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Incidências penais verificadas versus pequeno valor do bem furtado

No documento MARIA GABRIELA VIANA PEIXOTO (páginas 62-69)

2. A PRÁTICA JURÍDICO-PENAL DIANTE DO DISCURSO

2.1 A CRIMINALIZAÇÃO SECUNDÁRIA NO DISTRITO FEDERAL EM

2.1.2 O furto e o bem jurídico

2.1.2.2 Incidências penais verificadas versus pequeno valor do bem furtado

Além do alto índice de furtos tentados, constatou-se que de um modo geral, ele ocorre na sua forma simples. O indivíduo “subtrai, para si ou para outrem, coisa alheia móvel”, não se vislumbrando nenhuma circunstância que agrave a natureza do furto praticado. Ele chega a quase 50% do total de ocorrências, enquanto suas formas qualificadas, elencadas nos incisos do §4º do art. 155 do Código Penal, juntas, totalizam 43,75%. É o que restou diagnosticado pelos dados apresentados pelas Tabelas 12 e 13.

Tabela 12

Distribuição da incidência penal detalhada

INCIDÊNCIA PENAL PERCENTUAL

155 caput 47,22% 155 § 1º 0,69% 155 § 2º 6,94% 155 § 3º 1,39% 155 § 4º, Inc. I 5,56% 155 § 4º, Inc. I e II 1,39% 155 § 4º, Inc. I e IV 6,25% 155 § 4º, Inc. II 5,56% 155 § 4º, Inc. II e IV 3,47% 155 § 4º, Inc. III 2,78% 155 § 4º, Inc. IV 18,75% TOTAL 100,00%

Fonte: Processos do TJDFT que compuseram a amostra da pesquisa. Elaboração própria.

Tabela 13

Distribuição da incidência penal

INCIDÊNCIA PENAL PERCENTUAL

Furto Simples 49,31%

Furto Qualificado 43,75% Furto Privilegiado 6,94%

TOTAL 100,00%

Fonte: Processos do TJDFT que compuseram a amostra da pesquisa. Elaboração própria.

Onde para esta questão foi utilizada a seguinte convenção: 1) Furto simples: Caput, § 1º e § 3º;

2) Furto qualificado: § 4º; 3) Furto Privilegiado: § 2º.

Para além da crítica exposta por Bitencourt (2007, p. 20) acerca da majorante prevista para os casos em que o furto ocorra durante o repouso noturno, entendendo seu

fundamento por equivocado e sem razão de ser mantido no limiar do Século XXI, em verdade, a sua ocorrência é quase ínfima. No caso, apenas 0,69% dos casos.

Em relação aos tipos qualificados, situação entendida de maior reprovabilidade em virtude dar maior gravidade na violação do patrimônio alheio, merecedora, portanto, de maior punibilidade (BITENCOURT, 2007, p. 26-27), percebe-se que a grande incidência está na execução do furto mediante concurso de duas ou mais pessoas (§4º, IV), a qual chega a representar 18,75% do total de casos estudados quando foi aplicada isoladamente. No caso, o percentual é de 6,25% desta qualificadora em concurso com a que indica a destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa (§4º, I e IV) e 3,47 % com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza (§4º, II e IV).

Observa-se ainda pelas Tabelas 12 e 13, que em apenas 6,94% dos casos estudados foram considerados furtos privilegiados apesar de a pesquisa ter revelado que os casos de furto praticados no DF no período compreendido entre 1997 e 1999 foram furtos de bens de uso pessoal e de pequeno valor.

Pela Tabela 14, em quase 50% dos casos (49,31%), o bem furtado foi de uso pessoal e/ou mercadorias. Especificamente, bens de uso pessoal, 27,78% da amostragem, e mercadorias, 21,53%.

O tipo de bem furtado confirma que a vítima em sua maioria foi pessoa física (77,42% dos casos). O percentual de vítimas pessoa jurídica para os casos de furto estudados foi bem pequeno, 22,58%.

