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1 POSICIONAMENTO METODOLÓGICO: METODOLOGIA

5.2 Histórico da forma de votação no CARF

A necessidade de julgar com imparcialidade a irresignação do contribuinte contra uma exação tributária remonta à década de 1920, quando então foram instaurados os primeiros conselhos administrativos de litígios fiscais no Brasil.

Isso se deu através do Decreto nº 16.580/24, que eu seu artigo 16 determinava o seguinte:

CAPITULO IV

Dos Conselhos de Contribuintes

Art. 16. Em cada [estado] e no Districto Federal haverá um Conselho de Contribuintes, nomeado pelo Ministro da Fazenda. §1º. Os membros do Conselho serão escolhidos entre contribuintes do commercio, industria, profissões liberaes e funccionarios publicos, todos de reconhecida idoneidade.

§2º. Os conselhos serão constituidos por cinco membros e funccionarão nas sédes das Delegacias e na Delegacia Geral, no periodo de 15 de junho a 15 de agosto de cada anno. O 2º Delegado póde prorrogar este prazo por mais 15 dias e o ministro da Fazenda por maior tempo, mediante representação do mesmo Delegado.123

Conforme é possível notar do texto normativo então vigente, o Conselho de Contribuintes seria instaurado em cada estado e no DF, cuja composição era de 5 membros, na qual a escolha recairia entre contribuintes e funcionários públicos, todos com reconhecida idoneidade.

É interessante ressaltar que já naquela época o conselho era formado por um número ímpar de julgadores, o que, ao menos em tese, desconsiderada a possibilidade de ausência de um deles, impediria a ocorrência de um empate.

123

BRASIL. Decreto nº 16.580, de 04 de setembro de 1924. Approva o regulamento para o serviço de arrecadação do imposto sobre a renda.. . Rio de Janeiro, RJ: Diário Oficial da União, 06 set. 1924. Seção 1, p. 10559. Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1920-1929/decreto- 16580-4-setembro-1924-512543-publicacaooriginal-1-pe.html>. Acesso em: 15 jun. 2018.

A referida estrutura foi reformada pelo Decreto 24.036/34, que assim dispôs:

CAPÍTULO XV DOS RECURSOS

Secção 1ª - Das instâncias

Art. 150. São resolvidas em duas instâncias, uma singular e outra coletiva, as questões entre a Fazenda e os contribuintes, originadas de interpretação de lei, de cobrança de impostos, taxas e emolumentos, de infração ou de dívida fiscal.

Art. 151. Nas instâncias singulares, decidem: - os delegados fiscais, inspetores de alfândegas, diretores de recebedorias, diretor e chefes de secção do imposto de renda; e nas coletivas: os conselhos de contribuintes e o Conselho Superior de Tarifa. Umas e outras teem jurisdição e competência delimitadas no presente decreto.

[...]

Art. 172. Cada Conselho será composta de seis membros, de livre escolha e nomeação do Govêrno da República, sendo três estranhos ao quadro do funcionalismo de Fazenda, como representantes dos contribuintes; e três escolhidos dentre o mesmo funcionalismo, aproveitadas as especializações e competência.

Art. 173. Da mesma forma serão nomeadas dois suplentes, para cada Conselho, de modo a suprir as faltas ou impedimentos ocasionais.

Art. 174. O presidente de cada Conselho será o escolhido, anualmente, pelos seus pares; elegendo-se, pela mesma forma o substituto eventual do presidente.

Art. 175. As decisões são tomadas por maioria de votos presentes, tendo o presidente, também, o de qualidade, quando houver empate na votação.124

Salta aos olhos algumas alterações significativas. O número de julgadores passou de cinco para seis, sendo possível, portanto, um empate (art. 172), cuja composição seria paritária entre três membros fazendários e três “estranhos ao quadro do funcionalismo”.

Todavia, pelo teor daquela norma, o presidente do Conselho seria escolhido pelos seus pares, sem qualquer obrigatoriedade que ele fosse necessariamente oriundo dos quadros da Fazenda Pública (art. 174), sendo que a este presidente seria dado o voto de qualidade em caso de empate.

124

BRASIL. Decreto nº 24.036, de 26 de março de 1934. Reorganiza os serviços da administração geral da Fazenda Nacional e dá outras providências. . Rio de Janeiro, RJ: Diário Oficial da União, 28 mar. 1934. Seção 1, p. 5920. Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1930- 1939/decreto-24036-26-marco-1934-502364-publicacaooriginal-1-pe.html>. Acesso em: 15 jun. 2018.

É digno de nota o fato de que a referida norma, que visivelmente busca um equilíbrio de forças entre contribuintes e o estado, foi promulgada em 1934, ou seja, após o conflito civil de 1932, período no qual o Brasil não vivia uma democracia plena.

Desde então ocorreram duas outras alterações normativas na estrutura administrativa de julgamento fiscal, uma em 1964, através do Decreto nº 54.767, e outra em 1972, pelo Decreto 70.235. Em ambas as alterações as linhas gerais de 1934 foram mantidas, aumentando-se apenas o número de membros. Novamente, deve-se ressaltar que os textos originais dessas normas previam o equilíbrio entre contribuintes e o estado, em que pese também serem editadas sob a égide de regimes não democráticos.

O Decreto nº 70.235/1972 ainda está em vigor, todavia, foi alterado pela MP 449/2008, convertida na lei nº 11.941/2009.

Art. 25 [...]

§ 9o Os cargos de Presidente das Turmas da Câmara

Superior de Recursos Fiscais, das câmaras, das suas turmas e das turmas especiais serão ocupados por conselheiros representantes da Fazenda Nacional, que, em caso de empate, terão o voto de qualidade, e os cargos de Vice-

Presidente, por representantes dos contribuintes.125 (sem destaque no original)

O texto em vigor a partir de 2009 deixa claro duas determinações bastante cogentes: a) o presidente sempre será escolhido entre os membros da Fazenda Nacional e o vice sempre entre os contribuintes; b) somente o presidente, portanto, um membro da Fazenda Nacional, terá poder de voto de desempate.

Dentro da ótica da teoria dos jogos, tomando-se como parâmetro a análise do âmbito ôntico-prático deste caso, verifica-se que as regras que definem o funcionamento do CARF, sua composição e poder de voto são regras ônticas organizacionais. A regra que altera o poder de voto é uma regra ôntica potestativa.

A referida regra, criada após a Constituição Democrática e Cidadã de 1988, traz inequívoco desequilíbrio de forças dentro do julgamento administrativo,

125

BRASIL. Decreto nº 70.235, de 06 de março de 1972. Dispõe sobre o processo administrativo fiscal, e dá outras providências. . Brasília, DF: Diário Oficial da União, 07 mar. 1972. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/CCIVil_03/decreto/D70235cons.htm>. Acesso em: 15 jun. 2018.

posto que concede ao membro da Fazenda poder nunca antes exercido. Essa alteração será analisada sob o ponto de vista legal e constitucional nos próximos tópicos.