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4.1 A MATÉRIA NOS TRIBUNAIS SUPERIORES

4.1.2 Inovações ao instituto do § 3º

Desde a vigência do DL 406/68, cinquenta e quatro são os julgados que o Supremo Tribunal Federal ostenta cuja resolução fundamentou-se na interpretação do § 3º do referido dispositivo. Em sua grande maioria, as espécies recursais: a) ou não foram conhecidas com base na súmula 279 - por demandarem reexame de prova - ou b) reafirmaram o entendimento acima discutido sobre sua recepção pela Constituição Federal de 1988.

Contudo, do total de casos, pode-se extrair um referencial normativo formado por reiteradas decisões, entendimento este que veio a aclarar e a complementar o alcance regulatório do § 3º, sendo eles: a) sua aplicação a sociedades pluriprofissionais, desde que todas as profissões sejam afins à prestação do serviço; b) a necessidade de habilitação de todos os prestadores de serviços, não bastando o diploma ou o conhecimento da técnica e c) a possibilidade da sociedade de pessoas prestadoras de serviço pessoal contratar auxiliares sem se descaracterizar como beneficiária da diferenciação tributária, discutidos à seguir:

a) Incidência do benefício às sociedades pluriprofissionais

Importante questão dirimida pela Excelsa Corte sobre o § 3º do DL 406/68 foi com relação a sua aplicação às sociedades prestadoras de serviços pluriprofissionais. Inicialmente, a natural disputa entre contribuintes e o fisco municipal fez suscitar a dúvida de se tal benefício se aplicava somente às sociedades uniprofissionais, que congregam prestadores de uma só profissão ou especialidade, ou se o dispositivo seria extensivo àquelas sociedades cujo serviço prestado congregue profissionais de áreas diversas.

No Recurso Extraordinário 91.311/CE, julgado ainda em 04 de dezembro de 1979, o município de Fortaleza arguiu a necessidade de uma sociedade simples que contempla todos os requisitos para gozar do benefício tributário em comento recolher o ISS tendo como base de cálculo o preço do serviço prestado, alegando que a natureza interdisciplinar do serviço prestado, que demandou qualificações diversas de seus prestadores, descaracterizava a sociedade enquanto beneficiária do tratamento tributário diferenciado. Aduziu ainda, neste sentido, que o benefício

esculpido no § 3º do DL 406/68 atinge somente às sociedades cujos prestadores do serviço detenham somente uma mesma categoria.

Contudo, firmando entendimento em sentido diverso, o STF entendeu que tal pretensão não tem amparo normativo, uma vez que a lei não faz distinção entre os contribuintes sociedades uni ou pluriprofissionais. Sedimentou ainda a Corte constitucional que o benefício guarda como critério principal de incidência a natureza e a responsabilidade pessoal do serviço prestado, ainda que no âmbito societário, devendo, portanto, uma sociedade de profissionais de habilitações diferentes recolher o ISS na forma privilegiada:

IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS. DECRETO-LEI 406/68, ART. 9, PARAGRAFO 3 (REDAÇÃO DO DECRETO-LEI 834/69). - NEGA VIGENCIA A TAIS DISPOSITIVOS A DECISÃO QUE OS CONSIDERA APLICAVEIS TÃO SOMENTE A SOCIEDADES CIVIS CONSTITUIDAS EXCLUSIVAMENTE DE PROFISSIONAIS DE UMA MESMA CATEGORIA, POIS A LEI FEDERAL EM CAUSA NÃO AUTORIZA A DISTINÇÃO PRETENDIDA PELO FISCO MUNICIPAL. A HIPÓTESE DE INCIDENCIA CONTEMPLA A SOCIEDADE CIVIL PRESTADORA DE SERVIÇOS PROFISSIONAIS DE CARÁTER INTERDISCIPLINAR. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E PROVIDO.

(RE 91311, Relator(a): Min. RAFAEL MAYER, Primeira Turma, julgado em 04/12/1979, DJ 21-12-1979 PP-09667 EMENT VOL- 01158-04 PP-01225)

Contudo, em que pese a decisão pela aplicação do § 3º do art. 9º do DL 406/68 às sociedades pluriprofissionais, ressaltou o STF, ao decidir pelo não conhecimento do RE 102305/SP, que o referido benefício se aplica às sociedades de trabalhadores com diferentes habilitações somente quando o tipo de serviço prestado pela sociedade assim o demandar. Situação esta diferente de quando a sociedade se assume uniprofissional, ou seja, se assume enquanto prestadora de serviços em somente uma área, mas apresenta prestadores habilitados em áreas diversas da do serviço oferecido.

