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Capítulo V. Epistemologia e metodologia

5.5 Métodos de recolha dos dados

5.5.2 Inquérito por entrevista

Conforme referido, o objetivo da análise qualitativa, por meio de estudos de caso contratantes, consistiu em explorar o porquê do modelo de relato financeiro obrigatório para os municípios Portugueses ser mais ou menos adequado e identificar melhorias no conteúdo do mesmo de modo a torná-lo mais útil para as tomadas de decisão internas dos utilizadores municipais. A compreensão e o estudo das perceções dos utilizadores internos dos municípios Portugueses implica que sejam questionados diretamente, através de um conjunto de perguntas uniformizadas em entrevistas.

Hamel (1993) e Vieira et al. (2009) referem que existem diferentes formas de geração de evidência num estudo de caso59, entre elas as entrevistas que geralmente são utilizadas quando é pretendido compreender em profundidade determinado fenómeno social, tendo por base as experiências vividas pelos entrevistados (Yin, 2009), como é o caso desta investigação. Para Yin (2009) e Stake (1995) a entrevista é um método de recolha de dados, de informação ou de opinião, mediante a colocação de questões a um entrevistado que representa, normalmente, um encontro entre pessoas relativamente às quais há uma interação pessoal e social. Surge, com frequência, associada à investigação social, quer esta revista um caráter quantitativo, quer qualitativo. Embora a sua definição seja genericamente consensual, o tipo de entrevista pode variar enormemente quanto ao contexto, à forma como é conduzida, aos seus objetivos e ao modo como é estruturada.

De acordo com Stake (1995), a entrevista cumpre, normalmente, três funções:

1. Enquanto método exploratório – para examinar conceitos, verificar relações entre variáveis e formular hipóteses de investigação;

2. Constituir o principal instrumento de medida de uma investigação;

3. Servir como complemento a outros métodos – para explorar resultados não esperados; para a validação de resultados obtidos; ou ainda, como meio para aprofundar o conhecimento sobre o objeto de estudo.

No caso desta investigação, as entrevistas assumem explicitamente a forma desta terceira função. No contexto da análise qualitativa, procurou-se que as entrevistas constituíssem um

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Segundo Vieira et al. (2009), as fontes de evidências nos estudos de caso podem compreender: documentos, entrevistas, questionários, observação direta, registo de arquivos, artefactos e observação do participante.

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instrumento, a par de outros, que permitisse explicar, explorar, validar e aprofundar o conhecimento obtido através dos resultados da aplicação do inquérito por questionário. Em concreto, procurou-se aprofundar algumas das questões levantadas no questionário, designadamente explorar os fatores organizacionais internos influenciadores de uma maior ou menor utilidade da informação disponibilizada no relato financeiro municipal para as tomadas de decisão internas. Pretendeu-se ainda averiguar aspetos mais críticos para as decisões internas no modelo de relato financeiro municipal, e obter sugestões para eventual melhoria deste.

Na literatura existe diversidade quanto à classificação dos diferentes tipos de entrevistas existentes. Pardal & Correia (2008) e Vieira et al. (2009) consideram a existência de três grandes tipos: estruturada, não estruturada e semiestruturada. A entrevista estruturada obedece a um grande rigor na colocação das questões ao entrevistado. Trata-se de um tipo de entrevista estandardizado ao nível da formulação das perguntas, sequência destas e na utilização do vocabulário. Neste caso, quer o entrevistador quer o entrevistado são condicionados pelo rigor da técnica. A liberdade de atuação é muito limitada. Contrariamente, a entrevista não estruturada permite maior liberdade de atuação, na medida em que se traduz numa conversa livre entre o entrevistador e o entrevistado. A entrevista semiestruturada caracteriza-se pelo seu caráter informal. Neste tipo, o entrevistador possui um referencial de perguntas-guia, suficientemente abertas, que são colocadas ao entrevistado no desenrolar da conversa. As questões são colocadas numa lógica de oportunidade. Em qualquer dos casos, as entrevistas implicam, de uma forma geral, a definição prévia de questões a colocar.

