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Impossibilidade de abater em operações futuras o crédito oriundo do imposto

4 DA IMPORTAÇÃO PROMOVIDA POR NÃO CONTRIBUINTE

4.1 A não-cumulatividade como condição de validade para a cobrança do IPI:

4.1.3 Impossibilidade de abater em operações futuras o crédito oriundo do imposto

O legislador constituinte originário, consciente da perigosa conjuntura econômica e financeira oriunda da tributação cumulativa sobre o consumo, determinou, expressamente, vale mais uma vez afirmar, a subordinação do IPI ao princípio da não-cumulatividade;

58 PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da

.jurisprudência. 13. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora: ESMAFE, 2011. p. 307.

59

COÊLHO, Sacha Calmon Navarro; DERZI, Misabel Abreu Machado. Bens do ativo fixo: direito de crédito

.em tema de ICMS. Revista Dialética de Direito .Tributário, São Paulo, v. 116, p. 129-141, mai. 2005. p.

instituindo, pode-se dizer, apesar de não constar este do rol de princípios disposto na Seção II do Capítulo do Sistema Tributário Nacional, verdadeira limitação ao poder de tributar60:

Art.. 153. Compete à União instituir impostos sobre: [...]

IV - produtos industrializados; [...]

§ 3º - O imposto previsto no inciso IV: [...]

II - será não-cumulativo, compensando-se o que for devido e em cada operação com o montante cobrado nas anteriores;

Quando da interpretação da supracitada norma constitucional, deve-se considerar, saliente-se, que o constituinte não utiliza termos desnecessários, supérfluos. Cada expressão empregada na concepção do texto possui sua respectiva carga semântica, a denotar a real vontade do legislador (ratio legis), que jamais deve ser relevada ao esquecimento quando da exegese do dispositivo constitucional.

No que diz respeito ao texto do art.. 153, §3º, II, a conjugação do verbo ser aplicada exprime notoriamente a ideia de imperatividade. Não há como cogitar ter-se estabelecido espécie de faculdade na aplicação da não-cumulatividade. Esta, em verdade, apresentar-se-á como de aplicação compulsória, concretizando-se, assevere-se mais uma vez, como condição de validade para a cobrança do IPI.

“[...] a regra em exame não encerra mera sugestão, que o legislador ou a Fazenda Pública poderão, ou não, acatar. Ela aponta, sim, uma diretriz imperativa, que dá ao contribuinte o direito de ver observado, em cada caso concreto, o princípio da não- cumulatividade [...]”61 (grifo do original).

Uma vez constitucionalmente estabelecida e detalhada sua forma de aplicação, mostra-se desnecessária regulamentação infraconstitucional a supedanear a produção dos efeitos jurídicos esperados. Infere-se, pois, que a não-cumulatividade do IPI é introduzida por

norma de eficácia plena; quais sejam estas, na dicção de José Afonso da Silva, “as que receberam do constituinte normatividade suficiente à sua eficácia imediata [...]”62 (grifo nosso).

60 MARCUZZO, Ana Paula Coelho. O direito a crédito no ICMS e as limitações constitucionais. Jus Navigandi, .Teresina, ano 16, n. 3060, 17 nov. 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/20439>. Acesso em:

.18 dez. 2012.

61

CARRAZA, Roque Antônio. ICMS. 2. ed. São Paulo: Malheiros, 1995. p. 87.

62

SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p.

Da norma constante do art. 153, §3º, II, da Constituição Federal, pois, irrompe imediato direito ao creditamento e ao abatimento para o contribuinte que realiza o fato gerador de quaisquer das hipóteses de incidência do IPI constantes do art. 46 do CTN.

“O direito do contribuinte de abater do imposto devido o montante cobrado nas operações anteriores, [sic] é um direito potestativo, portanto o contribuinte não necessita da cooperação do Fisco para a realização do seu interesse”63 (grifo do original). Eventual regulação poderá, sim, existir, mas apenas acerca da periodicidade, forma de apuração e outros pormenores ligados ao crédito, conforme já relatado anteriormente.