ISS. SOCIEDADE POR QUOTAS DE RESPONSABILIDADE LIMITADA. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE ANALISES CLINICAS. PRETENSAO NO SENTIDO DE PAGAR O ISS, NA FORMA DO PARAGRAFO 3, DO ART. 9, DO DECRETO-LEI N. 406/1968, NA REDAÇÃO ATUAL. NÃO SE TRATA DE OBJETO SOCIAL DE NATUREZA PLURIDISCIPLINAR, MAS, TÃO SÓ, UNIPROFISSIONAL. ALÉM DE MEDICOS, HÁ, TAMBÉM, SOCIOS ECONOMISTAS, FUNCIONÁRIOS PUBLICOS E ATÉ COMERCIANTES. DISSIDIO PRETORIANO NÃO DEMONSTRADO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO CONHECIDO.

(RE 102305, Relator(a): Min. NÉRI DA SILVEIRA, Primeira Turma, julgado em 12/02/1985, DJ 04-09-1987 PP-18288 EMENT VOL- 01472-02 PP-00392)

Desta forma, para a análise da incidência do referido dispositivo conquanto a diversidade de habilitações dos prestadores de serviço em nome da sociedade, determina o STF a necessidade de analisar a uni ou pluriprofissionalidade da sociedade comparando-se as habilitações de seus profissionais com relação ao serviço objeto da atividade social, conforme se depreende da ementa acima colacionada.

b) Necessidade de habilitação dos prestadores de serviço

No Recurso Extraordinário nº 82.091/SP, julgado ainda antes da ordem constitucional de 1988 - em 11/10/1978 - o STF firmou entendimento que até hoje vigora, no sentido de que goza do benefício tributário esculpido no § 3º, art. 9º do DL 406/68 apenas aquelas sociedades em que todos os prestadores de serviço estejam habilitados para tanto. Neste caso, tratava-se de uma sociedade de contadores composta por profissionais formados e habilitados no Brasil e por profissionais formados no exterior, mas que ainda não tinham sido habilitados para a prestação de serviços no país.

Aduziu a sociedade que, enquanto sociedade de contadores – assim titulados, devem sofrer incidência de ISS na forma privilegiada trazida pelo DL 406/68, mesmo possuindo alguns de seus prestadores ainda sem a validação de seus diplomas estrangeiros no Brasil, não sendo a incidência uma distorção da natureza do benefício. Contudo, decidiu o STF que o benefício somente pode incidir sobre aquelas sociedades em que todos os profissionais estejam habilitados para a prestação de serviço:

IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS. SOCIEDADE EM QUE NEM TODOS OS PRESTADORES DE SERVIÇO, SÓCIOS, EMPREGADOS OU NÃO, POSSUEM HABILITAÇÃO PROFISSIONAL PARA A PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. EXEGESE DO § 3º, DO ARTIGO 9º, DO DEC.-LEI 406/68. RAZOÁVEL, QUANDO NÃO A MELHOR, A INTERPRETAÇÃO DE QUE, PARA FAZER JUS AO BENEFÍCIO PREVISTO NO MENCIONADO § 3º, É MISTER QUE TODOS OS PRESTADORES DE SERVIÇO EM NOME DA SOCIEDADE ESTEJAM PARA ISSO PROFISSIONALMENTE HABILITADOS. RECURSO EXTRAORDINÁRIO NÃO CONHECIDO.

(RE 82091, Relator(a): Min. LEITÃO DE ABREU, Tribunal Pleno, julgado em 11/10/1978, DJ 04-05-1979 PP-03519 EMENT VOL- 01130-01 PP-00393 RTJ VOL-00090-01 PP-00140)

Segundo a Corte, o § 3º demanda que haja prestação de serviço por profissionais habilitados, estes cujo número comporá a base de cálculo para a incidência do imposto diferenciado. Assim, uma vez a sociedade apresentando prestador de serviço não habilitado, este prestador seria excluído da base de cálculo do imposto se incidisse de forma diferenciada, o que desvirtuaria a técnica do instituto, não o devendo, portanto, ser aplicado.

c) Possibilidade de contratação de auxiliares

Outra matéria que demandou posicionamento da Corte Constitucional foi com relação à possibilidade de sociedades simples prestadoras de serviço pessoal contratar auxiliares, sem que seja descaracterizado o requisito da pessoalidade do serviço, assim mantendo-se beneficiária da diferenciação tributária trazida pelo DL 406. No caso do RE 88210/RS, uma sociedade de contadores que contratara auxiliares impetrou mandado de segurança após ter sido cobrada de ISS pelo fisco municipal sobre a receita bruta, pleiteando a devida correção do tratamento tributário. A segurança foi concedida pelo juízo de primeiro grau, denegada pelo tribunal de justiça e, posteriormente, reestabelecida pelo STF.

