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Capítulo 3 – O Transporte Hidroviário Interior na Região Amazônica

3.4. O Transporte de Passageiros

3.4.1. Histórico

Conforme citado no capítulo anterior, a base de todo o deslocamento de cargas e pessoas na Região Amazônica é o transporte hidroviário, servindo como meio de integração de grande parte da população. Seu papel social significativo, uma vez que inúmeras localidades não possuem outro modo de locomoção. A seguir é apresentado um pequeno histórico de sua evolução:

Em 1852 foi criada pelo empreendedor Irineu Evangelista de Sousa, o Barão de Mauá, a Companhia de Comércio e Navegação do Amazonas, que iniciou o transporte hidroviário de passageiros na Região Amazônica, sendo este subsidiado a cada viagem realizada entre as pequenas localidades da região (Ministério dos Transportes, 2007; Bittencourt, 1949 apud Fadda, 1987). O valor do subsídio era suficiente para manter um serviço regular mesmo numa região carente, sem poder aquisitivo, com enormes dificuldades e grandes distâncias a serem navegadas.

A navegação comercial na Região Amazônica teve início em 1853 com a introdução de embarcações a vapor e linhas regulares até o Peru. O tempo de viagem foi reduzido significativamente: uma viagem entre Belém e Manaus que durava de três a cinco meses, passou a ser realizada em 10 dias (Fadda, 1987).

A partir de 1866, através da Lei nº 3.749, o tráfego nos rios Amazonas, Negro, Madeira, Tapajós, Tocantins e baixo São Francisco foi aberto aos navios estrangeiros, dando início ao período de prosperidade e oportunidades na Região Amazônica (entre 1872 e 1911), em virtude da demanda mundial pela borracha.

Ao final do século, o Barão de Mauá transferiu o controle de sua concessão aos ingleses, transformando assim a Companhia de Comércio e Navegação do Amazonas

em Amazon Steam Navegation Company Ltda, cujos serviços permitiram a migração

dos nordestinos, que se espalharam pelos seringais da região. Por volta de 1900 a empresa foi considerada a maior empresa de navegação hidroviária do mundo, tanto em número de embarcações quanto em extensão de linhas. As viagens eram fixadas de acordo com os interesses dos armadores, ou seja, eram condicionadas à existência de quantidade de carga suficiente para tornar a viagem rentável (Bastos, 1990 apud

Costa, 2004; Fadda, 1987).

lugar à retração econômica na região, em função, principalmente, deste mesmo produto ser produzido na Ásia a um custo significativamente menor (Figueiredo, 1982

apud Fadda, 1987).

A retração econômica afetou também a empresa Amazon Steam, que embora tivesse

seus serviços subsidiados, deixou de renovar sua frota de embarcações. A não renovação da frota aliada às irregularidades nas contas da empresa, fizeram com que o Governo Federal a encampasse15 juntamente com a Companhia Port of Pará, prestadora de serviços portuários, criando em 27/04/1940, através do Decreto-Lei nº 2.154, uma autarquia federal vinculada ao Ministério da Viação e Obras Públicas: a Serviços de Navegação da Amazônia e Administração do Porto do Pará – SNAPP, que começou a suspender, gradativamente, suas viagens. Com o fim do subsídio, a SNAPP deixou de receber os recursos necessários para investir em novas embarcações, passando a operar somente com a frota existente, que era considerada obsoleta (CDP, 2007; Silva, 1944 apud Fadda, 1987).

Criado em 1953, o Plano de Valorização da Amazônia permitiu às empresas a renovação da frota de embarcações de passageiros. Todavia, esta renovação agravou o déficit financeiro da SNAPP, que apesar de ainda operar com a frota herdada da companhia inglesa, cuja idade média era elevada e estavam em condições precárias,

procurava manter a mesma freqüência e programação de viagens da Amazon River. A

nova frota era chamada de “frota branca”16.

