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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 Tecnologia Apropriada: um ponto de partida para a tecnologia social

2.2.1 Inserção da tecnologia social no cenário nacional

No contexto da inserção das TS no cenário nacional destacam-se as iniciativas de alguns atores sociais públicos e privado. Nesse sentido, a Fundação Banco do Brasil (FBB) destaca-se como um dos primeiros entusiastas das TS no cenário nacional. Criada em 1988, já em 2001 a entidade enxergou o potencial que as TS detinham para impulsionar o desenvolvimento social do país e mobilizou ONGs, universidades, governos estaduais, prefeituras, fundações e institutos de todo o território nacional através da criação do Prêmio Fundação Banco do Brasil de Tecnologia Social e do Banco de Tecnologias Sociais (BTS), aprimorando, assim, o seu potencial enquanto articuladora social capaz de aproximar os problemas e sua solução.

O BTS se configura num valoroso instrumento de disseminação de conhecimento e experiências geradoras de transformação social positiva que favorece o processo de reaplicação das tecnologias, pois se constitui numa base de dados de livre acesso que contempla informações relativas às mais de 500 TS certificadas pela própria entidade, as quais abrangem desde o problema solucionado quanto a solução adotada, a forma de envolvimento da comunidade, os municípios atendidos, os recursos necessários para implementação de uma unidade da tecnologia, assim como os contatos dos responsáveis favorecendo a transferência do conhecimento (FBB, 2013).

Também em 2001 o Instituto de Tecnologia Social (ITS) insurge-se com o objetivo de contribuir para a construção de uma interface entre as demandas e

necessidades da população com a produção de conhecimentos no país, não importando o lugar onde esses conhecimentos são produzidos, mas onde estão e como podem ser mobilizados para atender as demandas sociais. Para tanto, tem focado sua atuação em dois temas: a ampliação do acesso ao sistema nacional de CT&I e o papel desempenhado pelas organizações da sociedade civil na construção e desenvolvimento da CT&I (ITS, 2004).

A partir de então, o ITS passou a participar dos diversos eventos que discutiam os rumos da CT&I no país, inserindo os interesses da sociedade civil na discussão. Um evento significativamente representativo dessa inserção da sociedade civil nas discussões acerca da política de ciência e tecnologia foi a criação do Grupo de Trabalho de Ciência e Tecnologia e o Terceiro Setor, cujo trabalho resultou na criação, em 2003, da Secretaria para Inclusão Social (Secis), vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), cuja missão é “promover a inclusão social, por meio de ações que melhorem a qualidade de vida, estimulem a geração de emprego e renda e promovam o desenvolvimento sustentável, através da difusão do conhecimento” (SECIS, 2013, p. 15)

A partir dessas iniciativas novas ações e atores sociais foram convergindo para causa das TS, sendo os exemplos mais significativos a criação do Programa de Tecnologias Socialmente Sustentáveis (PTS), em 2003; do Centro Brasileiro de Referência em Tecnologia Social (CBRTS) e do Centro Avançado de Tecnologias Sociais Ayrton Senna, em 2004; e da Rede de Tecnologia Social (RTS), em 2005.

O Centro Brasileiro de Referência em Tecnologia Social (CBRTS) é um projeto do Instituto de Tecnologia Social (ITS), criado a partir de uma parceria com a Secretaria para a Inclusão Social (Secis) com o objetivo é identificar, conhecer, sistematizar e disseminar práticas de Tecnologia Social, envolvendo os diversos atores sociais (ONGs, poder público, universidades e institutos de pesquisa) com o intuito de apoiar propostas de políticas públicas que se baseiem em práticas eficazes para o desenvolvimento social sustentado (ITS, 2004).

Nesse sentido, um fator de extrema relevância na inserção e consolidação da TS no cenário nacional foi sua inserção como um dos programas da Secretaria para a Inclusão Social (Secis), onde é concebida como compreendendo “produtos, técnicas e/ou metodologias reaplicáveis, desenvolvidas na interação com a comunidade que represente efetivas soluções de transformação social” (MCTI, 2014a).

Quadro 5 – Objetivos da Tecnologia Social Objetivo Geral

Contribuir para a redução do quadro de pobreza, analfabetismo, fome e exclusão social por meio da utilização de Tecnologias Sociais.

Objetivos Específicos

a) Promover as condições para que as comunidades menos favorecidas, os micro e pequenos empreendedores, rurais e urbanos, sejam capazes de:

• Executar projetos de investimentos produtivos;

• Aumentar a produção;

• Elevar a sua eficiência e produtividade;

• Gerar ocupação e renda;

• Absorver, difundir e/ou desenvolver tecnologias sociais; e

• Melhorar a qualidade de vida das comunidades envolvidas;

b) Apoiar o desenvolvimento aplicado e a difusão de tecnologias sociais voltadas para a:

• Segurança alimentar e nutricional;

• Promoção da igualdade étnico-racial, de forma a favorecer oportunidades de inserção nas

atividades produtivas;

