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Ideias preconcebidas sobre o perfil e o comportamento do pesquisador científico no

CAPÍTULO I PERCEPÇÃO PÚBLICA DA CIÊNCIA E DA TECNOLOGIA: COMO OS

1.6. O retrato gerado por pesquisas de percepção pública da C&T

1.6.1. Ideias preconcebidas sobre o perfil e o comportamento do pesquisador científico no

Por parte de jornalistas e assessores de imprensa que atuam junto a instituições de pesquisa e ensino no Brasil, existe uma ideia preconcebida sobre o comportamento do pesquisador científico no que diz respeito ao relacionamento com a imprensa com o objetivo de divulgar ciência. Em geral, comenta-se que é mais fácil conseguir entrevistar um pesquisador americano do que um brasileiro. Essa afirmação refere-se ao fato de nos Estados Unidos os pesquisadores estarem mais disponíveis e acessíveis para falarem sobre suas pesquisas a jornalistas. (FRANÇA, 2005).

Um estudo publicado na revista científica Science, em janeiro de 2016, sobre o impacto de hidrelétricas foi assinado por cientistas de diversos países, dentre eles o Brasil, EUA, Alemanha e Canadá. Na reportagem feita pela Folha de S.Paulo, a fonte foi um especialista da Universidade do Texas, Kirk Winemiller. Segundo a jornalista Sabine Riguetti, apesar de haver mais de dez cientistas brasileiros que faziam parte do paper, nenhum foi encontrado para conceder entrevista. (RIGUETTI, 2018).

O problema é que se a ciência que aparece na grande mídia é sobretudo norte-americana, alemã e britânica, com estudos que compreendem fenômenos complexos e encontram explicações para doenças graves, então a percepção que se tem da ciência nacional ficará prejudicada. (p. 24).

No Brasil, os pesquisadores, em geral, alegam, dentre as várias justificativas para não atender a jornalistas, falta de tempo em suas agendas e incompreensão dos profissionais da mídia com relação ao assunto abordado, além de frequentes erros veiculados e pedidos feitos em cima da hora. Jornalistas classificam os pesquisadores como inacessíveis e estes consideram aqueles mal informados sobre o tema da entrevista, além de sempre apressados e, por vezes, mal- intencionados. Essa é a imagem conhecida. (FRANÇA, 2005).

Em geral, esses profissionais sentiam-se bastante inseguros ao dar entrevistas, pois não acreditavam na capacidade de os repórteres compreenderem e depois escreverem sobre suas atividades. Para eles, também era muito difícil ver aquela linguagem, aprimorada em anos de laboratório e revistas científicas, transformada de modo a ficar ao alcance do tal “público médio”. (p. 36).

A elaboração desses perfis, entretanto, resulta de interação existente nos expedientes de trabalho, mas não há dados precisos sobre essa relação que pudessem torná-la mais clara e ajudar a melhorá-la.

“Os cientistas têm uma longa história de criticar a mídia e têm sido particularmente críticos do que eles consideram ser imprecisões desenfreadas dentro da cobertura de ciência”. É o que traz o artigo Scientists’ Prioritization of Communication Objectives for Public Engagement, de Anthony Dudo e John C. Besley (2016, p. 2, tradução nossa). O texto mostra que o fator imprecisão das informações na cobertura das ciências é um problema levantado por cientistas americanos.

Dudo e Besley relatam como os cientistas avaliam cinco objetivos específicos de comunicação, que incluem informar o público sobre a ciência e estimulá-lo a respeito do assunto, reforçando a confiança da população na ciência, além de adaptar as mensagens a respeito da ciência e defendê-la da desinformação. O primeiro alvo da pesquisa é ver como os cientistas priorizam essas diferentes finalidades de comunicação, tendo em conta as suas percepções de como seus colegas priorizam essas metas.

Nenhuma pesquisa avaliou este tema, segundo Dudo e Besley. Por isso eles propuseram as seguintes questões de investigação: Que objetivos os cientistas priorizam quando se comunicam com o público? Em que medida os cientistas pensam que seus colegas partilham estes mesmos objetivos?

