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HISTORICIZANDO A ATUAÇÃO DO ESTADO NA TRAJETÓRIA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL

3 ESTADO, ASSISTÊNCIA SOCIAL E INFORMALIDADE: VERDADES, EQUÍVOCOS E CONTRADIÇÕES

3.1 HISTORICIZANDO A ATUAÇÃO DO ESTADO NA TRAJETÓRIA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL

A assistência social emerge em um contexto de práticas voltadas à solidariedade e benemerência aos pobres, em decorrência da impregnação dos princípios judaico-cristãos que por tanto tempo influenciaram, e ainda embasam os costumes e ações dos indivíduos (SPOSATI et al, 1985). Isto porque, ao longo da história, grupos filantrópicos e religiosos desenvolveram práticas de ajuda e apoio aos necessitados. Esse ideário de ajuda, parte da compreensão de que na humanidade sempre existirão os mais frágeis, pobres e carentes que não

conseguem reverter sua condição de vida precarizada e que, portanto, sempre dependem da “solidariedade” de outros. Desta forma, o termo “ajuda” incorpora-se à expressão de benesse e caridade ao próximo.

O Estado, historicamente, se apropria não só da prática assistencial como expressão de benemerência, como também catalisa e direciona os esforços de solidariedade social da sociedade civil (SPOSATI et al, 1985). Nesse sentido, as políticas sociais, dentre elas, a assistência social, será um mecanismo utilizado pelo Estado na tentativa de conter o agravamento da pobreza, ressaltando que os organismos da sociedade civil, e em especial, aqueles ligados à igreja, serão acionados pelo Estado a fim de realizar essa missão.

No contexto mundial, a adoção sistemática, por parte do Estado, de ações de cunho social vão se dar quando o capitalismo adentra a sua fase monopolista, pois frente às novas necessidades do capital faz-se necessário a intervenção do Estado para assegurar a acumulação nessa nova fase.

Sobre isto, à luz do pensamento de Netto (2001b, p.19):

[...] o capitalismo monopolista recoloca em patamar mais alto, o sistema totalizante de contradições que confere à ordem burguesa os seus traços basilares de exploração, alienação e transitoriedade histórica [...].

Nesse sentido, o referido autor considera a solução monopolista (a maximação dos lucros pelo controle dos mercados) como uma problemática, pelos próprios mecanismos que a deflagram, à medida que o seu desenvolvimento torna- se vítima dos constrangimentos causados pela acumulação e valorização do capital. Para tanto, a fim de efetivar-se com êxito é necessário recorrer à intervenção extraeconômica, e neste caso, acionou-se à intervenção do Estado.

Para Netto (2001b), a intervenção do Estado no processo econômico capitalista não é algo novo, pois essa começa a se dar a partir instauração da idade do monopólio (datada nos fins do século XIX), fase que passa a exigir novas atribuições do Estado, a fim de preservar o processo de acumulação. A partir daí, a intervenção estatal incidiu com mais fluidez e intensidade, na organização e na dinâmica da economia.

Assim, o Estado passou a atuar como um instrumento de regulação econômica, o que significa passar a operar como um forte administrador dos ciclos

da crise. Nisto, o que se observa é uma sinergia existente entre os aparatos privados dos monopólios e as instituições estatais, propiciando condições necessárias à acumulação e a valorização do capital monopolista.

É, pois, sob essas condições que “fraturas” da questão social tornaram-se objeto de uma intervenção contínua e sistemática por parte do Estado. De modo que, só mediante a concretização das possibilidades socioeconômicas e políticas segregadas na ordem do monopólio é que a questão social se revela como alvo das políticas sociais.

Nesse sentido, só é possível pensar em política social, com a instauração do capitalismo monopolista, no momento em que se estabelece a intervenção contínua, sistemática do Estado sobre as sequelas da questão social. Ressaltamos que foi pelo viés da política social que o Estado burguês, no bojo do capitalismo monopolista, buscará administrar as manifestações da questão social, conformando os interesses da ordem monopolista às demandas da classe trabalhadora.

Indubitavelmente, as políticas sociais decorrem da capacidade de organização e mobilização da classe trabalhadora e dos demais segmentos da população, o que força o Estado a atender aos interesses desta classe. Entretanto, Netto (op.cit.), adverte-nos que a dinâmica das políticas sociais está longe de constituir-se num campo de consensos. Antes, elas resultam de relações complexas, imbuídas num complicado jogo de interesses divergentes e contraditórios.

