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A (im)possibilidade da aplicação das escusas absolutórias frente aos crimes patrimoniais contra a mulher, no ambiente doméstico e familiar

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JULIANA RAMOS CAMPOS

A (IM)POSSIBILIDADE DA APLICAÇÃO DAS ESCUSAS ABSOLUTÓRIAS FRENTE AOS CRIMES PATRIMONIAIS CONTRA A MULHER, NO AMBIENTE

DOMÉSTICO E FAMILIAR

Içara 2020

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JULIANA RAMOS CAMPOS

A (IM)POSSIBILIDADE DA APLICAÇÃO DAS ESCUSAS ABSOLUTÓRIAS FRENTE AOS CRIMES PATRIMONIAIS CONTRA A MULHER, NO AMBIENTE

DOMÉSTICO E FAMILIAR

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina como requisito parcial à obtenção do título de bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Alex Sandro Sommariva

Içara 2020

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JULIANA RAMOS CAMPOS

A (IM)POSSIBILIDADE DA APLICAÇÃO DAS ESCUSAS ABSOLUTÓRIAS FRENTE AOS CRIMES PATRIMONIAIS CONTRA A MULHER, NO AMBIENTE

DOMÉSTICO E FAMILIAR

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado à obtenção do título de bacharel em Direito e aprovado em sua forma final pelo Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Içara, 07 de dezembro de 2020.

______________________________________________________ Professor e orientador Alex Sandro Sommariva, Esp.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Prof. Ronaldo da Silva Cruz, Ms.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Prof. Renan Cioff de Sant’ana, Esp.

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AGRADECIMENTOS

Planejamos todas as etapas de nossas vidas almejando um objetivo futuro, logo, sonhamos com o momento em que se concretizará o que fora idealizado. Todavia, ao chegar-se o dia, a hora e o momento que tanto se imaginou, o frio na barriga aumenta e parece inacreditável que aquele ciclo se finalizará.

Vejo agora o período acadêmico passar diante dos meus olhos e se despedir. Tenho certeza que a trajetória foi a melhor parte - em conhecimentos e emoções - e será lembrada com muito carinho, dando sentido a todo final.

Um sonho se realizando e só consigo pensar em Deus, com sua infinita bondade, que guiou meus passos e iluminou meus caminhos para que tudo acontecesse de forma imensamente melhor do que eu esperava.

Aos meus queridos professores, meu muito obrigada! Sinto-me imensamente privilegiada de ter tido profissionais de tamanho gabarito me ensinando a ser uma operadora do direito, dentro da Universidade do Sul de Santa Catarina, na minha cidade de Içara – SC.

Sem dúvidas, digo que a minha maior inspiração vem da minha família. De meu avô Eleazar Ramos (em memória) - eu e meus familiares herdamos o espírito trabalhador, honesto e do bem. Dessa forma, todos os dias acordo predestinada a dar meu melhor enquanto pessoa e profissional, sempre me inspirando nos meus familiares, grandes pilares na minha vida, base de minha estrutura.

Ao meu namorado Wagner de Bona Pinto, todo agradecimento por me apoiar em todos os momentos, por fazer eu acreditar mais em mim mesma e me ajudar em tudo que precisei, ainda mais nessa reta final tão turbulenta.

Mais do que feliz pela concretização de um sonho, o sentimento de gratidão é o que transborda meu coração por ter pessoas tão especiais ao meu lado, que partilham todos os dias comigo seus conhecimentos, sua experiência e seu exemplo.

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RESUMO

O presente trabalho tem o objetivo de analisar a aplicabilidade das escusas absolutórias com relação aos crimes patrimoniais contra a mulher, cometidos no âmbito doméstico e familiar. O Código Penal Brasileiro disciplina as escusas absolutórias, conforme se extrai de seu artigo 181. Estas hipóteses geram a isenção de pena de certas pessoas em razão da relação de parentesco existente entre agressor e vítima, prevendo assim o legislador com vistas à preservação da harmonia familiar. Todavia, com o advento da Lei 11.340/2006 – Lei Maria da Penha – existe certo conflito aparente de normas no que tange a aplicação dessa benesse, uma vez que esta legislação prevê a violência patrimonial de forma expressa, por meio do artigo 7º, IV. Outrossim, o objetivo da referida lei é justamente de prevenir, punir e erradicar a violência doméstica e familiar contra a mulher. Inicia-se o trabalho abordando o que são crimes patrimoniais e a política criminal no tocante àqueles em que não se tem o emprego de violência ou grave ameaça, deslindando a gama de benefícios que são a estes tipos penais resguardados. Na sequência, passa-se a abordar as escusas absolutórias, tratando do contexto histórico que levou a sua criação, seu fundamento, conceito, natureza jurídica, as hipóteses de sua aplicação, bem como as exceções de aplicabilidade deste benefício. É possível conhecer o instituto jurídico a que se discute a aplicação. Também é feita uma abordagem a respeito da Lei Maria da Penha, tratando de sua origem, as formas de violência previstas, o que vem a ser o âmbito doméstico, familiar e a relação íntima de afeto, os sujeitos ativo e passivo da referida Lei, assim como seus beneficiários, fazendo breves digressões, também, acerca dos instrumentos que a Lei 11.340/2006 se vale no combate e prevenção da violência doméstica e familiar contra a mulher. O capítulo seguinte faz a junção das escusas absolutórias e a Lei Maria da Penha, tratando do problema central proposto e das abordagens que defendem a sua aplicação e inaplicação. As divergências doutrinárias são apresentadas, de forma que é possível conhecer claramente seus fundamentos. A vista disso, são alcançados os objetivos da pesquisa, que se sustentam na abordagem das escusas absolutórias, sua natureza jurídica e as hipóteses de sua incidência, abordando os crimes patrimoniais que recepcionam aplicação desta benesse. Além disso, no que tange a (im)possibilidade de aplicação das escusas absolutórias no contexto dos crimes patrimoniais contra a mulher, no ambiente doméstico e familiar, foi atingido com êxito o conhecimento das discussões jurídico-doutrinárias acerca dessa controvérsia, assim como os reflexos que cada tese gera no mundo jurídico.

Palavras-chave: Escusas absolutórias. Violência patrimonial. Lei Maria da Penha.

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ABSTRACT

The present study has the objective of analyzing the applicability of the absolute excuses in relation to patrimonial crimes against women, committed in the domestic and family scope. The Brazilian Penal Code disciplines absolute excuses, as extracted from its article 181. These hypotheses generate the exemption from penalty of certain people due to the relationship between the aggressor and the victim, provided by the legislator a view to preserving family harmony. However, with the advent of Law 11.340/2006 - Maria da Penha Law - there is a certain apparent conflict of rules regarding the application of this benefit, since this legislation expressly provides for property violence, through Article 7, IV . Furthermore, the objective of the referred law is precisely to prevent, punish and eradicate domestic and family violence against women. The work begins by addressing what are property crimes and criminal policy with regard to those in which there is no use of violence or serious threat, unraveling the range of benefits that are protected to these criminal types. In the sequence, the absoluteness excuses are dealt with, dealing with the historical context that led to its creation, its foundation, concept, legal nature, the hypotheses of its application, as well as the exceptions of applicability of this benefit. It is possible to know the legal institute to which the application is being discussed. An approach is also made regarding the Maria da Penha Law, dealing with its origin, the forms of violence expected, which comes to be the domestic, family and intimate relationship of affection, the active and passive subjects of that Law, as well as its beneficiaries, making brief digressions, also, about the instruments that Law 11.340 / 2006 is used to combat and prevent domestic and family violence against women. The next chapter brings together the absoluteness excuses and the Maria da Penha Law, dealing with the central problem proposed and the approaches that defend its application and inapplication. The doctrinal divergences are presented, so that it is possible to clearly know their fundamentals. That way, the objectives of the research are reached, which are based on the approach of absolute excuses, their legal nature and the hypotheses of their incidence, addressing the patrimonial crimes that receive application of this benefit. Furthermore, with regard to the (im) possibility of applying absolute excuses in the context of patrimonial crimes against women, in the domestic and family environment, knowledge of the legal and doctrinal discussions about this controversy was successfully achieved, as well as the reflexes that each thesis generates in the legal world.

