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3 CONCEITOS SOBRE AS MANIFESTAÇÕES HETERODISCORDANTES E

3.1 ORIENTAÇÃO SEXUAL

3.1.2 Homossexualidade

Como observamos anteriormente, a história mostra que ocorreram diversas tentativas de impor um significado à homossexualidade, tanto de forma religiosa, filosófica ou científica. Atualmente, as ciências biológicas e a psicologia tentam nos dar uma explicação mais racional e sensata do que seriam, como se originam e como se manifestam as características homoafetivas no ser humano.

Etimologicamente, a palavra “homossexual” advém da junção do prefixo

homós, que significa “semelhante” e do sufixo latino sexus, que significa “relativo ao

sexo”. Este termo foi cunhado pelo médico psiquiatra Karoly Maria Benkert em 1869, tendo sido registrado em carta destinada ao Ministério da Justiça da antiga Alemanha do Norte, onde se defendia os direitos dos homossexuais que eram perseguidos naquela região (BRANDÃO, 2002).

Em termos gerais, o homossexual é aquele indivíduo que possui sua atenção afetiva e sexual direcionada para pessoas do mesmo sexo, como expõe Taísa Ribeiro Fernandes (2004, p. 21-22):

Homossexual é o indivíduo cuja inclinação sexual é voltada para uma pessoa do mesmo gênero, o homem que se sente atraído por outro homem e a mulher que se sente atraída por outra mulher. É alguém que não nega a sua formação morfológica, entretanto, seu interesse e sua atividade sexual são voltados, direcionados exclusivamente para quem tem o mesmo sexo que o seu. [...] Podemos definir o sentimento homossexual como a sensação de estar apaixonado, de se envolver amorosamente ou sentir atração erótica por pessoa de sexo semelhante. É uma forma distinta de ser da maioria, somente no que diz respeito à orientação sexual, pois, nos demais aspectos, não há diferença. É a troca de afetos, é o envolvimento íntimo entre duas pessoas pertencentes ao mesmo sexo.

A medicina e a psicologia possuem teorias próprias, nem sempre convergentes, a respeito da gênese da homossexualidade. Uma coloca o foco nas causas fisiológicas do comportamento homoafetivo; a outra comporta em seu arcabouço teórico a conjunção entre os fatores internos ao ser humano e o ambiente externo no qual aquele estaria inserido.

3.1.2.1 As teorias médicas sobre a homossexualidade.

Historicamente, a medicina tentou buscar diversos fatores que colocassem à luz a gênese da homossexualidade no ser humano. Conclusivas ou não, obtiveram- se evidências interessantes a respeito da diferença que poderia ocorrer no âmbito fisiológico entre pessoas homossexuais e heterossexuais. Nesta perspectiva, a genética, a endocrinologia e a neurociência buscam os fatores de desencadeamento da homossexualidade.

Em 1991, o pesquisador britânico Simon Le Vay encontrou diferenças estruturais com relação ao tamanho do hipotálamo cerebral, a região que está associada ao comportamento sexual, mostrando que esta sessão do cérebro seria menor nos homossexuais em contraste com os heterossexuais (LONGARAY; RIBEIRO, 2009).

Além da origem cerebral, a genética também realizou estudos sobre a transmissão desta característica entre as gerações. Em 1985, Richard Pillard e James Weinrich desenvolveram um estudo pioneiro utilizando árvores genéticas com famílias de homossexuais, focando nos irmãos gêmeos, irmãos fraternos (não-gêmeos) e irmãos adotados. Percebeu-se que homens homossexuais possuíam a tendência de ter mais irmãos também homossexuais, com uma incidência de 22%, enquanto que esta mesma incidência girava em torno de 4% no grupo que incluía os heterossexuais. A base do estudo era a incidência da homossexualidade entre irmãos gêmeos idênticos (ou univitelinos, provenientes do mesmo zigoto), gêmeos não idênticos (ou bivitelinos, originários de zigotos diferentes), irmãos não gêmeos (nascidos em momentos diferentes) e irmãos adotados. Estimava-se que a contribuição genética, caso houvesse, seria maior em gêmeos idênticos, um pouco menor entre gêmeos não idênticos e irmãos não gêmeos e muito pequenas entre irmãos adotados. Os resultados foram expressivos, totalizando um nível de incidência homossexual em 52% nos gêmeos idênticos, 22% em gêmeos não idênticos, 11% entre irmãos não gêmeos e traços menores de 1% em irmãos adotados. Nas mulheres, a homossexualidade era registrada em 48% das gêmeas idênticas, 16% nas gêmeas não idênticas e 6% em irmãs não gêmeas (FORASTIERI, 2006).

