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BUSCANDO E CONSTRUINDO ARGUMENTOS PARA A FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA DO ESTUDO

1.1. Desenho Geométrico

1.1.4. História do Desenho Geométrico no Brasil

No Brasil, entre os séculos XVII e XVIII, o ensino era regido pelos jesuítas e possuía um caráter clássico-humanista, pois era calcado em uma filosofia humanista de educação. Nesse período, o conteúdo matemático ensinado era “estritamente prático, e ensinava quase exclusivamente a escrita dos números e as operações, mesmo assim, destinado apenas a uma pequena elite” (MORALES; AMBRÓSIO; MAGALHÃES; PEDRASSOLI, 2003, p. 19). Porém, a partir do século XVIII, com a:

(...) urgência de Portugal em proteger e defender suas terras de além-mar, que se deram as primeiras iniciativas de um ensino de ciências, especialmente de Matemática e Desenho, a fim de formar pessoal capacitado para trabalhos com fortificações militares. Tanto que, em 1699, foi criada a Aula de Fortificações no Rio de Janeiro, cujo objetivo era ensinar a desenhar e fortificar. (VALENTE apud MACHADO, 2012, p. 53).

No século XVIII, o ensino do Desenho Geométrico tornou-se obrigatório para os oficiais militares. Dessa maneira, a partir de 1738, esses cursos de formação das Academias Militares começaram a oferecer aulas de fortificações, que incluíam o estudo dos conteúdos do Desenho Geométrico. Assim, o ensino proposto por essas academias:

(...) pretendia formar engenheiros militares, cartógrafos e matemáticos, capazes de levar a cabo o levantamento de mapas com latitudes determinadas pelos novos métodos empregados na Inglaterra e na França, e habilitar engenheiros a construir fortificações para a defesa dos domínios ultramarinos (MACHADO, 2012, p. 53).

Em 1808, a corte portuguesa, juntamente com D. João VI, transferiu-se para o Brasil, ocasionando mudanças no sistema educacional da colônia. Com a transferência da família real, algumas iniciativas educacionais mais formalizadas começam a se destacar no cenário nacional (NASCIMENTO, 1999). Por exemplo, em 1811, foi criada a Academia

Real Militar que consolidou “o ensino sistemático das matemáticas, das ciências e da técnica do Brasil, no início do século XIX” (ZUIN, 2001, p. 64).

Nesse contexto, é nos “cursos técnico-militares que vai se constituir o rol de conteúdos da Matemática escolar secundária que estará presente nos liceus e preparatórios do século XIX” (VALENTE apud MACHADO, 20120, p. 55). Nesse período, com a chegada de D. João VI ao Brasil, a:

(...) necessidade de se estabelecerem as profissões técnicas e científicas faz com que sejam criados cursos de Desenho no país. Para começar a reverter este quadro, em 1816, a Missão Francesa composta por 18 integrantes chega ao Rio de Janeiro, a convite de D. João VI, para organizar e criar a Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios no Brasil. Em 1817, é criado o curso de Desenho em Vila Rica. No entanto, apenas após a abolição da escravatura, as artes e os trabalhos manuais começam a ser mais valorizados (ZUIN, 2001, p. 64).

Então, no início do século XIX, “a educação brasileira se espelha no ensino da França, adotando-se seus métodos e livros pedagógicos” (ZUIN, 2001, p. 64). No entanto, é importante ressaltar que o objetivo da Missão Francesa era a implantação de um modelo educacional no Brasil nos moldes da educação francesa, na qual o ensino do Desenho Geométrico possuía um aspecto artístico (MACHADO, 2012). No final do século XVIII, termina o ensino jesuíta, motivo pelos quais se busca uma adequação do ensino brasileiro às novas ideias educacionais circulantes na Europa.

A Revolução Francesa e a Revolução Industrial, que ocorreram na Europa em meados do século XVIII, provocaram mudanças tecnológicas que tiveram impacto no processo produtivo mundial em nível econômico e social. Esse cenário possibilitou que o ensino das ciências se tornasse primordial, no qual o Desenho Geométrico era considerado como um saber essencial, que possibilitava a modernização das máquinas industriais (MACHADO, 2012).

A partir do século XIX, a revolução industrial expandiu-se mundialmente. Nesse contexto, no Brasil, a urgência em formar mão de obra especializada possibilitou, em 1835, a criação das Escolas Normais, dos Liceus Provinciais e, também do Colégio Pedro II, em 1837. Assim, a criação dessas instituições permitiu que o ensino do Desenho Geométrico se expandisse, sendo desvinculado da:

(...) esfera privada dos ateliês e das Escolas Militares, e [se tornasse] parte da cultura escolar geral. Isso, por conta dos professores militares convocados para o ensino nos preparatórios, o que acabou difundindo a escolarização técnico-militar desenvolvida nas Academias para a esfera pública (MACHADO, 2012, p.60).

No final do século XIX, Rui Barbosa, preocupa-se com a educação brasileira, avaliando que países como a Alemanha, a Áustria, os Estados Unidos, a França e a Inglaterra estavam em um nível de desenvolvimento econômico e educacional muito superior ao do Brasil. Para Rui Barbosa, o ensino do Desenho Geométrico era importantíssimo para auxiliar o desenvolvimento do país e, determinou, dessa maneira, que o Desenho Geométrico fosse considerado “como um saber escolar necessário para o desenvolvimento industrial” (MACHADO, 2012, p. 63) do Brasil.

