• Nenhum resultado encontrado

AS INFLUÊNCIAS NORMATIZANTES PARA A PRODUÇÃO DE SUBJETIVIDADE, A ESTIGMATIZAÇÃO E A POSSIBILIDADE DE REFLEXIVIDADE DO ATOR

No documento A criança (páginas 47-62)

SOCIAL

Este Capítulo tem o propósito de fornecer uma compreensão a respeito dos

processos sociais modernos de institucionalização e normatização e seus efeitos na produção de subjetividades, a fim de suscitar uma reflexão mais ampla e condizente com a complexidade que o nosso objeto de estudo requer, ou seja, com a problemática que envolve o processo social de estigmatização de crianças inseridas nos CAPS infanto-juvenis. Na verdade, tudo concorre para que a institucionalização das crianças se perpetue, constatando-se que, geralmente, quando atingem a maioridade, são encaminhadas aos CAPS adultos ou são confinadas em seus lares, quando não se iniciam no mundo da marginalidade, não sendo ao menos apontadas perspectivas de vida mais promissoras para as mesmas.

A princípio, traremos a visão de Goffman sobre a manipulação do “eu” em suas obras “A representação do eu na vida cotidiana” e “Estigma”. A seguir, discorreremos sobre o tema foucaultiano a respeito das esferas formadoras de valores, especialmente da filosofia e da religião, e sua repercussão na constituição de subjetividade.6 Evidenciaremos então a tendência constante do enquadramento do sujeito no próprio exercício de seus papéis sociais; no entanto, buscamos entender sobre a abertura de frestas ao agir reflexivo do ator social em Giddens e, mais tenuamente, em Goffman. Porém, é o primeiro autor quem detalha e esclarece a respeito deste aspecto, por isto pretendemos assinalar a sobre o seu “projeto vida”, tendo em vista as transformações sociais que se fazem necessárias no contexto pesquisado. Além destes estudos, fizemos um apanhado teórico sobre a normatização social em dois diferentes ângulos: o do funcionamento do discurso e o do nascimento dos valores morais e dos bons costumes impulsionado pelas instituições sociais.

6O termo “sujeito” e seu derivado “subjetividade”, neste contexto, não expressam toda a complexidade que a psicanálise apresenta, especialmente ao explicar a respeito do “sujeito de desejo”. Neste momento, o enfoque dado se refere à evolução do “indivíduo” enquanto ator social, embora que esta compreensão seja importante por nos fornecer subsídios para um maior aprofundamento na problemática apresentada por este trabalho, como veremos no decorrer da leitura. Tomemos como referência sobre esta concepção a obra de OLGIVIE, 1988.

Dando continuidade, no segundo momento, para dar ênfase a possibilidade já sublinhada, observamos que houve por parte das elaborações teóricas das ciências sociais um distanciamento do real panorama social em que os atores sociais costumam se deparar. Assim, tendo em vista que algumas destas privilegiaram o imperialismo unilateral da sociedade em detrimento do movimento criativo do ator social e que outras ressaltaram sabiamente a supremacia da criatividade do sujeito, contudo sem problematizar a força impositiva das regras e normas da sociedade no que se refere ao âmbito do poder-saber estruturado institucionalmente, enfatizamos o exame de Giddens em sua Teoria da Estruturação, já que este autor preza pela associação que há entre as duas análises, não admitindo nem um imperialismo do sujeito sobre as regras sociais ou institucionais, tampouco o seu oposto. Por conseguinte, pudemos compreender melhor sobre a possibilidade mais autônoma de atuação do ator social diante das estruturas normativas no terceiro e último ponto deste Capítulo, pois pretendemos ressaltar o sentido esclarecido de um “projeto vida”,

no qual há a perspectiva de uma constituição ou reconstituição subjetiva mais promissora para a criança vítima de um estigma.

