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INFORMATION LITERACY/COMPETÊNCIA EM INFORMAÇÃO – ENTENDENDO AS RAÍZES HISTÓRICASAS RAÍZES HISTÓRICAS

No documento ANNA CRISTINA C. DE A. S. BRISOLA (páginas 114-118)

3 DESINFORMAÇÃO: CONCEITOS, MECANISMOS E IMPORTÂNCIA

4.1 INFORMATION LITERACY/COMPETÊNCIA EM INFORMAÇÃO – ENTENDENDO AS RAÍZES HISTÓRICASAS RAÍZES HISTÓRICAS

Elmborg (2012, p. 80) localiza a primeira aparição do termo, information literacy, na década de 1970. Zurkowski (1974) é um dos primeiros a conceituar information literates. A ideia era conferir cientificidade aos processos de busca, recuperação e uso da informação. Dudziak (2016) pontua o caminho que levou à cunhagem do termo e sua consolidação entre as décadas de 1920 e 1980.

Nos anos 1920, após a Primeira Guerra Mundial e a grande depressão, agências federais dos EUA passaram a estimular a coleta de informações estatísticas por parte dos cidadãos, empresas e indústria, estabelecendo, através de estudos e pesquisas, parâmetros de atendimento às necessidades do público. As bibliotecas se fortaleceram como espaços de apoio aos esforços de guerra entre os anos 1940 e 1950. Na década de 1960 as pessoas em geral não tinham interesse ou qualificação para pesquisar, organizar e utilizar informações de forma eficiente e eficaz. Mas em 1966 foi criada a Lei Federal norte-americana de acesso à informação por meio do Freedom of Information Act (que não era universal, por não conceder acesso transparente e aberto de qualquer informação. Por exemplo, os cidadãos não tinham acesso a inúmeras informações governamentais e outros países também não) e a Comissão Nacional Consultiva de Bibliotecas.

relationships and priorities, cunhando o termo information literacy, considerando information literates, pessoas que “aprendem técnicas e habilidades para usar a ampla gama

de ferramentas de informação” (ZURKOWSKI, 1974, p. 6, tradução nossa) bem como fontes primárias que subsidiariam a tomada de decisão e solução de problemas. Assim, Zurkowski imprimia uma função muito mais pragmática que social, seguindo a finalidade de aumentar a eficácia17 e a eficiência18 no trato da informação e abrindo as portas para os produtos informativos.

Em entrevista concedida a Jeff Kelly (2013), publicada no Journal of Information

Literacy, o próprio Paul G. Zurkowski relata que as companhias da indústria da informação

perceberam que uma vez que as informações pudessem ser transcritas em formatos “lidos” por máquinas, elas poderiam ser entregues por qualquer meio que os clientes desejassem. Em cinco anos e com um aumento de 12 para 200 empresas associadas, em 1974, a Information

Industry Association19 percebeu que seria necessário um treinamento para que a população

aproveitasse ao máximo os novos serviços. Então ele, Zurkowski, como bom lobista dessa indústria, escreveu à Comissão pedindo treinamento universal em Information Literacy; em seguida pede treinamento apenas para o ensino fundamental, algo que julgava mais viável (KELLY, 2013, p. 164). A competência em informação seria alcançada por meio do desenvolvimento de habilidades e técnicas de uso eficaz e eficiente de tecnologias, ferramentas e recursos de informação. O objetivo primordial era maximizar a produtividade e o consumo. Esta característica voltada ao produtivismo vai se refletir por muitos anos na Competência em Informação.

Ainda no início, Zurkowski já estava preocupado com o excesso de informação, sabia que a percepção do usuário é definitiva na busca e uso da informação, atentando também à ideia de que esse acesso à informação reforça ou altera a percepção da realidade e do agir do sujeito. Logo no primeiro parágrafo do texto o autor afirmava que:

informação não é conhecimento; são conceitos ou ideias que entram em um campo pessoal de percepção, são avaliados e assimilados reforçando ou alterando o conceito de realidade do indivíduo e/ou sua capacidade de agir. Como a beleza está nos olhos de quem vê, as informações estão na mente do usuário. (ZURKOWSKI, 1974, p. 01, tradução nossa)

17 Segundo Barnard (1938, p. 55) eficácia é a satisfação dos fins do sistema. Segundo Antico e Jannuzzi (2006) cumprimento dos objetivos. No dicionário popular: fazer as coisas certas; resolução total de uma situação. 18 Segundo Barnard (1938, p. 55) eficiência é a satisfação das necessidades dos membros. Segundo Antico e

Jannuzzi (2006) se trata do nível de utilização de recursos frente aos custos em disponibilizá-los. No dicionário popular: fazer certo as coisas; agir com perfeição na realização de um determinado trabalho. 19 Associação, criada em 1968 para atender às necessidades de fornecedores de informação, congregava

editoras como Encyclopaedia Britannica, John Wiley& Sons, McGraw-Hill, New York Times, RCA, Xerox, entre outras empresas.

Para ele, explicitamente, o excesso de informação é uma condição universal que compromete a capacidade de avaliação. O desenvolvimento da competência em informação era a resposta. Por outro lado podemos questionar se: controlando a formação desta competência também não se controla a percepção de mundo? Estariam pensando no controle ao focar nos aspectos tecnicistas e na apropriação da informação como produto, capital? Afinal, “as informações estão na mente do usuário”.