Keywords: Absolute excuses. Patrimonial violence. Maria da Penha Law.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 8

2 CRIMES PATRIMONIAIS ... 11

2.1 CONCEITO ... 12

2.2 POLÍTICA CRIMINAL NOS CRIMES PATRIMONIAIS SEM VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA A PESSOA ... 13

2.2.1 Do arrependimento posterior ... 13

2.2.2 Dos privilégios ... 16

2.2.3 Da Súmula 554 do STF ... 20

2.2.4 Do acordo de não persecução penal ... 25

3 ESCUSAS ABSOLUTÓRIAS ... 33

3.1 CONCEITO ... 34

3.2 ORIGEM HISTÓRICA E FUNDAMENTOS ... 35

3.3 NATUREZA JURÍDICA ... 36

3.4 HIPÓTESES DAS ESCUSAS ABSOLUTAS ... 39

3.5 IMUNIDADES RELATIVAS ... 46

3.6 EXCEÇÕES A APLICAÇÃO DAS ESCUSAS ABSOLUTÓRIAS ... 50

4 LEI MARIA DA PENHA ... 53

4.1 A ORIGEM DA LEI 11.340/2006 ... 53

4.2 OS TIPOS DE VIOLÊNCIA PREVISTOS NA LEI 11.340/2006 ... 56

4.3 O ÂMBITO DOMÉSTICO, FAMILIAR E A RELAÇÃO ÍNTIMA DE AFETO ... 60

4.4 O SUJEITO ATIVO E PASSIVO DA LEI MARIA DA PENHA ... 62

4.5 OS INSTRUMENTOS JURÍDICOS DE PREVENÇÃO E COMBATE À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER ... 63

5 AS ESCUSAS ABSOLUTÓRIAS COM O SURGIMENTO DA LEI MARIA DA PENHA ... 68

5.1 JURISPRUDÊNCIA ... 72

5.2 PROJETOS DE LEI ... 79

6 CONCLUSÃO ... 81

REFERÊNCIAS ... 84

ANEXO A – Projeto de Lei nº 9.675/2018 ... 89

ANEXO B – Projeto de Lei nº 9.675/2018 ... 90

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ANEXO D – Projeto de Lei nº 1.310/2019 ... 96 ANEXO E – Projeto de Lei nº 3.059/2019 ... 99

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1 INTRODUÇÃO

A prática de crimes patrimoniais, no âmbito doméstico e familiar, é recorrente no Brasil e no mundo, visto que diariamente tais fatos criminosos são noticiados nos meios de comunicação. Ademais, alguns desses crimes patrimoniais acontecem no seio familiar, entre casais, pais e filhos, e permanece muitas vezes ocultado entre os integrantes da família.

Demonstrar-se-á que os crimes patrimoniais cometidos sem a égide de violência ou grave ameaça à pessoa possuem uma política criminal fortemente despenalizadora, ao passo que prevê uma gama de benefícios aos agentes desses delitos. Além disso, os delitos contra o patrimônio, ocorridos no seio familiar, entre cônjuges, ascendentes e descendentes, por opção do legislador, são abarcados com uma isenção de pena. Para que essa isenção, chamada de escusa absolutória, possa incidir, além da relação de parentesco entre agressor e vítima, não pode ter tido no crime o emprego de violência ou grave ameaça à pessoa.

O legislador assim o faz com intenção de preservação da intimidade da família, bem como em nome da harmonia entre seus membros. Entende-se, por não intervir nesses crimes patrimoniais que não são cometidos com o uso de algum tipo de ameaça ou violência à pessoa, cogitando que sejam dirimidos no seio familiar.

Deste modo, o presente trabalho abordará todo esse contexto despenalizador que estão inseridos os crimes contra o patrimônio, de forma a conhecer alguns benefícios que são a ele aplicáveis, e, precipuamente, as escusas absolutórias, dispostas no artigo 181 do Código Penal (BRASIL, 1940).

No ano de 2006 foi sancionada a Lei 11.340/2006, popularmente conhecida como Lei Maria da Penha, representando um marco no País em relação à luta das mulheres contra a violência de gênero, contra elas perpetuada. A referida Lei, conforme será abordado, ficou conhecida como Lei Maria da Penha por conta do símbolo dessa luta: Maria da Penha Maia Fernandes. O símbolo é de muita batalha e resistência, ao passo que essa precursora sofreu na pele os reflexos da violência doméstica e familiar.

Após o surgimento da Lei Maria da Penha, as mulheres estiveram – e estão – salvaguardadas em um instrumento de prevenção, erradicação e combate à

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violência doméstica e familiar. A Lei 11.340/2006 prevê uma série de medidas para coibir e erradicar essa forma de violência tão “comum” no Brasil e no mundo.

Não se bastando apenas a prever o que é o âmbito doméstico e familiar contra a mulher, a Lei Maria da Penha não se absteve em expor de forma expressa quais as formas de violência que podem se apresentar em seu contexto, conforme se extrai do que dispõe o seu artigo 7º, que prevê as seguintes formas de violência: física, psicológica, sexual, patrimonial e moral (BRASIL, 2006).

Levando em conta a previsão da violência patrimonial, conforme dispõe o artigo 7º, IV da Lei Maria da Penha, passaram a surgir discussões doutrinárias a respeito da aplicação do instituto da escusa absolutória, quando diante de crimes patrimoniais cometidos contra a mulher, no âmbito doméstico e familiar.

Apontam, os doutrinadores, um conflito aparente de normas, ao passo que a Lei Maria da Penha surgiu após o Código Penal, definindo a violência patrimonial. Discute-se, se esta previsão de violência patrimonial não caracteriza a violência de que trata o artigo 183, I do Código penal, que gera a inaplicabilidade das escusas absolutórias.

Discute-se, também, se a aplicação dessas escusas no que tange os crimes patrimoniais no âmbito doméstico e familiar contra a mulher também não minimiza a eficácia da Lei Maria da Penha e de todos os objetivos por ela almejados. Em contrapartida, a referida Lei foi omissa, ao passo que, nem tácita ou expressamente, dispôs se a benesse da imunidade absoluta foi por ela recepcionada.

Diante de todo o exposto, o presente trabalho tratará de toda essa temática em torno das escusas absolutórias do Código Penal e a Lei Maria da Penha, apresentando-se como delimitação temática: A (im)possibilidade da aplicação das escusas absolutórias frente aos crimes patrimoniais contra a mulher no ambiente doméstico e familiar.

Para corroborar com o tema proposto e motivar ainda mais a investigação acerca da aplicação das escusas absolutórias, frente aos crimes patrimoniais contra a mulher, no ambiente doméstico e familiar, este trabalho tende a responder algumas indagações: As escusas absolutórias podem ser aplicadas nos crimes cometidos no âmbito doméstico e familiar? Quais os argumentos que sustentam as correntes doutrinárias divergentes?

Destacadas as indagações e objetivando estabelecer precisamente o problema, indica-se como questionamento central do trabalho: É possível ou não a

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aplicação das Escusas Absolutórias, frente aos crimes patrimoniais contra a mulher, no ambiente doméstico e familiar?

O objetivo geral se funde na análise das divergências doutrinárias quanto à aplicação ou não das escusas absolutórias no contexto apresentado, a fim de entender de forma qualificada os argumentos que fundem as teses defendidas e analisar as consequências jurídicas de cada uma das opiniões antagônicas.

Como objetivos específicos, tratam-se da análise das medidas despenalizadoras dos crimes patrimoniais, especialmente acerca das escusas absolutórias, sua natureza jurídica e suas possibilidades de incidência. Além disso, abordar quais os delitos patrimoniais em que a benesse da escusa absoluta tem incidência.