Nessa envergadura, a intervenção estatal no âmbito da questão social está longe de se constituir fora de um terreno de tensões. No contexto da sociedade burguesa, o processamento das políticas sociais pode assinalar conquistas parciais e significativas para a classe operária e para o conjunto dos demais trabalhadores, mas não rompe a intervenção estatal atrelada à mediação dos interesses da classe burguesa.

Já na vigência da crise mundial do capitalismo de 1929, o Estado adotou uma nova postura frente à sociedade, inserindo-se, de maneira mais incisiva, na relação capital-trabalho. Essa inserção será condicionante para a acumulação, consolidação e expansão do capital que, no caso brasileiro, se deu na conjuntura de substituição do modelo agrário-exportador para o urbano-industrial, a partir do governo de Getúlio Vargas, em 1930. Por outro lado, o Estado também passou a assumir responsabilidades pelas condições de vida da população. A partir daí, progressivamente, o Estado brasileiro reconhece a questão social como uma

questão política a ser enfrentada através de sua intervenção. Desta forma, a assistência começa a se configurar, seja no campo da ação governamental para prestação de serviços, seja como aparato político para conter as tensões sociais (SPOSATI et al, 1985).

Isso posto, a Política de Assistência Social no Brasil, apresenta em sua gênese, o desenvolvimento de práticas filantrópicas e paternalistas, tornando-se mecanismos de manipulação e controle da população, particularmente da classe subalternizada32. Progressivamente, emergem lutas e movimentos a fim de romper com o vínculo assistencialista e emergencial da assistência social, apresentando-se como importante marco nesse processo, a compreensão dada à assistência social na Constituição Federal de 1988, posteriormente, fortalecida com a aprovação da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS).

Faleiros (2000), no trato dessa questão alega que, a promulgação da constituição se insere em um contexto marcado pela ruptura com o regime militar - caracterizado por uma enorme repressão política, forte inflação e alta dívida pública - e pela presença de fortes movimentos de pressão, nos quais se fará ouvir a voz das mulheres, negros, índios, ruralistas e outras categorias sociais. Desta forma, a Carta Constitucional é fruto de disputa e negociação entre blocos de forças antagônicas. A Constituição de 1988 constitui, portanto, o marco legal para compreensão das transformações e redefinições do perfil histórico da assistência social no país. Essa qualificará a assistência como política pública de seguridade social.

Ainda como característica da conquista constitucional de 1988 e resultado de pressões sociais pela regulamentação da constituição, através das leis específicas em 7 de dezembro de 1993 é aprovada pelo presidente Itamar Franco, a Lei Orgânica de Assistência social (LOAS), publicada no Diário Oficial da União em 8 de dezembro de 1993. Essa lei torna a assistência social uma política pública com base em uma gestão descentralizada e participativa.

A partir da LOAS, a assistência social parte para uma nova configuração, a qual visa romper com o perfil do favor e do clientelismo33, consolidando-se como

32 Há inúmeros trabalhos que assinalam as relações assistência/controle da população/

paternalismo/autoritarismo. Ver entre outros: (IAMAMOTO, 2007); (SPOSATI, 1985); (YAZBEK, 1993).

33 Trata-se de uma prática, que embora seja combatida no Brasil, ainda é bastante viva em períodos

política pública de direitos. A LOAS inaugura, portanto, uma nova era para assistência social brasileira, configurando-se enquanto política pública; atentando-se para os níveis de desigualdades que o Brasil vem acumulando, ao longo dos séculos, além de forçar suas diretrizes no atendimento das necessidades dos usuários. Fundamenta-se na ideia de que o direito à assistência é dever do Estado e não compensação do mercado, sobretudo, uma assistência que não se alia à ala conservadora e nem a ações compensatórias, antes, combina com a proteção, segurança e seguridade social (SPOSATI, 2004).

