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3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

3.2 Conceitos regulatórios aplicados à produção de gás de folhelho

3.2.5 Instrumentos econômicos

Em contraste aos instrumentos regulatórios descritos anteriormente, com a utilização de instrumentos econômicos, o governo não estabelece uma determinada prática, mas sim impõe um preço sobre uma atividade associada com o risco de dano ou sobre o dano em si mesmo (OLMSTEAD et al., 2014). Há uma redução do fardo dos reguladores em relação a informações técnicas, pois as agências de implantação desta abordagem não precisam especificar exatamente as práticas que as entidades regulamentadas devem seguir.

Esses instrumentos baseiam-se, em grande parte, no Princípio do Poluidor Pagador que obriga os poluidores a pagar pelo dano causado (NASCIMENTO et al., 2011). Tal compensação financeira permite que o custo social de controle ambiental seja menor e pode ainda fornecer aos cofres do governo local a receita de que tanto necessitam (NASCIMENTO

et al., 2011) para financiamento de programas ambientais e para remediação ambiental (DANA; WISEMAN, 2014). Os instrumentos econômicos conferem às indústrias maior flexibilidade para controlar suas emissões, demandam informações menos detalhadas dos órgãos de controle ambiental sobre cada empresa e menos meios destinados a obter diferentes níveis de controle (IPEA, 1996). Além disso, visam criar incentivos para que as entidades regulamentadas incorporem a redução da poluição nas decisões de produção ou de consumo e inovem, buscando continuamente o método menos dispendioso de redução das emissões (US EPA, 2010). Os mecanismos de mercado oferecem uma alternativa atraente e pragmática situada entre a abordagem de precaução, em que nenhuma prática deve ser realizada até que seja considerada segura (WIENER, 2003) e a abordagem laissez faire, que permite que a atividade econômica continue até que seja considerada insegura.

Os instrumentos econômicos também apresentam limitações. Podem ter resultados menos previsíveis que a regulamentação direta no caso de os poluidores persistirem no processo de poluição (IPEA, 1996). Ademais, se as multas por poluição forem fixadas abaixo do nível apropriado, os poluidores poderão preferir pagá-las a criar os controles adequados, o que aumentaria a receita do governo, mas não traria qualquer melhoria às condições ambientais (IPEA, 1996). Os instrumentos econômicos exigem a coordenação com os ministérios do planejamento ou das finanças, visto que envolvem transações monetárias - taxas, subsídios, incentivos fiscais. Consequentemente, os órgãos de controle ambiental devem ter abertura e disposição para lidar com questões econômicas e os órgãos econômicos precisam apresentar a mesma abertura e disposição para tratar de questões ambientais (IPEA, 1996). Condições difíceis de serem alcançadas, sobretudo em países em desenvolvimento (IPEA, 1996).

Os instrumentos econômicos não são recomendados em situações de alto risco ou de monopólio. No primeiro caso, não interessa aos governos e à sociedade dar aos poluidores a escolha de preferirem um incentivo econômico; é preferível o cumprimento compulsório da regulamentação direta e específica (IPEA, 1996). O mesmo ocorre em relação aos monopólios, visto que as despesas adicionais com cuidados ambientais irão aumentar ainda mais o preço final dos produtos, levando-os na direção oposta à socialmente desejável (IPEA, 1996).

Os itens a seguir abordam três instrumentos econômicos – taxas ambientais, mercados ambientais e seguro obrigatório – e identificam sua possível aplicação na produção de gás de folhelho.

3.2.5.1 Taxas ambientais

A prescrição econômica clássica para corrigir as falhas de mercado ambientais, também conhecida como impostos de Pigou, consiste em tributar as externalidades negativas e subsidiar as externalidades positivas, com taxa ou subsídio eficiente, bem como os danos ou benefícios marginais, ao nível eficiente da externalidade (MANKIW, 1999).

Segundo Olmstead et al. (2014), nos EUA as taxas ambientais não são utilizadas para regular per se os impactos negativos da produção de gás não convencional. Não obstante, a produção de petróleo e gás naquele país está sujeita a muitas taxas locais, estaduais e federais que potencialmente poderiam ser usadas como ferramentas para reduzir os riscos potenciais de desenvolvimento de gás de folhelho (OLMSTEAD et al., 2014). Chakravorty et al. (2013) apontam os impostos sobre exploração de recursos naturais como o imposto estatal de petróleo e gás mais utilizado nos EUA. Vinte e seis (26) dos trinta e um (31) estados revisados por Richardson et al. (2013) adotam impostos sobre a exploração de gás natural.