Os objetivos específicos, também, vão ao encontro do conhecimento da Lei Maria da Penha, sua origem, seus instrumentos de combate a violência doméstica e familiar contra a mulher, com o fito de compreender a quem e quando ela será aplicada. Por fim, o objetivo específico do trabalho se funde no conhecimento da controvérsia principal, que são as teses de aplicação e inaplicação das imunidades penais aos crimes cometidos contra o patrimônio e em desfavor da mulher, no âmbito da Lei Maria da Penha, analisando, também, os reflexos desses dois entendimentos diversos.

Justifica-se que, o tema é de grande relevância em um cenário de crimes patrimoniais recorrentes, ao passo que aqueles cometidos dentro do âmbito doméstico e familiar ficam, por vezes, abafados dentro dos lares, muitas vezes, sem uma definição para as vítimas; se possuem condições de gerar uma persecução penal em desfavor do agressor.

De um lado está a preservação da intimidade e harmonia da família, de outro, apontamentos de risco a eficácia de uma lei que visa punir, prevenir e erradicar a violência contra a mulher, que acontece dentro dos lares e, também, entre pessoas que possuem laços familiares. A fim de tratar dessa controvérsia, será utilizado o método indutivo, de forma que se buscará analisar casos particulares para atingir uma conclusão geral, pois serão analisados os posicionamentos de diversos juristas acerca do tema, para chegar a um resultado universal para resolver o problema.

Quanto ao nível de profundidade ou objetivo do estudo, o presente trabalho se funde no tipo exploratório, posto que “são pesquisas que visam aprimorar ideias sobre algum assunto, objetivando criar maior familiaridade com o problema. Na

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maioria das vezes, assumem a forma de pesquisa bibliográfica ou estudo de caso. ” (BASTOS, FERREIRA, 2016, p. 74).

Com relação aos procedimentos na coleta de dados, será aplicada a pesquisa de dois tipos: a bibliográfica e a documental. As pesquisas do tipo documental são aquelas que utilizam documentos para construir o conhecimento do objeto de estudo. Utilizam, para tanto, de documentos como publicações em diário oficial, registros oficiais de uma organização, entre outros. (BASTOS, FERREIRA, 2016, p. 74).

Além do procedimento documental, será utilizada, precipuamente, a pesquisa bibliográfica, como as doutrinas penalistas de grandes expoentes do direito penal brasileiro, como também, artigos científicos. Entende-se, que este tipo de pesquisa se desenvolve com base em um material já elaborado e sistematizado, a exemplo de livros, artigos científicos e pesquisas já elaboradas e publicadas. (BASTOS, FERREIRA, 2016, p. 74).

Por fim, quanto à abordagem, será a qualitativa, tendo em vista que não analisará números, mas sim, palavras. O principal objetivo da pesquisa qualitativa se trata do conhecimento das percepções dos sujeitos pesquisados a respeito da situação problema e objeto da investigação. (LEONEL, MOTTA, 2011, p. 108)

O trabalho monográfico, quanto ao método utilizado será indutiva, já quanto ao seu nível de profundidade ou objetivo, será a do tipo exploratória, com abordagem qualitativa e, por fim, quanto aos procedimentos na coleta de dados será bibliográfica e documental. Diante de tudo que foi exposto, passa-se agora para a análise aguçada da problemática do trabalho, a iniciar pelo estudo dos crimes patrimoniais e a série de benefícios que compõem sua política criminal.

2 CRIMES PATRIMONIAIS

Os crimes patrimoniais estão positivados na parte especial do Código Penal, tendo o patrimônio como bem jurídico protegido. Neste capítulo será apresentado de que se trata esse bem protegido juridicamente, ou seja, o que é considerado patrimônio para fins de compor os crimes patrimoniais. Ademais, será abordado que os crimes patrimoniais que não cometidos com violência ou grave ameaça possuem uma política criminal que beneficia o agente com diversas medidas despenalizadoras.

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2.1 CONCEITO

Os crimes patrimoniais são aqueles reunidos no Título II da Parte Especial do Código Penal, tutelando, dessa forma, o bem jurídico denominado patrimônio. Pois bem, justamente acerca desse objeto da tutela penal são travadas algumas discussões doutrinarias do que vem a ser patrimônio.

Fernando Capez (2016) expõe que, para alguns, a expressão “patrimônio” compreende apenas as relações aferíveis economicamente, adotando esse posicionamento. Para outros, no entanto, o valor econômico é dispensável.

Para Carlos Alberto Gonçalves (1997 apud CAPEZ, 2019, p. 568), o patrimônio em sentido amplo é formado pelo conjunto de bens, de qualquer ordem, pertencentes a um titular. Em sentido estrito, tal termo corresponde apenas às relações jurídicas ativas e passivas de que a pessoa é titular e, ainda, de mensurável valor econômico.

Ademais, Nelson Hungria (1958 apud CAPEZ, 2019. p. 568) expressava que também integram o patrimônio as coisas sem valor econômico, quais sejam as de valor puramente sentimental. Os exemplos dados pelo autor são meramente exemplificativos, como um amuleto sem valor de troca e um anel de cabelos que se guarda como lembrança da pessoa amada.

Diante disso, o Código Penal Brasileiro traz, em seu Título II da parte especial, os crimes contra o patrimônio, sendo que este título utilizou como critério prevalente o interesse aferível economicamente sobre os demais interesses. Acerca do tema, aduzem Julio Fabbrini Mirabete e Renato N. Fabbrini:

Patrimônio, conforme Clóvis Bevilácqua, configura o "complexo de relações jurídicas de uma pessoa que tiverem valor econômico". Inclui não só a propriedade e os demais direitos reais (servidão, uso, usufruto, penhor etc.), como também, os direitos obrigacionais (contratos, por exemplo). Os direitos intelectuais, objetos do denominado direito do autor (patentes, marcas etc.), embora patrimoniais, ficam protegidos no Título III, que trata dos crimes contra a propriedade imaterial, e em lei especial (Lei nº 9.279, de 14-5-1996). Estão excluídos do Título lI, também, os delitos que atingem precipuamente bens jurídicos não patrimoniais, como a vida, a integridade física, a honra etc., mas alguns desses são, também, tutelados, secundariamente, em crimes patrimoniais, como os de roubo (em que se atinge a

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integridade corporal ou a liberdade psíquica da vítima), o latrocínio (em que é lesada a vida) etc. (MIRABBETE, FABBRINI apud BEVILÁCQUA, 2014, p. 205).

Portanto, apesar de patrimônio, em sentido amplo, corresponde a bens de valor econômico, como também, àqueles de valor sentimental e intelectual; os crimes patrimoniais consideram, precipuamente, a aferição de proveito econômico. Ainda, de forma secundária, por vezes, tutelam bens jurídicos distintos, como a integridade física, honra, entre outros.

2.2 POLÍTICA CRIMINAL NOS CRIMES PATRIMONIAIS SEM VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA A PESSOA

Ao tratar de crimes patrimoniais, em que não se tem o emprego de violência ou grave ameaça, optou o legislador, bem como a jurisprudência sumulada do Supremo Tribunal Federal, por garantir alguns benefícios ao agente, das quais pode-se citar o arrependimento posterior, os privilégios, a Súmula 554 do STF e o acordo de não persecução penal.

Dentre essas benesses, tem-se o arrependimento posterior previsto na parte geral do Código Penal, aplicável não apenas aos crimes patrimoniais, mas aos crimes em geral. Aos crimes em geral, pode ocorrer também, o acordo de não persecução penal, bem como a Súmula 554 do STF e os privilégios; mas os dois últimos, ao seu turno, são empregados apenas aos crimes que tutelam o patrimônio.

2.2.1 Do arrependimento posterior

A previsão legal do arrependimento posterior está no artigo 16 do Código Penal, que dispõe: “Nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa, reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da denúncia ou da queixa, por ato voluntário do agente, a pena será reduzida de um a dois terços. ” (BRASIL, 1940).