II.1- A NORMATIZAÇÃO SOCIAL, A PRODUÇÃO SOCIAL DE SUBJETIVIDADE E A POSSIBILIDADE REATIVA DO ATOR SOCIAL

II.1.1- NOÇÕES SOBRE A CONSTITUIÇÃO SOCIAL DA SUBJETIVIDADE E CONSIDERAÇÕES SOBRE O SUJEITO ESTIGMATIZADO

O objetivo deste primeiro momento será esclarecer como foi possível o sujeito se situar enquanto ator social, historicamente falando, em termos de se valer das normatizações sociais para o exercício de sua autonomia, considerando a influência delas na produção de sua subjetividade, com repercussões na nossa atualidade. A princípio, veremos o que Goffman entende por “manipulação do eu”, se observando este efeito quando há o fardo de um estigma já instalado, como é o caso das crianças inclusas neste estudo. Em seguida, com a obra foucaultiana sobre as normatizações propagadas desde a antiguidade e as condutas comportamentais moldadas para estes contextos, constataremos que estas padronizações se deram em detrimento de um “conhece-te a ti mesmo”, num sentido mais crítico e reflexivo, no que tange a constituição social de subjetividades. De fato, após essas reflexões, pudemos melhor nos apropriar de questões pontuais que fazem surgir e perpetuar o processo social estigmatizante ora estudado.

Tendo em vista que Goffman (1985) possui um amplo estudo sobre o processo de manipulação do “eu” na vida cotidiana, sendo apreendido que há uma constante preocupação do indivíduo em atuar e manter uma representação já aceita na sociedade, de acordo com os papéis sociais desenvolvidos, acreditamos ser de extrema pertinência discorrer sobre tal texto na perspectiva de um maior debate acerca da relação que há entre estrutura social e mobilidade de ação do ator, bem como sobre o grau de passividade e reatividade do ator social diante das normatizações, já que nos interessa saber o reflexo disto para a transformação vislumbrada por este estudo.

Em conformidade com a teoria em tela, nota-se, já inicialmente, uma intenção que ocorre na interação social, haja vista que há sempre uma precaução do indivíduo, assim que se depara com outros, em saber ao máximo a respeito deles: sua situação sócio-econômica geral, o que pensa de si mesmo, capacidades, confiabilidade etc.; logo, esta antecipação se configurará em um fator que trará segurança quanto às expectativas do contexto social, a fim de que a ação se faça da melhor maneira, no intuito da obtenção de algo, seja de ordem material, cujas variações neste sentido são muitas, ou de ordem psicológica, como se verifica na manutenção do prestígio, do

status, na aceitação social etc. Então, é através da observação de certos indícios,

como a aparência, a conduta, informações de terceiros, experiências anteriores, entre outros aspectos, que isto ocorre. Realmente, é visto com o autor que “os outros” precisam ser cativados para que resultados como estes possam vir à tona, colocando- se, para tanto, em prática, da melhor forma, a expressividade de cada um, tanto a relativa às verbalizações emitidas, quanto às variadas ações não verbais. Com efeito, não há dúvidas de que nestas articulações existe toda uma intenção e, consequentemente, toda uma mobilidade do ator social de acordo com os seus interesses. Sob esta perspectiva, pensamos a respeito dos comportamentos dos familiares frente as suas crianças “estigmatizadas” e nas outras interfaces da criança (com a comunidade, com a escola etc.); ou seja, diante da existência de um processo social de estigmatização é percebido que nas interações as diferenças acabam sendo sobressaltadas, propiciando-se uma constituição subjetiva da criança de acordo com estas crenças e prejudiciando que se coloque em prática esse “jogo social de interação face a face em defesa do eu ”, mesmo tendo em vista a legitimação de “novos discursos” trazidos com a Reforma Psiquiátrica e com a psicanálise,

considerando que esta linha teórica norteou quase por uma década as práticas profissionais no setor da Saúde Mental.

Retornando ao texto em questão, vemos que, objetivando o alcance ou manutenção das aquisições em termos de aceitação, variando em uma escala ascendente, o ator social pode chegar até mesmo ao extremo de agir de maneira completamente calculada. Mas, de todo modo, sempre estará em jogo características morais tidas como relevantes para determinado grupo, como veremos no seguinte trecho (GOFFMAN, 1985, p.21):

[...] quando um indivíduo projeta uma definição da situação e com isso pretende, implícita ou explicitamente, ser uma pessoa de determinado tipo, automaticamente exerce uma exigência moral sobre os outros, obrigando-os a valorizá-lo e a tratá-lo de acordo com o que as pessoas de seu tipo têm o direito de esperar.

