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III A LEI N.º 69/2014, DE 29 DE AGOSTO O processo legislativo

Petição n.º 173/XII - «Solicitam a aprovação de uma nova lei de protecção dos animais»

O processo legislativo que conduziu à aprovação da Lei n.º 69/2014, de 29 de Agosto, que procede à trigésima terceira alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro, criminalizando os maus-tratos a animais de companhia, e à segunda alteração à Lei n.º 92/95, de 12 de Setembro, sobre protecção aos animais, alargando

transpuseram para a ordem jurídica interna as Directivas n. os 2005/36/CE, do Parlamento Europeu e do

Conselho, de 7 de Setembro, e 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de Dezembro, relativas ao reconhecimento das qualificações profissionais e aos serviços no mercado interno. Procede ainda à quarta alteração ao Decreto-Lei n.º 142/2006, de 27 de Julho, que estabeleceu «as regras para identificação, registo e circulação dos animais das espécies bovina, ovina, caprina, suína e equídeos, bem como o regime jurídico dos centros de agrupamento, comerciantes e transportadores e as normas de funcionamento do sistema de recolha de cadáveres na exploração (SIRCA)»; à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 255/2009, de 24 de Setembro (relativo à circulação de animais de circo entre os Estados-Membros) e à primeira alteração ao Decreto-Lei n.º 79/2011, de 20 de Junho (que estabeleceu os procedimentos de elaboração de listas e de publicação de informações nos domínios veterinário e zootécnico, aprova diversos regulamentos relativos a condições sanitárias, zootécnicas e de controlo veterinário e transpôs a Directiva n.º 2008/73/CE, do Conselho, de 15 de Julho).

241 Procedendo à quadragésima alteração ao Código Penal e à terceira alteração ao Decreto-Lei n.º 315/2009, de

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os direitos das associações zoófilas, teve início com a entrega, na Assembleia da República, de uma petição que solicitava a aprovação de uma nova lei de protecção dos animais.

A petição promovida pela «Associação Animal» deu entrada na Assembleia da República a 4 de Outubro de 2012, com um total de 41.511 assinaturas e propunha a aprovação de uma nova legislação de protecção dos animais, remetendo em anexo um anteprojecto de diploma. Em 2010, quando lançou esta iniciativa, a «Associação Animal» tinha como objectivo desencadear uma iniciativa legislativa de cidadãos, no entanto, de acordo com o art.º 6.º da Lei n.º 17/2003, de 4 de Junho242, para tal seria necessária a recolha de 35.000 assinaturas e a

Associação apenas havia logrado recolher 10.224 assinaturas.

Assim, após aquilo que a própria Associação reconheceu como “tempo de paragem e

reflexão”, decidiu avançar com a recolha da petição de uma forma mais simples,243

entregando na Assembleia da República todas as assinaturas recolhidas desde o início da campanha dado que estas se prendiam com o mesmo propósito.

No texto que acompanha a petição e o anteprojecto de diploma que constitui o seu objecto, a Associação Animal refere que “… num momento como o que o país atravessa, estes [os

animais] acabam por ser vítimas das maiores atrocidades, e, por serem muitas vezes o “elo mais fraco” de uma família são as primeiras a ser abandonadas e maltratadas em situações de crise”.

O anteprojecto de diploma integra 13 artigos, prevendo não só definições e princípios gerais, mas desenvolvendo também as funções do Estado na protecção dos animais, a desclassificação dos animais como coisas e a previsão de ilícitos penais (e as penas associadas).244

A petição foi recebida e admitida pela Assembleia da República,245 uma vez que cumpria todos os requisitos formais e não se verificaram nenhuma das causas de indeferimento

242 Actualmente, a Lei n.º 17/2003, de 4 de Junho foi alterada pela Lei n.º 26/2012, de 24 de Julho e pela Lei

Orgânica n.º 1/2016, de 26 de Agosto, sendo que esta última introduziu alterações ao nível dos requisitos previstos no art.º 6.º, baixando o número de subscritores de 35.000 para 20.000 e consagrando a possibilidade da assinatura digital.

243 Assinalando que “lamentavelmente as ILC (iniciativas legislativas de cidadãos) não são muito populares em

Portugal”, a Associação Animal não recolheu mais assinaturas em papel (mantendo as 10.224 assinaturas

inicialmente recolhidas) às quais juntou mais 31.287 assinaturas em formato digital.