Ao tratar do arrependimento posterior, Capez (2019) pontua que a expressão é por ele considerada redundante, pois não há como se arrepender de algo antes de sua prática. Aduz, ainda, por ser o arrependimento posterior, causa – obrigatória – de diminuição de pena que incide nos crimes sem emprego de violência ou grave

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ameaça à pessoa, na qual o agente, de forma voluntária, repara o dano ou restitui a coisa até o recebimento da denúncia ou queixa.

Ademais, quanto a sua natureza jurídica, acrescenta Greco (2017) será considerado o arrependimento posterior uma causa geral de diminuição de pena. Explica isso ao fato de que, quando o legislador prevê frações de diminuição ou de aumento da pena, tem-se as causas de diminuição ou aumento de pena, nessa ordem. Ademais, quando essas causas estão dispostas na parte geral do Código Penal, são designadas causas gerais de diminuição ou aumento de pena, já quando dispostas na parte especial, são intituladas de causas especiais de aumento ou diminuição de pena.

Ao passo que é um benefício para o agente, tendo em vista a diminuição da pena, atende também à expectativa da vítima. Nesse sentido:

Lembrou-se o legislador, aqui, de elaborar um artigo que atendesse mais às necessidades da vítima que propriamente aos anseios do indiciado, pois, uma vez reparado o dano ou restituída a coisa até o recebimento da denúncia por ato voluntário do agente, sua pena sofrerá uma redução de um a dois terços, amenizando, dessa maneira, para a vítima, as consequências da infração penal. (GRECO, 2017, p. 415)

Ainda, vale mencionar o artigo 15 da Exposição de Motivos da nova Parte Geral do Código Penal, o qual fundamenta o legislador a criação do instituto do arrependimento posterior, que dispõe:

Essa inovação constitui providência de Política Criminal e é instituída menos em favor do agente do crime do que da vítima. Objetiva-se, com ela, instituir um estímulo à reparação do dano, nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa. (BRASIL, 1940)

Relevante elencar os requisitos para a aplicação do instituto em comento. Capez (2019) elenca as seguintes exigências para a aplicação desse instituto: cometimento do crime sem emprego de violência ou grave ameaça, reparação do dano ou restituição da coisa, voluntariedade do agente e que seja realizado até o recebimento da denuncia ou queixa.

Sendo assim, para que o agente seja beneficiado pelo arrependimento posterior, o crime deve ter sido cometido sem emprego de violência ou grave ameaça à pessoa. Quanto a este requisito, assevera Capez (2019) que a legislação trata da violência dolosa, admitindo, deste modo, a diminuição da pena nos crimes culposos, em que se tenha violência, como o homicídio e a lesão corporal culposa.

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Acrescenta ainda, que a violência deve ser aplicada contra a pessoa, caso contrário, no seu emprego em desfavor da coisa, este requisito resta preenchido, como é o caso do crime de dano.

Greco (2017) complementa, por meio de um exemplo, no qual um indivíduo, por falta da atenção necessária, deixa com que um objeto corpulento despenque sobre o pé da vítima, causando-lhe lesões corporais. No exemplo, caso o agente se esforce a fim de reparar os danos, posiciona-se no sentido de ser de boa política criminal a aplicabilidade do arrependimento posterior. O autor também entende por ser cabível a incidência desse instituto jurídico em relação aos crimes culposos, em que haja o emprego de violência ou grave ameaça.

Além disso, Cunha (2016) trata do emprego de violência imprópria, entendida como aquela em que não há de fato o uso de violência física ou grave ameaça, todavia, atinge a capacidade de resistência da vítima, entendendo por sua vez pela aplicabilidade do instituto. Afirma, ainda, que esse entendimento impera na doutrina, já que o legislador penalista impediu a benesse apenas no caso de violência própria. Nessa esteira:

No tocante à chamada violência imprópria, através da qual o agente reduz a vítima à impossibilidade de resistência, sem contudo empregar força física ou grave ameaça, entendemos que não deve ser excluída do raio de incidência do art. 16 do CP. O dispositivo em análise fala em 'violência ou grave ameaça'. Se quisesse excluir a violência imprópria, a expressão usada seria 'violência, grave ameaça ou redução, por qualquer meio, da capacidade de resistência da vítima'. Uma ligeira interpretação lógico-sistemática dos arts. 146 e 157 do CP não permite outra conclusão. Sobremais, como diz um velho princípio hermenêutica, 'onde a lei não distingue, ao intérprete não é lícito distinguir'. Se, por exemplo, o agente narcotiza a bebida da vítima, oferecendo-lhe uma fruta 'contaminada’, pondo-a para dormir, aproveitando-se para, logo em seguida, subtrair-lhe a carteira, haverá delito de roubo, diante do emprego da violência imprópria. Nesse caso, porém, o agente, vindo a reparar o dano, pode beneficiar-se do art. 16 do Código Penal. Já num roubo com violência física ou grave ameaça torna-se inadmissível a aplicação deste artigo. (DE BARROS, 2003 apud CUNHA, 2016, p. 361).

Quanto ao requisito da reparação do dano ou restituição da coisa, assinala Capez (2019) que esta deve ser integral, exceto se a vítima ou seus herdeiros assentirem de parte e abdicarem o remanescente. Ademais, ao tratar da reparação dos danos, é pertinente destacar o tratamento particular dado pelo artigo 74, parágrafo único, da Lei n. 9.099/95, que afirma que na ação penal de iniciativa

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privada ou na ação penal pública condicionada à representação, o acordo homologado acarreta a renúncia ao direito de queixa ou de representação.

Acerca do tratamento peculiar dado pela Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, aduz Greco (2017) que a composição dos danos realizada em audiência preliminar entre autor do fato e vítima tem a capacidade de extinguir a punibilidade, nos termos do artigo 107, V, do Código Penal, tendo em vista a renúncia legal imposta à vítima ao seu direito de ingressar em juízo com a queixa-crime ou pelo oferecimento da representação.

Outrossim, acrescenta ainda, que a Lei n. 9.099/95 não diferencia se a infração penal teve ou não o emprego de violência ou grave ameaça à pessoa. Deste modo, uma vez que o crime seja de competência do juizado especial criminal, independentemente do uso de violência própria e, ainda, se a ação for privada ou pública, condicionada à representação, o acordo relativo à reparação dos danos entre autor do fato e vítima importará na renúncia desta ao direito de queixa ou representação.

Em relação à voluntariedade do agente, aduz Capez (2019) não ser sinônimo de espontaneidade. Nas palavras de Cunha (2016), para a Lei, basta a atitude não subordinada de coação física ou moral, não obstante a existência de interferências externas subjetivas ou até mesmo a inexistência de motivos ilustres para o arrependimento.

Por fim, é necessário que o arrependimento se dê até o recebimento da denúncia ou queixa. Nas dicções de Masson (2017), é insignificante o momento do oferecimento da denúncia ou queixa-crime, tendo em vista que o limite temporal que enseja o benefício é o juízo de admissibilidade da petição inicial.

2.2.2 Dos privilégios

Não obstante a parte geral do Código Penal prever o arrependimento posterior, a parte especial da legislação supracitada estabelece os chamados privilégios, igualmente aplicáveis aos crimes patrimoniais que não hajam emprego de violência ou grave ameaça.

Todavia, não todos os crimes patrimoniais são agraciados com os privilégios, tendo em vista que são previstos para alguns crimes específicos, quais sejam: o furto, a apropriação indébita, o estelionato e a receptação dolosa, previstos

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respectivamente nos artigos 155, §2º, 170, 171, §1º e 180, §5º, todos do Código Penal.

A primeira figura privilegiada é a do furto, previsto no artigo 155, §2º, do Código Penal. Nas palavras de Capez (2019), trata-se do chamado furto de pequeno valor ou furto mínimo e seus requisitos são: a primariedade do agente e o pequeno valor da coisa subtraída.

Cunha (2016) menciona que, originalmente, o privilégio nasceu em favor de autores primários de subtração de coisa de valor ínfimo, movidos pela necessidade de uso. Dessa forma, tinham três requisitos essenciais para sua configuração, ou seja, além da primariedade do agente e do pequeno valor da res, era requisito a necessidade de usar, com urgência, a coisa furtada.