Julgando a matéria, aduziu a Corte através do voto do ministro relator que o engajamento de auxiliares não prejudica a responsabilidade direta e pessoal do contador pelo serviço prestado, sendo, portanto, inapto a afastá-lo da prestação para desloca-lo para organizar a atividade, o que configuraria a empresarialidade. Para a Corte, caso a atividade exercida pelo auxiliar demande habilitação, o máximo que se poderia ocorrer é a consideração deste na base de cálculo da sociedade, mas não a negativa de incidência da tributação diferenciada.

Imposto sobre serviços. Técnico em contabilidade. A circunstância

de manter escritório e engajar auxiliares não exclui a incidência tributária pela modalidade privilegiada do art. 9º, § 1º do Decreto- lei 406/68, em cuja interpretação deve pesar a norma do § 3º do mesmo artigo. Dissídio jurisprudencial configurado. Segurança

reestabelecida. Recurso extraordinário conhecido e provido.

(RE 88210, Relator(a): Min. XAVIER DE ALBUQUERQUE, Primeira Turma, julgado em 25/09/1979; DJ

Contudo, após anos de vigência deste entendimento, a Corte Constitucional ponderou seu posicionamento ao julgar o RE 99266/RS, caso este em que uma sociedade simples limitada prestadora de serviços contábeis impetrou mandado de segurança após ter seu ISS cobrado pelo fisco municipal de Porto Alegre sobre o preço dos serviços prestados, requerendo cobrança que considerasse como base de cálculo os prestadores de serviço da sociedade. Arguiu a sociedade que possui quatro sócios contadores e mais alguns auxiliares, contudo sem que estes possuam condições de assumir responsabilidade de ordem técnica, ficando, portanto, os contadores sócios direta e pessoalmente responsáveis pela prestação dos serviços da sociedade.

Julgando a causa, entendeu a Corte Suprema que, conforme entendimento já sedimentado, a sociedade de pessoas pode sim contratar auxiliares sem prejuízo de sua caracterização como beneficiária do tratamento tributário diferenciado. Contudo, neste caso, a sociedade de quatro contadores contava com quarenta auxiliares contratados, o que se mostrou desproporcional. Para a Corte, se há a necessidade de uma média de dez auxiliares por prestador de serviço habilitado – os sócios -, ficou claro que o volume de trabalho e a forma de sua prestação exigia organização, afastando assim a característica de pessoalidade do trabalho do prestador e caracterizando a empresarialidade da atividade: o que afasta a incidência do benefício tributário.

Imposto sobre serviços. Alíquotas. Sociedade de prestação de serviços contábeis. Forma empresarial. Decreto-lei 406/68, art-9º, §§ 1º e 2º - Desde que a prestação do serviço assuma forma empresarial, pela atividade conjunta e indiscriminada dos seus elementos na realização do serviço típico, descaracterizada está a forma pessoal do trabalho do profissional, sem que caiba, portanto, o tratamento favorecido no § 3º c/c § 1º do art. 9º do Decreto-lei nº 406. Recurso Extraordinário não conhecido.

(RE 99266, Relator(a): Min. RAFAEL MAYER, Primeira Turma, julgado em 19/04/1983, DJ 13-05-1983 PP-16508 EMENT VOL- 01294-05 PP-01139 RTJ VOL-00105-03 PP-01292)

Desta forma, é assente no Supremo Tribunal Federal a possibilidade de as sociedades de pessoas prestadoras de serviço mediante trabalho e responsabilidade pessoal dos prestadores contratarem auxiliares. Contudo, a contratação autorizada é no sentido do contratado auxiliar o prestador em sua direta e pessoal execução do serviço, o que fica prejudicado quando é grande a quantidade de auxiliares, porquanto demanda que o prestador desloque-se da

atenção pessoal à prestação do serviço para organizar a atuação que os diversos auxiliares – no mínimo, gerenciar os contratos de trabalho: horários, pagamentos, etc.

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