244 É possível consultar a Petição n.º 173/XII, o anteprojecto de diploma que a acompanha e algum elementos a

respeito do processo parlamentar desencadeada através do site do Parlamento, mais precisamente através de:

http://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalhePeticao.aspx?BID=12287

245 Seguindo os trâmites previstos no n.º 3 da Lei n.º 43/90, de 10 de Agosto (Lei do Exercício do Direito de

Petição), alterada pelas Leis n.º 6/93, de 1 de Março, n.º 15/2003, de 4 de Junho, e n.º 45/2007, de 24 de Agosto, a Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, após a esta ter sido remetida por

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liminar.246 Refere-se ainda algumas questões iniciais colocadas sobre a competência da 1.ª Comissão – Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para a apreciação do objecto da petição, tendo estas questões sido ultrapassadas em reunião de presidentes de Comissão, que deliberou o prosseguimento do processo nesta Comissão, que em reunião a 8 de Maio de 2013 deliberou: dar conhecimento da Petição e do relatório elaborado pela Comissão aos Grupos Parlamentares para apresentação eventual de iniciativa legislativa, dar conhecimento aos peticionários do conteúdo do relatório e, considerando o número de subscritores ser superior a 4.000, enviar o relatório à Senhora Presidente da Assembleia da República, para agendamento da sua apreciação em plenário.247

A quando da apreciação da Petição encontravam-se pendentes duas iniciativas legislativas cujo objecto era conexo com o da Petição: o projecto de lei n.º 173/XII - Altera o Código Civil, estabelecendo um estatuto jurídico dos animais, da autoria do Partido Socialista248 e a proposta de lei n.º 135/XII, da autoria do Governo, que previa a alteração ao Decreto-Lei n.º 315/2009, de 29 de Outubro, que aprovou o regime jurídico da criação, reprodução e detenção de animais perigosos e potencialmente perigosos enquanto animais de companhia.249

Os projectos de lei n.º 474/XII do Partido Socialista e n.º 475/XII do Partido Social Democrata

No seguimento da discussão desta petição foram apresentados dois projectos de lei: o projecto de lei n.º 474/XII – Aprova o regime sancionatório aplicável aos maus-tratos contra animais e alarga os direitos das associações zoófilas, procedendo à 2.ª alteração à Lei n.º

despacho da Senhora Presidente da Assembleia da República (à data Maria da Assunção Esteves), deliberou da sua admissão.

246 Os requisitos formais estão previstos no artigo 9.º da Lei n.º 43/90, de 10 de Agosto (Lei do Exercício do

Direito de Petição) e as causas de indeferimento liminar no seu artigo 12.º.

247 Cumprindo o disposto, respectivamente, na alínea c) do n.º 1 do artigo 19.º, na alínea m) do n.º 1 do artigo

19.º e na alínea a) do n.º 1 do artigo 19.º e no artigo 24.º da Lei n.º 43/90, de 10 de Agosto (Lei do Exercício do Direito de Petição).

248 Este projecto, elaborado no seguimento da Petição n.º 80/XII (Cumprimento do artigo 13.º do Tratado de

Lisboa, que Portugal assinou e ratificou, e consequente a imediata alteração dos Códigos Civil e Penal, na parte respeitante aos animais, seres sencientes, e não coisas móveis) deu entrada a 15 de Fevereiro de 2012 e após terem sido recebidos todos os pareceres solicitados e se ter aprovado por unanimidade o requerimento de baixa à 1.ª Comissão sem votação, caducou por não ter sido colocado à votação pelos autores até ao término da XII Legislatura.

249 Esta proposta de lei seguiu o seu caminho autónomo, tendo levado à aprovação da Lei n.º 46/2013, de 4 de

Julho, que procedeu à segunda alteração ao Decreto -Lei n.º 315/2009, de 29 de Outubro, alterado pelo Decreto - Lei n.º 260/2012, de 12 de Dezembro, que aprovou o regime jurídico da criação, reprodução e detenção de animais perigosos e potencialmente perigosos, enquanto animais de companhia, reforçando os requisitos da sua detenção e os regimes penal e contra-ordenacional.

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92/95, de 12 de Setembro, apresentado a 29 de Novembro de 2013 pelo Partido Socialista, tendo como primeiro subscritor o Deputado Pedro Delgado Alves;250 o projecto de lei n.º 475/XII – Altera o Código Penal, criminalizando os maus-tratos a animais de companhia, apresentado a 5 de Dezembro de 2013, tendo como primeiro subscritor o Deputado Cristóvão Norte.251

Ambos os projectos propunham criminalizar os maus-tratos infligidos a animais de companhia, mas apenas o projecto apresentado pelo PSD introduzia alterações ao Código Penal.252

Este projecto considerava o aditamento de três novos artigos ao Código Penal – o artigo 387.º, que continha a previsão dos maus-tratos a animais de companhia e as respectivas sanções penais; o artigo 388.º, que previa o crime de abandono de animal de companhia e as penas associadas; e artigo 389.º que definia o conceito de animal de companhia, para efeitos penais.