Contudo, a LOAS ainda hoje se depara com muitos entraves para ser efetivada em sua plenitude. Um dos obstáculos é o avanço do ideário neoliberal que insiste em desviar políticas públicas para caminhos que não propiciam a construção da cidadania. Além desses aspectos, a LOAS configurou um novo significado para a assistência social, diferenciando-a do assistencialismo34 e situando-a como política de seguridade voltada à extensão da cidadania social aos segmentos desprovidos dos direitos sociais. No entanto, ações assistencialistas, focalizadas e residuais, ainda estão presentes no modelo de assistência impresso na conjuntura atual.

O Sistema Único da Assistência Social (SUAS) constitui outro avanço no âmbito da assistência que se configurou como Lei Federal através da Lei nº 12. 435/201135, por meio da qual deve assegurar e garantir a continuidade dos serviços socioassistenciais. Através desse modelo de gestão busca-se materializar as diretrizes da LOAS, primando pela descentralização e participação dos sujeitos sociais envolvidos nesse processo. Essa nova sistematização da assistência define os elementos basilares para a execução da atual política de assistência36, de modo que possibilite a normatização de padrões nos serviços de qualidade no atendimento, avaliação e resultados dos serviços oferecidos à população usuária (BRASIL, 2004). Entretanto, a referida padronização e qualidade dos serviços

favores”, na maioria dos casos, em troca dos votos dos eleitores. A intermediação pode ser feita por afiliados de partidos políticos, prefeitos, vereadores, servidores públicos, deputados, secretários ou pessoas influentes nos vários recantos do país.

34 Historicamente esse termo esteve relacionado e, ainda permanece atrelado ao sentido de ajuda,

benesse ou caridade. Trata-se da mediação de acesso a um determinado bem ou serviço, de maneira isolada, pontual e individualizada. Cuja ação é incapaz de produzir efeitos significativos na vida dos sujeitos.

35 Esta Lei foi sancionada em 06 de junho de 2011, pela atual presidente Dilma Rousseff.

36 A atual Política Nacional de Assistência Social (PNAS) foi aprovada em reunião descentralizada e

participativa do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) realizada entre aos dias 20 a 22 de setembro de 2004, após um processo de discussões em torno de sua versão preliminar, efetivado em diversos eventos ocorridos em todos os estados brasileiros (BRASIL, 2004).

prestados a população usuária dessa política, ainda não se efetiva conforme a normativa do SUAS presume.

O SUAS, incorpora em seus serviços, programas, projetos e benefícios, a centralidade na atenção às famílias, a defesa do co-financiamento para a alocação dos recursos e, ainda, a participação e mobilização da sociedade civil, no que se refere à implantação e implementação das políticas sociais. No sistema descentralizado e participativo da assistência social, o financiamento é representado pelos “fundos” de assistência social nas três instâncias do governo. Esse financiamento deve ter como base o diagnóstico sócio-territorial que aponta as diversidades de cada território e, ainda, os diferentes níveis de complexidade37.

Aqui é pertinente acrescentarmos que a matricialidade sociofamiliar, impresso na NOB/SUAS, defende centralidade à família na implementação e execução dos benefícios, serviços, programas e projetos socioassistenciais. Sobre isto, temos duas ponderações a tecer. A primeira, que reconhecemos ser legítima e importante destinar ações para as famílias diante das suas responsabilidades e desafios complexos e multifacetados, cujos deveres são voltados ao seu desenvolvimento e para prover meios de sobrevivência aos seus membros. No entanto, esses encargos não devem ser restritivos a família, antes, devem ser mediado e assegurados pelo poder público (Estado), no tocante a necessidade de acesso aos direitos socioassistenciais.

A segunda ponderação, deriva da primeira, em que o discurso da matricialidade familiar pode retomar a tradicional perspectiva de culpabilização dos indivíduos pela situação de privações em que vivem. Retrocedendo assim, ao aspecto neoconservador da assistência social cuja lógica está concatenada a antiga intervenção “moralizadora” da família. Neste sentido, esse viés “moralizador” tende a responsabilizar a família pelas manifestações da questão social as quais vivenciam, a exemplo do desemprego, da pobreza, segregação de renda e etc. Obscurecendo