José Eduardo Soares de Melo e Luiz Francisco Lippo, tratando da classificação da norma constitucional veiculadora da não-cumulatividade e de suas consequências, asseveram:

[...] podemos concluir com segurança que o princípio da não-cumulatividade é norma de aplicação, [sic] eventualmente regulamentável, e que possui eficácia plena, porquanto não depende de qualquer outro comando de hierarquia inferior para emanar seus efeitos. O legislador infraconstitucional nada pode fazer em relação a ele, posto faltar-lhe competência legislativa para restringir o seu conteúdo, sentido e alcance.

[...]

[...] a regra insculpida no princípio da não cumulatividade constitui norma de

hierarquia constitucional auto-aplicável [sic], de maneira que pelos seus próprios contornos é possível implementar-se o comando, sem a necessidade de quaisquer

outras normas regulamentadoras.64 (grifo nosso)

Conforme asseverou o Ministro Cezar Peluso em voto de sua relatoria no RE 475.551/PR, “geração e utilização de créditos derivam, pois, diretamente da Constituição da República, que agasalha, no ponto, norma de eficácia plena e incidência imediata, a todos oponível”65.

Não há dúvida, assim, que o dispositivo constitucional que agasalha a técnica não- cumulativa (art. 153, §3º, II) assegura o contribuinte independentemente de qualquer regulamentação66, ensejando, porquanto autoaplicável, seu emprego em toda e qualquer situação em que haja incidência do IPI, sem exceções, sob pena de inconstitucionalidade flagrante.

63 CARVALHO, Antônio Gilson Aragão de. Não-cumulatividade. In: MACHADO, Hugo de Brito. (Org.). Não- .cumulatividade tributária. São Paulo: Dialética; Fortaleza: ICET, 2009. p. 84.

64

MELO, José Eduardo Soares de; LIPPO, Luiz Francisco. A não-cumulatividade tributária: (ICMS, IPI,

.ISS, PIS e COFINS). 3. ed. São Paulo: Dialética, 2008. p. 106-107; 129.

65 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 475.551/PR. Relator(a): Min. Cezar Peluso, Relator(a) p/

.Acórdão: Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgado em 06/05/2009, DJe-213. Divulgado em 12-11-2009.

.Publicado em 13-11-2009.

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PAULSEN, Leandro; MELO, José Eduardo Soares de. Impostos federais, estaduais e municipais. 6. ed.

Uma vez autoexecutável o princípio, pois, e atrelado indissociavelmente ao imposto em apreço, à cada nova entrada de produto industrializado (seja este adquirido no País ou importado) deve, simultaneamente, existir para o contribuinte, sempre, o direito de escriturar o crédito relativo ao imposto recolhido na operação anterior e o direito de, futuramente, abater tal crédito em nova operação com produto industrializado.

O direito do contribuinte ao abatimento, em sua plenitude, portanto, pelo fato de ser oriundo da Constituição e veiculado por norma de eficácia plena, deve obrigatoriamente ter

eficácia imediata em qualquer circunstância fática.

“[...] jamais poderá o legislador ordinário ou, ainda, o complementar, em nível de normas gerais, excluir o princípio da não-cumulatividade [...], senão nas expressas e poucas hipóteses constitucionais [...]”67, nos moldes em que realizado para o ICMS no art. 155, §2º, IX, “a”.

Estabelecidas tais premissas, é forçoso concluir que, face à hierarquia constitucional do princípio da não-cumulatividade, veiculado por norma de eficácia plena e aplicação imediata, seu método de operacionalização, ou seja, a compensação do tributo devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores, deve sempre estar disponível ao

contribuinte do IPI.

O supracitado entendimento, frise-se, já no final dos anos 90, foi aplicado pelo Supremo Tribunal Federal para afastar a incidência do ICMS na importação promovida por não contribuinte (até a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 33 de 2001, a qual alterou o texto do art. 155, §2º, IX, “a”, da Constituição).

