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A IMIGRAÇÃO ALEMÃ 82 PARA O BRASIL E SUAS REFRAÇÕES NA ESFERA ESCOLAR

4.024/1961, duração mínima de quatro anos O ensino secundário no Brasil ganhou

3 METODOLOGIA E PRIMEIROS PASSOS DA PESQUISA

4 REFLEXÕES SOBRE A ESCOLA, A CULTURA ESCRITA E A CULTURA ESCOLAR EM BLUMENAU: O INÍCIO

4.1 A IMIGRAÇÃO ALEMÃ 82 PARA O BRASIL E SUAS REFRAÇÕES NA ESFERA ESCOLAR

Como apontam Ruivo (2010) e Bergamasch e Silva (2007), ao chegarem ao Brasil83, os conquistadores portugueses pouco se interessaram pela terra recém-conquistada. Apenas após 1530, quando a hegemonia portuguesa no comércio com o Oriente foi abalada, eles voltaram os olhos para o Brasil, primeiro com objetivo extrativista centrado na exploração do pau-brasil e, em seguida, após a expedição de Martim Afonso de Souza de 1532, para o cultivo de cana-de-açúcar.

Ao longo do final da década de 1540 e nos anos seguintes, a questão da mão de obra foi tornando-se crítica; os portugueses que emigravam não desejavam trabalhar na lavoura de cana-de- açúcar e o índios, dada a sua própria cultura, resistiam ao trabalho escravo (RUIVO, 2010). Ainda, tenha sido pela violência do colonizador, pela fragilidade às doenças dos brancos – à varíola, à sífilis, ao sarampo e mesmo à gripe – contra as quais não tinham anticorpos, ou ainda pelo grande número de suicídios, a população indígena foi sendo dizimada e os que sobreviviam se refugiavam na floresta em pontos mais distantes (INGLÉSIAS, 1992).

A necessidade de mão de obra para mover os engenhos de cana-de-açúcar motivou, então, a importação de escravos africanos. Marquese (2006) aponta que, entre 1576 e 1600, cerca de 40.000 escravos africanos chegaram aos portos brasileiros, tendo esse número dobrado entre 1601 e 1625. O

82 Sabemos que a política de imigração europeia para o Brasil envolveu contigentes populacionais de diversos países, mais especificamente, no caso do sul do Brasil, envolveu italianos e alemães. Dado o recorte da pesquisa, focaremos principalmente a imigração alemã, sem, no entanto, ignorarmos o papel e a dimensão que a imigração italiana teve na mesma época.

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Procuraremos evitar o uso do termo descobrimento, julgado inadequado por diversos autores, que argumentam que o uso desse termo aponta no sentido de uma visão eurocêntrica (IGLÉSIAS, 1992; RUIVO, 2010), a qual toma os territórios descobertos pelos conquistadores como inabitados na época em que foram conquistados, o que seria uma inverdade no caso do Brasil e da América como um todo. Iglésias (1992, p. 23) assim se posiciona a esse respeito: “[...] A expressão descobrimento implica em uma idéia imperialista, de encontro de algo não conhecido; visto por outro que proclama sua existência, incorporando-o ao seu domínio, passa a ser sua dependente.”.

tráfico negreiro atingiu seu auge entre 1741 e 1760, quando 354 mil escravos africanos chegaram ao Brasil.

Já nessa época, porém, o número de alforriados vinha crescendo principalmente entre as mulheres, seus filhos nascidos no Brasil, os mais idosos e os escravos urbanos. Segundo Marquese (2006), no início do século XIX, a população Brasileira (oficialmente contabilizada em estatísticas e censos) era composta por: 28% de brancos; 27,8% de negros livres e mulatos; 38,5% de escravos negros e mulatos e 5,7% de ameríndios. Essa composição populacional, bastante diferente daquela encontrada nas colônias portuguesas na África e nas colônias Inglesas e Francesas no Caribe e no sul dos Estados Unidos, onde a miscigenação foi significativamente menor, somada às pressões inglesas no sentido de proibir/coibir o tráfico negreiro84, representavam um ponto de tensão. Para diluir essa tensão, o governo regencial adotou medidas que levaram à redução do tráfico de escravos, ainda que esse, como apontam Mariani e Furtado (2004), continuasse ocorrendo em larga escala.

