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1 POSICIONAMENTO METODOLÓGICO: METODOLOGIA

2.3 Sobreprincípio da segurança jurídica

Um sobreprincípio, na nossa concepção, é um princípio cuja realização se dá concomitante com a existência e sobreposição de outros do ordenamento jurídico, tais como a confiança-legítima, legalidade, a isonomia, a irretroatividade, a boa-fé, a certeza do direito, a calculabilidade, a previsibilidade, a estabilidade jurídica dentre outros.

Os ensinamentos de Paulo de Barros Carvalho corroboram essa linha:

Há “princípios” e “sobreprincípios”, isto é, normas jurídicas que portam valores importantes e outras que aparecem pela conjunção das primeiras. Vejamos logo um exemplo: a segurança jurídica não consta de regra explícita de qualquer ordenamento. Realiza-se, no entanto, pela atuação de outros “princípios”, tais como o da legalidade, o da irretroatividade, o da igualdade, o da universalidade

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SANTI. Eurico Marcos Diniz de; COELHO, Isais. Contribuinte não pode ser visto como potencial criminoso. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2013-abr-25/contribuinte-brasileiro-não-visto- potencial- criminoso. Acesso em: 01/11/2018

de jurisdição etc. Na sua implicitude, é um autêntico “sobreprincípio”, produto da presença simultânea dos cânones que o realizam. 36

Compreendida essa múltipla formação do sobreprincípio, devemos considerar que a aplicação da segurança jurídica requer que o operador do direito se confronte com situações nas quais se discute, primordialmente, o próprio tempo e a possibilidade ou não de mudanças em uma dada relação.

E sobre isso, José Afonso da Silva afirma com propriedade que “A temática lega-se à sucessão de leis no tempo e à necessidade de assegurar o valor da segurança jurídica, especialmente no que tange à estabilidade dos direitos subjetivos”. 37 No mesmo sentido temos o Ministro Gilmar Mendes:

É possível que a aplicação da lei no tempo continue a ser um dos temas mais controvertidos do Direito hodierno. Não raro, a aplicação das novas leis às relações já estabelecidas suscita infindáveis polêmicas. De um lado, a ideia central de segurança jurídica, uma das expressões máximas do Estado de Direito; de outro, a possibilidade e a necessidade de mudança. Constitui grande desafio tentar conciliar essas duas pretensões, em aparente antagonismo. 38

Assim, considerando o complexo Sistema Constitucional Brasileiro, verificamos que, toda Constituição é composta de princípios e que, em uma análise sistêmica, nem todos os princípios possuem o mesmo valor ou importância e é exatamente nesse momento que se apresenta a Segurança Jurídica como Sobreprincípio do direito.

Portanto, diante do pensamento desses doutrinadores, pode-se concluir para analisar a expressão Segurança Jurídica, que é indispensável considerar quais os efeitos temporais da aplicação do direito em determinadas situações, seja oriunda de uma nova lei, seja de uma decisão administrativa ou judicial ou até mesmo atos

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CARVALHO, Paulo de Barros, Sobre os princípios constitucionais tributários. Revista de Direito Tributário, v. , n. 55, jan-mar 1991. Pág.: 150.

37

SILVA, José Afonso da, Curso de Direito Constitucional Positivo. 32ª edição. Ed Malheiros. São Paulo 2009. Pág.: 433.

38

MENDES, Gilmar Ferreira, COELHO. Inocêncio Mártires e GONET BRANCO. Curso de Direito Constitucional. 2ª edição, Editora Saraiva. São Paulo. 2008. Pág.:. 398.

da administração pública. Portanto, um princípio adstrito às funções típicas dos três poderes. Paulo de Barros Carvalho esclarece que:

É bem verdade que a concretização efetiva do princípio da segurança jurídica não depende apenas de estatuições genéricas como as mencionadas. Mister se faz que a dinâmica de positivação do sistema tomado por modelo venha a confirmá-lo, repetindo-se interativamente no intervalo histórico escolhido por referência. Diga- se o mesmo da justiça. 39

Quando se analisa a questão da aplicação da segurança jurídica em casos concretos, o que se pretende fazer mais adiante, a primeira questão que se põe em discussão é a efetividade dos princípios atrelados a esse sobreprincípio.

Paulo de Barros Carvalho já pontuou o seguinte entendimento:

Quando o comando emergente de um princípio é transgredido, nem por isso estaremos autorizados a declarar que a diretriz não tem eficácia. Se, quantas vezes atacado, tantas vezes reafirmado na sua força axiológica, confortavelmente poderemos afirmá-lo como vetor relevantíssimo do sistema. 40

Isso se dá porque os princípios são normas dotadas de intensa carga axiológica, de tal forma que “que expressam uma preferibilidade por certos conteúdos de abstratamente integrados num sentido consistente”41. Assim, a análise da efetividade desses valores normativos depende não da ausência de violação, mas do funcionamento de mecanismos previstos para repelirem a violação.

Isso posto, tem-se que qualquer análise que se pretenda fazer da efetividade de um princípio tem que levar em consideração o funcionamento (ou

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CARVALHO, Paulo de Barros, Sobre os princípios constitucionais tributários. Revista de Direito Tributário, v. , n. 55, jan-mar 1991. Pág.:. 150.

40

CARVALHO, Paulo de Barros. Princípios e Sobreprincípios na Interpretação do Direito. In: LUCCA, Newton De; MEYER-PFLUG, Samantha Ribeiro; BAETA NEVES, Mariana Barboza Baeta (Org.). Direito Constitucional Contemporâneo. Homenagem ao Professor Michel Temer. 1ª edição, São Paulo-SP. Quartier Latin, 2012. Pág.: 288.

41

CARVALHO, Paulo de Barros. Direito Tributário, linguagem e método. 3ª edição São Paulo-SP: Noeses, 2009. Pág: 252.

não) dos mecanismos previstos no ordenamento jurídico para repelir eventual violação.

Deve-se, destarte, considerar a Segurança Jurídica sempre amparada por outros princípios, pois sua aplicação implica necessariamente na existência de outros requisitos, por exemplo: (i) exige do enunciado normativo a especificação do fato e da conduta regrada, bem como, de outro; (ii) requer previsibilidade do conteúdo da coatividade normativa.

Para tanto, deve-se considerar a lição de Heleno Taveira Torres:

O princípio do Estado Democrático de Direito não pode ser aplicado e efetivado sem uma apurada compreensão dos efeitos jurídicos da soberania, tanto em relação ao poder constituinte quanto em face da Constituição que institui o Estado de Direito, e não o contrário, como muitos apregoam, como se fosse o Estado a origem ou a razão da existência da constituição e da soberania. Está posto o novo modelo de Estado Democrático de Direito, cuja hermenêutica há de levar em conta todos os valores que o conformam, sob a garantia da segurança jurídica material. Por tudo isso, a segurança jurídica integra-se à Constituição como forma de garantir a certeza e a estabilidade interna do sistema.42

Assim, importa considerar que o Estado não é fonte desses princípios, mas seu garantidor, devendo zelar pelo funcionamento dos mecanismos previstos no ordenamento para sua proteção, aqui especialmente a segurança jurídica.

Pelo que foi exposto, conclui-se que a segurança jurídica como sobreprincípio é vetor de interpretação que deve orientar toda a análise jurídica que se pretende fazer neste trabalho, especialmente com enfoque na segurança jurídica tributária e na sua aplicação em casos concretos pelos tribunais brasileiros, pela administração pública e pelo poder legislativo. Sem, contudo, olvidar outros princípios existentes.