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Instrumentos de recolha de informação

No documento TESE FINAL carla Galego (páginas 191-197)

CAPÍTULO IV Modelo Sociológico de Análise

11. Instrumentos de recolha de informação

Após a identificação dos objectivos do estudo e da determinação da estratégia metodológica a utilizar, apresentam-se agora os instrumentos de recolha de informação accionados para a análise da compreensão dos contextos e condições de trabalho da profissão académica em Portugal e Espanha.

Nas investigações que têm o estudo de caso como procedimento metodológico o investigador é considerado o principal instrumento de recolha de formação. Aqui o investigador não é tomado como um especialista uma vez que a relação sujeito/objecto é marcada por um elevado grau de intersubjectividade. Quer isto dizer que o sujeito produtor de conhecimento, enquanto ser humano, está ligado ao seu objecto, igualmente humano, dotado de um saber e de uma experiência que lhe é reconhecida (Fortin, 1999). Deste ponto de vista, os sujeitos investigados são, também eles, co-investigadores do conhecimento que se visa produzir. O facto da intersubjectividade do investigador estar presente em todo o processo de pesquisa não é considerado um obstáculo à produção de conhecimento, pois, ao contrário da investigação quantitativa,

os métodos qualitativos encaram a interacção do investigador com o campo e os seus membros como parte explícita da produção do saber, em lugar de a excluírem a todo o custo, como variável interveniente. A subjectividade do investigador e dos sujeitos estudados faz parte do processo de investigação. (Flick, 2005, p. 6)

Além disso, um investigador consciente tem uma acrescida preocupação em validar interna e externamente os seus procedimentos por meio da triangulação das fontes de informação. Assim sendo, neste estudo, o instrumento privilegiado de recolha de informação foi a entrevista semi-estruturada cujos resultados constituem o principal corpus de análise. Porém, foram utilizadas outras técnicas de recolha de dados que, não obstante de se considerarem importantes, foram tidas como fontes indirectas de

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informação. O recurso a outras técnicas permitiu a integração de diferentes perspectivas do fenómeno da profissão académica e conduziu a investigadora a uma atitude mais crítica face aos dados recolhidos. Essas técnicas de recolha de informação foram «entrevistas exploratórias», dirigidas a informantes privilegiados que no percurso das suas vidas profissionais ocuparam lugares de destaque, com o intuído de abrir o conhecimento acerca deste grupo profissional, e a aplicação de um «focus group» com a intenção de clarificar alguns resultados empíricos e verificar algumas conjecturas, além de ter contribuído também para interpretações alternativas aos resultados da pesquisa. Seguindo a proposta de Denzin (1989), que sugere que essas fontes complementares de informação estudem o fenómeno em tempos, espaços e com indivíduos diferentes, na figura em baixo apresenta-se a sequência cronológica da aplicação dos instrumentos de pesquisa accionados para este estudo.

Ilustração 3 - Cronologia da aplicação das diferentes técnicas de recolha de informação

A entrevista é uma técnica directa de recolha de informação sobre determinado fenómeno, a qual é obtida através da formulação de questões a sujeitos que de algum modo estão envolvidos com o fenómeno em estudo (Tuckman, 2000). As respostas dadas por cada um dos sujeitos a essas questões reflectem a percepção e os interesses de cada um fazendo emergir “um quadro razoavelmente representativo da ocorrência ou ausência do fenómeno e, desse modo, propiciar-nos uma base para a sua interpretação” (Tuckman, 2000, p. 517). Significa isto, na esteira de Durkheim (1989), que as percepções dos professores acerca da sua profissão “traduzem a maneira como o grupo se pensa nas suas relações com os objectos que o afectam” (p. 206). Considerados como grupo – e não indivíduos isolados – as percepções dos professores permitem elaborar

2008 Entrevistas exploratórias em Portugal 2009 Entrevistas semi- estruturadas em Espanha e a informante privilegiado 2011 Focus Group & Entrevista a informante previligiado 2011 Entrevistas semi- estruturadas em Portugal

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uma visão colectivamente partilhada. Assim sendo, a finalidade da entrevista é conseguir captar a diversidade constitutiva da profissão académica, enquanto fenómeno social, condensando-se os resultados mais importantes a que se chega e “aferir às principais modalidades que tal fenómeno assume” (Costa, 1999, p.10).