A partir de 1845, em virtude da Bill Aberdeen, lei inglesa que tinha como objetivo coibir o tráfico negreiro e que dava à Marinha de Guerra Inglesa o direito de perseguir e aprisionar navios negreiros, o tráfico foi se tornando mais arriscado e menos lucrativo, o que contribuiu para o seu enfraquecimento. Cinco anos depois, iniciou-se, no Brasil, em virtude das pressões externas, mas também de pressões internas, derivadas principalmente dos interesses dos fazendeiros do Oeste Paulista, um processo gradativo de coibição da escravatura, o qual culminou com a libertação dos escravos em virtude da publicação da Lei Áurea, em 1888 (MARQUESE, 2006).

O fazendeiros paulistas incentivavam a substituição da mão de obra escrava pelo trabalhador europeu assalariado, o qual possuiria capacidade de consumo e fomentaria a formação

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Desde o início do século XIX, consolidava-se, na Inglaterra, importante aliado da Coroa Portuguesa, a Revolução Industrial. Era interesse dos ingleses que a mão de obra utilizada nas colônias portuguesas se tornasse assalariada, representando, assim, um novo mercado consumidor para os produtos vindos da Inglaterra. Essa foi, então, uma das razões principais que moveram aquele país no sentido de pressionar a Coroa Portuguesa para a libertação dos escravos.

de um mercado interno (ainda, que inicialmente, bastante reduzido).

De fato, a imigração europeia não portuguesa teve início pouco depois da chegada de D. João VI ao Brasil85, quando o rei de Portugal abriu os portos brasileiros às nações amigas e elevou o Brasil à condição de Reino Unido, mas alcançou seu auge após 1850 (após a publicação da Lei Eusébio de Queiroz), em virtude, justamente, da premência de substituir a mão de obra escrava nas lavouras de café (principalmente do Oeste Paulista) (CORRÊA, 2005). Para Corrêa (2005), as políticas públicas para implementação da imigração europeia então instituídas tinham como objetivo: (1) o “branqueamento” da população brasileira, formada então por um grande número de negros e mestiços; (2) a “melhoria da qualidade da população”, elevação do grau de instrução, criação de hábitos e costumes mais semelhantes aos “europeus” e combate à corrupção administrativa; (3) a ocupação de áreas estratégicas no que diz respeito a questões de ordem geopolítica; (4) a criação de uma classe média agrária, resultado da transformação da estrutura fundiária, a qual estaria voltada à produção de alimentos para o mercado interno; (5) a criação/fortalecimento desse mercado; (6) a substituição da mão de obra escrava por uma mais qualificada e com melhor domínio das práticas agrícolas.

Seyferth (2000) ressalta que o marco imigratório inicial oficial se dá com a chegada ao Brasil, em 1819, de 1700 imigrantes suíços, todos constituindo unidades familiares, que fundaram a colônia de Nova Friburgo, na região serrana do Rio de Janeiro. No decreto de 16/05/1818, que autorizou a imigração suíça para o Brasil, era realçado o interesse do governo português por imigrantes europeus brancos, preferencialmente agricultores e artífices, que pudessem "promover e dilatar a civilização do vasto Reino do Brasil", ou seja, “nos termos dos discursos imigrantistas desde essa época, gente „afeita‟ ao trabalho.” (SEYFERTH, 2000, s/p).

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Ainda que ao longo do século XVIII tenham chegado ao Brasil um número expressivo de açorianos, os quais se fixaram principalmente no Sul do Brasil (1716, 1720, 1748) e no Pará (1763), esses colonos, segundo Corrêa (2005), não são considerados imigrantes não portugueses.

