• Nenhum resultado encontrado

As imunidades relativas dizem respeito ao disposto no art. 182 do Código Penal, compondo as disposições gerais acerca dos crimes contra o patrimônio. Nas escusas relativas, por sua vez, o legislador optou por condicionar à representação a ação penal dos crimes patrimoniais cometidos sem violência ou grave ameaça nas hipóteses dos incisos I, II e III.

O legislador, assim como no caso das imunidades absolutas, não apresentou uma nomenclatura às hipóteses prescritas no artigo 182 do Código Penal. Sendo assim, a doutrina as denomina como imunidades relativas ou processuais. (MASSON, 2014, p. 1371)

Ao tratar das imunidades relativas, conveniente trazer as lições de Bitencourt (2012), que aduz não se tratar de imunidade, seja ela absoluta ou relativa, mas tão somente de alteração na espécie de ação penal, condicionada à representação do ofendido. Para isso, é necessário que o crime patrimonial tenha sido praticado em detrimento de cônjuge desquitado ou judicialmente separado; irmão, legítimo ou ilegítimo; tio ou sobrinho com quem o agente coabita.

As imunidades relativas são assim chamadas porque, em que pese o fato ser punível nestas hipóteses, a ação penal é condicionada à representação do ofendido ou de seu representante legal. O parquet, portanto, depende da ocorrência dessa condição de procedibilidade para oferecer a denúncia. Ressalta-se que os delitos patrimoniais que dependem de queixa não são abarcados por esta imunidade, tendo em vista que a ação penal depende de vontade exclusiva do ofendido. (PRADO, 2014, p. 1006)

Conforme discorrem Mirabete e Fabbrini (2014) é claro que a legislação trata apenas dos crimes em que a ação penal é pública, e não àqueles que dependem de queixa, que seguiram submetidos à ação privada. Complementam, ainda, que em havendo discordância entre as vítimas, sobrepõe-se a vontade daquela que deseja a instauração da ação penal.

Nas digressões de Greco (2017), as imunidades relativas retratam situações que não ocasionam o afastamento da punibilidade, como acontece nas imunidades absolutas do artigo 181 do CP. Assim, no prazo decadencial de 06 (seis) meses, as pessoas previstas no rol do artigo 182 do CP podem oferecer sua representação,

permitindo a instauração do IP, assim como da ação penal pública que estava a essa representação condicionada.

Ao tratar da natureza jurídica das imunidades relativas, Capez (2019) salienta que não excluem a punibilidade, mas apenas impõe uma condição objetiva de procedibilidade. Neste caso, portanto, ao contrário do acontece com a imunidade absoluta, em que o agente é isento de pena, no caso da incidência de imunidade relativa os crimes de ação penal pública incondicionada passam a ser condicionados à representação do ofendido. Os crimes de ação penal privada, dessa forma, não ficam abrangidos por essa imunidade, como por exemplo, o crime de dano simples.

Acerca da natureza jurídica, ainda, destacam-se as seguintes considerações:

As imunidades relativas ou processuais não isentam de pena. Seu papel consiste em transformar crimes contra o patrimônio de ação penal pública incondicionada em delitos de ação penal pública condicionada à representação do ofendido ou de quem o represente. Institui-se, desta forma, uma autêntica condição de procedibilidade para o exercício da ação penal. Por corolário, as imunidades relativas não se aplicam aos crimes patrimoniais de ação penal privada nem aos crimes originariamente de ação penal pública condicionada. No caso de existirem diversas vítimas de um mesmo crime, e elas discordarem entre si, há de prevalecer a vontade daquela que deseja o início da ação penal. (MASSON, 2014, p. 1371)

Assim, é possível concluir que as hipóteses do artigo 182 do Código Penal não têm o condão de isentar o agente de pena, mas sim condicionar a ação penal à representação. Nas palavras de Mirabete e Fabbrini (2014), explicam-se pelas mesmas razões das escusas absolutas, embora nas hipóteses de imunidade relativa, em tese, a ligação familiar é menos acentuada.

A primeira hipótese em que o crime patrimonial sem violência ou grave ameaça será condicionado à representação, conforme dispõe o artigo 182, I do CP, é quando cometido em detrimento do cônjuge desquitado ou judicialmente separado. Bitencourt (2012) diz que, em que pese o dispositivo supramencionado fazer uso da terminologia “desquitado”, deve ser feita uma interpretação contextualizada, posto que desde 1977 o desquite foi substituído pela separação judicial e pelo divórcio. Essa condição de procedibilidade é exigida então quando o crime patrimonial for praticado por ex-cônjuges, um em desfavor de outro, quando separados ou divorciados.

Nas digressões de Prado (2014), essa imunidade abrange situações em que os cônjuges se encontram separados judicialmente, divorciados ou em separação de corpos. Todavia, a separação de fato não se inclui na imunidade relativa, uma vez

que é uma hipótese em que se opera a imunidade absoluta. Ademais, aplica-se a condição de procedibilidade no caso de união estável formalmente dissolvida (art. 182, I, CP). Ainda, se o crime é cometido em detrimento também de terceiro, o agente não é agraciado com a benesse.