Todavia, o autor esclarece que o atual entendimento doutrinário e jurisprudencial não tem levado em consideração essa terceira exigência, tendo em vista que sua presença configura nítida hipótese de estado de necessidade ou furto de uso (fato atípico).

Em se tratando do primeiro requisito, a primariedade, elucida Capez (2019), que é primário quem não é reincidente e mesmo que o agente tenha sido por muitas vezes condenado, caso não seja considerado reincidente por não ter praticado mais nenhuma conduta típica após a condenação em definitivo, tecnicamente será primário e consequentemente, fará jus ao privilégio.

Todavia, entendimento diverso é defendido acerca da aplicabilidade do benefício quando se tratar de agente tecnicamente primário:

O primeiro requisito para que ocorra o privilégio é ser o agente primário, ou seja, que não tenha sofrido, em razão de outro crime, condenação anterior transitada em julgado. Embora não seja tecnicamente reincidente, não goza do benefício o réu que já tenha sido condenado anteriormente em outro processo, embora não tenha a decisão transitado em julgado antes do cometimento do segundo crime. (MIRABETE, FABBRINI, 2014, p. 212).

Considera-se primário, também, o condenado em definitivo pela prática de contravenção penal e que, posteriormente, comete crime, nos termos do artigo 63 do Código Penal. (CAPEZ, 2019, p. 589). O segundo requisito para aplicação do furto privilegiado se trata do pequeno valor da coisa subtraída, que não é condição pacífica na doutrina e jurisprudência, posto que, por vezes, se considera o valor da

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Acerca do valor a ser considerado, mencionam Mirabete e Fabbrini (2014), que a jurisprudência entende por furto mínimo aquele em que a coisa não atinge o valor de um salário mínimo vigente na época do fato. Caso superado o valor de um salário mínimo, não restará reconhecido o privilégio.

Posiciona-se Capez (2019), que o pequeno valor da coisa não deve ser analisado em razão da situação financeira da vítima, tendo em vista que o furto de um carro, por exemplo, acabaria sendo considerado de pequeno valor quando em desfavor de pessoa de muitas posses. Outrossim, complementa que, o pequeno prejuízo constitui apenas causa de diminuição da pena no crime de estelionato, conforme artigo 171, §2º, do Código Penal.

É travada, também, uma discussão acerca da aplicação do privilégio concomitante às figuras qualificadas previstas no §4º do artigo 155 do Código Penal. O entendimento majoritário acredita na possibilidade de aplicar o privilégio à figura qualificada, enquanto que o entendimento minoritário defende que apenas em relação ao caput e § 1º do Código Penal seria aplicável a benesse (NUCCI, 2019, p. 475).

Nas palavras de Capez (2019), não há o que impeça que o crime de furto seja qualificado-privilegiado, tendo em vista que as qualificadoras têm natureza objetiva. Cita ainda a Súmula 511 do STJ, que disciplina: “É possível o reconhecimento do privilégio previsto no § 2º do art. 155 do CP nos casos de crimes de furto qualificado, se estiverem presentes a primariedade do agente, o pequeno valor da coisa e a qualificadora for de ordem objetiva”.

Não se pode confundir o furto privilegiado com o princípio da insignificância ou da bagatela. Segundo Cunha (2016), o requisito do pequeno valor do prejuízo não se mistura com o prejuízo insignificante, mesmo porque, em caso de prejuízo insignificante, tem-se a exclusão da tipicidade material.

Desvenda Nucci (2019), que a insignificância ocasiona a atipicidade da conduta, ao passo que o bem subtraído tem valor insignificante, sendo inapto a impactar o patrimônio da vítima. O furto privilegiado, por sua vez, possibilita a concretização do delito, ainda que com atenuação da pena por conta do valor de pequena monta.

Presentes os requisitos acima elencados, quais sejam: a primariedade do agente e o pequeno valor da coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços ou aplicar somente a pena de

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multa. Pode, ainda, substituir a pena de reclusão por detenção e diminuir de um a dois terços (JESUS, 2020, p. 436).

Elucida Capez (2019), que se fazendo presentes os requisitos da primariedade, em que pese o artigo 155, §2º do Código Penal, utilizar o verbo “poder”, como se fosse uma faculdade do juiz, é dominante o entendimento de que é o privilégio um direito subjetivo do réu. Dessa forma, o juiz é obrigado a conceder o benefício quando preenchidas as exigências legais.

Nessa esteira, Jesus (2020) defende que presentes as circunstâncias, a aplicação do privilégio é obrigatória e não uma simples faculdade do juiz. Ademais, a faculdade expressada pelo vocábulo “poder” se refere ao quantum da diminuição e a conveniência da substituição da pena.

Da mesma forma que no crime de furto, a apropriação indébita também é agraciada pelo privilégio, previsto no artigo 155, §2º, do Código Penal, conforme dispõe o artigo 170 do mesmo diploma. Nas palavras de Capez (2019), a leitura do artigo 170 do CP revela que se o criminoso é primário e é de pequeno valor a coisa apropriada, deve o magistrado substituir a pena de reclusão pela detenção, diminuí-la de um a dois terços ou aplicar apenas a pena de multa.

Outrossim, o crime de estelionato possui sua forma privilegiada, consoante do artigo 171, §1º, do Código Penal. Este dispositivo prevê a redução ou a substituição da pena em se tratando de criminoso primário e quando é de pequeno valor o prejuízo. (MIRABETE; FABBRINI, 2014, p. 292)

Nas digressões de Jesus (2020), o Código Penal define o estelionato privilegiado, impondo ao magistrado, em sendo preenchidos os requisitos da primariedade e do pequeno prejuízo causado pelo fato, a substituição da pena de reclusão pela detenção, a sua diminuição de um a dois terços ou apenas a aplicação de multa.

Todavia, em que pese o requisito similar da primariedade em relação às outras hipóteses de crime patrimonial privilegiado, o estelionato diverge dos outros tipos penais em relação ao pequeno valor. Enquanto no furto se considera o pequeno valor da coisa, o estelionato pressupõe o pequeno valor do prejuízo sofrido pela vítima, que não deve ser superior a um salário mínimo. (NUCCI, 2019, p. 638)

Ademais, quanto à aplicação do privilégio em relação não apenas à figura do “caput” do artigo 171 do Código Penal, como também às formas equiparadas, previstas no §2° do mesmo dispositivo, apesar de haver corrente que entenda de

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forma diversa, parece um paradoxo não estender o benefício às variantes do crime previstas no parágrafo segundo, tendo em vista que alguns, inclusive, são menos graves do que àquela estampada no “caput”. Além disso, tratar de forma diversa crimes da mesma natureza é ferir o princípio constitucional da proporcionalidade. (CUNHA, 2016, p. 354)

Nesse sentido, expressam Mirabete e Fabbrini (2014), que se aplica o privilégio ao crime de fraude no pagamento por meio de cheque, bem como a todas as demais figuras do art. 171, §2º do Código Penal, ocasionando a substituição da pena de reclusão pela de detenção, a redução de qualquer delas ou a imposição de simples pena de multa, caso restarem preenchidos os requisitos da primariedade do pequeno valor o prejuízo.

Por fim, a última figura de crime patrimonial privilegiada é a da receptação dolosa privilegiada. Dessa forma, em se tratando da figura do caput e do § 2º do artigo 180 do Código Penal, aplica-se o disposto no §2º do artigo 155 do mesmo diploma legal. (MIRABETE, FABBRINI, 2014, p. 343)

Conforme complementa Jesus (2020), o artigo 180, §5º, do Código Penal disciplina que, em se tratando de receptação dolosa, tem cabimento o privilégio previsto para o crime de furto. Todavia, a benesse se aplica às formas dolosas da receptação, previstas no caput e §1º do artigo 180 do Código Penal, não incidindo na figura qualificada do §6º.