Na mesma época, surgiram, na Bahia, a colônia Leopoldina e outras duas colônias, para onde se deslocaram imigrantes alemães, com o objetivo principal de buscar resolver o problema do fornecimento de alimentos para o mercado interno, principalmente para grandes núcleos populacionais, como Rio de Janeiro e Salvador, prejudicado pela escassez da mão de obra escrava (CORRÊA, 2005)86.

Para tanto, Carmo (2010) explica que, em 1818, foram doadas as primeiras sesmarias para formação de colônias agrícolas em atenção ao decreto de 1818. Em 1820, um outro decreto assinado por D. João VI estabelecia a cessão de terras para fixação de estrangeiros no país e criava um fundo de subvenções a imigrantes. Caberia ao governo português pagar despesas de viagem, subsidiar os imigrantes nos primeiros tempos na colônia e isentá-los do pagamento de impostos por dez anos. A colonização era, entretanto, dirigida de forma a não contrariar os interesses dos fazendeiros: as colônias deveriam ser agrícolas, localizar-se em locais pouco povoados e distantes de centros urbanos e não fazer uso de trabalho escravo (a não ser para derrubada das matas) (CARMO, 2010; HANDELMANN, 1931 [1859]) 87.

É importante, todavia, compreender a imigração dentro da lógica da época. Corrêa (2005) menciona que o período pombalino (1760 – 1808) foi marcado pelo início da propagação das ideias Iluministas em Portugal e, por extensão, no Brasil. A preferência pela imigração alemã para o Brasil já era citada em cartas trocadas pelo marquês de Pombal com Sebastião José de Carvalho e Melo e com Manuel Teles da Silva, em meados do século XVIII (CORRÊA, 2005), ainda que se temesse o fato de

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Tanto a imigração suíça para Nova Friburgo quanto a imigração alemã para a Bahia foram marcadas pelo insucesso. Seyferth (2000) credita a esse insucesso, além da inexpressividade do número de alemães envolvidos nesse processo - um número pouco superior a 200 imigrantes registrados até o ano de 1822 (FOUQUET, 1974 apud SEYFERTH, 2000) -, o fato de a fundação de São Leopoldo (nas proximidades da cidade de Porto Alegre - RS), em 1824, ter se tornado o marco emblemático da imigração alemã para o Brasil.

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As experiências iniciais de imigração diferem daquelas que foram empreendidas por cafeicultores a partir de 1840. Nessas últimas, o acesso à terra foi negado aos imigrantes, os quais foram utilizados para substituir a mão de obra escrava na lavoura agroexportadora, como trabalhadores assalariados, sem terem direito à posse de terra.

muitos alemães serem protestantes, o que poderia trazer problemas junto à Igreja Católica.

O próprio movimento de independência e os sujeitos que influenciaram mais fortemente os destinos do Brasil durante o primeiro reinado também tinham formação iluminista. Dentre eles, ressalta-se José Bonifácio de Andrade e Silva, que, entre outras personalidades da época88, compreendia que só através do trabalho livre seria possível alcançar o “progresso” e “civilizar” o país. Segundo Corrêa, para esse grupo de sujeitos, “a escravidão era a responsável por todos os males que assolavam o país, pois os negros seriam boçais e preguiçosos, imorais (prostituíam-se), ociosos e dados a todos os vícios, e dessa forma corromperiam toda a sociedade.”(CORRÊA, 2010, p. 8). Era esse argumento que sustentava, de certa forma, a tese do “branqueamento” da população.

O desejo de atrair imigrantes europeus e as motivações que apontamos até aqui podem ser ilustrados com dois excertos (de um relatório e de um discurso, respectivamente) citados por Piccolo (1997) em sua pesquisa a respeito da imigração alemã para o Rio Grande do Sul, os quais citamos abaixo:

Na opinião geral, é considerada a colonização a necessidade mais palpitante do Império: a vastidão das terras desertas que não quereis sem dúvida povoar com negros... [sic.] (relatório do presidente da Província de São Pedro do Rio Grande do Sul, Manuel Antônio Galvão, dirigindo-se à Assembleia Legislativa de outubro de 1847, PICCOLO, 1997, p.165).

