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Informem os Srs Peritos se os limites da portaria ministerial que determinou a criação da reserva remontam aos limites dos títulos

QUESITOS APRESENTADOS PELOS AUTORES

3.6. Informem os Srs Peritos se os limites da portaria ministerial que determinou a criação da reserva remontam aos limites dos títulos

dominiais dos Autores? Elaborar o croqui.

Não necessariamente. No caso da ampla maioria dos pequenos pro- dutores e trabalhadores rurais da vila Campestre, os limites da Portaria MJ n° 1.456, de 30/10/2002, publicado no Diário Oficial da União n° 212, de 31/10/2002, pp. 23-24, remontam aos limites de seus títulos dominiais. Por outro lado, no caso dos produtores rurais proprietários de fazendas na área em litígio, os limites da referida portaria não remontam, necessariamente, aos limites dos títulos dominiais de todos os proprietários.

Ocorre que a identificação e a delimitação de uma terra indígena não têm de coincidir com os limites constantes em títulos dominiais. Isso 28 MELLO, Raul S. 1969. A epopéia de Antônio João. Rio de Janeiro, Bibliex.

porque as “terras tradicionalmente ocupadas pelos índios”, conforme esta- belece o artigo 231 da Constituição Federal, são identificadas e delimitadas a partir de um processo administrativo adotado pelo órgão indigenista ofi- cial, em especial por meio da Portaria MJ n°. 14, de 09/01/1996, conhecida como Portaria 14. Áreas assim identificadas têm a ver com ideia de terri- tório indígena e sua delimitação se dá dentro de orientações constantes na mesma portaria, conforme a Legislação Indigenista brasileira e normas correlatas:

Considerando que o referido relatório, para propiciar um regular pro- cesso demarcatório, deve precisar, com clareza e nitidez, as quatro situações previstas ao parágrafo 1° do art. 231 da Constituição, que consubstanciam, em conjunto e sem exclusão, o conceito de “terras tradicionalmente ocupadas pelos índios”, a saber: (a) as áreas “por eles habitadas em caráter permanente”, (b) as áreas “utilizadas para suas atividades produtivas”, (c) as áreas “imprescindíveis à preser- vação dos recursos ambientais necessários ao seu bem estar”, e (d) as áreas “necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições” (Magalhães 2003: 341).

De acordo com o Resumo do relatório circunstanciado de identifi- cação e delimitação da Terra Indígena Ñande Ru Marangatu, publicado no Diário Oficial da União, n° 62-E, de 29/03/2001, Seção 1, pp. 3-6, a área em litígio possui um perímetro de uns 48 km e uma superfície aproximada de 9.300 ha. Está situada nas coordenadas geográficas dos extremos que seguem no quadro a seguir.

Quadro 2: Coordenadas geográficas dos extremos da Terra Indígena

Ñande Ru Marangatu.

EXTREMO LATITUDE LONGITUDE

Norte 22°11’44”S 55°58’32”W Gr.

Leste 22°13’28”S 55°57’59”W Gr.

Sul 22°17’09”S 56°04’21”W Gr.

Oeste 22°16’24”S 56°06’33”W Gr.

Na p. 6 da referida publicação (p. 223 dos Autos), também existe uma carta cartográfica da área em litígio, elaborado segundo normas vi- gentes na cartografia moderna. Consta ainda na p. 43 do Processo, na parte correspondente ao Relatório de estudo antropológico de identificação, pp. 22-23 da numeração original do estudo, um croqui da Terra Indígena Ñan- de Ru Marangatu (Thomaz de Almeida 2000). Tanto a carta topográfica quanto o referido croqui são claros e precisos quanto à delimitação da área

em litígio. No mesmo estudo está anexado um croqui de n°. 4 (p. 1.608 dos Autos) com a indicação da vila Campestre e das seguintes fazendas: (1) Piquiri ou Santa Cleuza; (2) Soberaninha; (3) Itaguassú; (4) Primavera; (5) Fronteira, Cedro e Barra; (6) Itabrasílica (parte); (7) Morro Alto (parte); (8) Triunfo.

Portanto, entende-se ser desnecessário elaborar um outro “croqui” em que haja a sobreposição cartográfica da área em litígio sobre a pro- priedade dos Autores, esclarecendo, por exemplo, o quanto em termos percentuais ela incide sobre os referidos imóveis.