Pedidos de líderes científicos para os seus colegas se tornarem melhores comunicadores públicos compôs o cenário no entorno do estudo relatado pelos autores. Os resultados mostram que a maioria dos cientistas prioriza a comunicação destinada a defender a ciência da desinformação e educar o público sobre a ciência, e menos priorizar comunicação que busca construir confiança e estabelecer ressonância com o público. (DUDO; BESLEY, 2016)

Líderes da comunidade científica estão convidando cientistas americanos a se envolverem significativamente com os seus concidadãos. A expectativa é que tais interações possam melhorar a relação ciência-sociedade, trazendo cientistas em maior proximidade com os seus concidadãos. (p. 2, tradução nossa).

A pesquisa aponta a necessidade de formar comunicadores para ajudar os cientistas a selecionar metas de comunicação específicas para determinados contextos e públicos.

Os entrevistados classificaram a defesa da ciência como a sua prioridade mais alta e também indicaram que eles acham que os seus colegas também veem este objetivo como o mais

importante. Os cientistas também priorizaram "informar o público sobre a ciência" e acreditam que essa priorização também ocorre junto aos seus colegas. "Emocionar o público sobre ciência" aparece em seguida. "Construção de confiança" e "adaptação de mensagens” foram os dois objetivos de comunicação menos preferidos. (DUDO; BESLEY, 2016, p. 4, tradução nossa).

Os membros da Associação Americana Para o Avanço da Ciência (AAAS, na sigla em inglês) acreditam que eles priorizam cada um dos intuitos específicos de comunicação mais do que seus colegas cientistas. Os respondentes indicaram que eles acreditam que os seus colegas, ao contrário de si, priorizam a adaptação de mensagens mais do que a construção de confiança. (DUDO; BESLEY, 2016).

De acordo com a conclusão desse estudo junto aos membros da AAAS, a mensagem que fica é a seguinte: os pesquisadores de comunicação e profissionais têm a oportunidade de ajudar os cientistas a pensarem de forma mais reflexiva e estrategicamente sobre as finalidades para os seus esforços de comunicação públicos. Jurdant (2006) relata que esta necessidade de reflexão já foi apontada pelo físico Michel Crozon, que afirmou em uma conferência, em Paris, em 2001: “Divulgo para melhor compreender o que faço”, ao ser perguntado sobre o tema “Por que divulgar?” (p. 45). A resposta do físico vai além das justificativas sobre compartilhar conhecimento, o direito de saber ou a colaboração para reduzir a distância entre especialistas e leigos. Para o físico, segundo Jurdant, os pesquisadores têm uma compreensão muito reduzida do contexto social em que sua pesquisa está inserida.

A expectativa de Dudo e Besley é que as descobertas reveladas pela pesquisa contribuam para aumentar os esforços de treinamento voltados para a capacitação dos cientistas na comunicação com o público. Os resultados apontam no sentido que a formação ajuda os cientistas a respeito dos propósitos da comunicação selecionados para determinados contextos e públicos.

Muitas das organizações de alto perfil que tentam melhorar nos cientistas a 'capacidade de engajamento’ reconhecem que este processo envolve mais do que simplesmente ensinar cientistas sobre as habilidades de comunicação específicas e táticas. Um painel da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos, por exemplo, destacou o desafio de levar os cientistas a refletirem sobre os processos de comunicação de uma forma sistemática. (DUDO; BESLEY, 2016).

Da mesma forma, a Communication Partnership for Science and the Sea (COMPASS), uma organização especializada na construção de habilidades de comunicação dos cientistas, inclui a necessidade de os cientistas conhecerem o seu público. A pesquisa sugere que, para a comunicação científica, "conhecer o seu público" pode significar ser reflexivo sobre que tipos de impactos estão esperando ter sobre aqueles com quem estamos comunicando. Isto é, o cientista precisa conhecer o seu público e refletir sobre os impactos que a ciência causa sobre aqueles com os quais está falando. (DUDO; BESLEY, 2016).