A Pensilvânia, apesar da produção significativa de gás de folhelho, não possui impostos sobre a exploração de gás natural. O estado optou por uma “taxa de impacto” (em inglês, Impact Fee) que incide sobre os operadores em municípios que optam pela imposição da taxa. Esta é fixada anualmente pela Public Utility Commission de acordo com o preço médio anual do gás natural e cobrada por poço, independentemente da produção, e, como tal, não é considerada imposto sobre exploração de gás natural (HEADWATER ECONOMICS, 2013).

Os estados que adotam os impostos sobre a exploração de gás natural variam não só no valor das taxas, mas também no método de cálculo. Para calcular o imposto, eles utilizam geralmente ou uma percentagem do valor de mercado do gás extraído ou um valor fixo em dólar por quantidade extraída (RICHARDSON et al., 2013). Há ainda estados que usam uma abordagem híbrida em que o imposto percentual varia entre os diferentes níveis com base no preço do gás (RICHARDSON et al., 2013).

Alguns impostos estaduais sobre a exploração de gás natural variam de acordo com os níveis de produção, duração do período de produção, características do poço, entre outros fatores. Em Montana, a taxa de imposto é de 0,5% para os primeiros 18 meses de funcionamento de um poço (em comparação com 9% depois deste período) (MONT. R. ADMIN. 42.25.1809). Oklahoma reduz a taxa de imposto se o preço do gás cair abaixo de US$ 2,10/milhão de pés cúbicos (OKLA. STAT. TIT. 68. § 1001.B).

No Colorado, a alíquota de imposto varia de acordo com o valor bruto do gás extraído pelo operador, podendo ser de 2% (menos de US$ 25.000) a 5% (mais de US$ 300.000) [CRS § 39‐29‐105(1)(a)].

Alguns estados, como Maryland e Virginia, deixam os impostos sobre a exploração de gás natural a cargo dos governos locais, ainda que existam propostas em Maryland para que a taxa seja de 2,5% em todo o estado, valor superior a todas as taxas locais (MD. S.B. 879). O estado de Virginia limita as taxas de indenizações locais a 1% (VA. CODE ANN. § 58.1‐3712).

Vários estados oferecem programas de incentivo que podem reduzir a carga fiscal dos impostos sobre a exploração de gás natural, como o Texas, que permite baixar os impostos para poços de alto custo e poços inativos (RICHARDSON et al., 2013).

Conforme os preços do gás sofrem alterações, os impostos sobre a exploração também variam em termos de porcentagem ou dólar (dependendo do método escolhido pelo estado para cálculo da taxa). A Figura 11 mostra as taxas calculadas a um preço de gás de US$5,40 por milhão de pés cúbicos em ambos os termos, percentagem e dólar (RICHARDSON et al., 2013). Este valor é o preço estimado em longo prazo pela EIA (2030) (EIA, 2013).

Figura 11- Impostos sobre exploração de gás natural com base no preço do gás a US$ 5,40/Mcf

É importante ressaltar que os impostos sobre exploração de recursos naturais diferem das taxas ambientais cobradas geralmente sobre o fluxo de emissões a partir de uma fonte específica para a atmosfera ou para a água. No caso dos impostos sobre exploração de recursos naturais, a cobrança ocorre sobre o valor ou a quantidade de recurso natural não renovável removido do ambiente (RICHARDSON et al., 2013).

Os governos estaduais e locais dependem fortemente de receitas fiscais de impostos para financiar bens públicos (KUNCE, 2003). Tais taxas podem também ser justificadas, em teoria, como uma maneira de capturar o custo externo intertemporal relacionado ao esgotamento de um recurso natural não renovável, no caso de desenvolvimento de gás não convencional. O fato é que uma unidade de gás de folhelho removida hoje não estará lá para ser extraída amanhã. As empresas privadas que operam em mercados competitivos internalizam este custo de acordo com suas escolhas em relação à alocação de suas atividades de extração ao longo do tempo (HOTELLING, 1931). No entanto, o setor público, como proprietário de minerais do subsolo, em alguns casos e como administrador de tais recursos de forma mais geral, pode capturar e investir estas rendas para promover o uso economicamente sustentável dos recursos não renováveis, remediar danos ambientais (OLMSTEAD et al., 2014) ou, simplesmente, proporcionar uma renda contínua que pode suavizar o ciclo de expansão e recessão comum nas economias baseadas em recursos.

3.2.5.2 Mercados Ambientais

A tributação ambiental foi proposta no início do século XX, enquanto que o conceito de criação de mercados ambientais teve início mais tarde, quando Ronald Coase, economista ganhador do Prêmio Nobel, observou que a mera existência de externalidades em um mercado poderia, sob certas condições muito restritivas, induzir a negociação privada de resultados eficientes na redução dos níveis de poluição (COASE, 1960). Esse instrumento permite a criação artificial de um “mercado para poluição”, onde os agentes podem comprar ou vender direitos (cotas) de poluição de fato ou potencial (NASCIMENTO et al., 2011).