Segundo Bezerra, Schneider e Saldanha (2019, p. 8) a fundação da Coinfo está atrelada aos pêndulos políticos liberalismo humanista e neoliberalismo mecanicista, que se sobrepõe e estão subsumidos ao modelo capitalista ocidental anglo-americano. De acordo com os autores “a historicidade da prática biblioteconômica do ‘serviço de referência’ em relação às ‘obras de referência’ e aos ‘sistemas bibliográficos’ [...] torna-se a base do que futuramente abordar-se-á como ‘competência’” pela American Library Association (ALA). Com o advento das TIC, há um distanciamento entre os sujeitos “competentes” (que sabem manipular as novas infotécnicas) e os “incompetentes” (que não sabem).

Os autores citam Marilena Chauí (2003) que denomina esse fenômeno de “ideologia da competência”, que “oculta a divisão social de classes ao afirmar que a divisão social se realiza entre os competentes (os especialistas que possuem conhecimentos científicos e tecnológicos) e os incompetentes (os que executam as tarefas comandadas pelos especialistas)” (BEZERRA, SCHNEIDER; SALDANHA, 2019, p. 15). Essa ideologia apela para a meritocracia, imputando ao indivíduo e somente a ele o fracasso, por não ter se esforçado a aprender a aprender e/ou a ser competente. Os autores fazem uma reflexão sobre como a Competência em Informação foi forjada atrelada a essa influência liberal capitalista e como é necessária a crítica para ressignificar e libertar a Coinfo e o indivíduo dessa opressão.

Voltando aos aspectos históricos, nos anos 1980 o conceito de Competência em informação extrapolava a questão do conhecimento relacionado ao uso de computadores e à informática. Bibliotecários já trabalhavam com o conceito de competência em informação com foco no desenvolvimento do usuário de informação. Em 1983 surgiam termos como “sociedade de aprendizagem” e “era da informação” e Competência em Informação começa a substituir termos como “educação em biblioteca” e a “instrução bibliográfica”.

Nos anos 1990 Patrícia Senn Breivik e Gee Gordon apresentam o trabalho “Libraries

and Learning”, onde argumentam que o aprendizado de qualidade deveria basear-se em

recursos (resource based learning) e que, portanto, estaria centralizado no educando, incluindo o aprendizado de habilidades relacionadas ao acesso e avaliação crítica de informações pertinentes à resolução de problemas. Os autores destacavam a importância de

desenvolver a competência em informação para alcançar o aprendizado ao longo da vida e a atuação cidadã. Ainda assim, os anos 1990 foram marcados pelo conservadorismo, o que conduziu as pesquisas a questões mais ligadas aos preceitos do liberalismo econômico (DUDZIAK, 2003) e, novamente, aos trilhos da produtividade, eficácia e eficiência. Nas palavras de Vitorino e Piantola (2019, p. 48) “o uso da noção de competência começou a aparecer quando as empresas tiveram necessidade de reconhecer as habilidades das pessoas independentemente do posto de trabalho que elas ocupam”.

Dudziak (2003) narra que a Coinfo acontece quando a informação e as práticas que a enredam ganham destaque e estar bem informado é a tônica na Sociedade da Informação. O efeito rebote é um processo diametralmente oposto, ligado a barreiras de acesso, mas também de uso. Estas barreiras foram e são fruto de uma “ampla e por vezes caótica disponibilização de informações [...] número ilimitado de fontes e desconhecimento de certos mecanismos de filtragem, organização e mesmo apropriação da informação” (DUDZIAK, 2003, p. 23).

Desde sua fundação a competência em informação foi influenciada pelo caráter tecnicista e da produtividade forjado em suas raízes. Os anos 2000 destacam-se pelas críticas a este modelo tecnicista, propondo a Critical Information Literacy. Com estas críticas alguns pesquisadores e documentos oficiais tentam conferir um caráter mais crítico à Coinfo, mas a CCI (CIL em inglês) continua como uma área de pesquisa e aplicação diferenciada da Coinfo por seu aporte, bases e aplicações mais voltadas para a Teoria Crítica e a Pedagogia Crítica. Os alicerces da CCI a conduzem a um lugar diferente da Coinfo, contudo não antagônico e sim complementar.

Nesta mesma época a Coinfo desembarca no Brasil.

A tradução de information literacy para o português brasileiro como competência em informação, sugere uma aderência com a gestão do conhecimento, que por sua vez está aproximada à administração, retomando, em certa medida a questão da eficácia, eficiência e o tecnicismo, apoiado nos métodos ensináveis e avaliáveis de busca, uso etc. da biblioteconomia. A gestão do conhecimento nasce da ideia de otimização dos usuários como processadores de informação e da captura do conhecimento tácito dos funcionários para constituir o capital de uma empresa. “As propostas de conversão de conhecimentos tácitos em explícitos desenvolvidas nessa abordagem acabaram por reproduzir a tendência mecanicista do paradigma cognitivo iniciado em fins da década de 1970” (ARAÚJO, 2013, p. 19).

Carlos Alberto Ávila Araújo (2013) explica a evolução da CI descrevendo suas origens e fases. “O campo da Ciência da Informação, desde sua origem, encontra-se marcado por uma forte natureza operacional, tendendo a se preocupar com a otimização de produtos e

processos e pouco se detendo na reflexão crítica” (ARAÚJO, 2013, p. 10). Contudo, apesar de um caráter inicial eminentemente prático e custodial, a área possui uma ambição pedagógica e divide-se entre vertentes tecnicista e humanista, que perduram. É nesta vertente humanista e pedagógica que os estudos críticos tiveram mais influência, principiando na década de 1970, em aproximação com a área de Comunicação, sobretudo, na América Latina, com a chamada Teoria do Imperialismo Cultural, que tem Matellart como autor de destaque (ARAÚJO, 2013, p. 20).

No documento ANNA CRISTINA C. DE A. S. BRISOLA (páginas 114-118)