Por outro lado, não podemos deixar de ressaltar que, observando melhor o impacto da normatividade na constituição subjetiva dos indivíduos, apesar das representações poderem ser imbuídas de intenções, o ator social pode estar sinceramente convencido de que sua “encenação” é realmente condizente com a “verdade das coisas”, ou seja, ele está certo de que o que faz é verdadeiro, dizendo

Goffman que apenas um cientista social ou uma pessoa que se sente prejudicada

socialmente poderão ter dúvida sobre a realidade do que é apresentado. De toda maneira, mesmos nestes casos, a preocupação com o desempenho e os consequentes benefícios obtidos se farão presentes na interação, haja vista que o relacionamento social pode ser equiparado a uma cena teatral, onde há a concepção de que a própria vida é uma encenação7; muito embora seja esclarecido que o mundo em que se vive não é um palco concretamente falando, mas há a evidencia de que “a vida imita a arte e vice-versa”.

Em todo caso, é acentuado que o indivíduo se utiliza de máscaras, pois sempre estará, mais ou menos conscientemente, representando um papel, sendo unicamente por meio destes papéis que poderá conceber tanto a si mesmo quanto aos outros. Neste âmbito, o papel social é equivalente ao verdadeiro “eu” do indivíduo, no sentido daquilo que ele gostaria de ser, em consonância com sua constituição subjetiva.

7

Este autor procurou analisar sociologicamente a interação face a face em qualquer circunstância da vida social, definindo-a como sendo aquela em que há uma influência recíproca dos indivíduos sobre as ações uns dos outros, quando em presença física imediata. Utilizou-se do termo “encontro” para designar estas situações e do termo “desempenho” para avaliar a ação do participante, chamando também de “platéia” os observadores ou co-participantes que estejam presentes no contexto da interação; por fim, “papel social”, refere-se aos direitos e deveres ligados a uma determinada situação social. GOFFMAN, 1985, p.24.

Ademais, como vimos, o indivíduo precisa fazer um esforço para que sua conduta seja significativa para os outros, ou seja, ele precisa dar credibilidade ao que está expressando, necessitando se utilizar dos valores ideais reconhecidos, sejam estes incorporados à sua personalidade ou não; então, terá também que omitir o que não é compatível com eles, embora possa usufruir disto de forma secreta.

Neste contexto, ao confrontarmos estes escritos com a Teoria da Estruturação

de Giddens (2009), ver-se que existem interesse e intencionalidade do ator em seu

“agir por entre as normas sociais”, significando isto que essa interiorização não se dá sem que possa ocorrer também uma reação e o desenvolvimento de um processo de conscientização. Nesse sentido, diante de certas incompreensões, pudemos

reiteradamente constatar as reações das crianças da nossa pesquisa em relação as tentativas de controle de seus comportamentos, embora que, pela imaturidade, sua reflexidade fica impossibilitada, levando-as a interiorizar os rótulos estigmatizantes.

Isto porque suas reações não são compreendidas de modo subjetivo, sendo estas prontamente atreladas às concepções negativistas; por exemplo, em nossa prática foi corriqueira a verificação de cenas em que a criança agride física ou verbalmente a mãe por insatisfações suas, quando esta, ao invés de tomar uma atitude de acolhimento de tal manifestação infantil, nivela seu comportamento ao da criança, mesmo existindo reiteradas orientações profissionais.

