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Capítulo 4: o Literateias

4.3 Os hiperlinks

4.3.5 Hiperlinks Diretos

Identificados pela cor verde, este tipo de hiperlink é o único no site que não passa pela tela intermediária, justamente por vincular textos diretamente. Construímos nesta versão demo, portanto, associações que não são feitas em teias, mas em duplas de texto, ora com um caminho único (texto A que leva ao texto B), ora com uma via de duas mãos (texto A que leva ao texto B e texto B que leva ao texto A, simultaneamente).

A função destes hiperlinks é mostrar ao leitor-navegador que alguns vocábulos ou sentenças presentes em um fragmento aleatório podem ter seu sentido ampliado quando relacionados a outro texto. Este tipo de leitura é muito comum na hipertextualidade cotidiana, usado de maneira abundante em veículos de comunicação e redes de informação – um exemplo são os hiperlinks contidos em léxicos incomuns que, quando o leitor passa o cursor em cima da palavra, surgem seus significados de acordo com o dicionário.

No Literateias, os hiperlinks diretos possuem basicamente duas motivações: a primeira, mais evidente e superficial, é a ocorrência homônima de um título no corpo

de um outro texto, como acontece nos momentos que o narrador traz a figura do patrão Vasques. Observe-se o fragmento “Estilhaço do Dia”:

Figura 26 – Texto “Estilhaço do Dia”

Fonte: http://literateias.com.br/livro-do-desassossego/texto.php?id=459

A Figura 26 mostra que o texto possui um hiperlink rosa, visto que está presente na teia temática do escritório, e outros quatro hiperlinks verdes, nas quatro ocorrências de “o patrão Vasques”, título de um dos fragmentos presentes na versão demo. O leitor-navegador que clicar em quaisquer hiperlinks verdes será direcionado para o texto homônimo, quando Soares apresenta mais detalhadamente o homem a quem é subordinado. Dessa maneira, o site oferece a chance de, sempre que o leitor encontrar a nomeação de Vasques em um texto, ampliar o conhecimento a respeito dessa personagem, lendo sequencialmente o fragmento em que o patrão é descrito com mais detalhes.

Outro fragmento para analisar a presença dos hiperlinks verdes é “Sintaxe”:

Figura 27 – Texto “Sintaxe”

Fonte: http://literateias.com.br/livro-do-desassossego/texto.php?id=236

A Figura 27 mostra que há dois hiperlinks laranjas, relativos à teia sintática das cores, além de dois hiperlinks verdes. O primeiro funciona de maneira muito similar àqueles de “Estilhaço da Dor”, com a diferença de que neste não há a homonímia

explícita, mas subentendida: ao clicar em “muitos poentes, em todas as suas cores”, o leitor-navegador é levado diretamente ao texto “As Cores do Poente”. O segundo hiperlink verde, no entanto, ocorre em uma relação interpretativa e subjetiva, pois não há relações de igualdade vocabular entre os dois fragmentos. Como mostra a Figura 27, este aparece na máxima: “Sem sintaxe não há emoção duradoura”. Se o usuário escolher seguir por esse caminho, será conduzido diretamente ao texto “Defesa da Literatura”, quando Soares parece destrinchar a sentença em uma reflexão maior, afirmando:

Mover-se é viver, dizer-se é sobreviver. Não há nada de real na vida que o não seja porque se descreveu bem. Os críticos da casa pequena soem apontar que tal poema, longamente ritmado, não quer, afinal, dizer senão que o dia está bom. Mas dizer que o dia está bom é difícil, e o dia bom, ele mesmo, passa. Temos pois que conservar o dia bom em uma memória florida e prolixa, e assim constelar de novas flores ou de novos astros os campos ou os céus da exterioridade vazia e passageira (PESSOA, 2006a, p. 59). Na comparação dos dois fragmentos, interpretamos que “Defesa da Literatura” pode ser lido como o desenvolvimento de um período presente em “Sintaxe”, e por isso, criamos um hiperlink que conduz o leitor de um texto a outro, ampliando o sentido da sentença lida.

O último tipo de hiperlink direto é o que possui a mesma via contrária, como já mostramos aqui nas citações do imperador Severo. Outro momento em que se percebe a construção exata do mesmo raciocínio com poucas palavras diferentes está nos fragmentos “Para quê viajar?” e “Viagens Imaginadas”, quando Soares cita Thomas Carlyle. A diferença é que o narrador dá os créditos ao autor em apenas um dos fragmentos. Observe, primeiramente, o fragmento de “Para quê viajar?” e, na sequência, sua associação com “Viagens Imaginadas”

"Qualquer estrada, esta mesma estrada de Entepfuhl, te levará até ao fim do mundo." Mas o fim do mundo, desde que o mundo se consumou dando-lhe a volta, é o mesmo Entepfuhl de onde se partiu. Na realidade, o fim do mundo, como o princípio, é o nosso conceito do mundo. É em nós que as paisagens têm paisagens. Por isso, se as imagino, as crio; se as crio, são; se são, vejo- as como às outras. Para quê viajar? Em Madrid, em Berlim, na Pérsia, na China, nos Pólos ambos, onde estaria eu senão em mim mesmo, e no tipo e género das minhas sensações? (PESSOA, 2006a, p. 409)

Que é viajar, e para que serve viajar? Qualquer poente é o poente; não é mister ir vê-lo a Constantinopla. A sensação de libertação, que nasce das viagens? Posso tê-la saindo de Lisboa até Benfica, e tê-la mais intensamente do que quem vá de Lisboa à China, porque se a libertação não está em mim, não está, para mim, em parte alguma. "Qualquer estrada", disse Carlyle, "até esta estrada de Entepfuhl, te leva até ao fim do mundo". Mas a estrada de Entepfuhl, se for seguida toda, e até ao fim, volta a Entepfuhl; de modo que o

Entepfuhl, onde já estávamos, é aquele mesmo fim do mundo que íamos a buscar. (PESSOA, 2006a, p. 156)

Não só a citação se repete, mas também a reflexão a respeito do que disse Carlyle, que ajuda na argumentação do narrador de que as melhores viagens são aquelas imaginadas, uma das teias semânticas presentes na versão demo. Além disso, nota-se no segundo fragmento a presença do hiperlink em “para que serve viajar?”, que se relaciona ao mesmo texto. Assim, como a citação de Severo, ambos os fragmentos ajudam a compor uma teia semântica, identificados por hiperlinks roxos, mas, como julgamos suas relações mais próximas, o usuário pode se deslocar entre esses dois textos diretamente, através dos hiperlinks verdes.