[...] nós queremos colonos alemães, porque a colonização alemã significa trabalho, indústria, agricultura e sobretudo aumento do número de cidadãos. (discurso do deputado Félix da Cunha, na Assembleia Legislativa da

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Some-se aqui os nomes de Luís dos Santos Vilhena (nascido em Portugal, em 1744, foi nomeado professor régio de língua grega em Salvador, em 1787. É autor de algumas obras sobre a sociedade soteropolitana, entre elas, Notícias soteropolitanas e brasílicas) e de João Severiano Maciel (Marquês de Queluz - nascido em Mariana (MG), em 1769, era formado em direito pela Universidade de Coimbra e pertenceu ao Conselho de D. João VI e ao Conselho do Imperador D. Pedro I).

Província de São Pedro do Rio Grande do Sul, em outubro de 1862, PICCOLO, 1997, p.165).).

No primeiro excerto, parece clara a valoração negativa emprestada não propriamente ao trabalho escravo, mas à presença do negro na região. Como afirma Bakhtin (1998 [1975]), quando o sujeito entra em relação com o objeto do discurso, já o encontra entrecruzado de índices de valor que o valoram de diferentes formas. Esses valores estão de certa maneira atrelados ao horizonte apreciativo do grupo social do qual o sujeito faz parte, assim todo o discurso encontra seu objeto “[...] iluminado pelos discursos de outrem que já falaram sobre ele. “ (BAKHTIN, 1998 [1975], p. 86). Como afirma Corrêa (2010), parte influente da elite política do país, durante o início do século XIX, atribuía aos negros muitos dos problemas existentes no Brasil, em oposição ao posicionamento dos grandes proprietários de terra, que buscavam à força manter “os braços” da mão de obra escrava que haviam alimentado os latifúndios exportadores.

No segundo excerto, revela-se aquilo que era esperado dos alemães e, mais do que isso, revela-se uma das crenças que os brasileiros tinham a respeito desses imigrantes: “esse era um povo afeito ao trabalho”, algo que se opunha à pretensa “indolência” do escravo africano e que, poderia, nos termos realçados por Handelmann (1931 [1859])89, ser a solução para a economia brasileira quando ocorreu a redução da mão de obra escrava, a partir da adoção de uma política de imigração espontânea e fixação em pequenas propriedades. Assim se expressa Handelmann, a esse respeito: “Que resta, então, como único recurso recommendavel para o Brasil? A immigração européa livre e voluntaria (espontanea), um ininterrupto affluxo

89 Handelmann era alemão, historiador e professor na universidade de Kiel. Dedicou- se a escrever sobre a história de diversos países americanos, entre eles os Estados Unidos, o Haiti e o Brasil. Sua obra, História do Brasil, publicada originalmente em 1860, foi traduzida para o português, no início dos anos 1930 e publicada na Revista do Instituto Históirico e Geográfico Brasileiro. Na introdução do texto (uma dedicatória ao príncipe alemão Adalberto da Prússia), ao qual nós aqui fazemos referência, realça a importância de se escrever sobre um país que vinha “offerecendo uma nova pátria aos [...] compatriotas [alemães] levados a emigrar” e que, há muito, vinha despertando o interesse do próprio príncipe alemão.

de lavradores, como o que agora, anno após anno, vai rolando para a America do Norte.” (HANDELMANN, 1931 [1859], p. 979). Das palavras de Handelmann, depreende-se também o interesse alemão nessa imigração. Para isso, todavia, segundo o autor, o Brasil precisaria rever sua política imigratória e abrir mão de agenciadores, cujos “abusos” haviam contribuído para a má-fama da empreitada colonizadora brasileira na Alemanha.