A Suprema Corte Nacional, quando do julgamento dos RE 203.075/DF e 185.789/SP, ambos de relatoria do Ministro Ilmar Galvão, tratando do ICMS na importação realizada por pessoa física, alterou o posicionamento consolidado, à época, pelo Superior Tribunal de Justiça, que apregoava a incidência do ICMS na citada situação.

A mudança de entendimento operada pelo STF rendeu ensejo à edição da Súmula nº 660 de sua jurisprudência, a qual assevera, ainda hoje, após discussões acerca da necessidade de alteração em seu texto, que “não incide ICMS na importação de bens por pessoa física ou jurídica que não seja contribuinte do imposto”.

67

MARTINS, Ives Gandra da Silva. Direito a compensação do ICMS incidente sobre combustíveis e insumos

.nas operações de transporte mesmo quando realizadas mediante subcontratação. Revista Dialética de Direito

Leandro Paulsen resume, com bastante clareza, as alterações do entendimento no passar dos anos acerca da importação realizada por não contribuinte do ICMS, o qual, conforme será demonstrado afrente, também cabe ao IPI:

A questão da incidência de ICMS na importação realizada por pessoa física para uso próprio é bastante controvertida. Em abril de 1996, foi editada a Súmula 155 do STJ: “O ICMS incide na importação de aeronave, por pessoa física, para uso próprio”. Em outubro de 1997, foi publicada a Súmula 198 do STJ: “Na importação de veículo por pessoa física, destinado uso próprio, incide o ICMS”. Logo em seguida, porém, o plenário do STF, ao julgar o RE 203.075/DF, analisou a matéria sob enfoque constitucional e firmou posição dizendo da não incidência do ICMS [na importação por pessoa física].68

Vale citar, a fim de permitir melhor compreensão do entendimento do STF à época, indispensável que será ao presente estudo, as ementas dos RE 203.075/DF e 185.789/SP:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. PESSOA FÍSICA. IMPORTAÇÃO DE BEM. EXIGÊNCIA DE PAGAMENTO DO ICMS POR OCASIÃO DO DESEMBARAÇO ADUANEIRO. IMPOSSIBILIDADE. 1. A incidência do ICMS na importação de mercadoria tem como fato gerador operação de natureza mercantil ou assemelhada, sendo inexigível o imposto quando

se tratar de bem importado por pessoa física.

2. Princípio da não-cumulatividade do ICMS. Pessoa física. Importação de bem.

Impossibilidade de se compensar o que devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal. Não sendo comerciante e como tal não estabelecida, a pessoa física não pratica atos que envolvam circulação de mercadoria. Recurso extraordinário não conhecido.69 (grifo nosso)

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMPORTAÇÃO DE BEM POR SOCIEDADE CIVIL PARA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICOS. EXIGÊNCIA DE PAGAMENTO DO ICMS POR OCASIÃO DO DESEMBARAÇO ADUANEIRO. IMPOSSIBILIDADE.

1. A incidência do ICMS na importação de mercadoria tem como fato gerador operação de natureza mercantil ou assemelhada, sendo inexigível o imposto quando se tratar de bem importado por pessoa física.

2. Princípio da não-cumulatividade do ICMS. Importação de aparelho de mamografia por sociedade civil, não contribuinte do tributo. Impossibilidade de se

compensar o que devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal. Inexistência de circulação de

mercadoria. Não ocorrência da hipótese de incidência do ICMS. Recurso extraordinário não conhecido.70 (grifo nosso)

Pela leitura dos julgados acima elencados, depreende-se de logo que o principal argumento utilizado a embasar o afastamento da incidência do ICMS na importação realizada por não contribuinte é a impossibilidade de utilização da técnica não-cumulativa em nova

68 PAULSEN, Leandro. Direito Tributário: Constituição e Código Tributário à luz da doutrina e da

.jurisprudência. 13. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora: ESMAFE, 2011. p. 378.