Se o delito for praticado após a dissolução da sociedade conjugal, pela separação judicial, mas antes do divórcio ou até mesmo depois de decretada cautelarmente a separação de corpos, o delito passa a se condicionar a representação. Porém, se o crime for praticado após o rompimento do vínculo patrimonial pelo divórcio, não há benesse alguma para o agente neste caso, haja vista não haver relação familiar a ser preservada pela omissão do Direito Penal. (MASSON, 2014, p. 1372)

Na dicção de Nucci (2019), quando houver separação decretada pela justiça, seja separação judicial ou separação de corpos, aplica-se a imunidade relativa, estando o crime patrimonial condicionado à representação. No caso de divórcio, todavia, não existe qualquer tipo de imunidade – absoluta ou relativa – em proveito ao agente.

Conforme leciona Greco (2017), o marco inicial para a aplicação do inciso I do artigo 182 do CP – imunidade relativa – é o trânsito em julgado da sentença que decretar a separação judicial. Com relação à hipótese elencada no inciso I do artigo 182 do Código Penal, no que tange a incidência da imunidade relativa, pode-se concluir por se aplicar nos casos que não tem guarita a imunidade absoluta. Deste modo, se apenas separados de fato, opera-se a imunidade de caráter absoluto. Todavia, havendo separação judicial ou separação de corpos, é a imunidade relativa a benesse aplicável. Por fim, no caso de divórcio, por não haver vínculo familiar a ser preservado, não é agraciado o agente por nenhum destes benefícios.

A segunda hipótese que condiciona o crime patrimonial à representação está disposta no artigo 182, II do Código Penal e diz respeito ao crime cometido em detrimento de irmão, legítimo ou ilegítimo. Não se distinguem, assim, irmãos germanos ou bilaterais, legítimos ou ilegítimos, e, ainda, consanguíneos ou não, seja um deles ou ambos adotados. (CAPEZ, 2019, p. 828)

Conforme Nucci (2019), a previsão legal compreende tanto aos irmãos havidos legitimamente, ou seja, dentro do casamento, como também o havido ilegitimamente, isto é, fora do casamento. Outrossim, englobam-se os filhos dos

mesmos pais, chamados de bilaterais ou germanos, como também da mesma mãe, denominados unilaterais uterinos.

Uma observação que vai ao encontro do texto constitucional merece ser mencionada, uma vez que, nas palavras de Masson (2014) a ressalva expressa no inciso II do artigo 182 do CP é inoportuna, uma vez que o artigo 227, § 6º da Lei Maior veda qualquer tipo de tratamento discriminatório entre os filhos, sejam eles ou não havidos do casamento.

Todavia, há de se observar que se o dano for em prejuízo não apenas do irmão, mas também atingir um estranho, deixa de existir a condição de procedibilidade e a ação penal conserva sua natureza jurídica normal de pública incondicionada. (BITENCOURT, 2012, p. 955)

Na opinião de Nucci, a imunidade relativa com relação ao irmão foi justa, uma vez que, em que pese sejam parentes e possam viver juntos, é importante que a vítima decida se vale invocar o direito penal a fim de resolver o conflito, resolver pela via civil ou até mesmo nada fazer. Assim, não se imuniza totalmente o irmão, mas se garante a possibilidade de que o irmão que teve o patrimônio atingido represente, autorizando o parquet a agir. Salienta, por fim, que o relacionamento entre irmãos não pode ser comparado ao de pais e filhos.

A última hipótese de imunidade relativa, disposta no artigo 182, III do Código Penal diz respeito ao crime patrimonial cometido em detrimento de tio ou sobrinho com quem o agente coabita. Nas palavras de Capez (2019), necessita de efetiva coabitação, todavia, prescinde que o crime seja praticado no local da coabitação. Outrossim, a coabitação transitória frustra a incidência da imunidade.

A exigência que se impõe, neste caso, é que a vítima e o infrator coabitem sob o mesmo teto, com animus duradouro. Coabitar significa morar junto na mesma casa e sob o mesmo teto e, portanto, algumas passagens esporádicas são incapazes de configurar esta hipótese de imunidade relativa. Deste modo, segundo se presume do texto legal, é preciso que no momento do crime a vítima e o agente – tio e sobrinho – coabitem. O que importa é o momento do crime e, sendo assim, a coabitação anterior ou posterior ao fato não tem o condão de configurar a imunidade do inciso III, do artigo 182 do CP. (BITENCOURT, 2012, p. 955)

Nesta esteira, afirma Cunha (2016), que a coabitação não contempla visitas esporádicas ou até mesmo temporárias, mas deve ocorrer efetiva residência em

comum no momento do crime. Salienta, ainda, que se o crime se der antes ou depois desta residência, será indiferente com relação à aplicabilidade da benesse.

Esta hipótese de imunidade é a única que se admite no que concerne o parentesco colateral. O critério para sua aplicação é objetivo, a coabitação, dispensando-se, assim, o relacionamento íntimo entre tio e sobrinho. Outrossim, o objetivo legal é a proteção do relacionamento entre estas pessoas e não a inviolabilidade domiciliar, tendo em vista que o inquérito policial ou a ação penal podem gerar intenso desgaste entre pessoas que moram no mesmo lar, necessitando assim da representação. (MASSON, 2014, p. 1372)

Diante do exposto, é possível concluir que as imunidades relativas nada mais são do que hipóteses taxativas, elencadas no artigo 182, incisos I, II e III do Código Penal, que tem o condão de condicionar as ações penais públicas à representação do ofendido. Garante-se, assim, aos parentes que geralmente possui uma ligação um pouco mais distante daqueles a quem o legislador previu escusa absoluta, em decidir por permitir a instauração de um processo criminal ou não.