O artigo 387.º na redacção proposta considerava como ilícito penal o acto injustificado que infligisse “…dor, sofrimento ou quaisquer outros maus-tratos físicos a um animal de

companhia…”, prevendo que estes actos seriam punidos com pena de prisão até um ano ou

pena de multa até 240 dias, estabelecendo um agravamento da moldura penal, para pena de prisão até dois anos e pena de multa até 360 dias, caso deles resultasse a morte do animal. Por sua vez, o artigo 388.º continha a previsão do crime de abandono de animal de companhia por aquele que tivesse o “… o dever de o guardar, vigiar ou assistir…”, punindo este acto de abandono com pena de prisão até seis meses ou com pena de multa até 120 dias.

250 É possível consultar este projecto de lei e processo parlamentar e legislativo, aqui: http://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=38076

251 É possível consultar este projecto de lei e processo parlamentar e legislativo, aqui: http://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=38087

252 Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de Setembro, e alterado pela Lei n.º 6/84, de 11 de Maio, pelos

Decretos-Leis n.ºs 101-A/88, de 26 de Março, 132/93, de 23 de Abril, e 48/95, de 15 de Março, pelas Leis n.ºs 90/97, de 30 de Julho, 65/98, de 2 de Setembro, 7/2000, de 27 de Maio, 77/2001, de 13 de Julho, 97/2001, 98/2001, 99/2001 e 100/2001, de 25 de Agosto, e 108/2001, de 28 de Novembro, pelos Decretos-Leis n.ºs 323/2001, de 17 de Dezembro, e 38/2003, de 8 de Março, pelas Leis n.ºs 52/2003, de 22 de Agosto, e 100/2003, de 15 de Novembro, pelo Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março, e pelas Leis n.ºs 11/2004, de 27 de Março, 31/2004, de 22 de Julho, 5/2006, de 23 de Fevereiro, 16/2007, de 17 de Abril, 59/2007, de 4 de Setembro, 61/2008, de 31 de Outubro, 32/2010, de 2 de Setembro, 40/2010, de 3 de Setembro, 4/2011, de 16 de Fevereiro, 56/2011, de 15 de Novembro, 19/2013, de 21 de Fevereiro, 60/2013, de 23 de Agosto, pela Lei Orgânica n.º 2/2014, de 06 de Agosto e pelas Leis 59/2014, de 26 de Agosto, 69/2014, de 29 de Agosto, 82/2014, de 30 de Dezembro, pela Lei Orgânica n.º 1/2015, de 08 de Janeiro e pelas Leis n.º 30/2015, de 22 de Abril, 81/2015, de 03 de Agosto, 83/2015, de 05 de Agosto, 103/2015, de 24 de Agosto, 110/2015, de 26 de Agosto e 39/2016, de 19 de Dezembro.

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Finalmente, o artigo 389.º procedia à definição do conceito de animal de companhia para efeitos de aplicação penal, considerando como tal “… qualquer animal detido ou destinado a

ser detido pelo homem, designadamente no seu lar, para seu entretenimento e companhia”.

Já o projecto de lei n.º 474/XII do Partido Socialista, apesar de também prever a criminalização dos maus-tratos a animais de companhia não previa alterações ao Código Penal mas à Lei n.º 92/95, de 12 de Setembro (Lei de Protecção dos Animais).

Além de prever a alteração de dois artigos253 e uma pequena alteração sistemática254, este projecto propunha o aditamento de quatro novos artigos à Lei de Protecção dos Animais. O novo artigo 11.º estabelecia no seu n.º 1 que aquele que “…praticar um acto de violência

injustificada contra um animal de companhia, independentemente da titularidade do mesmo…” seria punido com pena de prisão de seis meses a dois anos ou com pena de multa,

prevendo no n.º 2 o agravamento em função do resultado – lesões permanentes ou morte – da pena de prisão, que passaria de um a três anos.

O n.º 3 do mesmo artigo procede à especificação daquilo que se deve entender por «acto de violência injustificada», definindo como tal os actos praticados sem necessidade, sem justificação, sem permissão específica ou, quando aplicável, sem autorização, que causem sofrimento a um animal de companhia e o alojamento de animais de companhia em condições que ponham em causa a sua saúde, o seu bem-estar e a sua vida.