Num primeiro momento, realizaram-se três entrevistas exploratórias a académicos de diferentes universidades em Portugal, mas todas elas em Lisboa. Utilizou-se para esse efeito o guião de entrevistas produzido no âmbito do projecto de investigação internacional que motivou e desencadeou a pesquisa que aqui se apresenta138 (ver apêndice 2). Verificou-se que a aplicação dessas perguntas da forma

como estavam desenhadas no guião não respondiam aos interesses do estudo aqui presente, visto a especificidade deste estar mais centrada nas reformas da universidade e não nos efeitos da globalização na educação superior. No entanto, este guião internacional foi particularmente útil sob dois pontos de vista. Primeiro, porque não se partiu do zero no redesenho das questões que mais tarde foram aplicadas na entrevista semi-estruturada. Segundo, porque nem toda a informação recolhida se tornou descartável, na medida em que se utilizou parte dessa informação para clarificar alguns dados obtidos mais tarde por meio da entrevista semi-estruturada.

Ilustração 4 – Mapa das entrevistas exploratórias realizadas em Portugal

Entrevistado Formação Localidade Duração de entrevista

Nº de páginas transcritas Entr.expl.1 Matemática Lisboa 1h02 25

Entr.expl.2 Geografia Lisboa 1h06 29

Entr.expl.3 Economia Lisboa 1h33 34

Total 3h41 88

Neste estudo, optou-se pela aplicação da entrevista semiestruturada como instrumento privilegiado na recolha de material empírico, constituindo esse material o centro da análise. Considera-se que este tipo de entrevista permite, de um modo planificado, recolher informações relativas a um conjunto diversificado de factos, ideias, comportamentos, preferências, sentimentos, expectativas e atitudes (Fortin, 1999) expressas pelos entrevistados acerca do fenómeno que se pretende estudar: os

138 O projecto Educating the Global Citizen: Globalisation, Educational Reform and the Politics of Equity

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contextos de trabalho da profissão académica. Perante esta diversidade de sentidos interpretativos e representativos que este tipo de entrevista pode oferecer, cabe ao entrevistador conhecer:

todos os temas sobre os quais tem de obter reacções por parte do inquirido, mas a ordem e a forma como os irá introduzir são deixados ao seu critério, sendo apenas fixada uma orientação para o início da entrevista. (Ghiglione & Matalon, 1997, p. 64)

Esta estratégia dá aos informantes a oportunidade de desenvolverem as suas respostas acerca dos temas e tópicos em torno dos quais se constituíram as questões no decurso da conversa, fomentando a possibilidade de se levantarem novas questões que não foram contempladas na entrevista, abrindo assim outros olhares e possibilidades para a pesquisa.

Sendo o objectivo de um estudo qualitativo de casos a compreensão do caso na sua totalidade, compete ao investigador desenhar boas perguntas, tarefa que não é nada fácil. Aliás, Stake (2005) refere mesmo que esta é a tarefa mais difícil que se apresenta ao investigador, já que muitas vezes as perguntas iniciais não funcionam na prática ou fazem emergir novos temas que obrigam a um redesenho das perguntas iniciais da investigação. A isto chama-se «enfoque progressivo» (Parlett & Hamilton, cf. Stake, 2005). Como tal, o desenho de toda a investigação requer uma organização conceptual, ideias que expressem a compreensão que se necessita, pontes conceptuais que arranquem do que já se conhece, estruturas cognitivas que guiem a recolha de dados e esquemas para apresentar as interpretações a outras pessoas. Foi o que se procurou fazer neste estudo.

Assim, uma vez que aquilo que se pretende com um estudo qualitativo de casos é uma maior compreensão do caso, a partir da sua singularidade e complexidade, seguiu-se a proposta de Stake (2005) e optou-se por recorrer à utilização de temas na estrutura conceptual do estudo em detrimento da construção de hipóteses. O argumento deste autor é que a hipótese delimita o enfoque de estudo mas reduz em grande medida o interesse pela situação e pela circunstância da problemática em estudo. Além disso, nas pesquisas com estudos de caso, os temas não são estáticos. Aqui, os temas «nascem, crescem e morrem», ou seja, têm vida própria e reclamam uma atenção cada vez maior à medida que se adquire complexidade e interesse. Significa isto que, à medida que um

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tema adquire uma maior precisão e importância, se inicia um estudo paralelo ou subsequente (Stake, 2005).

Com base nas entrevistas exploratórias, as perguntas da entrevista semi- estruturada foram, então, desenhadas por temas e de acordo com algumas leituras prévias sobre a problemática da profissão académica (ver apêndice 3), permitindo assim estruturar a entrevista e identificar os documentos importantes para compreensão do caso. Foi construído um segundo guião de entrevista (ver apêndice 3) de acordo com determinados campos temáticos que perpassam as três dimensões de análise do trabalho académico identificadas para este estudo. Esses campos temáticos são:

• Percurso profissional dos académicos entrevistados; • Percepção das condições de trabalho na investigação; • Percepção das condições de trabalho na docência;

• Percepção sobre os impactos das políticas educativas e dos modos de governação nas condições gerais do trabalho da profissão académica;

• Representações sociais sobre a universidade e sobre os desafios colocados à profissão académica.