• Inclusão social e melhoria da qualidade de vida dos catadores de rua (lixo/resíduos); e

• Inclusão social das comunidades indígenas;

c) Apoiar a difusão de tecnologias sociais aplicadas à agricultura familiar e à agroecologia; d) Agregar valor aos produtos e processos;

e) Construir indicadores de gestão e planejamento de projetos; que possibilitem avaliar o modo como o gasto público em C,T&I produz melhoria social; e

f) Estabelecer critérios e indicadores que, ao lado da avaliação do mérito técnico/científico, educacional e financeiro de projetos com características sociais, permitam, também, medir, avaliar e acompanhar os requisitos de produção e distribuição dos produtos e processos, a dimensão, apropriação e eficácia sociais, o caráter ético, os valores culturais, o ambiente onde as tecnologias serão aplicadas e os seus impactos e benefícios.

Fonte: MCTI (2014b)

Referido conceito ressalta características distintivas da TS em relação a sua precursora TA, que pela sua ênfase na inclusão social e na participação social na construção do conhecimento, convergem para os objetivos estabelecidos pelo governo brasileiro (Quadro 5). Tendo como um dos seus eixos de atuação o desenvolvimento de tecnologias voltadas à solução efetiva da transformação social, com foco na resolução dos problemas sociais enfrentados por populações sem acesso aos recursos tecnológicos convencionais, a Secretaria para a Inclusão Social (Secis) insere a TS no escopo das políticas públicas dirigidas para a inclusão social. Nesse sentido, Freitas (2012) ressalva que a TS

(...) apesar de manter forte atuação em instrumentos voltados a fomentar atividades econômicas, herança de suas antecessoras, seu escopo foi ampliado no atendimento a outros problemas sociais, como pobreza, fome, educação, desigualdade étnico-racial e questões ligadas às comunidades indígenas (FREITAS, 2012, p. 98).

Entretanto, parece-nos ocorrer exatamente o inverso. Ao incluir o atendimento de “outros problemas sociais” amplia-se o escopo da própria política pública e não da TS, que agora passa a ser apenas uma ferramenta dentro de um universo extremamente amplo, conforme deixa transparecer a própria Secis ao consignar que

Tecnologia Social é termo bastante peculiar, de escopo restrito e específico e significa as tecnologias que derivam diretamente das comunidades que as produziu. Entendemos que o nosso papel deva ser mais inclusivo e englobar quaisquer tipos de tecnologias que erradiquem ou ao menos amenizem a pobreza e a extrema pobreza. Por essa razão, usaremos doravante o termo Tecnologias para Inclusão Social, termo mais abrangente e por isso considerado mais apropriado (SECIS, 2013, p. 46).

Dada a inserção da TS no contexto das políticas públicas, efetivando o seu reconhecimento nacional, enxergou-se a necessidade de que os diversos atores sociais engajados na causa atuassem de forma sinérgica, otimizando a utilização dos recursos e garantindo maior efetividade dos projetos. Nesse sentido, a Rede de Tecnologia Social (RTS) emerge como fruto de uma proposta lançada durante a I Conferência Internacional e Mostra de Tecnologia Social, realizada na cidade de São Paulo em 2004, ocasião na qual também foi lançado pela FBB o livro “Tecnologia Social: uma estratégia para o desenvolvimento” (FBB, 2004).

A ideia de criação de uma rede em torno da TS surgiu do entendimento comum a várias pessoas e instituições que trabalham com a interação entre projetos sociais, geração de trabalho e renda e fomento tecnológico que as soluções dos principais problemas do país e as consequentes experiências de sucesso ainda ficavam restritas a algumas localidades, além de serem marcadas por ações que possuíam poucas conexões entre si, resultando na pulverização de recursos. Daí o entendimento de que a criação de uma rede possibilitaria uma atuação mais articulada, minimizando sobreposições e lacunas, e otimizaria a aplicação dos recursos, possibilitando a construção de sinergias através da articulação e integração de atores sociais e de políticas públicas (RTS, 2005).

Nesse sentido, a estruturação e implementação da RTS contou com o envolvimento de diversas entidades públicas e privadas, tais como: Fundação Banco

do Brasil (FBB), Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Petrobrás, Serviço Brasileiro de Apoio à Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), Caixa Econômica Federal e Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) na condição de mantenedores; e Articulação do Semiárido (ASA), Grupo de Trabalho Amazônico (GTA), Associação Brasileira de ONGs (Abong); Instituto Ethos e Fórum de Pró-reitores de Extensão das Universidades Públicas Brasileiras, na condição de articuladores de redes sociais.

Dentro dessa proposta de reunir, organizar, articular e integrar um conjunto de instituições, a RTS tem como propósito contribuir para a promoção do desenvolvimento sustentável mediante a difusão e a reaplicação de TS em escala, através do estímulo de sua adoção como política pública, a sua apropriação por parte das comunidades, além do desenvolvimento de novas TS, nos casos em que não existam para reaplicação. Todavia, um desafio que se apresentou nesse percurso foi o de se estabelecer uma sólida base analítica e conceitual para TS.