Mais se acrescenta, ainda no artigo 11.º proposto que, quer a tentativa, quer a negligência seriam puníveis, que o procedimento criminal depende de queixa e que a reincidência seria punida com a elevação em um terço dos limites mínimos e máximos das penas previstas. O artigo 12.º previa a instauração de um regime contra-ordenacional a aplicar caso se verificasse alguma das condutas previstas no n.º 3 do artigo 1.º, no artigo 2.º ou no artigo

253 A alteração do art.º 9.º, que remetia a definição do quadro sancionatório dos actos proibidos para lei especial

(que nunca chegou a existir), inscrevendo aqui a legitimidade das associações zoófilas para requerer a todas as autoridades e tribunais as medidas adequadas a evitar violações da presente lei (que já constava, no essencial, do artigo 10.º), e a alteração do artigo 10.º, mantendo a possibilidade de as associações zoófilas se constituírem como assistentes em todos os processos originados ou relacionados com a presente lei, ficando dispensadas do pagamento de custas e taxas de justiça e acrescentando a inclusão das associações zoófilas no regime previsto na Lei n.º 35/98, de 18 de Julho, para as organizações não-governamentais do ambiente.

254 Esta lei apenas compreendia 3 capítulos: «Princípios gerais», «Comércio e espectáculos com animais»,

«Eliminação e identificação de animais pelas câmaras municipais», e o projecto previa a inclusão de mais dois capítulos. Um que permitisse enquadrar de forma mais adequada os artigos 9.º e 10.º, sob a epígrafe «Associações Zoófilas» e um novo capítulo epigrafado de «Regime Sancionatório», para enquadrar os novos artigos cujo aditamento se propunha.

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3.º255, associando-lhes contra-ordenações puníveis com coima de 500 a 5.000 euros no caso de pessoa singular e de 1.500 a 60.000 euros no caso de pessoa colectiva, prevendo igualmente o agravamento em caso de reincidência (com a elevação, em metade do valor, dos montante mínimos e máximos).

Quanto ao destino das coimas, este projecto de lei propunha no seu artigo 14.º que estas revertessem em 60% para o Estado, devendo a entidade que levantou o auto e a DGAV (Direcção-Geral de Alimentação e Veterinária) dividir o remanescente, sendo atribuída a competência para sua instauração ao Director-Geral de Alimentação e Veterinária. Quanto à competência para assegurar a fiscalização das normas previstas e a elaborar autos de contra- ordenação, esta era atribuída, em especial, à DGAV, às autarquias locais, às polícias municipais, à GNR, à PSP e às demais forças de segurança, bem como à ASAE.

Finalmente, este projecto de lei previa ainda a aplicação de penas e sanções acessórias, cumulativamente com pena ou coima, de acordo com a gravidade do ilícito e com a culpa do agente, ditando a perda a favor do Estado de animais ou objectos propriedade do agente; a privação do direito de detenção de animais até dez anos; a privação do direito de participar, até ao máximo de três anos, em feiras, mercados, exposições e concursos; encerramento do estabelecimento sujeito a autorização ou licença administrativa, até ao máximo de três anos; suspensão de permissões administrativas, até três anos.

Os pareceres solicitados

Na reunião plenária realizada no dia 6 de Dezembro de 2013 realizou-se a discussão conjunta dos dois projectos de lei apresentados e da petição que lhes deu origem, seguida da votação e aprovação, na generalidade, dos dois projectos.256

Assim, ambos os projectos desceram à Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias para a discussão na especialidade257, tendo a Comissão deliberado

255 Que regulam o regime de licenciamento municipal e outras autorizações, respectivamente.

256 Nos termos do n.º 1 e do n.º 2 do artigo 168.º da Constituição da República. Os projectos foram aprovados na

generalidade com o voto contra de cinco deputados do CDS-PP, com a abstenção do PCP e de outros cinco do CDS-PP e o voto favorável das restantes bancadas e deputados.

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solicitar pareceres ao Conselho Superior do Ministério Público, ao Conselho Superior de Magistratura e à Ordem dos Advogados.258

Os pareceres emitidos pela Ordem dos Advogados destacaram-se pela concisão. Demonstraram o seu agrado geral com os projectos apresentados referindo apenas, no que toca ao projecto da autoria do PS, que seria sensata a redução das penas de prisão consideradas259, e sugerindo, a respeito do projecto n.º 475/XII do PSD, que se alterasse a redacção de conceito de animal de companhia.260

Por sua vez, os pareceres enviados da parte do Conselho Superior do Ministério Público apresentam já um desenvolvimento maior, debruçando-se sobre problemas e limitações na aplicação prática das normas propostas.