De outra forma, Goffman (1985) expõe que o ator social, apesar do planejamento que faz em razão do que conhece com antecedência ou em virtude de experiências passadas, não sabe exatamente o que pode acontecer em seus pormenores em termos de como se procederá a sua ação e de como serão os efeitos ocasionados por ela, como, por exemplo, no julgamento das expressões que usa e na condução do controle corporal, dos gestos e dos movimentos, podendo alguns deles ser avaliados desfavoravelmente; logo, haverá um constante policiamento das atividades e um receio de se fazer perceber diferentemente do que se quer ser. Em razão disto, a comunicação finda por se traduzir em um ato moral, haja vista que se utilizando uma imagem de si planejada, tanto pelo caráter de obrigação como pelos benefícios advindos das atitudes, o indivíduo se molda a estar constantemente representando, como se realmente estivesse em um palco. Apesar disto, Giddens (2009) analisa esta falta de controle no momento das ações, admitindo que o ator social não possui o domínio de todos os gestos e de todos os termos que usa, mas também dizendo que isto não significa que o objetivo almejado possa ser anulado caso não possua

tamanha rigidez com as questões morais, nem que o grau de racionalidade, para não perder as rédeas da ação, faça com que o ator não possa atuar mais reflexivamente. Por conseguinte, o monitoramento das ações se faz de forma sempre reflexiva, dando possibilidade de, na mesma medida do agir, atuar-se de outra maneira, como poderemos ver oportunamente nos passos seguintes deste estudo.

Para finalizar esta apreensão, em síntese e em conformidade com todo este jogo de interesse ora discutido, é sobressaltado o efeito dramático através do qual o ator social será acreditado ou desacreditado em seu “eu”. Observa-se, de modo claro, que os atributos individuais são de natureza psicológica, mas possue íntima interligação com as contingências da “representação do palco”, demonstrando então a existência de uma dualidade interagindo, como bem nos ensinou Giddens, o que veremos no próximo tópico, em sua Teoria da Estruturação: normas sociais e ação reflexiva do indivíduo. Em razão deste ensinamento, um fator fundamental que não foi apontado por Goffman, pelo menos de forma mais direta, e que queremos destacar, é que esta estrutura social que se esforça para ser mantida, sempre estará suscetível de ocorrências transformativas advindas dos atores sociais. Deste modo, entendemos a influência dos papéis sociais na personalidade do indivíduo, mas indagamos sobre o grau desta influência, acreditando haver outros tipos de efeitos que se mesclam ao dado pelas padronizações, fator este que proporciona a constituição de um sujeito mais autônomo. Por outro lado, não deixamos de perceber a dificuldade para que um

efeito positivo nesse sentido possa ocorrer, tendo em vista o fardo de um estigma já interorizado nas crianças por nós estudadas, no qual já é normalmente esperado um comportamento e um papel social negativos para as mesmas.

Em razão de tal percepção e já procurando nos aproximar de forma mais direta do nosso problema de pesquisa, não poderíamos deixar de examinar a pesquisa realizada por Goffman (1988) a respeito do estigma, haja vista que através das conceituações encontradas em sua obra que trata deste tema, compreendemos melhor sobre o que acontece com a criança vítima de um processo social estigmatizador, sendo ela logo enquadrada nas normatizações legitimadas socialmente. Neste estudo é afirmado que com o passar do tempo a concepção sobre o estigma8 foi sendo modificada, chegando à atualidade de sua época com um caráter

8

Segundo os ensinamentos de Goffman, é visto que o termo estigma teve início com os gregos, cujo objetivo era identificar, por meio de uma marca que se fazia em alguém, algo de extraordinário ou mau sobre o status moral de quem a apresentava. Tais sinais eram feitos com cortes ou fogo no corpo para

muito mais moral, desvalorizando-se, desse modo, o seu aspecto unicamente corporal.9 Por conseguinte, a sociedade começou a categorizar as pessoas por meio de atributos tidos como comuns e naturais para os membros de cada uma dessas categorias, as quais tinham os seus próprios ambientes sociais estabelecidos. Isso se deu de acordo com o cotidiano social e as relações que aconteciam em ambientes assim configurados, levando as pessoas a não refletirem e haver uma naturalização das concepções. É dessa maneira que acontecia a formação da identidade social de um indivíduo, sendo seus atributos designados principalmente pelas questões morais, incluindo aí seus atributos estruturais, como é o caso de sua ocupação profissional, já que estes indiretamente estariam inseridos às categorias morais.10 Vale registrar aqui

que em grande parte das crianças consideradas na nossa pesquisa o estigma físico coexiste com o moral, embora que este primeiro tipo não seja evidente, como seria se houvesse algo de “estranho” corporalmente; isto é, além do aspecto moral relacionado aos seus comportamentos, sendo estes ainda reforçados pela pobreza e a escolaridade atrasada, existem geralmente também características físicas: a cor da pele mais mestiça e/ou a desnutrição, levando-a a não atingir os padrões de crescimento esperados à sua faixa etária.

