proposta de definição do mesmo. Segundo a autora, existem quatro termos (pluri-, multi-, inter- e transdisciplinaridade) e quatro contextos distintos, mas apenas uma utilização abusiva, extremamente ampla, de um deles: a interdisciplinaridade. Através da decomposição das denominações e da análise dos seus constituintes – raiz e prefixos –, Pombo avança com uma proposta assente em dois princípios fundamentais: por um lado “aceitar estes três prefixos:

multi ou pluri, inter e trans (digo três e não quatro porque, do ponto de vista

etimológico, não faz sentido distinguir entre pluri e multi) enquanto três horizontes de sentido” e, por outro “aceitá-los como uma espécie de continuum que é atravessado por alguma coisa que, no seu seio, se vai desenvolvendo” (2004:98). Reduzindo os termos a três, a autora conclui: “se juntarmos a esta continuidade de forma um crescendum de intensidade, teremos qualquer coisa deste género: do paralelismo pluridisciplinar ao perspectivismo e convergência interdisciplinar e,

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desta, ao holismo e unificação transdisciplinar” (2004:98). A figura abaixo representa graficamente a tese defendida pela autora (Figura 1).

FIGURA 1–PLURIDISCIPLINARIDADE, INTERDISCIPLINARIDADE, TRANSDISCIPLINARIDADE2

Numa visão actual e complexificada, que realça os valores de convergência, da complementaridade e do cruzamento de áreas do conhecimento, a proposta da autora situa a interdisciplinaridade no contexto social, ético e político da vida, onde é necessário encontrar formas mais alargadas de pensar:

No fundo, estamos a passar de um esquema arborescente, em que havia uma raiz, um tronco cartesiano que se elevava, majestoso, acima de nós, que se dividia em ramos e pequenos galhos dos quais saíam vários e suculentos frutos, todos ligados por uma espécie de harmoniosa e fecunda hierarquia e a avançar para um modelo em rede, em complexíssima constelação, em que deixa de haver hierarquias, ligações privilegiadas: por exemplo, nas ciências cognitivas, qual é a ciência fundamental? (Pombo, 2004:117).

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Mais tarde, Pombo reforça ainda que o apelo à interdisciplinaridade constitui também um caminho para a unidade da Ciência. Por isso a autora afirma que, para além de as ciências, continua a fazer sentido falar da Ciência:

Se, desde os gregos, o homem faz ciência é para, em última análise, compreender o mundo em que vive e compreender-se a si como habitante desse mundo. É também por essa razão que o homem faz filosofia, faz religião, faz literatura, faz arte. Ora, o que está em causa é, em todos os casos, a sua relação com um

mesmo e único mundo. Um mundo que é um sistema coerente:

as partes que o compõem não estão isoladas umas das outras nem agrupadas em diversos sub mundos independentes – ele não é um

pluriverso mas um universo. Um mundo que é estruturado,

dotado de regularidades, invariâncias, similaridades, simetrias – ele não é um caos mas um cosmos (Pombo, 2006:25).

A hiperespecialização e a interdisciplinaridade não são, no entanto, tendências necessariamente antagónicas, podendo, efectivamente, ser complementares. Se por um lado, a hiperespecialização tende para uma dissecação da complexidade da realidade, a interdisciplinaridade permite a sintetização e a percepção globalizante dos fenómenos ou objectos. Poderemos comparar estas duas tendências à atitude analítica e à atitude sistémica dos saberes abordadas por Rosnay, no contexto educativo. Segundo o autor,

A atitude analítica conduz à redução dos saberes num determinado número de disciplinas disjuntas, isoladas umas das outras – é uma atitude de natureza enciclopédia –, ao passo que a atitude sistémica se encontra nas interacções entre os parâmetros, entre os fenómenos (2001-434).

Enquanto que a primeira se centra nos elementos, aprofundando o conhecimento acerca deles; a segunda centra-se na interacção entre esses elementos, relacionando-os e recombinando-os. De acordo com o autor, a complementaridade destas abordagens permite satisfazer os objectivos fundamentais da educação: “em vez de levar a cabo a acumulação permanente dos conhecimentos, a relação entre a analítica e a sistémica vai permitir religar os saberes dentro de um quadro de referências mais amplo” (2001:437). Ora, do

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mesmo modo, a hiperespecialização permite ao ser humano um estudo exaustivo e aprofundado de cada objecto e fenómeno em particular, o que lhe possibilitou, por exemplo, chegar à teoria atómica e à sua actual contestação. A interdisciplinaridade, por seu lado, permite religar esses conhecimentos, reforçando-os, como é o caso da Nutrigenómica, que alia os conhecimentos em Nutrição e em Genómica, contribuindo assim para o enriquecimento de ambas as áreas e, essencialmente, do estudo do ser humano.

Frequentemente, uma área de origem interdisciplinar acaba, pois, por resultar, a médio ou a longo prazo, numa disciplina, como são exemplos disso a Bioinformática, a Bioquímica, a Psicolinguística, etc. Essa área interdisciplinar, quase num ciclo vicioso, origina, por sua vez, estudos mais específicos, dando lugar a novas ciências, também elas, muitas das vezes, interdisciplinares: da Neurofilosofia advêm a Neuroestética e a Neuroética, por exemplo.

Consideramos, em suma, que, na fomentação do conhecimento e no incremento da papel activo da ciência na sociedade, a delimitação e o aprofundamento de um objecto e/ou fenómemo de estudo é compatível com a compreensão da complexidade do todo em que este se insere e que o caracteriza. Efectivamente, a área de especialidade sobre a qual nos centramos é uma área marcadamente interdisciplinar – as Ciências da Nutrição. Por motivos que se prendem, precisamente, com a vasta dimensão desta área, sentimos necessidade de circunscrever a nossa análise a uma subárea específica – denominada Alimentos Funcionais. Esta subárea, para além de constituir uma das parcelas em que o conhecimento nas Ciências da Nutrição se divide, resulta, igualmente, de um diálogo claro entre as Ciências da Nutrição, a Saúde e a Tecnologia Alimentar.

Para além disso, também no presente trabalho de investigação propomos a adopção, pela Terminologia, de um modelo proposto e em uso na Tradução, concretamente no que concerne o processo tradutivo.

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Por fim, uma breve consideração que remete para o próximo subcapítulo. O conhecimento, na actualidade, para além de se caracterizar por um patente diálogo entre áreas, e por uma especialização cada vez mais marcada dentro de cada uma, também se caracteriza pela sua crescente divulgação à sociedade. O reconhecimento do impacto social da ciência e da tecnologia – concretamente através da fomentação do desenvolvimento de uma cultura científica nos cidadãos – caracteriza, efectivamente, a sociedade em que vivemos: “citizens need to understand the major questions involving science in our contemporary world – because it is in the present that decisions are made, even though the action will necessarily take place in the future” (Caraça, 2004:22). Mas em que consiste, afinal, a divulgação da ciência?