Tabela 14

Distribuição do tipo de bem furtado

TIPO DE BEM PERCENTUAL

Bens de uso pessoal 27,78%

Mercadorias 21,53% Acessórios de veículo 18,06% Eletrodomésticos/móveis 17,36% Dinheiro 16,67% Veículo 13,19% Bicicleta 4,86% Água/energia 1,39%

Arma 0,69%

TOTAL 100,00

Fonte: Processos do TJDFT que compuseram a amostra da pesquisa. Elaboração própria.

O diagnóstico do tipo de bem furtado e quem foram as vítimas coincidem com o fato de que, em sua maioria, os furtos ocorreram em estabelecimentos comerciais (31,94%) e em vias públicas (28,47%).

Tabela 15

Distribuição do local do fato

LOCAL DO FATO PERCENTUAL

Estabelecimento comercial 31,94%

Via pública 28,47%

Residência de pessoas físicas 22,92%

Veículo 11,81%

Local de Trabalho de pessoas físicas 2,78%

Hospital 0,69%

Outros: construção 0,69%

Transporte coletivo 0,69%

TOTAL 100,00%

Fonte: Processos do TJDFT que compuseram a amostra da pesquisa. Elaboração própria.

Sobre o valor do bem furtado, destaca-se que este não ultrapassou mais de R$ 275,00 (duzentos e setenta e cinco reais) em até 50% dos casos. É o que nos indica a Tabela 16 que trata do valor do bem furtado para os casos estudados.

Tabela 16

Distribuição do valor do bem furtado (Em R$)

MEDIDA DE POSIÇÃO VALOR DO BEM FURTADO

Menor valor 7,98

1ª quartil 105,50

Mediana 275,00

3ª quartil 675,00

Maior valor 93.673,90

Obs.: O 1º quartil representa até 25% dos casos; a mediana representa até 50% e o 3º quartil até 75%.

Fonte: Processos do TJDFT que compuseram a amostra da pesquisa. Elaboração própria.

Pelos dados da referida Tabela, em até 25% dos casos o valor do bem furtado não ultrapassou R$ 105,50 (cento e cinco reais e cinquenta centavos).

Cumpre destacar o valor do salário mínimo à época da coleta de dados da pesquisa. No caso, no período compreendido entre 1º de maio de 1997 a 30 de abril de 1998 era de R$ 120,00 (cento e vinte reais); entre 1º de maio de 1998 a 30 de abril de 1999 o seu valor era de R$ 130,00 (cento e trinta reais); e, entre 1º de maio de 1999 a 02 de abril de 2000 o salário mínimo representava 136,00 (centro e trinta e seis reais).10

Fazer o comparativo entre o valor do salário mínimo vigente à época dos furtos estudados e o diagnóstico do valor do bem furtado ganha destaque ao confrontar estas informações com o baixo índice diagnosticado para as ocorrências de furto privilegiado previsto no §2º do art. 155 (6,94% – Tabelas 12 e 13).

Como foi visto está entregue à livre apreciação do juiz a consideração do privilégio associado ao valor do bem furtado, lembrando que, normalmente, a interpretação busca avaliar o pequeno valor em função do patrimônio da vítima e das peculiaridades e as circunstâncias pessoais e locais do fato, representando como teto o valor equivalente ao salário mínimo (FRAGOSO, 1976, p. 301 e BITENCOURT, 2007, p. 24).

10

Fonte: Lei nº 9.971, de 18 de maio de 2000, que dispõe sobre o salário mínimo a partir de 1º de maio de 1996, e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/Leis/L9971.htm >

De fato, para além do critério do pequeno valor, concorre para que seja considerado o furto privilegiado a “primariedade” do réu, lembrando que neste caso eventuais condenações anteriores, por si sós, ou meros antecedentes criminais negativos não são causa impeditivas do reconhecimento da existência desse requisito à luz de nosso ordenamento jurídico em vigor (BITENCOURT, 2007, p. 23-24).