Assim, a respeito da proposta apresentada pelo Partido Socialista, a primeira consideração tecida refere que a introdução de alterações à Lei n.º 92/95, de 12 de Setembro em nada contribuirá para que sejam dados passos no sentido da codificação e sistematização da legislação avulsa e dispersa, como parecia ser intenção na exposição de motivos que antecede o projecto de lei.

A respeito da alteração proposta ao artigo 9.º referem que seria necessária posterior concretização, por via legislativa, da ideia de “medidas preventivas e urgentes” e levantam também dúvidas quanto ao conceito de “violência injustificada” inserido no n.º 1 do artigo 11.º - admitindo a sua utilização para garantir a exclusão de actos de violência com cobertura legal (como a tauromaquia, por exemplo) da tutela penal, não deixam de referir a sua redundância em face da redacção do n.º 1 do artigo 1.º da Lei n.º 92/95, de 12 de Setembro.261 Tecem ainda críticas à previsão do carácter semipúblico do procedimento criminal, dado que nada mais é dito quanto à legitimidade para apresentação de queixa, sobretudo quando estejam em causa actos de violência cometidos pelo próprio proprietário ou utilizador do animal. Fica por responder se, nestes casos, a legitimidade caberá às associações zoófilas,

258 Os pareceres emitidos a respeito dos projectos de lei n.º 474/XII e n.º 475/XII podem ser consultados,

respectivamente aqui: http://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=38076 e aqui:http://www.parlamento.pt/ActividadeParlamentar/Paginas/DetalheIniciativa.aspx?BID=38087

259 Sugeriram a redução da moldura penal prevista no n.º 1 do artigo 11.º - de seis meses a dois anos - para dois

meses a 18 meses. Já na situação prevista no n.º 2 do referido preceito, de agravamento pelo resultando, propuseram que a moldura proposta – pena de prisão de um a três anos ou pena de multa – deveria ser reduzida para pena de seis meses a dois anos, determinando-se que a pena de multa não deveria ser inferior a 18 meses.

260 A sugestão efectuada foi que a redacção passasse a: “Para efeitos do disposto neste título, entende-se por

animal de companhia, qualquer animal mantido em agregados familiares, para companhia dos seus membros”

261 Que estabelece que: “São proibidas todas as violências injustificadas contra animais, considerando-se como

tais os actos consistentes em, sem necessidade, se infligir a morte, o sofrimento cruel e prolongado ou graves lesões a um animal”.

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uma vez que, nos termos do n.º 1 do artigo 113.º do Código Penal, apenas se vislumbra a hipótese de ser o próprio proprietário considerado como o titular dos interesses que a lei especialmente quis proteger com a incriminação.

Finalmente, colocam a hipótese de inconstitucionalidade, por violação no n.º 3 do artigo 29.º da Constituição da República, da norma prevista no artigo 13.º, dada a total confusão entre as penas e as sanções acessórias e a não previsão específica de a que ilícito se aplicam em concreto.

Já a respeito da proposta apresentada pelo Partido Social Democrata, referem que o Decreto- Lei n.º 176/2001, de 17 de Outubro («Estabelece as normas legais tendentes a pôr em aplicação em Portugal a Convenção Europeia para a Protecção dos Animais de Companhia e um regime especial para a detenção de animais potencialmente perigosos») já previa o conceito de animal de companhia na alínea a) do n.º 1 do artigo 1.º, razão pela qual é redundante a duplicação de conceitos. Também em relação ao abandono, previsto no artigo 6.º-A, chama-se à atenção para a necessidade de harmonização legislativa, dado que este já seria punido com coima entre os 500 e os 3740 euros, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 68.º da referida lei.

O último dos pareceres a merecer a nossa referência será o parecer remetido pelo Conselho Superior de Magistratura, que ganha destaque pelo aprofundamento da análise e pelo teor das questões colocadas.

De facto, é o único dos pareceres que aborda a questão de estarmos perante uma neocriminalização e haver, portanto, necessidade de trazer à colação a problemática da restrição a direitos fundamentais e da sua justificação constitucional.

Assim, o parecer traz à lide, a par do direito de propriedade previsto no n.º 1 do artigo 62.º, o direito à liberdade, consagrado no n.º 1 do artigo 27.º da Constituição e a possibilidade da sua restrição em face da aplicação de pena de prisão legalmente prevista, inscrita no n.º 2 do mesmo preceito.

O art.º 27.º insere-se no capítulo dos «direitos, liberdades e garantias», gozando assim do seu estatuto específico, especialmente atendendo a que qualquer restrição de que este venha a