69 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 203.075/DF. Relator(a): Min. Ilmar Galvão, Relator(a) p/

.Acórdão: Min. Maurício Corrêa, Primeira Turma, julgado em 05/08/1998, DJ 29-10-1999.

70

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 185.789/SP. Relator(a): Min. Ilmar Galvão, Relator(a) p/

operação, porquanto impossível compensar-se o que devido em cada operação com o montante cobrado nas anteriores, ou seja, inexistente o acesso amplo ao sistema de abatimento.

No que diz respeito ao IPI, o Ministro Carlos Velloso, em seu voto no Agravo Regimental no RE 255.682/RS, transcrevendo parte de voto seu relativo ao ICMS, assentou ainda a aplicação para o imposto federal das mesmas conclusões já obtidas para o imposto estadual nos citados leading cases acerca da importação por não contribuinte:

‘O contribuinte do ICMS é o vendedor, não obstante tratar-se de um imposto que repercute e acaba sendo pago pelo comprador. Todavia, esse é um fato econômico que o Supremo Tribunal Federal entende que não tem relevância na relação jurídica contribuinte-fisco. Se o contribuinte é o vendedor, numa importação não haveria pagamento de ICMS, pelo simples motivo de o exportador estar no exterior. Foi preciso, portanto, que a Constituição estabelecesse, expressamente, a incidência desse tributo, na importação e expressamente explicitou que o seu pagamento seria feito pelo comprador, ou seja, pelo importador. Ao estabelece a incidência, no caso, o constituinte, entretanto, optou pelo comerciante, ou pelo industrial, é dizer, por aquele que tem um estabelecimento, certo que o particular que não é comerciante ou industrial tem simplesmente domicílio ou residência. E por que procedeu assim o constituinte? Porque o importador, assim o comprador, que é comerciante ou industrial, pode, na operação seguinte, utilizar o crédito do tributo que pagou no ato do desembaraço aduaneiro. O particular, que não é comerciante ou industrial, jamais poderia fazer isso. É dizer, caberia a ele o ônus total do tributo.’ [...]

Para viabilizar a cobrança do ICMS, em caso tal, foi promulgada a EC 33, de 12.12.2001, que alterou a redação da alínea a do inc. IX do art. 155 da C.F. Com

relação ao IPI, entretanto, não há disposição igual. O que há, simplesmente, é o dispositivo constitucional que estabelece o princípio da não-cumulatividade, de obediência obrigatória, evidentemente, pelo legislador ordinário (C.F., art. 153, IV, 3º, II).71 (grifo nosso)

A decisão é de ser mantida.

[...] Aplicou-se, no caso, a jurisprudência atinente ai ICMS, no que toca ao princípio da não-cumulatividade. Tem-se, aqui, o denominado ‘argumento a pari, que este o preceito formulado para um caso às hipóteses iguais, ou fundamentos semelhantes: ubi eadem ratio...’ [...]. Ora, onde existe a mesma razão, prevalece a mesma regra de Direito: ‘ubi eadem ratio, ibi eadem legis dispositio’. (grifo do original)

Conforme exposto pelo ministro, face à flagrante semelhança das situações fáticas, bem como da semelhança entre os tributos, ao menos no que diz respeito à obrigatoriedade de aplicação da técnica não-cumulativa, é de se ressaltar que as conclusões obtidas para o

ICMS nos precedentes acostados podem, e devem, sem dúvida, ser estendidas ao IPI.