Na Portaria MJ n°. 1.456, de 30/10/2002, também publicada no Diário Oficial da União, n°. 212, de 31/10/2002, pp. 23-24, precisamen- te em seu artigo 1°, constam os pontos que devem ser seguidos para a demarcação da área em litígio, onde foram colocados marcos físicos. Se- gundo os Kaiowa de Ñande Ru Marangatu, muitos desses marcos físicos foram propositalmente destruídos por parte de alguns autores, embora os pontos estejam georreferenciados e são facilmente identificáveis com o uso de um aparelho GPS, uma fez que existe o registro das coordenadas geográficas.

No caso da Portaria MJ n°. 14, tratada anteriormente, cumpre ainda mencionar sua Sétima Parte, a que trata da delimitação de uma terra indí- gena:

VII – Sétima Parte

Conclusão e delimitação, contendo a proposta de limites da área demar- cada.

Art. 2° No atendimento da Segunda à Quinta parte do artigo anterior29

dever-se-á contar com a participação do grupo indígena envolvido, re- gistrando-se a respectiva manifestação e as razões e fundamentos do acolhimento ou rejeição, total ou parcial, pelo Grupo de Trabalho, do con- teúdo da referida manifestação.

Art. 3° A proposta de delimitação far-se-á acompanhar de carta topográ- fica onde deverão estar identificados os dados referentes a vias de acesso terrestres, fluviais e aéreas eventualmente existentes, pontos de apoio car- tográfico e logístico e identificação de detalhes mencionados nos itens do artigo 1°.

Art. 4° O órgão federal de assistência ao índio fixará, mediante portaria de seu titular, a sistemática a ser adotada pelo grupo técnico referido no § 1° do art. 2° do Decreto n° 1.775, de 8 de janeiro de 1996 relativa à demarca- ção física e à regularização das terras indígenas.

Art. 5° Aos relatórios de identificação e delimitação de terras indígenas, referidos no § 6° do art. 2° do Decreto n° 1.775 de 8 de janeiro de 1996, encaminhados ao titular do órgão federal de assistência ao índio antes da publicação deste, não se aplica o disposto nesta Portaria.

29 Essas partes são as seguintes: II – Habitação permanente; III – Atividades produtivas; IV – Meio ambiente; V – Reprodução física e cultural.

Art. 6° Esta portaria entrará em vigor na data de sua publicação”

(Magalhães 2003: 152).

De acordo com a legislação mencionada, entende-se que a identi- ficação e a delimitação de uma terra indígena devem ocorrer a partir de um diálogo entre o GT e a comunidade indígena que está reivindicando determinada área como sendo de sua ocupação tradicional. Por meio desse diálogo é que os limites de uma área devem ser definidos e, salvo melhor juízo, este foi o procedimento adotado no caso da Terra Indígena Ñande Ru Marangatu.

A própria Associação Brasileira de Antropologia (ABA), entidade que congrega os antropólogos que atuam no país, ao promover um amplo debate sobre os laudos periciais, trouxe ao público a obra Laudos periciais antropológicos em debate, organizado por Ilka Boaventura Leite (2005) (ver também Souza Lima & Barretto Filho 2005). Nesse livro consta a Car- ta de Ponta das Canas, um documento que a entidade favoreceu a sua elaboração em 2000. Nele estão claras as condições a serem observadas por um antropólogo no que diz respeito à realização de laudos, pareceres e relatórios. No que se refere aos laudos sobre territórios tradicionais, o pró- prio documento também deixa claro e ratifica aquilo que consta no Portaria MJ n° 14:

• promover ampla discussão com o grupo para definir uma posição clara sobre os limites do território em questão, ou sobre a impossibilidade de definir tais limites no momento, observando-se os parâmetros constitucio- nais e legais vigentes.

• justificar cada limite da área identificada, documentando etnografica- mente as razões que sustentam tais posições identificadas, as posições tomadas em campo por parte do pesquisador e do grupo que é alvo de investigação (Carta de Ponta das Canas) (Boaventura Leite 2005: 39).

As explicações retro apresentadas não respondem apenas a este que- sito, mas dirimem eventuais dúvidas sobre os procedimentos que devem ser observados em um processo administrativo referente à identificação e delimitação de uma terra indígena.

3.7. Informem os Srs. Peritos, há quanto tempo às propriedades em

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