A informação foi recolhida, como já se referiu, por meio de entrevistas semi- estruturadas, onde se explorou uma ampla agenda de 36 perguntas de investigação que iam sendo colocadas de forma espontânea e sempre em articulação com o discurso que o entrevistado ia produzindo. Essas entrevistas foram gravadas e transcritas e, no caso espanhol, traduzidas directamente para português. Os resultados obtidos por meio das entrevistas constituem um amplo e denso corpus de análise que nos permitiu aceder ao conhecimento da complexidade do actual contexto de trabalho da profissão académica das universidades públicas em Portugal e Espanha.

Para apoio na «tecelagem» do contexto profissional dos académicos, quer em termos de clarificação de resultados, quer em termos da introdução de perspectivas e interpretações alternativas sobre o fenómeno em estudo, aplicaram-se mais duas entrevistas a académicos, em Espanha, tendo por base o mesmo guião de entrevista, embora em âmbitos diferentes. Estes académicos, enquanto actores colectivos importantes nas questões do trabalho académico, contribuíram, um com a sua experiência sindical e, o outro, com a experiência em matérias de gestão académica.

Também em Espanha, foi aplicada uma outra técnica de recolha de informação complementar: o «focus group». O recurso a esta técnica foi accionado pela necessidade de, na altura em que se procedeu ao levantamento de informação através das entrevistas

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semi-directivas em Espanha e de se ter realizado uma entrevista a um informante privilegiado, o qual ocorreu entre Março a Abril de 2009, o modelo de Bolonha ainda não estar implementado nas universidades espanholas, em geral, e na Universidade de Barcelona e Universidade de Valência, em particular. Aplicou-se esta técnica por permitir entrevistar vários indivíduos em simultâneo num curto espaço de tempo, por o investigador/moderador poder dirigir a discussão para um novo tópico interessante que tenha surgido no desenrolar da discussão e por possibilitar a conciliação com outras modalidades de investigação (Galego & Gomes, 2005). O facto de a investigadora ter de deslocar-se, uma vez mais, a Espanha para recolher novas informações implicava custos que não permitiam uma longa estadia no país e efectuar uma nova ronda de entrevista individuais. Perante esta limitação e as características do «focus group» apresentadas em cima, esta técnica de recolha de informação figurou-se como uma alternativa viável e credível para atingir esse fim. Participaram neste «focus group» seis académicos da Universidade de Barcelona, com características semelhantes às dos académicos seleccionados para a entrevista: professores investigadores pertencentes às duas tradicionais áreas científicas – Ciências e Humanidades – distribuídos por várias áreas do saber, de ambos os sexos – quatro mulheres e dois homens – e com distintas categorias profissionais. O «focus group» teve a duração de 2h13. Durante esta curta estadia houve tempo ainda para efectuar uma entrevista a um informante privilegiado, neste caso um professor jubilado, a qual teve uma duração de 53m. Este informante para além de esclarecimentos orais disponibilizou alguns textos da sua autoria que durante a sua actividade profissional tinha escrito sobre a profissão académica. Tanto o «focus group» como esta entrevista a um informante privilegiado não foram transcritas para o papel.

Ilustração 5 – Mapa das entrevistas a informantes privilegiados realizadas em Espanha

Entrevistado Formação Localidade Profissional Categoria Anos de serviço Duração de entrevista Nº de páginas transcritas Entr.Informante 1 Barcelona Catedrático Emérito 53m 15

Entr.Informante 2 Filosofia Barcelona Universidade Titular de 28 1h35 18

FGroup *** Barcelona Diversificadas *** 2h13 transcrito Não foi

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Nesta pesquisa, dá-se ainda um lugar de destaque aos documentos legais, enquanto instrumentos de recolha de informação. Segundo Quivy e Campenhoudt (1998, p. 201) “o investigador em ciências sociais recolhe documentos por duas razões”: ou tenciona estuda-los em si, ou utiliza-os para encontrar informações úteis para estudar o objecto. Seleccionou-se e recolheu-se para este estudo documentos com ambas as funções. Assim, recorreu-se aos documentos normativos (leis, decretos-lei), relativos à reforma do ensino superior em Portugal e Espanha e documentos mandatários, como por exemplo a Declaração de Bolonha, que funcionaram como apoio à contextualização, quer na análise da legislação, quer na análise dos discursos produzidos pelos professores e investigadores universitários. Quivy e Campenhoudt (1998) referem que a utilização dos documentos como objecto de análise “derivam da escolha do objecto de estudo ou da delimitação do campo de análise, e não dos métodos de recolha de informação propriamente ditos” (1998, p. 201). No entanto, considera-se importante explicitar a utilidade destes documentos, neste ponto do texto, dada a importância que estes representam para o estudo e cuja análise está incorporada nos capítulos II e II da dissertação.

No documento TESE FINAL carla Galego (páginas 191-197)

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