71

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 255.682/RS AgR. Relator(a): Min. Carlos Velloso, Segunda Turma,

A fim de complementar o ensinamento exposto pelo Ministro Carlos Velloso, o Ministro Joaquim Barbosa, também no mesmo Agravo Regimental no RE 255.682/RS, em seu voto aduziu:

[...] a diferença entre os fatos geradores e as bases de cálculo tributáveis por ICMS e por IPI, bem como entre os respectivos regimes jurídicos, não é suficiente para, de pronto, afastar a aplicabilidade da orientação firmada pela Corte por ocasião do julgamento do RE 203.075 à tributação por IPI das operações de importação de bens industrializados por sujeito que não tenha acesso aos instrumentos de ponderação da carga tributária, assegurando a não-cumulatividade do tributo.72

Os Arts. 155, §2º, I, e 153, §3º, II, da Constituição, que estabelecem a não- cumulatividade para ICMS e IPI respectivamente, comungam entre si a mesma ratio legis; demandando, pois, a ambos os impostos, face à semelhante conjuntura fática, a aplicação do mesmo entendimento: não incide o imposto no caso de importação promovida por não contribuinte em razão de violação à não-cumulatividade, porquanto indisponível acesso ao sistema de abatimentos em operação futura.

Não há como cogitar, pois, conforme já sobejamente explicado, da constitucionalidade da incidência do IPI na importação promovida por não contribuinte. “O critério da não- cumulatividade é de aplicação obrigatória, inclusive na importação. Se não puder ser aplicado (importação por não industrial), o tributo não pode ser cobrado”73.

Apenas poder-se-ia dizer constitucional a incidência do IPI na importação promovida por não contribuinte caso houvesse exceção explícita ao princípio da não-cumulatividade neste caso e oriunda de alteração no texto constitucional; como, por exemplo, realizou-se para o ICMS com a edição da Emenda Constitucional nº 33 de 2001, a qual modificou o texto do art. 155, §2º, IX, “a”, determinando a incidência do ICMS sobre toda importação de pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto.

Alterações na Constituição nos moldes da acima citada, realizadas em razão de interesse político-fiscal, no entanto, representam sério risco ao ordenamento jurídico pátrio. Vale citar o ensinamento de Konrad Hesse na tradução de Gilmar Ferreira Mendes:

[...] perigosa para a força normativa da Constituição afigura-se a tendência para a frequente revisão constitucional sob a alegação de suposta e inarredável necessidade política. Cada reforma constitucional expressa a ideia de que, efetiva ou aparentemente, atribui-se maior valor às exigências de índole fática do que à ordem

72 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 255.682/RS AgR. Relator(a): Min. Carlos Velloso, Segunda Turma,

.julgado em 29/11/2005, DJ 10-02-2006.

73

PAULSEN, Leandro; MELO, José Eduardo Soares de. Impostos federais, estaduais e municipais. 6. ed.

normativa vigente. [...] A frequência das reformas constitucionais abala a confiança na sua inquebrantabilidade, debilitando a sua força normativa. A estabilidade constitui condição fundamental da eficácia da Constituição. 74

É de se concluir, pois, que a incidência do IPI na importação promovida por não

contribuinte demonstra-se inconstitucional. Uma vez não detentor dos meios de produção

fabril o importador, inexistirão novas operações com produtos industrializados a ensejar a utilização devida dos créditos já escriturados na importação, promovendo-se acúmulo sem utilização que viola a não-cumulatividade, pois o acesso ao sistema de compensação, em sua plenitude, é característica indissociável ao princípio.

O Ministro Cezar Peluso, em voto de sua relatoria no RE 475.551/PR, abordou a vedação à acumulação inútil e indefinida de créditos, à exemplo da oriunda da importação no caso em estudo, condenando conjunturas semelhantes:

O instituto do crédito do IPI deve, ademais, [ser] analisado à luz de duas subcategorias unidas por liame indissolúvel: a geração de créditos e seu aproveitamento. Cuida-se de dois momentos distintos no tempo, mas indissociáveis na essência, porque guardam relação finalística e instrumental: o crédito nasce para ser aproveitado! A Constituição estaria a hospedar princípio absurdo, [sic] se previsse direito de crédito sem possibilidade de exercício. O sistema da não- cumulatividade tem por fundamento a compensabilidade entre créditos e débitos de imposto, gerados, respectivamente, na entrada e na saída dos inputs e outputs. [...]