Restando superadas as digressões acerca dos privilégios previstos aos crimes patrimoniais de furto, apropriação indébita, estelionato e receptação dolosa, será tratado da Súmula 554 do STF, instituto relacionado aos crimes patrimoniais no que tange à figura do crime de estelionato por emissão de cheque sem provisão de fundos.

2.2.3 Da Súmula 554 do STF

O crime patrimonial de estelionato, que comporta diversas modalidades equiparadas, pode ser beneficiado com o instituto do arrependimento posterior, caso preencha os requisitos previstos no artigo 16 do Código Penal. Todavia, a modalidade de estelionato por fraude no pagamento por meio de cheque possui uma Súmula que é mais benéfica ao agente, mas anterior ao arrependimento posterior, que surgiu com a reforma penal. Dessa forma, veremos adiante no que consiste a

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referida súmula e qual o entendimento que prevalece, ou seja, a benesse aplicável a essa modalidade de estelionato.

Nas digressões de Nucci (2019), é este um crime artístico, tendo em vista que pressupõe representação, convencimento, falas decoradas, cenários montados, figurantes e todos os apetrechos essenciais para enganar alguém com uma história. A diferença crucial entre uma peça teatral e o estelionato reside no fato de que este não ganha aplausos no fim da encenação, mas, sim, uma vantagem ilícita em prejuízo da vítima enganada.

Este tipo penal compreende induzir ou manter alguém em erro por meio de artifício, ardil ou outro meio fraudulento e com a finalidade de obter para si ou para outra pessoa uma vantagem ilícita em despesa alheia. Ao invés do uso de violência ou grave ameaça, vale-se o agente de artimanha para compelir a vítima em erro, obtendo falsa percepção dos fatos, ou mantendo-a em erro, valendo-se de estratégia para obstar que perceba o equivoco com que está lidando. (CAPEZ, 2019, p. 744)

O artigo 171, §2º do Código Penal prevê as figuras equiparadas de estelionato e, dentre elas, encontra-se disposto no inciso VI a fraude no pagamento por meio de cheque. Assim dispõe a norma supramencionada: “§ 2º - Nas mesmas penas incorre quem: VI - emite cheque, sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado, ou lhe frustra o pagamento. ” (BRASIL, 1940)

Essa figura de estelionato pode ser realizada por meio de duas condutas. A primeira se trata da emissão do cheque sem provisão de fundos em poder do estabelecimento bancário sacado, na qual o título é posto em circulação para efeito de imediato pagamento, não havendo suficiente saldo bancário. Na segunda forma, entretanto, apesar da provisão de fundos, a quantia é retirada antes do saque ou é dada a contraordem de pagamento. (DE JESUS, 2020, p. 567)

Desdobrando essa figura equiparada, Nucci (2019) destaca que a emissão de um cheque consiste em colocar esse título de crédito em circulação. Frustrar o pagamento significa iludir ou enganar o credor, impedindo assim a remuneração. Ademais, essa frustração pode ocorrer de formas variadas, como a retirada dos fundos da conta, o encerramento da conta antes da apresentação do cheque, bem como a sustação do título de crédito.

A emissão, nas digressões de Mirabete e Fabbrini (2014), não acontece com o simples preenchimento e assinatura do emitente, e sim pela circulação do título sem existência de fundos em poder do sacado, exigível no momento do saque.

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Todavia, completam que caso o agente providencie o depósito antes da apresentação do título pelo tomador sacador, sem ocasionar prejuízo ao beneficiário, restará inexistente o crime, ante a necessidade do resultado lesivo (crime material). Pode acontecer, ainda, que o sacador honre o pagamento, em se tratando da inexistência de fundos, sem que o tomador sofra qualquer dispêndio. Neste caso, o pagamento pelo sacado descaracteriza o crime apenas com relação ao beneficiário, mas não quanto ao sacado.

A segunda figura típica se trata de frustrar indevidamente o pagamento. Neste caso, portanto, o cheque é emitido quando se tem provisão de fundos, todavia, o agente os retira, apresenta uma contraordem de pagamento ou emite um novo cheque que tem ciência da cobrança anterior ao pagamento do sujeito passivo a quem quer prejudicar. (MIRABETE, FABBRINI, 2014, p. 338)

O cheque, nas palavras de Capez (2019), reproduz uma ordem de pagamento à vista. Logo, emitido o título de crédito em proveito do beneficiário (tomador), em havendo provisão de fundos na conta do emitente, a instituição bancária (sacado) deve realizar o pagamento que nele está consubstanciada.

Todavia, acrescenta Capez (2019) que, quando a conta bancária do emitente não tiver o valor suficiente para cobrir o cheque, consequentemente a instituição financeira não efetuará o pagamento. Esse acontecimento nem sempre configurará um ilícito criminal, podendo ocasionar um ilícito civil.

Cheque é um título de crédito, que consubstancia uma ordem de pagamento à vista, cujo conceito deve ser obtido no direito comercial; portanto, depende de valoração jurídica.

Consta do tipo a expressão sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado no momento da emissão do cheque – que não significa simplesmente o seu preenchimento, mas a entrega a terceiro; portanto, é preciso que o estabelecimento bancário, encarregado da compensação, já não possua fundo suficiente para cobrir o pagamento.

Se possuir a provisão de fundos, mas esta for alterada antes da apresentação do título, recorre-se à segunda figura (frustrar o pagamento). Por outro lado, se o agente possuir cheque especial, é natural que o pagamento feito pelo banco, ainda que resulte em saldo negativo, não configure o delito. E mais: contando o emitente com seu limite de cheque especial – e emitindo o cheque com valor que não ultrapasse o referido limite –, caso o banco recuse o pagamento, por razões de política institucional, o crime também não se configura. (NUCCI, 2019, p. 650)

Explica Capez (2019), ainda, que no caso de o emitente emitir a cártula na certeza de que possui fundos disponíveis para o adequado pagamento, quando na verdade não há qualquer verba depositada na agencia bancária, não se configura o

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ilícito criminal em virtude da falta de má-fé. O portador da cártula (beneficiário), em face do ilícito civil, poderá ingressar com uma ação de execução civil contra o emitente em busca do valor do título que o banco devolveu, posto que o cheque é um título executivo extrajudicial, segundo a lei processual civil.

São travadas algumas divergências doutrinárias acerca do momento consumativo dessa figura do estelionato, nesse sentido:

Várias as opiniões a respeito da consumação do delito em apreço. Basileu Garcia, tendo-o como crime formal, entende que se consuma ele com a simples emissão do título, ou seja, no momento em que o agente lança sua assinatura. Hungria, por seu turno, afirma que a consumação se dá com a emissão do título, que só ocorre quando é ele posto em circulação. Noronha, por fim, considerando-o como crime material, só o tem por consumado quando o cheque é apresentado ao sacado e este recusa o pagamento pela inexistência de fundos ou em decorrência de contraordem. Esta última tese é a adotada na jurisprudência, inclusive no STF, diante da Súmula 521, assim redigida: "O foro competente para o processo e julgamento dos crimes de estelionato, sob a modalidade da emissão dolosa de cheque sem provisão de fundos, é c do local onde se deu a recusa do pagamento pelo sacado." No mesmo sentido foi editada a Súmula 244 do STJ. Como a competência é determinada pelo local da consumação, admite-se a recusa do pagamento como o momento da consumação. Somente aí ocorre o prejuízo, mesmo porque a falta de provisão poderia ter sido suprida ou o cheque poderia ter sido honrado pelo sacado. É de salientar-se que, em se tratando de direito penal, basta uma apresentação do cheque recusado por ausência de fundos para que o crime se consume. (MIRABETE, FABBRINI, 2014, p. 340)

Dessa forma, apesar de alguns defenderem a consumação pela simples emissão do título (assinatura), e outros considerarem o momento em que foram postos em circulação, a posição jurisprudencial, sumulada inclusive pelo STF, entende por ser este um crime material. Sendo compreendido como delito material, portanto, se consuma com a apresentação ao sacado e a efetiva recusa ao pagamento por inexistência de fundos ou contraordem.