A endocrinologia, ciência que estuda a influência dos hormônios no corpo humano, também buscou estudar a gênese da homossexualidade. De acordo com Longaray e Ribeiro (2009), a explicação para a origem da identidade homossexual é

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que que fetos predispostos à homossexualidade masculina não absorvem com eficácia o hormônio testosterona produzido pela mãe durante o seu desenvolvimento, ocasionando uma “falha” no desenvolvimento pela atração ao sexo oposto. A causa considerada é relativa aos níveis de stress a que o feto se encontra exposto durante a gravidez pois, por incrível que pareça, homens que foram concebidos e que nasceram em períodos de grande stress são mais frequentemente homossexuais do que homens concebidos em ambientes calmos. Isto porque, o corpo humano produz o cortisol, o hormônio do stress, a partir da mesma matéria prima que a testosterona. Com isso, acaba sobrando menos quantidade para a transformação desta matéria prima em testosterona. Já para a homossexualidade feminina, a explicação seria dada a partir do mal funcionamento de uma proteína localizada no útero materno que é responsável por proteger os fetos femininos contra a exposição excessiva à reação hormonal masculina. Ou seja, devido a essa “deficiência” em seu funcionamento, tal proteína não protege suficientemente o feto feminino, que fica sujeito à ação dos hormônios masculinos produzidos pela mãe.

3.1.2.2 A homossexualidade sob a ótica da psicologia freudiana

A psicologia, ao contrário das ciências médicas, tem uma visão mais ampla sobre os fatores que deflagram o comportamento homossexual do ser humano. Não se considera um fator isolado, mas sim, uma série de variantes que se encadeiam entre si para determinar a sexualidade do sujeito.

O neurologista e psicanalista Sigmund Freud, considerado o pai da psicanálise, consolidou as bases nas quais a homossexualidade deixaria de ser tratada como doença, conceito enraizado na teoria médica até o início do séc. XX.

A preocupação de Freud não era direcionada à cura da homossexualidade. Mas sim, na importância desta questão no processo analítico. Diversos pacientes passaram por seu consultório e foi possível construir a percepção de como os laços familiares da infância são capazes de influenciar a vida sexual adulta. Em se tratando da homossexualidade propriamente dita, a grande ligação com a figura materna e a autoridade rígida da paterna são essenciais para que ela ocorra, onde o homossexual reprime seu amor pela mãe e acaba produzindo uma espécie de autoerotismo diversificado. (PEDRINI; CORREIA, 2012).

Como já dito, não há como estabelecer uma direção una sobre a causa da homossexualidade. O que existe é um somatório de fatores biológicos, psíquicos e sociais que interferem diretamente na formação sexual do sujeito. Hélio José Guilhardi (2007, p. 1), mestre em Psicologia Experimental da USP, nos esclarece com precisão a respeito:

Os comportamentos e sentimentos homossexuais são instalados e mantidos como qualquer outro comportamento. São regidos, em suma, pelas mesmas leis e pelos mesmos princípios fundamentais que explicam as ações humanas. Nada os torna peculiares, nem idiossincráticos. Uma questão (não respondida de maneira convincente pela Ciência, até o momento) que se pode propor é se a suscetibilidade aos reforços sexuais é determinada pela constituição genética da pessoa ou é adquirida durante o processo de desenvolvimento comportamental, cognitivo e afetivo da pessoa, através de práticas sociais, culturais e familiares. Mas, sugerir tal dicotomia ("nature" ou "nurture"), não parece um caminho promissor. É mais compatível com o que se conhece sobre os determinantes dos comportamentos e sentimentos humanos enfatizar a influência recíproca, a interação entre os eventos biofisiológicos e ambientais. Como tal, não existe uma única causa ou determinante para os comportamentos homossexuais. São comportamentos multideterminados por complexa teia de contingências de reforçamento, que se influenciam através do desenvolvimento de cada ser humano e que vão formando pessoas em contínuo processo de transformação, e não homossexuais, como uma entidade substantiva que existe à parte dos outros seres humanos.

Como se vê, não há como estabelecer uma causa específica para a homossexualidade. Os esforços, tanto na área médica quanto psíquica, nos servem para apreciar o tema sobre um viés científico. Porém, o importante é frisar que a homossexualidade não pode ser encarada como uma doença, mas sim, como uma mera variante do comportamento sexual humano.

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