• Nenhum resultado encontrado

Opções metodológicas

No documento TESE FINAL carla Galego (páginas 186-191)

CAPÍTULO IV Modelo Sociológico de Análise

10. Opções metodológicas

Como referem Graue e Walsh (2003), os pormenores de um plano de investigação contam com aquilo que já se sabe de antemão. Por outro lado, segundo Quivy e Campenhoudt (1997), os dispositivos metodológicos escolhidos dependem da formação e do nível de formação do investigador (principiante ou experiente), bem como da sua imaginação sociológica e das precauções com que se rodeia para levar a cabo as suas investigações.

Consciente do exposto e atendendo às características da investigação apresentadas no ponto anterior, entendeu-se que a estratégia metodológica que melhor servia o propósito do presente estudo era a investigação de natureza qualitativa. Considerou-se que este era o tipo de abordagem que melhor permitia conhecer e compreender com maior profundidade a problemática da profissão académica no seu ambiente e contexto social, através das percepções individuais que cada um dos académicos produz acerca das práticas e dos conhecimentos desenvolvidos no exercício do trabalho académico, sem preocupações com a representatividade numérica, generalizações e relações lineares de causa e efeito (Flick, 2007). Este método é particularmente útil e necessário na identificação e exploração dos significados do fenómeno em estudo, bem como na análise das interacções que nele se estabelecem,

_____________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________ Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias – Instituto de Educação

186

possibilitando assim estimular o desenvolvimento de novas compreensões sobre a variedade e a profundidade da profissão académica enquanto fenómeno social.

Dentro das possibilidades da investigação qualitativa, escolheu-se como procedimento fundamental o «estudo colectivo de casos» (Yin, 2005) tipo descritivo, cuja unidade de análise foram os professores e investigadores de universidades públicas, tipificados na categoria «profissão académica», representando – não representativos – os dois casos em análise nesta pesquisa: o caso português e o caso espanhol.

A opção por este procedimento prendeu-se com o facto de este permitir empreender uma investigação aprofundada sobre acontecimentos e fenómenos contemporâneos sobre o qual existe pouco ou nenhum controlo (Yin, 2005). Fortin (1999) refere que o estudo de caso é útil em três situações:

a) para verificar uma teoria;

b) para estudar um caso que é reconhecido como único;

c) para explicar relações de causalidade entre a evolução de um fenómeno e uma intervenção.

No caso desta pesquisa será útil para aumentar o pouco conhecimento que se tem acerca do contexto e das condições de trabalho da profissão académica em Portugal e Espanha, no quadro das profundas transformações que a educação superior tem vindo a assistir nestes dois países – à semelhança do se passa também no resto do mundo. No fundo, analisar-se-ão os contextos e condições da profissão académica na sua relação com as transformações sociais pelas quais a universidade tem vindo a passar nos últimos anos, procurando identificar padrões ou tendências na configuração do perfil dos académicos, contextualizadas ao momento em que vivemos e discutindo-as com base em fundamentos empíricos. O estudo em profundidade dos fenómenos ligados à educação superior nestes dois países mostra-se necessário para uma melhor compreensão do caminho que países distintos inseridos no mesmo bloco regional – a União Europeia – seguem em relação a orientações políticas comuns. Pretende-se, assim, contribuir para a elucidação daquilo em que consiste a singularidade de cada um dos casos, através da articulação das dimensões de análise estabelecidas (dimensão docente, de investigação e de gestão) e através do esclarecimento dos modos em que essas dimensões se relacionam com domínios sociais mais vastos (eixo de diferenciação, de identificação e fragmentação).

_____________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________ Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias – Instituto de Educação

187

O «estudo colectivo de casos» é um dos três tipos de estudo de caso identificado por Stake (1998). Os outros dois são o «estudo de caso intrínseco», em o que importa é o caso em si, e o «estudo de caso instrumental» onde o que sobressaí são os temas de pesquisa.