Na investigação qualitativa realizada efetuamos uma abordagem empírico-analítica, com a condução de entrevistas semiestruturadas, baseadas num conjunto de questões abertas, aos utilizadores internos que habitualmente tomam decisões e assumem responsabilidade política e técnica na área financeira de um determinado número de municípios Portugueses. Apesar das entrevistas não estruturadas poderem fornecer informação em maior profundidade (Fontana & Frey, 2008), a abordagem semiestruturada foi preferida porque permite ao investigador o controlo sobre o conteúdo, tempo e sequência da entrevista. Embora o encadeamento dos tópicos esteja pré-definido, os inquiridos, de certo modo, ditam a sequência com que são colocados, de forma a obter uma visão precisa dos factos e maior riqueza de informação (Carmo & Ferreira, 1998; Fontana & Frey, 2008).

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145 De um modo geral, “(…) o objetivo de qualquer entrevista é abrir a área livre dos dois interlocutores no que respeita à matéria da entrevista, reduzindo, por consequência, a área secreta do entrevistado e a área cega do entrevistador” (Carmo & Ferreira, 1998:216). Esta opção é sustentada pelo facto de constituir uma via privilegiada da apreensão da realidade, na medida em que permite obter uma variedade de respostas, a fim de se alcançar os objetivos propostos e proporcionar respostas às questões de pesquisa (Carmo & Ferreira, 1998). Assim sendo, a entrevista pareceu ser a escolha mais acertada nesta investigação, uma vez que as componentes empíricas em análise estão profundamente interligadas e, por vezes, até sobrepostas. De facto, como a análise efetuada está orientada em torno da utilidade do relato financeiro municipal no contexto de tomada de decisões internas, a entrevista havia que prever a possibilidade de dar ao entrevistado alguma autonomia para gerir o encadeamento da abordagem entre questões tão próximas. Adicionalmente, esta possibilidade permitiria também condições para que emergissem espontaneamente no discurso dos sujeitos, o grau de relevância e peso que determinados fatores organizacionais associados aos municípios teriam, do seu ponto de vista, na maior ou menor adequabilidade do modelo de relato financeiro para disponibilizar informação útil para as tomadas de decisão internas. Esta flexibilidade permite cruzar a informação recolhida e, por conseguinte, aumentar a robustez dos resultados obtidos (Fontana & Frey, 2008).

As entrevistas foram sustentadas por um guião dividido em quatro componentes distintas, compreendendo um total de treze questões (Apêndice B). As perguntas para as entrevistas foram desenvolvidas tendo por base os resultados obtidos no inquérito por questionário (isto é, foram formuladas novas questões para os resultados obtidos de algumas questões do questionário que necessitavam de um maior aprofundamento/explicação), bem como de informação obtida a partir da pesquisa da literatura teórica, nomeadamente sobre as NICSPs. As questões abrangeram diversos aspetos no contexto do processo de tomada de decisões internas, nomeadamente:

5. O porquê do modelo de relato de informação financeira municipal ser mais ou menos adequado para a disponibilização de informação útil para as tomadas de decisão internas;

6. A extensão (tipo/quantidade) de informação disponibilizada no relato financeiro municipal que é realmente útil para apoio ao processo de tomada de decisões e, em concreto, para que tipo de decisões; investigar em que medida o decisor utiliza essa

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informação para legitimar a decisão tomada e apurar a necessidade de recurso a outros tipos de informação;

7. Os fatores organizacionais internos que podem influenciar a maior ou menor utilidade/uso da informação disponibilizada no relato financeiro municipal para o processo de tomada de decisões internas; e

8. O grau de conhecimento do respondente referente às NICSPs e a influência da aplicação dos padrões de referência destas (modelo das demonstrações financeiras, critérios de valorimetria, etc.) na preparação e apresentação do relato financeiro municipal, no que concerne à divulgação de informação útil para as tomadas de decisão.