Em 1967, através do Decreto-Lei nº 155, de 10/02/1967, a SNAPP foi extinta. Em seu lugar foram constituídas duas estatais: a Empresa de Navegação da Amazônia S.A. - ENASA e Companhia Docas do Pará - CDP, com objetivos de explorar o transporte aquaviário na Bacia da Amazônia e administrar os portos organizados e terminais do estado do Pará, respectivamente.

Com a reforma administrativa realizada pelo governo federal na década de 60, foi iniciada uma nova fase no transporte hidroviário de passageiros na Região Amazônica, que dentre as ações implementadas, alterou a denominação do Ministério da Viação e Obras Públicas para Ministério dos Transportes, através do Decreto-Lei nº

15

Tomar (o governo) posse de (uma empresa), após acordo em que se ajusta a indenização que deverá ser paga (FERNANDES et al, 1993).

16

Barcos importados na primeira metade da década de 1950 e incorporados à frota com base no programa de renovação parcial dos meios flutuantes, no âmbito do Plano de Valorização Econômica da Amazônia, de 1953 (FUNDAÇÃO COPPETEC, 2003).

200, de 25/02/1967. Este passou a ter como áreas de competência os transportes ferroviário, rodoviário, aquaviário, marinha mercante, portos e vias navegáveis e a participação na coordenação dos transportes aeroviários.

A Superintendência Nacional de Marinha Mercante – SUNAMAM foi criada 1969, através do Decreto Nº 64.125, de 19/02/1969. Seu objetivo era controlar a navegação interior.

As ações que foram tomadas em relação ao transporte hidroviário na Região Amazônica não beneficiaram o transporte de passageiros. A ENASA durante o período de 1967 a 1980 cancelou as linhas consideradas deficitárias com o objetivo de recuperar as finanças da empresa, e retirou diversas embarcações consideradas obsoletas e antieconômicas de sua frota, que em 1970 era composta de 22 embarcações: metade com mais de 64 anos e as mais novas, com aproximadamente 15 anos, faziam parte da chamada “frota branca”.

Em razão da redução da prestação do serviço por parte da empresa estatal, que resultou no isolamento de diversas localidades situadas às margens do rio Amazonas e de seus afluentes, houve um incremento na participação de pequenos operadores privados no transporte de passageiros e carga. Visando atender a demanda, os operadores começaram a utilizar embarcações regionais de madeira, que ligavam pequenas localidades atendidas ou não pelos serviços regulares, cobravam preços exorbitantes e não ofereciam segurança, sendo freqüentes e conhecidos os acidentes envolvendo estas embarcações.

Com o objetivo atender de forma adequada as localidades situadas às margens dos afluentes e subafluentes dos rios Amazonas e Solimões, bem como prover a região de uma infra-estrutura de transporte hidroviário de passageiros e carga, foi criada pelo governo do estado do Amazonas através da Lei Estadual Nº 1.362, de 27/12/1979, a Companhia de Navegação Interior do Amazonas – CONAVI.

O Instituto de Pesquisas Tecnológicas de São Paulo – IPT-SP desenvolveu, por solicitação do governo do estado do Amazonas, o projeto de concepção de embarcação-tipo para a CONAVI, através da qual o transporte de passageiros e carga ficaria mais barato, seguro e confortável. Seriam construídas 40 embarcações de pequeno calado, visando atender as linhas dos afluentes do rio Amazonas que haviam sido canceladas, em virtude de serem, na época, consideradas deficitárias.

Todavia, foram construídas apenas dezessete embarcações. Estas não chegaram a entrar em operação nas linhas para as quais foram desenvolvidas, uma vez que foram alocadas em linhas da calha principal, onde não havia restrições de calado. Por serem mais lentas do que as embarcações regionais de madeira e consideradas economicamente inviáveis para o transporte de passageiros nessas linhas, as novas embarcações foram subutilizadas, sendo aproveitadas como empurradores no transporte de carga. As Figuras 10 e 11 mostram embarcações típicas da Região Amazônica.