Diante de tal realidade, Goffman diz que inicialmente percebiam-se imediatamente características que identificavam pessoas como não sendo possível entrar em certas categorias, podendo-se chegar ao extremo de tê-la como altamente indesejáveis, sendo excluída com extremismo por ser vista como perigosas ou fracas. Nesse tipo de exercício de categorização, os outros atributos que seriam

designar alguém que fosse tido como moralmente inferior e que precisaria ser evitado e excluído, como era o caso, por exemplo, de um escravo, um criminoso ou um traidor. Iniciada a Era Cristã, houve uma referência ao estigma como uma revelação divina, necessitando-se que o sinal de identificação fosse padronizado através de uma erupção na pele em forma de flores; houve também o início da crença em uma ciência médica nascente, no sentido de se considerar o estigma como um distúrbio físico. GOFFMAN, 1988, p. 9-10.

9

A título de maior esclarecimento, o autor relata que há três tipos de estigmas: os referentes às abominações do corpo que surgem devido as várias deformidades físicas; os que são causados pelas culpabilidades que se atribui à uma “vontade fraca”, à “paixões tirânicas” ou à “crenças falsas” e à desonestidade, sendo essas inferidas a partir de relatos conhecidos de, por exemplo, distúrbio mental, prisão, vício, alcoolismo, homossexualismo, desemprego, tentativas de suicídio e comportamento político radical; por último, há os estigmas raciais ou relativos à nacionalidade e à religião. As crianças de nosso estudo se enquadram no segundo tipo.GOFFMAN, 1988, p. 14.

10 Em um estudo específico sobre o assunto, foi constatado que, atualmente, crianças portadoras de

alguma doença crônica de pele são discriminadas e consideradas diferentes e podem ser tratadas até mesmo como portadora de deficiência mental em diversos contextos sociais, mesmo sem ter este diagnóstico, sendo, por isto, desvalorizadas e pouco aceitas; logo, observa-se que tanto uma característica moral como uma física levam a atributos estigmatizantes sobre a criança. GON; ROCHA; GON, 2005.

considerados de forma mais positiva se apagavam para prevalecer o que era negativo, reduzindo a pessoa a apenas uma aspecto classificado como diminutivo, isto é, o seu estigma.11 Além disso, por já está localizada em uma categoria, mesmo passando por nova avaliação, havia uma tendência de serem menosprezadas suas novas categorias. Vislumbramos, de acordo com essa problemática, mesmo considerando a nossa contemporaneidade, o quanto é dificultosa para as crianças por nós estudadas a “saída” de tal categorização.

Vale salientar neste momento que, sem dúvida, para Goffman, o termo estigma será sempre usado em referência a um atributo profundamente depreciativo, o que concordamos; mas, por outro lado, na verdade, o que o autor igualmente deixa claro é que se está valorizando uma linguagem de relações sociais e não de atributos, tendo em vista que um atributo que estigmatiza alguém pode confirmar outros que valorizam várias pessoas, como é o caso do conceito de “normalidade”, fortalecendo, então, alguns estereótipos, e facilitando-se, desse modo, a existência de muitos atributos que levam ao descrédito. É o que este estudo quer, de fato, enfatizar, considerando

que são exatamente essas relações sociais que ajudam a esclarecer o que ocorre no processo social de estigmatização infantil e seu peso na constituição subjetiva da criança. Desse modo, “um indivíduo que poderia ter sido facilmente recebido na

relação social quotidiana, possui um traço que pode se impor, afastando aqueles que ele encontra e destruindo a possibilidade de atenção para outros atributos seus” (GOFFMAN, 1988, p.14). Acrescentando-se a isso, as ações sociais benevolentes em relação às pessoas estigmatizadas apenas fazem reforçar o menosprezo e discriminação. A impressão que se dá com estas condutas é a de cumprir uma norma

No documento A criança (páginas 47-62)