37 Com a municipalização, a assistência social adotará novas classificações para o desenvolvimento

de ações e serviços, a qual passa a ser distribuída em três categorias: a primeira é a Proteção Social Básica, a qual tem como objetivo desenvolver ações de caráter preventivo, buscando o desenvolvimento das potencialidades dos usuários, bem como o fortalecimento dos vínculos familiares; a segunda é a Proteção Especial de Média Complexidade, que desenvolve ações destinadas a atender a famílias e indivíduos que tiveram seus direitos violados, porém não houve rompimento do vínculo familiar; e a terceira é a Proteção Social Especial de Alta Complexidade, a qual tem ações voltadas aos indivíduos e famílias que tiveram seus direitos violados e vínculos familiares rompidos (BRASIL, 2004).

então, o entendimento que o agravamento das diversas fraturas da questão social é inerente a quem a idealizou e criou: o modo de reprodução e acumulação capitalista. Em face disto, a centralidade às famílias ou a matricialidade familiar, nos dias atuais, ainda se configura como um grande desafio. A sociedade capitalista exige dos “executores das políticas sociais”, soluções imediatas aos dilemas das “famílias pobres”. Ao mesmo tempo faz transparecer, que os profissionais das políticas sociais, principalmente, os assistentes sociais, possuem algum tipo de “fórmula mágica ou receita pronta” capaz de sanar todos os conflitos que permeiam o universo das famílias pobres. Além disso, tende a responsabilizar os sujeitos sociais pelas suas vicissitudes, num contexto em que cada vez mais, os direitos da classe aviltada pela pobreza sofrem retração.

Para, além disso, é preciso pensar que o enfoque atribuído às ações voltadas às famílias pode conduzi-las a uma direção reducionista, pragmática e focalista. É, pois, necessário considerar os determinantes estruturais da sociedade, a saber: aspectos macroeconômicos, sociais, políticos, culturais, particularidades regionais, além das novas redefinições da composição familiar no cenário atual.

Aliás, o conceito de família, ainda se apresenta num invólucro de superficialidade e sem consensos, haja vista os muitos debates e incursões que se têm em torno de suas contradições e das novas reconfigurações familiares que se estabelecem no cenário atual.

A esse respeito, coadunamos com o entendimento da PNAS/2004 a qual define família como um conjunto de pessoas que se encontram unidas por laços consanguíneos, afetivos e de solidariedade. Portanto, transcende o modelo tipificado e nuclear burguês (constituído por pai, mãe e filhos). Destarte é preciso entender que “as novas feições de família estão intrínseca e dialeticamente condicionadas às transformações societárias contemporâneas” (BRASIL, 2004, p. 41). Assim, se faz necessário imprimir na gestão do SUAS, ações e estratégias que atendam às necessidades postas pelas famílias, as quais precisam da intervenção estatal, seja em que dimensão macro-social for, a que perfil ou arranjo familiar pertencer.

A nova sistematização da assistência social reforça ainda a ideia de que essa, enquanto política pública deve inserir-se na articulação intersetorial com outras políticas sociais, a fim de que as ações não sejam fragmentadas e pontuais, mas sejam capazes de contemplar as necessidades de todos os membros das famílias (BRASIL, 2004).

Nessa perspectiva, a Constituição Federal, promulgada em 1988, em seu o Art. 226, assegura especial proteção do Estado às famílias. Todavia, a conjuntura atual do Estado Neoliberal se revela insuficiente na garantia de políticas públicas que assegurem os direitos sociais a todos os cidadãos. Nessa envergadura, a assistência social, enquanto política pública não têm se configurado como um conjunto de ações articuladas, intersetorialmente, com outras políticas: a saúde, a previdência, a habitação, o emprego e a educação. Elas aparecem pulverizadas, focalizadas e deficitárias, não favorecem acesso amplo e com qualidade às famílias que não podem pagar por estes serviços.

Ainda sob as armadilhas neoliberais, em consonância com o pensamento de Mioto (2004), observamos uma tendência de sobrecarga de funções e responsabilidades que recaem sob as famílias, em decorrência da retração da ação do Estado na promoção de políticas que atendam as demandas do seio familiar. Para Mioto (2004, p. 15), a relação Estado-família:

[...] travaram sempre uma relação conflituosa e contraditória, numa parceria que não é bem uma parceria, em que o Estado se compromete a proteger a família, em uma espécie de „parceria‟, mas ao longo da história vimos que essa parceria é um conto do vigário, muitas vezes porque a família vem sendo mais sobrecarregada e não esvaziada [de funções e/ou responsabilidades]. [acréscimo da autora]

O referido engodo foi acentuado pelo avanço neoliberal, reformulação do Estado, transformações no processo produtivo e a precarização das relações de trabalho. Tal contexto favorece a retomada de redes de solidariedade e de sociabilidade, nas quais a família é chamada a atuar como parceira na proteção e inclusão social. De fato, a família vê-se mais e mais com uma sobrecarga de responsabilidades sociais para propiciar alimentação, educação, moradia, e saúde dos seus membros.