Segundo Stake (1998), o «estudo colectivo de casos» não deixa de ser um estudo de caso instrumental apenas distinguindo-se deste pelo facto de ser estudado mais de um caso. Se, num «estudo intrínseco», o caso está pré-seleccionado, no «estudo de caso instrumental» estes podem ou não estar pré-seleccionados, na medida em que uns casos poderão servir melhor o estudo que outros. Como tal, teve-se em consideração, alguns pressupostos na identificação dos casos. Como critério de selecção teve-se em conta a máxima rentabilidade possível na obtenção da informação pretendida. Para isso, foi preciso identificar os casos que podiam conduzir à compreensão ou até mesmo à modificação das propostas do estudo e definir o tempo que se dispõe para o trabalho de campo bem como o acesso à informação.

De entre as possibilidades metodológicas do estudo de caso optou-se pelo tipo descritivo, em detrimento do estudo de caso exploratório e do estudo de caso explicativo. Pretende-se descrever um fenómeno complexo – a profissão académica – que, face às transformações sociais pela qual a instituição universitária está a passar, se encontra em processo de reconfiguração. Assim, parte-se de uma análise em profundidade dos diferentes elementos que compõe a profissão académica, enquanto fenómeno sociológico, de modo a apreender suficientemente o assunto em estudo para transmitir toda a sua complexidade em forma de uma narrativa.

Existem alguns preconceitos em relação à investigação com recurso ao estudo de caso. As críticas apontadas são as poucas bases que oferecem para a generalização científica, o excessivo tempo que leva à sua aplicação e o facto de ter como produto inúmeros documentos ilegíveis. Mas a maior desconfiança está na falta de rigor atribuída ao investigador, acusando-o de aceitar evidências equivocadas ou visões tendenciosas. Segundo Yin (2005), estas críticas surgem por se associar fortemente o estudo de caso, ainda que erradamente, à etnografia, que exige longos períodos de trabalho de campo e realça evidências observadas, e à observação participante que, não exigindo a mesma quantidade de tempo, presume um investimento pesado de trabalho de campo.

_____________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________ Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias – Instituto de Educação

188

O valor científico dos estudos de caso afere-se mediante a validade interna e validade externa que o investigador vai controlando ao longo da pesquisa. Assim, para garantir validade interna, o investigador, à medida que vai construindo o seu caso, vai eliminando as variáveis que considera estranhas e que possam conduzir a explicações diferentes daquelas a que deveria de chegar (Fortin, 1999). Diz-nos Yin (2005) que o caso atinge a sua validade interna pela intensidade na análise do fenómeno, pela simetria do comportamento tipo, pela construção das explicações e pela triangulação das fontes de dados. No que diz respeito à triangulação de fontes, salienta-se que esta não é unicamente entendida, neste estudo, como validação cumulativa da informação obtida, mas também como uma forma de integrar diferentes perspectivas do fenómeno em estudo de modo a encontrar paradoxos e contradições (Flick, 2005). Fielding & Schreier (2001) referem que a mais-valia da triangulação consiste não em retirar conclusões fidedignas e precisas, mas em permitir que os investigadores sejam mais críticos, e até cépticos, face aos dados recolhidos e serve mais de controlo de qualidade do que de garantia de validade. Quanto à validade externa, é obtida por meio de «generalizações analíticas» (Yin, 2005)137 que permitem a utilização dos resultados do caso na

interpretação e aplicação de princípios genéricos a outros casos semelhantes.

Como vantagem, a investigação de estudo de caso apresenta tecnicamente características únicas com mais variáveis de interesse do que outro tipo de investigação baseando-se os resultados em várias fontes de evidência sujeitos a triangulação. Beneficia ainda do desenvolvimento de proposições teóricas conduzidas pela recolha de informação. Neste sentido, “o estudo de caso não é nem uma táctica para a colecta de dados nem meramente uma característica do planeamento em si, mas uma estratégia de pesquisa abrangente” (Yin, 2001, p. 33).