Feitas as considerações acerca da fraude no pagamento por meio de cheque, inclusive, quanto à sua consumação, importante mencionar sobre tratamento especial dado a esta figura equiparada, no que tange à figura da Súmula 554 do STF. Nas digressões de Cunha (2016), a Súmula 554 do STF disciplina que na modalidade de emissão de cheque sem fundos, a reparação do dano anterior ao recebimento da inicial obsta a instauração da ação penal. Em que pese a referida súmula não fazer menção à modalidade de frustrar o pagamento, o autor diz não existir razão para o tratamento distinto, acreditando ser abrangida pelo benefício.

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Nucci (2019), ao seu turno, acredita ser necessário distinguir se essa modalidade de estelionato foi cometida com intenção fraudulenta ou não, ou seja, se está presente o elemento subjetivo específico. Ele defende que, em havendo a intenção do sujeito em praticar a fraude, não deveria o pagamento do cheque antes do recebimento da denúncia impedir a ação penal, mas tão somente se aplicar a causa de redução da pena do artigo 16 do Código Penal. Todavia, a Súmula 554 do STF não fez essa distinção.

Bitencourt (2012) aponta que, em que pese a reforma penal que criou a norma do artigo 16 do CP – único benefício que poderia incidir no crime de estelionato na modalidade de emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos, no caso de pagamento antes da denúncia – o Supremo Tribunal Federal permaneceu aplicando a Súmula 554.

Bitencourt (2012) acrescenta, ainda, que esta súmula nasceu da discussão sobre a natureza dessa modalidade de estelionato, se seria afinal um crime material ou formal. Prevaleceu, portanto, o entendimento de que é um crime material e, como tal, a consumação se daria com o efetivo prejuízo da vítima, verificado na agencia bancária em que ocorresse a recusa de pagamento, e não no local em que fosse emitido o título. Dessa forma, sustenta que a referida súmula, por ser mais favorável ao agente, continua tendo aplicação tão somente na hipótese do artigo 171, §2º, VI, do Código Penal e o artigo 16 do mesmo diploma incidirá aos demais casos.

Em sentido contrário, Prado (2014) aponta que o entendimento que prevalece, qual seja, a aplicação da Súmula 554 do STF, não possui fundamentação jurídica, uma vez que a recomposição do patrimônio lesado não pode ser aceita como excludente de ilicitude. Explica que a recomposição do patrimônio do sujeito passivo é uma consequência do crime, não podendo excluir o delito, inclusive, porque o tipo penal se aperfeiçoa com o acréscimo ao patrimônio do agente com a vantagem ilícita obtida.

Ademais, pontua Prado (2014), ainda, que os defensores da aplicação da Súmula 554 do STF obliteram do disposto no artigo 846 do Código de Processo Civil, que dispõe que a transação efetuada entre as partes, referentes às obrigações advindas do delito, não extinguem a ação penal. Dessa forma, a recomposição patrimonial deve ter efeitos apenas na intensidade da pena, e não na destipificação da conduta ilícita, devendo se aplicar o instituto do arrependimento posterior.

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2.2.4 Do acordo de não persecução penal

O acordo de não persecução penal é um negócio jurídico de natureza extrajudicial previsto no artigo 28-A do Código de Processo Penal, incluído no ordenamento jurídico por meio da Lei 13.964/19, denominada Pacote Anticrime. Este negócio jurídico é celebrado entre Ministério Público e autor do fato delituoso, devidamente assistido pelo seu defensor, e, ainda, devendo ser homologado pelo juízo competente (ao menos, em regra, pelo juiz das garantias, nos termos do artigo 3º-B, XVII do CPP). Neste acordo, o autor confessa formal e circunstancialmente a prática do delito, comprometendo-se a cumprir certas condições que não privem a sua liberdade e, em troca, o parquet se compromete a não o denunciar, sendo extinta a punibilidade ao final do cumprimento integral do pacto. (DE LIMA, 2020, p. 274)

Ao tratar do conceito e da natureza jurídica do acordo de não persecução penal, Cunha (2020) define como sendo um ajuste obrigacional realizado entre o órgão acusador e o investigado, assistido por advogado. Assinala que deve ser este homologado pelo juiz, onde o autor do delito assume a sua responsabilidade com relação ao fato, aceitando cumprir condições mais brandas do que a sansão penal aplicável ao crime cometido.

Dessa forma, é evidente que esse instituto trouxe grande mudança para o cenário criminal, tendo em vista que aqueles delitos com menor potencialidade lesiva têm em suas mãos mais um benefício aplicável. Pacelli (2019) considera positiva qualquer tentativa de reduzir o campo da persecução penal em relação a crimes de gravidade reduzida e praticados sem emprego de violência, pontuando que a Constituição Republicana é minimalista ao tratar de incriminação. Entretanto, diz que não apenas nulla poena sine lege, mas também que toda e qualquer restrição de direitos deve estar prevista em lei.

Outrossim, alguns doutrinadores fazem críticas ao acordo de não persecução penal, tendo em vista a atuação do Ministério Público como protagonista em sua criação. As críticas ainda são fundamentadas em nome dos princípios consagrados pela Constituição Cidadã, como a reserva legal, legalidade e devido processo legal, além do nulla poena sine iudicium. Nesse sentido:

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Feitas tais considerações, não podemos deixar de reconhecer que a discordância judicial quanto à medida surge como obstáculo intransponível ao princípio da legalidade. A última palavra não poderá ser do Ministério Público, tal como ocorre nas hipóteses do art. 28 do CPP. E há uma razão, também insuperável, para a ressalva. O controle judicial do arquivamento no Brasil tem previsão legal. Nunca achamos ser essa a melhor solução, mas a Lei não existe para contemplar nossas preferências teóricas. (PACELLI, 2019, p. 180)

Rangel (2019), ao seu turno, critica esse instituto despenalizador, reputando-o inconstitucional, ao passo que fere gravemente os princípios do devido processo legal, da reserva legal, do nulla poena sine iudicium e da legalidade. Ainda, assevera que o pior de tudo é o fato dessa afronta ter sido feita pelo órgão máximo de todos os Ministérios Públicos, que é o Conselho Nacional do Ministério Público. Aduz que deve o CNMP cuidar de assuntos administrativos internos da instituição e deixar que o Congresso Nacional desempenhe o papel de legislar sobre matéria de direito penal e processo penal, a fim de não perder a credibilidade.

Pacelli (2019) acredita que a única alternativa que autorizaria a validade da iniciativa prevista na Resolução 181 do CNMP seria a confirmação, tanto pelo MP, como pelo magistrado competente, da carência de uma das condições da ação penal, que se mostraria inviável por ausência de interesse (necessidade/utilidade) de agir. Cumprido o requisito para não persecução em juízo, o acusado, devidamente assistido por advogado por ele constituído, poderia por livre e espontânea vontade se submeter ao cumprimento de deveres tipicamente penais, tendo como retorno o benefício de afastamento do risco de condenação mais severa.

Em complemento, o autor diz que isso só seria possível em cronologia de simultaneidade. E explica: o acordo de não persecução penal estaria incluído no requerimento de arquivamento do inquérito ou procedimento, por ausência de justa causa penal – ausência de causa processual penal, a rigor – todavia, admitindo o procedimento interno, nos moldes da Resolução 181 do CNMP. Salienta, ainda, que a decisão judicial de homologação do acorda abrangeria, também, o juízo da indivisibilidade da ação penal, estrito senso. (PACELLI, 2019, p. 179)

Ademais, mesmo que o acordo, conforme previsão legal, seja submisso à apreciação judicial, é possível que o Procurador-geral (ou órgão superior interno responsável por sua apreciação) mantenha o acordo de não persecução penal, ainda que em oposição ao Poder Judiciário, ato que vincularia toda a Instituição. (PACELLI, 2019, p. 178)

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Feitas as considerações acerca do que vem a ser o acordo de não persecução penal, e ainda, as críticas que recebeu esse instituto despenalizador, importante mencionar os requisitos que autorizam a sua celebração, dispostos no CPP.