Em nenhuma hipótese, porém, pode ser condenada [a parte beneficiária] a acumulá-los [os créditos] inútil e indefinidamente. Menos ainda poderá ser compelida a abdicar os créditos, nem a suportar-lhes anulação prática, já que nasceram de imposição constitucional. Noutras palavras, nenhuma empresa [...] pode ser forçada a acumular créditos sem propósito, nem privada desse como direito-dever, que decorre da aquisição de insumos e o obriga a abater aqueles em eventual operação sujeita à incidência do IPI.75 (grifo nosso)

Saliente-se, por fim, estabelecidas todas as já citadas premissas, que, atualmente, restou pacificado nos tribunais superiores o entendimento defendido no presente trabalho no sentido da não-incidência de IPI na importação promovida por não contribuinte:

CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IPI. IMPORTAÇÃO DE BEM PARA USO PRÓPRIO POR NÃO CONTRIBUINTE. IMPOSSIBILIDADE DE INCIDÊNCIA. PRINCÍPIO DA NÃO CUMULATIVIDADE. AGRAVO IMPROVIDO.

I – A exigência de IPI na importação de bem para uso próprio por pessoa não contribuinte do tributo implica violação ao princípio da não cumulatividade.

74 HESSE, Konrad. A força normativa da Constituição (Die normative kraft der verfassung). Tradução de

.Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1991. p. 22.

75 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RE 475.551/PR. Relator(a): Min. Cezar Peluso, Relator(a) p/

.Acórdão: Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, julgado em 06/05/2009, DJe-213. Divulgado em 12-11-2009.

II – Agravo regimental improvido.76

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. IPI. IMPORTAÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. PESSOA FÍSICA. USO PRÓPRIO.

1. Não incide o IPI em importação de veículo automotor, para uso próprio, por pessoa física. Aplicabilidade do princípio da não-cumulatividade. Precedente. Agravo regimental a que se nega provimento.77

TRIBUTÁRIO. IPI. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. VEÍCULO AUTOMOTOR. PESSOA FÍSICA. NÃO-INCIDÊNCIA. ENCERRAMENTO DA MATÉRIA PELO

COLENDO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.

1. Recurso especial interposto contra acórdão que determinou o recolhimento do IPI incidente sobre a importação de automóvel destinado ao uso pessoal do recorrente. 2. Entendimento deste relator, com base na Súmula nº 198/STJ, de que “na importação de veículo por pessoa física, destinado a uso próprio, incide o ICMS”. 3. No entanto, o colendo Supremo Tribunal Federal, em decisão proferida no RE nº 203075/DF, Rel. p/ acórdão Min. Maurício Corrêa, dando nova interpretação ao art. 155, § 2º, IX, 'a', da CF/88, decidiu, por maioria de votos, que a incidência do ICMS sobre a entrada de mercadoria importada do exterior, ainda quando se tratar de bem destinado a consumo ou ativo fixo do estabelecimento, não se aplica às operações de importação de bens realizadas por pessoa física para uso próprio. Com base nesse entendimento, o STF manteve decisão do Tribunal de origem que isentara o impetrante do pagamento de ICMS de veículo importado para uso próprio. Os Srs. Ministros Ilmar Galvão, Relator, e Nelson Jobim, ficaram vencidos ao entenderem que o ICMS deve incidir inclusive nas operações realizadas por particular.

4. No que se refere especificamente ao IPI, da mesma forma o Pretório Excelso também já se pronunciou a respeito: “Veículo importado por pessoa física que não é comerciante nem empresário, destinado ao uso próprio: não-incidência do IPI: aplicabilidade do princípio da não-cumulatividade: CF, art. 153, § 3º, II. Precedentes do STF relativamente ao ICMS, anteriormente à EC 33/2001: RE 203.075/DF, Min. Maurício Corrêa, Plenário, 'DJ' de 29.10.1999; RE 191.346/RS, Min. Carlos