Existem inúmeras definições de estudo de caso, mas entre elas encontram-se propostas comuns que o definem como “estudo de caso como uma investigação empírica que investiga um fenómeno contemporâneo dentro de seu contexto da vida real, especialmente quando os limites entre o fenómeno e o contexto não estão

137 Respondendo à crítica da generalização, diz-nos Yin (2001) que o estudo de caso não tem por

objectivo a generalização a outros casos, mas sim a sua particularização. Isto é, a ideia é partir de um caso particular e procurar conhecê-lo bem e em profundidade. A esta não generalização Stake (2005) dá o nome de «generalização naturalista» cujo objectivo é a aprendizagem mediante a experiência do caso. Um bom estudo de caso é paciente e reflexivo, disposto a considerar outras versões do caso. O investigador qualitativo de casos procura preservar as múltiplas realidades, diferentes visões e inclusivamente contradições.

_____________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________ Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias – Instituto de Educação

189

claramente definidos” (Yin, 2001, p. 32). Mais concretamente, e segundo Yin (2001), o estudo de caso utiliza-se quando se colocam questões do tipo «como» e «porquê», quando o pesquisador tem pouco controle sobre os acontecimentos e quando o foco está em fenómenos contemporâneos. Desde modo, o estudo de caso permite a compreensão de fenómenos sociais complexos, ao preservar as características holísticas e significativas de acontecimento da vida real tais como “ciclos de vida individuais, processos organizacionais e administrativos, mudanças ocorridas em regiões urbanas, relações internacionais e a maturação de alguns sectores” (Yin, 2001, p. 21). Diz-nos Stake (1998) que um estudo de caso é tanto um processo como um produto de aprendizagem acerca de um caso.

Neste estudo é precisamente este tipo de questões que se procura desocultar, pois pretende-se através de dois casos saber como é que a reforma universitária em curso em Portugal e Espanha está a afectar os contextos de trabalho dos profissionais académicos (professores e dos investigadores universitários) e, tendo em mira a agenda global dominante, porque é que isso está a acontecer. A contemporaneidade do caso é inquestionável uma vez que se trata de um processo em curso o que dificulta o controlo das variáveis envolvidas na pesquisa. O recurso ao estudo de dois casos permite-nos então compreender o fenómeno da reforma educativa mediante a interpretação daqueles que o experienciam – os professores e investigadores de universidades públicas portuguesas e espanholas. Deste modo, o que se procura é a compreensão, a descrição das coisas que ocorrem mais ou menos no mesmo momento, sem esperar uma explicação causal (Stake, 2005).

Não se tratado especificamente de um estudo comparado, mas porque aborda dois contextos nacionais distintos, a comparação surge como inevitável. Procurar-se-á encontrar factores que ajudem a compreender as diferenças e as semelhanças dos processos de ressignificação das políticas educativas de ensino superior nos dois contextos nacionais e ver de que modo essas políticas estão a afectar os contextos de trabalho dos professores universitários, fazendo emergir uma nova geração de professores e investigadores com características distintas do passado. Contudo, essa confrontação não será tanto para comparar países mas sim para ver como é que estes dois países estão a responder às demandas da agenda global e dominante. Visto que o tema transcende as fronteiras nacionais, este trabalho explora e compara diferentes

_____________________________________________________________________________________

_________________________________________________________________________________ Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias – Instituto de Educação

190

perspectivas e propósitos específicos na actuação dos professores em dois contextos nacionais distintos.

Tal como noutras estratégias de pesquisa, o estudo de caso representa uma maneira de se investigar um tópico empírico seguindo um conjunto de procedimentos pré-especificados. Apresentar-se-ao de seguida esses procedimentos.

No documento TESE FINAL carla Galego (páginas 186-191)

Documentos relacionados