Segundo Seyferth (1993), a preferência do governo brasileiro por imigrantes alemães se justificava em virtude da presença de alemães na corte e no exército brasileiro e em virtude da gestão do principal agenciador de imigrantes até 1829, o major Schaffer, oficial do corpo de guardas do Imperador. Já Handelmann (1931 [1859]) destaca o papel de J. D. Sturz, imperial cônsul geral do Brasil na Prússia, no papel de mediador dessa imigração e, segundo o autor, defensor dos interesses do Brasil e dos alemães. Além disso, até a metade do século XIX, muitos estados germânicos (principalmente a Prússia) eram regiões de emigração (dirigida preponderantemente aos Estados Unidos, como se observa no excerto supracitado), ação fomentada pelo superpovoamento de algumas regiões; pelo esgotamento das terras, pouco promissoras para a agricultura; e pela incipiência da industrialização, incapaz de absorver a população rural, então, bastante empobrecida (RAMBO, 2003).

A preferência do governo brasileiro por imigrantes que fossem trabalhadores rurais ficou mais evidente a partir da regulamentação da Lei de Terras em 1854, o que facilitou aos estrangeiros o acesso a terras devolutas e regulamentou a colonização, abrindo espaço para a atuação de empresas particulares como agentes de imigração e para a ação de governos provinciais nesses assuntos.

Ainda, contaram a favor da imigração alemã para o sul do Brasil, os seguintes aspectos: (1) o fato de tanto alemães quanto italianos terem praticado durante séculos a agricultura familiar organizada em pequenas propriedades; (2) de não terem problemas anteriores com a Coroa Portuguesa, inclusive no que tange à disputa de terras (como representaram franceses, holandeses e ingleses); (3) de não representarem problemas para a delimitação de fronteiras ao sul, como representariam os espanhóis; (4) o casamento de D Pedro I com a princesa austríaca Dona Leopoldina (RAMBO, 2003).

No que tange à Santa Catarina, segundo Deeke90 (1995 [1917]), o início da colonização alemã se efetivou oficialmente em 1828, com a fundação da Colônia São Pedro de Alcântara91. Nos anos seguintes, alguns outros núcleos coloniais foram estabelecendo-se no estado, ainda que, em muitos, os colonos passassem muitas dificuldades, resultado, principalmente, da natureza do solo, que pouco se prestava a atividades agrícolas.

No entanto, a partir da metade dos anos 184092, as atividades colonizadoras no Brasil ganharam novo incremento, e, no início dos anos 1850, duas novas colônias foram criadas, a Colônia Dona Francisca (hoje, Joinville) – aonde os primeiros imigrantes alemães chegaram em 09 de março de 1851 – e a Colônia Blumenau.

A colônia de Blumenau, inicialmente (entre 1850 e 1859) um empreendimento particular, foi fundada pelo Dr. Hermann Bruno Otto Blumenau93 em 02 de setembro de 1850, data em

90 José Deeke nasceu em Blumenau em 1875 e faleceu também em Blumenau em 1931. Era cartógrafo, agrimensor e historiador. Foi Diretor das Colônias Hanseáticas (Hansa Hammonia – hoje região correspondente à Ibirama, Presidente Getúlio, Vitor Meireles, José Boiteux, Dalbérgia, Dona Emma, Wittmarsum, Serra dos Índios, Mirador – e Hansa Humboldt – hoje Corupá). Fez seus estudos iniciais na Escola São Paulo, em Blumenau (posteriormente, Colégio Franciscano Santo Antônio), e, não havendo no estado colégio mais avançado recebeu lições de engenharia e cartografia com seu tio, o engenheiro Heinrich Krohberger, e de matemática superior com um professor particular, tornando-se posteriormente cartógrafo e agrimensor diplomado através de concurso prestado em Florianópolis. Os registros de Deeke constituem fonte importante de pesquisa a respeito das primeiras décadas da colônia de Blumenau.