Acontece que, na amostra pesquisada, revelou-se uma baixa ocorrência de réus reincidentes, ou seja, que estavam sendo processados pelo furto objeto da pesquisa, mas que tinham praticado um crime após trânsito em julgado de decisão condenatória, antes de transcorrer o prazo de cinco anos do cumprimento ou da extinção da pena. Como visto, esta é a hipótese de exclusão da previsão para “primariedade” prevista no §2º do art. 155.

Pelas tabelas que seguem poder-se-á observar que dos 144 formulários de furto estudados, foi diagnosticado que, embora tenha sido comum a presença de pelo menos um antecedente, poucos réus se enquadravam no conceito técnico de reincidência.

Tabela 17 Resultado do feito RESULTADO TOTAL % Em andamento 90 50,56% Arquivado/Extinção 41 23,03% Condenação 40 22,47% Suspenso 7 3,94% Absolvição - TOTAL 178 100,00%

Fonte: Processos do TJDFT que compuseram a amostra da pesquisa. Elaboração própria.

Por esta tabela, percebe-se que dos 178 antecedentes encontrados entre os 144 réus de furto estudados, apenas 22,47% do total referiam-se a condenações. No entanto, 50,56% ainda se encontravam em andamento.

De fato, pela Tabela 18, observa-se um alto índice de antecedentes que se referiam, tão somente, a inquéritos policiais. No caso, 44,44%.

Tabela 18

Tipo de feito do antecedente

ANTECEDENTE TOTAL %

PJ 100 55,56%

IP 80 44,44%

TOTAL 180 100,00%

Fonte: Processos do TJDFT que compuseram a amostra da pesquisa. Elaboração própria.

Pelos dados que seguem da Tabela 19, entre o total de antecedentes diagnosticados, em torno de 180 (conforme Tabelas 17 e 18) foi pequena a quantidade dos que se referiam a sentenças com “trânsito em julgado”.

Tabela 19

Trânsito em julgado do antecedente TRÂNSITO EM JULGADO TOTAL

Sim 65

Fonte: Processos do TJDFT que compuseram a amostra da pesquisa. Elaboração própria.

Menor ainda foi o número de casos em que restou evidenciada a existência de antecedentes cumulados com condenação cuja data do trânsito em julgado era anterior à data do fato, isto é, casos de reincidência.

Tabela 20

Número de antecedentes com reincidência (data do trânsito em julgado da condenação anterior à data do fato)

ANTEC. COM REINCID. TOTAL

Sim 32

Fonte: Processos do TJDFT que compuseram a amostra da pesquisa. Elaboração própria.

Ainda assim, é importante observar que de modo geral os antecedentes diagnosticados referiam-se a crimes patrimoniais. Em 68,10% dos casos, tratava-se de furtos e em apenas 11,04%, roubos. O percentual diagnosticado para antecedentes

referentes a crime contra a vida, no caso homicídio, foi menor que o percentual encontrado para crimes de menor potencial ofensivo, 3,07% e 5,52%, respectivamente.

Tabela 21

Tipo penal do antecedente

ANTECEDENTE 1º 2º 3º 4º 5º TOTAL % Furto 39 27 17 15 13 111 68,10% Roubo 8 4 3 2 1 18 11,04% Menor potencial 5 1 2 1 - 9 5,52% Homicídio 3 1 - 1 - 5 3,07% Outros 10 7 2 1 - 20 12,27% TOTAL 65 40 24 20 14 163 100,00%

Fonte: Processos do TJDFT que compuseram a amostra da pesquisa. Elaboração própria.

Ressalta-se que avaliar a vida pregressa dos réus dos furtos estudados além de nos fornecer informação acerca do segundo critério necessário para a consideração, ou não, da hipótese de furto privilegiado, é importante, pois estas informações irão refletir, igualmente, na análise dos requisitos subjetivos para a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos arrolado no art. 44 do CP. Este artigo impõe que o réu não seja reincidente em crime doloso; que a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias, indiquem que a substituição seja suficiente.

No documento MARIA GABRIELA VIANA PEIXOTO (páginas 62-69)