A licença de poluição negociável (também conhecida como sistema de cap-and-trade) atua via quantidade e não via preço (custo) de poluição, sanando uma fraqueza das taxas em relação à determinação e à manutenção de seu valor para garantir a sua eficiência econômica e

ecológica. Seu processo começa quando o governo define um limite de poluição para a comunidade regulamentada. Cotas transferíveis são então alocadas ou vendidas aos poluidores. O número total de licenças deve ser reduzido gradualmente até o cumprimento da meta de qualidade ambiental. Nesse sistema, para os poluidores cujos custos marginais de controle de poluição forem menores que o preço de uma cota de poluição, a opção de menor custo é a instalação de equipamentos de controle, com consequente redução das emissões e venda das suas licenças. Nos demais casos, a melhor opção para o poluidor será a compra de licenças (NASCIMENTO et al., 2011).

Segundo Olmstead et al. (2014), nos EUA nenhum programa de comércio de emissões foi estabelecido especificamente para regular os riscos de desenvolvimento de gás de folhelho, mas as aplicações atuais e futuras podem ser relevantes, requerendo ou facilitando a participação de desenvolvedores de energia direta ou indiretamente.

3.2.5.3 Seguro obrigatório

O seguro obrigatório é outro instrumento econômico e, segundo Dana e Wiseman (2014), geralmente uma forma mais eficaz, especialmente para os riscos de longo prazo (com impactos cumulativos e sinérgicos). Ele fornece um mecanismo para a redução do risco na medida em que prêmios de seguro são definidos para recompensar os comportamentos que gerarem menos riscos e punir os comportamentos que criarem mais risco.

Esta ferramenta tem vantagens importantes sobre outras respostas a riscos. Em primeiro lugar, precisamente porque os riscos das indústrias emergentes ou novas não são bem compreendidos (MERRIL et al., 2013), os formuladores de políticas não podem facilmente formular regulamentos de comando e controle que assegurem um nível razoável de segurança. Os instrumentos econômicos consideram os próprios entendimentos da indústria sobre os riscos associados aos seus comportamentos e incentivam outro ator, as seguradoras, a gerarem mais informações sobre quais comportamentos são mais ou menos arriscados. Os instrumentos econômicos são, portanto, geradores de informações de uma forma muito mais significativa e abrangente do que, por exemplo, regulamentos que forçam informação (WISEMAN, 2013).

O seguro obrigatório é exigido em apenas dois estados estadunidenses (embora não de títulos especialmente para fraturamento hidráulico), e nenhum estado tentou estabelecer apólices de seguro para áreas com desenvolvimento de poço não convencional (DANA; WISEMAN, 2014).

Dana e Wiseman (2014) enumeram as principais objeções ao seguro ambiental obrigatório geral. Estas objeções são: a incapacidade do mercado privado de seguros em atender a demanda gerada a partir da exigência do seguro obrigatório; a dificuldade das seguradoras em determinar os prêmios de risco baseando-se em preço, com pouca probabilidade de se tornarem agentes eficazes na redução do risco; e o favorecimento da criação de grandes negócios sobre pequenos operadores. Dana e Wiseman, no mesmo trabalho, apresentam argumentos contra essas acusações. Segundo os autores, o mercado de seguros estadunidense tem provado ao longo do tempo ser capaz de inovar e expandir-se para atender às novas demandas do mercado; apólices de seguros podem fazer ajuste prêmio facilmente, apesar das limitações de informação e também podem ajudar a moderar os encargos dos operadores de menor dimensão. Além disso, as seguradoras de todos os tipos têm repetidamente demonstrado uma capacidade e vontade para exigir que os segurados sigam práticas que mitiguem riscos.

A realidade da regulamentação ambiental é que, enquanto há muita discussão e vários debates sobre instrumentos regulatórios, a regulação de comando e controle domina e é muitas vezes o conteúdo exclusivo do regime. A utilização de impostos pigouvianos sobre a poluição é um mecanismo de mercado amplamente discutido, mas grande parte não utilizado (GALLE, 2012). As licenças de poluição negociáveis têm sido utilizadas, mas apenas em contextos muito limitados, sobretudo no que diz respeito a certos poluentes atmosféricos (DANA; WISEMAN, 2014). Neste cenário, a aplicação de instrumentos econômicos na regulamentação da produção de gás de folhelho ainda é minimamente praticada.