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Deeke aponta que a data deveria ser 1829, pois apesar de os colonos terem chegado ao Brasil em 1828, somente em 1829 eles puderam efetivamente ser transferidos de Desterro para a região da colonização. Essa demora na transferência dos colonos fez com que algumas famílias (14 famílias das 146 que originalmente iriam para a colônia) permanecessem em Desterro, onde já haviam se adaptado. 92

Seyferth (2000) aponta que apesar de em menor número do que italianos, portugueses e espanhóis, a imigração alemã foi bastante significativa entre 1824 e 1947, concentrando-se no período anterior à 1ª Guerra Mundial e nos primeiros anos da década de 1920, no auge da crise da República de Weimar. Essa concentração, ainda segundo a autora, devia-se a questões de natureza econômica, mas também a questões de ordem política, que levaram principalmente revolucionários de 1848 (envolvidos em um conjunto de revoluções que foi denominado de Primavera dos Povos) a deixarem a Alemanha.

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Ainda que a associação do título de Doutor (Dr.) ao nome do fundador da cidade de Blumenau (e seu administrador durante as primeiras décadas de existência) constitua um índice de valor, preferimos nomeá-lo, nesta tese, em respeito à cultura local, Dr. Hermann Bruno Otto Blumenau ou, simplesmente, Dr. Blumenau, com ele é

que chegaram à colônia os primeiros dezessete imigrantes. Em 1860, dadas as dificuldades financeiras pelas quais passava a colônia, Dr. Blumenau entregou-a ao governo imperial, tendo Blumenau se constituído como colônia imperial entre 1860 e 1882. Em 1883, Blumenau foi elevada à categoria de vila e, em 28 de julho de 1894, foi elevada à categoria de cidade.

A região então ocupada pelo município era de 10.000km2, área significativamente mais ampla do que os atuais 519,83 km²; e incluía, além da área da atual cidade de Blumenau, a extensão territorial hoje englobada por Rio do Sul (separada de Blumenau em 1930); Ibirama, Timbó, Gaspar e Indaial (desmembradas em 1935); Rodeio (desmembrada em 1936); Taió e Ituporanga (que se separaram em 1948) e uma série de outros 31 pequenos municípios que foram desmembrados na década de 1960.

De acordo com Deeke (1995 [1917]), quando Blumenau foi fundada pelo Dr. Hermann Blumenau, outras colônias já haviam sido criadas no Vale do Itajaí. Em 1835, foi criada a colônia chamada Itajaí, a qual foi praticamente abandonada nos anos seguintes, em virtude dos ataques constantes dos indígenas em Camboriú. Apenas em 1838, sendo “controlados” esses ataques, os imigrantes voltaram à colônia, posteriormente chamada de São Luiz Gonzaga. Também a região onde hoje existe o município de Brusque contava com um núcleo colonial. Além disso, na região, existiam numerosos colonos94 alemães, que ali

usualmente referido na cidade. Ressaltamos que Dr. Blumenau era farmacêutico e químico, tendo concluído seus estudos de doutorado sobre “Alcalóides e as salinas afins em suas relações e correlações” na Faculdade de Filosofia, em Erlangen, Alemanha, poucos anos antes de visitar o Brasil pela primeira vez, em abril de 1846 (SILVA, 1978). Nessa ocasião, Dr. Blumenau era representante da "Sociedade de Proteção aos Emigrantes Alemães", fundada em Hamburgo, que tinha como objetivo observar a situação em que se encontravam os imigrantes alemães então instalados no sul do Brasil. Entendemos, todavia, que a associação do título de doutor ao nome do fundador da cidade parece extrapolar as questões acadêmicas, sinalizando respeito, admiração ou mesmo atribuição de poder. Essa valoração parece-nos clara quando examinamos o caso de um contemporâneo de Dr. Blumenau, o biólogo Fritz Müller (o qual, certamente, adquiriu mais notoriedade no universo científico e acadêmico do que o Dr. Blumenau), também doutor em filosofia, referido na cidade de Blumenau apenas pelo nome.

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Tendo em vista os diferentes sentidos que podem ser associados a essa palavra em diferentes contextos de uso, esclarecemos que ao longo deste trabalho entendemos por “colono(s)” aquele(s) que residia(m) na colônia de Blumenau durante os primeiros anos após a sua fundação, ou seja, na época em que a cidade