Figura 10: Embarcação Típica da Região Amazônica.

Fonte: ANTAQ

Figura 11: Embarcação Típica da Região Amazônica.

Fonte: ANTAQ

A desativação de embarcações consideradas inadequadas reduziu a oferta de transporte, prejudicando o atendimento às localidades ribeirinhas. Todavia, a falta de regularidade e pontualidade em determinadas linhas, em alguns casos, é

conseqüência da sazonalidade da demanda, tanto de passageiros quanto de carga, que provoca a escassez da oferta de serviços nessas linhas, isolando dos pólos de atração econômicos as localidades até então atendidas.

Em 1986, através da Portaria Nº 343, o Ministério dos Transportes estabeleceu as condições básicas, gerais e financeiras para implantação do Programa Hidroviário Interior de Passageiros, com o objetivo de desenvolver o transporte fluvial de passageiros de baixa renda, incluindo um sistema de financiamento de embarcações e medidas direcionadas a organização do transporte, no que se referia a freqüência e regularidade (Fadda, 1987).

Porém o programa resultou apenas na construção de duas embarcações regionais mistas, não permitindo a renovação da frota, e conseqüentemente a substituição das embarcações de madeira por embarcações de aço. O financiamento dessas não era acessível, na maioria dos casos, aos armadores regionais, que geralmente não atendiam às exigências para concessão dos empréstimos: capital social mínimo, balanços auditados e garantias contratuais (Fundação COPPETEC, 2003a).

Através das Resoluções Nº 9.311 e Nº 9.312, de 22/10/1986, a SUNAMAM estabeleceu linhas regulares de navegação e normas para exploração de linhas de navegação para o transporte hidroviário interior de passageiros, respectivamente. O setor foi reordenado quando da implementação da última resolução, sendo então estabelecidas linhas com tabela de tarifas e horários de saída (Fundação COPPETEC, 2003a).

Em 1991, o Ministério da Infra-Estrutura, por intermédio da Portaria Nº 228, de 17/10/1991, facultou às empresas brasileiras autorizadas a operarem quaisquer serviços de transporte hidroviário interior em quaisquer bacias, enseadas ou angras, linhas, rotas ou travessias, permitindo aos armadores autorizados à operação nos tráfegos e mercados que desejassem, incluindo o transporte de passageiros.

Embora o Governo tenha estabelecido e implementado ações visando à organização do transporte hidroviário de passageiros na Região Amazônica e, conseqüentemente, a garantia de níveis mínimos de serviço e segurança para população, bem como um sistema de financiamento adequado, estas não foram completamente eficazes.

passageiros na Região Amazônica foi realizado em embarcações do governo ou por este subsidiadas em quase toda a sua totalidade. Fadda (1987) complementa afirmando que de acordo com as características do transporte hidroviário da Região Amazônica, o comércio e a condução de pequenas mercadorias têm merecido maior atenção por parte dos armadores do que o transporte de passageiros, que é visto como “carga complementar” e fonte de melhoria de receita. Esta situação não foi alterada, mesmo tendo se passado cerca de 30 anos desde sua identificação.

A Agência de Desenvolvimento da Amazônia (2006b) afirma que embora se observem algumas melhorias recentes, em algumas linhas, o sistema de transporte de passageiros é carente de condições mínimas de eficiência, conforto, regularidade e segurança. A Agência ressalta ainda diversos fatores que penalizam o transporte hidroviário de passageiros na Região Amazônica:

Inexistência de infra-estrutura de terminais.

Nível de estrutura organizacional dos armadores, praticamente, inexistente.

A frota de embarcações pertence a projetos navais obsoletos, em sua maioria.

A baixa velocidade praticada torna as viagens mais longas e, consequentemente,

gera a necessidade de se habitar na embarcação por um longo período de tempo, o que onera os custos, causa desconforto e desestimula a viagem por pessoas que querem conhecer a região.

A falta de higiene das embarcações.

O barulho excessivo do motor nas embarcações.

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