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O sítio arqueológico de Vilar, também conhecido por Vila Verde, junto de Alfundão é muito profícuo em indícios de ocupação entre os Séculos I e XIII. Neste local existiu um uicus que deverá ter correspondido a sede de ma paróquia a atestar pelos indícios registados por Abel Viana. Uma leitura atenta da descrição feita por este investigador em 1954 permite esclarecer melhor alguns dados. Citando José Leite de Vasconcelos, informa-nos que no primeiro terço do século XX foram recolhidos neste local mármores trabalhados, que se julgavam romanos tendo como ponto de comparação outras as peças que José Leite de Vasconcelos conhecia no Alentejo (VIANA, 1954: 9 e 10)12. No mesmo sítio tinham sido descobertos fragmentos de talhas, de panelas, de telhas, moedas romanas de cobre e moedas de prata islâmicas. Abel Viana indica ainda que José Leite de Vasconcelos viu as moedas de cobre, considerando que eram do tempo de Constantino, datando do século IV (Idem, ibidem: 10). Incluindo no seu texto alguns testemunhos de pessoas mais idosas de Alfundão, o autor foi ainda mais longe, afirmando que a esta aldeia fora mudada dos sítios de Vila Verde e Vilar para o local onde se encontra na actualidade porque os terrenos eram ali muito barrentos (Idem, ibidem). Um importante proprietário local tê-lo-á informado que, necessitando de material para construções, solicitou ao dono dos terrenos de Vila

12 Deve ter-se em consideração que, segundo Abel Viana, José Leite de Vasconcelos nunca esteve em Alfundão, pelo que este insigne investigador não viu pessoalmente as peças paleocristã deste local.

Verde e Vilar autorização para recolher os destroços que ali existiam, tendo mandado executar escavações onde recolheu muitas pedras e grandes fragmentos de cerâmica. No decorrer destas, terá sido encontrada uma sala com pavimento em opus uermiculatum, com “desenhos muito bonitos”, a par de paredes que preservavam ainda 10cm de altura e tinham uma espécie de debrum feito de argamassa (opus signinum) (Idem, ibidem: 10). Abel Viana destacou ainda o testemunho de um trabalhador, que lhe assegurou ter encontrado uma talha cheia de entulho e ossadas de cadáveres, que o investigador considerou não serem humanos, no decorrer de abertura de covas para plantação de oliveiras. O mesmo ter-lhe-á indicado ainda que numa outra ocasião, no mesmo tipo de serviço, com mais trabalhadores, encontrara muitos alicerces com pavimentos de “pedrinhas de cores” (mosaicos) e que entre estes alicerces existiam ruas pavimentadas, acrescentando ainda que, pela forma de tantos alicerces, os trabalhadores ficaram a pensar que ali existira uma igreja com uma grande laje em frente da entrada (VIANA, 1954: 10). Abel Viana acrescentou ainda que outras pessoas tinham encontrado ali moedas, colheres de prata, bocados de talhas e coisas de ferro, entre outras coisas, e que em 1866 a actual Igreja Matriz de Alfundão foi reconstruída e muito transformada, tendo sido empregues nessas obras muitas pedras levadas de Vilar. Pelo que deixa transparecer no texto, acrescentou que outras pedras trabalhadas com motivos paleocristãos, com a mesma proveniência, foram aplicadas no lajeado diante do portal principal da igreja, ficando com as faces lavradas para cima. Desta forma, com o trânsito a passar sobre elas e, sobretudo porque os jovens se entretinham a percutir as pedras, precisamente para destruir os ornatos, as decorações já tinham desaparecido em 1954 (Idem, ibidem, 1954: 10 e 11). Destacou ainda o facto de uma das peças então reutilizadas ter sobrevivido, afirmando que isso se devia às suas dimensões. Dela fez uma descrição mais pormenorizada, integrando-a no grupo de placas ornamentais, acreditando tratar-se de um suporte de altar. Trata-se do pilar ou suporte de transenna de iconostase que ainda hoje se encontra encostado à parede sul da cabeceira da Igreja Matriz de Alfundão. Em Maio de 1954, o Sr. José António dos Santos, proprietário dos terrenos de Vilar, ofereceu ao Museu de Beja o colunelo que se encontra depositado no núcleo visigótico da Igreja de Santo Amaro e que outra peça, que se encontrava a servir de batente num portal lhe tinha sido entregue para seguir o mesmo destino (Idem,

Pelos dados apresentados, pode afirmar-se que existiu um uicus junto de Alfundão, com importância suficiente para ter uma basilica, muito provavelmente, em finais do século VI, ou nos inícios do século VII. A ecclesia teria alguma monumentalidade, a atestar pelos elementos arquitectónicos ali recolhidos. A actual aldeia de Alfundão era uma povoação relativamente importante em época islâmica, aparecendo mencionada na delimitação do território de Alcácer do Sal, aquando da doação desta cidade à Ordem de Santiago de Espada em finais do século XII13. A deslocalização deste povoado para o local onde actualmente se situa Alfundão poderá ter ocorrido no âmbito de uma reorganização territorial, executada com novos pressupostos políticos, económicos e geográficos, que ocorreu durante a baixa idade média, sobretudo na segunda metade do século XIII, altura em que o mesmo acontece nesta zona geográfica com Alvito, onde se abandona São Romão e ocupa o planalto onde actualmente se localiza a vila; com Viana do Alentejo, quando Foxem, eventualmente situada em Nossa Senhora d’Aires, é abandonada e criada Viana de a Par de Alvito, ou como Vila Nova da Baronia, quando, pouco depois de 1262 a vila de Mugia d’Arem foi abandonada para dar lugar a Vila Nova de Alvito e com Bonalbergue ou Oriola, deslocada para o local onde hoje se encontra em finais do século XIII.

Infelizmente, não se conhecem plantas das paredes ali encontradas e receamos que tenham sido completamente destruídas em 1954. Desta forma, com os dados apresentados, não foi possível perceber se este uicus evoluiu a partir de uma uilla ou se já era uma mansio em época romana. De qualquer maneira, considera-se que as informações obtidas e transmitidas por Abel Viana são muito importantes para esclarecer todas as dúvidas sobre os materiais paleocristãos de Alfundão.