• Nenhum resultado encontrado

3 CAPÍTULO II: A ANÁLISE DO DISCURSO

3.1 A Análise do Discurso como método

3.1.1 História da Análise do Discurso

Dentro da conjuntura teórico-política do fim da década de 1960, nos anos que precederam 1968-70, dois estudiosos conhecidos pelo nome de Michel Pêcheux, filósofo influenciado pelos pensamentos de Michel Foucault, envolvido com questões relacionadas ao marxismo, psicanálise, epistemologia e ciências humanas, e J. Dubois, lingüista e universitário, preocupado com determinados aspectos e conotações pertencentes à linguagem, apesar de compartilharem a mesma idéia sobre a luta de classes, independente um do outro, elaboram o que vai se chamar Análise do Discurso.

Na década de 60, anos do Estruturalismo triunfante, a Lingüística, apesar de ser uma ciência sólida e bem fundada, enfrenta ainda alguns problemas sem solução, e é nesse contexto que a AD passa a ser instaurada.

Marxismo e lingüística presidem então o nascimento da AD em suas bases teóricas, propondo-a como novo modo de leitura. É nesse momento que Dubois a coloca no terreno dos grandes estudos dos textos políticos da época, sendo pensada a passagem do estudo das palavras (lexicografia) ao estudo do enunciado (análise do discurso), procurando, de certa forma, relacionar o lingüístico com o meio sociológico, histórico e psicológico.

Já Pêcheux a concebe como a ruptura epistemológica com a ideologia que domina as ciências humanas, relacionando a questão do discurso com as questões que relacionavam sujeito e ideologia. Tanto para Dubois como para Pêcheux, uma disciplina se achava instituída, uma disciplina dita transversal, que se recusava a aplicar os conceitos advindos puramente da lingüística, pois era na confluência de diversos campos do conhecimento que se romperiam as fronteiras e se constituiria um novo objeto, que era o discurso.

Mesmo que a Análise do Discurso não tenha sido reconhecida oficialmente na época, os trabalhos de pesquisa, os estudos concretos feitos naquele tempo passam a conferir-lhe determinada realidade, fazendo com que, em 1970-75, ela ocupasse lugar específico na França.

A AD passa então a propor aos lingüistas um modo de tratar a relação entre língua e história. Depois da metade da década de 70, a sua história se compõe da desconstrução- reconfiguração dos conceitos propostos na construção inicial.

Hoje a Análise do Discurso é uma disciplina que analisa conjuntos de textos com ancoragem em critérios mais sofisticados que os de outras abordagens, tendo em mente o relevo que ela dispensa às condições de produção. Foi a partir da descoberta das diversas maneiras de significar, que os estudiosos da linguagem passaram a conceber sua origem. Ela não trata da língua, nem da gramática, ainda que esses fatores lhe interessem. Ela trata agora é do discurso. Procura compreender a língua fazendo sentido, enquanto trabalho simbólico, e concebe a linguagem (o discurso) como mediação necessária entre o homem e a realidade natural e social. “A AD não trabalha com a língua enquanto um sistema abstrato, mas com a língua no mundo, com maneiras de significar” (ORLANDI, 1999, p. 16).

Segundo Pêcheux (1975), não há discurso sem sujeito, e não há sujeito sem ideologia, o indivíduo é interpelado em sujeito pela ideologia, e é assim que a história faz sentido. É através do discurso que se pode notar a relação entre língua e ideologia, observando como aquela produz sentidos para os sujeitos. A AD não atribui à linguagem um papel translúcido, transpassando o texto para encontrar um sentido em seu outro lado. Não faz uso da pergunta “o que ele quer dizer”, porém questiona o “como ele quer dizer”.

Alguns estudiosos defendem a AD como uma área interdisciplinar de outros campos do conhecimento. Já pensadores franceses a indicam como área autônoma do saber. Embora haja discordância nesse quesito, importante é que se nota uma consolidação cada vez maior da Análise do Discurso como disciplina de método próprio. Orlandi endossa essa posição, ao dizer que ela:

não estaciona na interpretação, trabalha seus limites, seus mecanismos, como parte dos processos de significação. Também não procura um

sentido verdadeiro através de uma “chave” de interpretação. Não há esta chave, há método, há construção de um dispositivo teórico. Não há uma verdade oculta atrás do texto. Há gestos de interpretação que o constituem e que o analista, com seu dispositivo, deve ser capaz de compreender (ORLANDI, 1999, p. 26).

Insertá-la na posição de teoria acarreta dizer que sua formação teórica pode sofrer questionamento de um objeto próprio, trazendo-lhe autonomia, sem se esquecer, todavia, de seu viés multidisciplinar. Na verdade, seu ponto central se traduz em abarcar uma soma de dizeres, sem que para isso ela se torne superficial, pois:

a própria existência de uma disciplina como a análise do discurso constitui um fenômeno que não é banal: pela primeira vez na história, a totalidade dos enunciados de uma sociedade, apreendida na multiplicidade de seus gêneros, é convocada a se tornar objeto de estudo (CHARAUDEAU; MAINGUENEAU, 2006, p. 46, grifo dos autores).

Neste estudo, privilegiaremos a Análise do Discurso como método, já que os conceitos teóricos que a constituem estão incluídos nas teorias que fundamentam esta pesquisa – Teoria do Jornalismo (ou da Notícia). A visão da Análise do Discurso como método também se alinha com a utilização da corrente inglesa (que veremos a seguir), concomitantemente à francesa.

Há pouco tempo, duas correntes têm ganho destaque na esfera que circunda a AD — Análise do Discurso francesa e Análise Crítica do Discurso —, alargando, ainda mais, o campo de estudo e demonstrando que “a análise do discurso se aplica a qualquer tipo de texto, que ela não é exclusivamente dos estudantes e pesquisadores em letras, que ela não é mera técnica de comentário de textos, mas que se enraíza em conhecimentos lingüísticos” (MAINGUENEAU, 2004, p. 9). Afinal, todas essas pesquisas, sejam elas focadas em textos literários ou midiáticos, visam a investigar o discurso, tendo a linguagem como subsídio indispensável para análise.

Visto que as duas correntes especificadas anteriormente não se chocam, mas, ao contrário, criam dialética nos pontos de encontro, a união das duas oferece vantagem para os que delas se apropriam, de forma que possibilite extensão de conhecimento, permutação de dados e variáveis e maior intensificação do saber.

Alguns autores brasileiros que podem ser citados como adeptos da Análise do Discurso de linha francesa, em razão de maior convergência dos estudos dessa área entre Brasil e França, são, por exemplo, Helena H. Nagamine Brandão (2004), Eni Orlandi (1999) e Milton José Pinto (2002). Já Jorge Pedro Sousa (1999 e 2004), estudioso português, aproxima-se mais da Análise Crítica do Discurso, por causa do maior contato com textos jornalísticos, e da inserção em sua pesquisa de elementos relacionados com as teorias do jornalismo (ver item 2.2). Com relação a esse último autor, observa-se, ainda, que ele utiliza estudo pormenorizado de elementos

quantitativos — gráficos, tabelas — que auxiliam na análise não só do discurso verbal, mas também no discurso não verbal, tendo como foco principal as fotografias.

É baseado nesse intrincado de saberes que nossa análise se constituirá, e que a AD servirá de sustentáculo para a comprovação desta hipótese, que consiste em dizer que a linguagem utilizada pelo jornal Agora São Paulo, além de ser popular, contém resquícios de determinadas estratégias sensacionalistas aplicadas não somente ao texto, mas também aos aspectos gráficos e imagéticos.