Posteriormente, na década de 50, o Desenho Geométrico estava:

(...) plenamente instituído enquanto disciplina escolar no currículo brasileiro. Pode-se inferir, inclusive, que as décadas de 1930 a 1950 constituíram os anos de ouro dessa disciplina em nosso país, dada sua visibilidade em meio aos documentos educacionais oficiais. (MACHADO, 2012, p. 68).

Nesse contexto, é importante ressaltar que entre as décadas de 30 e 70, o ensino do Desenho Geométrico era considerado como um componente curricular escolar básico, permanecendo oficialmente nas matrizes curriculares.

Porém em 1961, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB 4.024/61 determina novos rumos para o ensino do Desenho Geométrico, tornando-o uma disciplina curricular optativa. Esse fato ampliou o desprestígio dessa disciplina nos meios acadêmicos, pois, nessa época, os documentos oficiais elaborados pela academia desvalorizaram o Desenho Geométrico, tornando-o uma disciplina curricular complementar, que compunha a parte diversificada do currículo escolar. É importante ressaltar que após a determinação de que o Desenho Geométrico não fosse considerado como uma disciplina curricular obrigatória, o seu ensino foi excluído da grande maioria das escolas brasileiras enquanto que o seu conteúdo foi retirado da programação dos principais vestibulares do Brasil (ZUIN, 2001).

Continuando essa discussão, entre o final da década de 50 e início da década de 60, inicia-se um movimento, denominado Movimento da Matemática Moderna (MMM), visando a uma renovação do ensino da Matemática (WIELEWSKI, 2008). Esse movimento visava aproximar os conteúdos matemáticos trabalhados na escola básica com a Matemática produzida pelos pesquisadores dessa área do conhecimento. Em outras palavras, esse movimento buscava preparar os estudantes dessa disciplina para trabalhar com a tecnologia emergente da época.

De acordo com essa perspectiva, foram incluídos no currículo estudado na disciplina de Matemática, os conteúdos referentes à teoria de conjuntos, à topologia e às

estruturas algébricas. Assim, esse movimento facilitou a redução e, em alguns casos, excluiu o ensino da Geometria Euclidiana em alguns países do mundo, inserindo o Brasil (ZUIN, 2002). Desse modo, a ausência da geometria no currículo matemático também foi repercutida no ensino do Desenho Geométrico, pois essa disciplina estuda a geometria e as suas aplicações de uma maneira gráfica (COSTA, 1981 apud ZUIN, 2002).

Em 1971, foi promulgada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei 5692, que excluiu definitivamente o Desenho como disciplina obrigatória da grade curricular escolar, instituindo a obrigatoriedade do ensino de Educação Artística (ZUIN, 2001). De acordo com o estabelecido nessa lei, o papel do Desenho Geométrico no currículo matemático não ficou bem definido, pois era considerado como uma disciplina autônoma e, também, como parte integrante dos conteúdos de Educação Artística (ZUIN, 2001). Por exemplo, o parecer 853/71 do Conselho Federal de Educação (CFE) relata que quando o ensino do Desenho Geométrico é centrado na Geometria, a sua aprendizagem se desloca com mais propriedade para o campo das Ciências, na qual o conhecimento matemático está inserido. No entanto, é de suma importância enfatizar que, nesse período, os pareceres expostos pelo CFE não foram claros quanto ao papel do Desenho Geométrico na Educação Artística ou mesmo na Matemática (ZUIN, 2001), pois os pareceres e resoluções do CFE se mostraram contraditórios e indefinidos.

Na década de 90, em 1996, foi promulgada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394 (BRASIL, 1996) na qual o Desenho Geométrico não é considerado como disciplina obrigatória e nem optativa para o Ensino Fundamental e Médio. Os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCNs para o ensino das Artes do 6° ao 9° anos (BRASIL, 1998) não referenciam a disciplina de Desenho Geométrico. Porém, os PCNs de Matemática (BRASIL, 1998), para esses mesmo anos, possuem alguns indicativos de que o ensino do Desenho Geométrico pode contribuir para auxiliar na conceituação de conteúdos matemáticos. É importante destacar que a tímida inserção do Desenho Geométrico nos PCNs de Matemática não implica a concretização de seu ensino nas salas de aula.

Atualmente, no Brasil, o Desenho Geométrico é considerado como uma disciplina independente, sendo que poucas escolas ainda mantêm essa disciplina em sua matriz curricular nos dois últimos anos do Ensino Fundamental (ZUIN, 2001). Nessa perspectiva, existem escolas que:

(...) mantêm a disciplina Desenho Geométrico; escolas que tratam das construções geométricas dentro da disciplina [de] Artes; escolas que não possuem a disciplina Desenho Geométrico em suas grades curriculares e não abordam as construções geométricas em nenhum momento, nem mesmo dentro do conteúdo de Geometria, desenvolvido em Matemática; e, uma outra classe de escolas que trazem a disciplina em questão em sua grade curricular, mas o conteúdo não é cumprido, sendo estas aulas preenchidas com o conteúdo de Matemática, sem nem sequer se mencionarem as construções geométricas (ZUIN, 2001, p. 99).

Esse breve histórico indica que existe a necessidade de que o ensino das construções geométricas por meio da disciplina de Desenho Geométrico continue sendo um conhecimento acessível a todos os alunos. Nesse sentido, é de suma importância que a academia exerça o seu papel de propulsora de retorno desse saber (STENHOUSE, 1991) ao currículo escolar.