Os pressupostos do acordo de não persecução penal são cumulativos e todos aqueles previstos, mesmo que implicitamente, no caput do artigo 28-A do Código de Processo Penal. Assim, um pressuposto é a existência de procedimento investigatório, uma vez que é importante a segurança de um procedimento formalizado, a fim de evitar abusos por parte do Estado e proporcionando a clareza da negociação. O importante é a existência desse procedimento, seja ele um inquérito policial ou um procedimento investigatório presidido pelo órgão de execução do MP, para que as condições adequadas e necessárias sejam corretamente ajustadas. (CUNHA, 2020, p. 128)

Outro requisito é que a infração penal cometida tenha como pena cominada patamar inferior a 04 (quatro) anos. Para que seja aferida a pena mínima cominada do tipo penal, devem ser consideradas as causas de aumento e diminuição de pena aplicáveis no caso concreto, conforme elucida o artigo. 28-A, §1º, do CPP. Nesse sentido, ainda, disciplina o Enunciado 29 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM), na linha que dispõem também os enunciados sumulados do STJ e STJ, respectivamente, súmulas n. 243 e 723. (DE LIMA, 2020, p. 280)

Outrossim, ao tomar como norte a pena abstratamente cominada ao delito, em sendo aplicável causa de aumento variável, deve ser utilizada a menor fração e, em sendo o caso de diminuição variável, a maior. Somente utilizando esse critério é possível chegar na pena mínima abstratamente possível da infração penal em tese praticada pelo investigado. (CUNHA, 2020, p. 129)

Além disso, Lima (2020) aponta que é condição para o acordo que a infração penal cometida não tenha emprego de violência ou grave ameaça à pessoa. Tendo em vista que o caput do art. 28-A do CPP utiliza a expressão infração penal, pode-se concluir que o acordo pode ser celebrado independentemente da natureza do delito, seja ele crime ou contravenção penal.

Importante mencionar que a violência ou grave ameaça há de ser praticada a título doloso, visto que se admite celebração de acordo em eventual crime culposo

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com resultado violento. A violência que impossibilita o pacto é a presente na conduta, e não no resultado. Nesse sentido, elucida o Enunciado n. 23 do Conselho Nacional de Procuradores-Gerais dos Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPG) e do Grupo Nacional de Coordenadores de Centro de Apoio Criminal (GNCCRIM). (DE LIMA, 2020, p. 280)

Outra exigência diz respeito a não ser o caso de arquivamento dos autos, posto que o Acordo de não persecução penal pressupõe justa causa para a denúncia, ou seja, mínimo de suporte fático. Dessa forma, ainda que apenas se tenha um início de prova, representado indícios capazes de justificar a oferta da instancia penal, é possível que o acordo seja formalizado, posto que a justa causa restará configurada. (CUNHA, 2020, p. 128)

Por fim, é necessário que o investigado tenha confessado formal e circunstanciadamente a prática do crime. A Resolução 181/17 do CNMP disciplina que a confissão detalhada dos fatos e ajustes do acordo devem ser registradas por meios ou recursos de gravação audiovisual, a fim de que as informações tenham maior veracidade. A Lei 13.964/19 (Pacote Anticrime) não exigiu as formalidades supramencionadas, mas valem ser observadas, dentro do possível. (CUNHA, 2020, p. 129)

Acerca da confissão, Nucci (2020) defende que o acordo de não persecução penal não só pode, mas como deve ser celebrada sem a necessidade de confissão plena e detalhada. Todavia, como alerta Cunha (2020), não se tem o reconhecimento expresso da culpa pelo investigado, mas apenas uma admissão implícita. Para que a culpa seja efetivamente reconhecida, imprescindível o devido processo legal.

Quanto às condições que são impostas ao investigado, estão dispostas nos incisos I a V do CPP do artigo 28-A, que disciplina que podem ser ajustadas de forma cumulativa ou alternativamente:

Art. 28-A. Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente: I - reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo;

II - renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime;

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III - prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); IV - pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou

V - cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada. (BRASIL, 1940, Art.28-A)

Dessa forma, a primeira condição se trata da reparação do dano ou restituição da coisa, exceto se o investigado não tiver a possibilidade de fazê-lo. Lima (2020) aduz que, pelo fato deste dispositivo não fazer nenhuma delimitação, parece possível a reparação de qualquer tipo de dano, seja ele moral, estético, material, etc. Ademais, não causando o delito nenhum tipo de dano à vítima, nitidamente, esta condição não será imposta.

Crítica a essa condição é apontada, como sendo absurda, ao passo que ninguém tem a obrigação de fazer nada, senão em virtude da Lei. Ainda, o investigado é obrigado a reparar o dano sem, ao menos, uma sentença judicial da qual não caiba mais recurso. (RANGEL, 2019, p. 407)

Outra condição, disposta no inciso II do art. 28-A do CPP, trata-se da renúncia voluntária de bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime. Nucci (2020) diz que a renúncia de bens e direitos, no que diz respeito a voluntariedade, trata da realização livre e sem nenhum tipo de coação; quanto a renúncia, se refere a abdicar da propriedade ou posse de algo; no que concerne a bens e direitos, que constituem, conforme indicação do MP, em instrumentos (mecanismos usados para prática do delito), produto (objeto dou direito que resulta diretamente do crime cometido) e proveito (tudo aquilo que resulta de lucro advindo do delito, indiretamente) do crime.

A afronta à Constituição Federal resta apontada nessa condição, tendo em vista que o artigo 5º da Constituição Republicana, no inciso LIV, disciplina que ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal. No acordo de persecução penal, entretanto, o investigado tem que renunciar os seus bens sem ao menos uma sentença judicial com trânsito em julgado. (RANGEL, 2019, p. 407)

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O inciso III do art. 28-A do CPP, trata da prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito, diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Código Penal. O artigo 46 do Código Penal dispõe que a prestação de serviços à comunidade ou às entidades públicas se aplica às condenações superiores a seis meses de privação da liberdade.

Lima (2020) diz que, por se tratar de uma condição para a celebração do acordo de não persecução penal, e não uma pena restritiva de direito, o descumprimento jamais ocasionaria em conversão em pena privativa de liberdade. Já Rangel (2019), ao seu turno, mais uma vez faz críticas a essa condição, levando em consideração o devido processo legal. O autor cita que existe um princípio basilar do processo penal chamado nulla poena sine judicio, que diz, que não há pena sem processo. Acrescenta, por fim, que somente a Constituição Republicana poderia autorizar tal imposição, assim como fez nas infrações de menor potencial ofensivo.

Outra condição, disposta no inciso III do art. 28-A do CPP, diz respeito ao pagamento de prestação pecuniária, na forma do artigo 45 do CP, a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito. Rangel (2019), ao seu turno, mais uma vez aponta a afronta ao princípio da reserva legal, pois este reproduz que não se pode obrigar ninguém a pagar multa, senão em virtude da Lei.

Quanto a este dispositivo e ao anterior (inciso III do art. 28-A do CPP), Cunha (2020) alerta que são condições do ANPP, ou seja, é uma cláusula que estabelece a realização de uma ação ou situação para que o negócio jurídico aconteça. Não é, portanto, uma sanção penal e, consequentemente, no caso de seu descumprimento, o MP não poderá executar, mas sim, oferecer a denúncia.

Por fim, o inciso V do artigo 28-A do CPP aduz que pode o Ministério Público indicar outra condição a ser cumprida pelo investigado, por prazo determinado e, desde que proporcional e compatível com a infração imputada. Acerca do tema, colhem-se as lições de Lima (2020), que diz não se tratarem essas condições a serem estipuladas pelo parquet para punir o investigado, mas para mostrar autodisciplina e senso de responsabilidade objetivando a ressocialização e demonstrando a desnecessidade de deflagração da persecutio criminis in judicio.

Referências

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