Segundo Sgritta (1998), existem dois canais “naturais” para satisfação das necessidades dos cidadãos: o mercado (via trabalho) e a família. Apenas quando esses canais falham, o Estado intervém, ou seja, a ajuda pública acontece somente sob forma de compensação em decorrência de “falimento”38 ou pobreza.

Reportamo-nos ainda a Mioto (2004, p. 15) para afirmar que, independentemente, das condições objetivas e das mudanças das relações familiares, a família “tem uma capacidade infinita de proteção”. Desse pensamento, se determinou o direcionamento de políticas sociais para as famílias pobres, sobretudo, aquelas que faliram na proteção de seus membros, consideradas pela sociedade burguesa como “incapazes”, “patológicas”, ou ainda as chamadas “sobrantes”39. A essa categoria de família é destinada a assistência pública, ou impreterivelmente, a assistência social. Isso revela-nos que o Estado não privilegia políticas de caráter universal e emancipatórias para as famílias brasileiras.

Para Sarti (1996), as famílias pobres são firmadas por redes de solidariedade, que envolvem um sistema de obrigações morais, em que para essas famílias, prevalece uma relação de ajuda mútua, extensiva àqueles com quem se pode contar. Para a autora, essas redes dificultam a individualização dos sujeitos e, ao mesmo tempo, viabilizam condições básicas de sobrevivência. De maneira que, a família para o pobre, fundamentada nas relações de redes e obrigações morais, está assim concatenada:

[...] associa-se àqueles em quem se pode confiar. [...]. Como não há

status ou poder a ser transmitido, o que define a extensão da família

entre os pobres é a rede de obrigações que se estabelece: são da família aqueles com quem se pode contar, isto quer dizer, aqueles que retribuem o que se dá, aqueles, portanto, para com quem se tem obrigações (SARTI, 1996, p. 63).

Por conseguinte, as relações com parentes consanguíneos só são válidas se os membros estiverem inseridos no “sistema de obrigações morais”, ou seja, se entre eles for estabelecida algum tipo de ajuda mútua, firmando assim, uma rede de confiança, afeto e estratégias comuns de sobrevivência.

A ineficiente atenção do Estado às famílias pobres, as quais mais sofrem violação de direitos e a precariedade dos serviços sociais, deixa as famílias diante

39Esse termo emerge da relação capital-trabalho, na medida em que, o processo produtivo capitalista

descarta visivelmente o trabalho humano pelo maquinário. Isso significa tornar supérfluo um grande contingente de trabalhadores que não se inserem na dinâmica da produção capitalista. Carvalho e Guerra chamam atenção para o modo como a exclusão é vista nessa relação. Para as autoras a exclusão não e vista como total e absoluta, já que a própria lógica do capital cria formas precárias de inclusão, com o intuito de incluir as populações que se encontram nas franjas do mercado, mesmo que minimamente, através do consumo. A informalidade é um exemplo clássico disso (CARVALHO; GUERRA, 2006).

do desafio cotidiano de encontrar alternativas de sobrevivência, em contextos de grande dilema da vida social. Muitas destas famílias transitam na linha tênue entre a assistência social ineficiente e limitada, com suas condicionalidades associadas à atribuição de benefícios e a total desproteção e “desassistência” por parte de quem deveria, por excelência, protegê-la: o Estado.

Aqui é pertinente fazermos referência às recentes iniciativas divulgadas pelo Governo Federal no âmbito da Política de Assistência Social, especialmente por estarem diretamente associadas ao enfrentamento da extrema pobreza, no governo de Dilma Rousseff (2011-2014).

Em 2 de junho de 2011, o Decreto nº 7.492, instituiu o “Plano Brasil Sem Miséria”, cuja finalidade explícita é superar a situação de extrema pobreza da