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Instrumentos e estratégias da investigação para adotar olhos de descobrir

NATUREZA PROGRAMA ANO TÍTULO AUTORIA ORIENTAÇÃO INSTITUIÇÃO Dissertação

3.1 Instrumentos e estratégias da investigação para adotar olhos de descobrir

A partir das orientações metodológicas de Graue e Walsh (2003) quanto à utilização de observação, entrevista e recolha de dados/artefatos, com relação a esta última estratégia considerei a documentação disponibilizada online, como a Proposta Curricular da instituição (NDI, 2014) e portarias de criação do NDI (1980a; 1980b; 1980c), e outros documentos solicitados à instituição, como o Projeto Pedagógico do Grupo 1 e o Plano de Trabalho dos Grupos 2 e 321, planejamentos dos referidos grupos que foram disponibilizados e caracterização das crianças. Também foram considerados brinquedos/instrumentos que as crianças utilizavam junto e/ou a partir da natureza, que analiso no capítulo “5 Aproximando crianças bem pequenas e bebês da natureza na educação infantil: discutindo sobre espaços, materiais e brinquedos”.

21 Mantive os dois nomes porque a professora do Grupo 1 se refere a Projeto Pedagógico no seu

documento e as professoras dos Grupos 2 e 3, a Plano de Trabalho, sendo este desenvolvido de forma coletiva entre G2 e G3, resultando, portanto, em um documento único. O Projeto/Plano é um documento a ser apresentado às famílias em uma reunião prevista no calendário da instituição e difere-se de um projeto temático. Constam nele, dentre outros aspectos, caracterização do grupo, objetivos e metodologia de trabalho para o ano letivo. Os dois documentos foram consultados e estão referenciados ao longo do texto. Porém, não estão na lista de referências ao final da tese em razão da impossibilidade de divulgação do nome das professoras que os elaboraram.

De acordo com minha perspectiva metodológica, essa atenção dada aos instrumentos não foi feita de forma quantitativa, mas considerando a proposição da professora e/ou as ações das crianças nas suas relações com a natureza. Como não “recolhi” o material, para usar o termo dos autores, destaco que isso foi possível a partir de observações e registros dessas observações.

Minha entrada no grupo se deu de forma progressiva. Iniciei somente observando – e participando – sem instrumentos de registro, para poder me aproximar das crianças, de modo que elas não estranhassem a entrada de uma outra pessoa. Como aponto na sequência, a câmera – e mesmo o meu pequeno caderno de anotações – não passavam despercebidos pelas crianças, que passaram a demonstrar curiosidade por eles, de modo que até nos aproximavam. Então, ter chegado no grupo já acompanhada desses instrumentos poderia ter causado estranhamento por parte das crianças, pois além de ser a única adulta no grupo que carregava um caderno e uma câmera, eu ainda era um pouco desconhecida para elas. Com essa postura, procurei diminuir a distância entre mim, adulta, e os participantes, sobretudo bebês e crianças, pela nossa diferença geracional. Da mesma forma, procurei interferir o mínimo possível no trabalho desenvolvido pelas profissionais da escola. Mas reconheço que, mesmo desejando interferir o mínimo possível, qualquer relação com as crianças poderia ser uma interferência, aliás, somente a presença de um investigador em um contexto já altera o cenário em questão.

Além disso, mesmo que a distância entre nós diminua, eu continuarei sendo uma “outra” em relação àquele grupo, especialmente quanto às crianças, pela questão geracional, mas também porque a ideia defendida por Graue e Walsh (2003) não é a de que o investigador desenvolva a sua pesquisa no sentido de tornar-se um “nativo”, ou seja, um membro do grupo participante da pesquisa. Os autores acreditam que isso não seja possível, mas que o esforço deva ser no sentido de estabelecer uma aproximação, respeitosa, e que melhor permita conhecer o grupo.

Para compreender bebês e crianças bem pequenas, estar junto a eles observando-os é fundamental, uma vez que seus modos de ação são complexos, ricos em detalhes e especificidades e tomados de uma multiplicidade de linguagens. Por isso, a observação precisa ser acompanhada de um registro, caso contrário, os seus elementos se dispersam e se misturam. Graue e Walsh chegam a mencionar que “as observações não registradas não constituem dados” (2003, p. 129). Dessa

forma, quando anuncio que, na minha chegada ao campo somente observei e participei, significa que minha estratégia inicial foi somente a de me aproximar dos grupos, passando, a fazer, posteriormente, registros escritos em um pequeno caderno que carregava comigo e, posteriormente, na câmera.

Assim como Graue e Walsh (2003), a professora Maria Riera defende que “a observação tenta ir além do olhar e da percepção para não permanecer na superfície” (2015, p. 57, tradução nossa), para o que se fazem necessários “atitudes e processos como a atenção, percepção, memória, comparação, discernimento ou reflexão” (2015, p. 57, tradução nossa). Os registros são fundamentais para voltar ao campo e possibilitar o redirecionamento das observações e as posturas enquanto pesquisadora.

Para bem observar, então, precisamos ter em conta os nossos objetivos e a clareza de que o olhar que direcionamos é sempre seletivo. No parque, por exemplo, pela multiplicidade de possibilidades existentes nesse contexto, coexistiam vários grupos de crianças desenvolvendo ações diferentes, como exploração da areia, brincadeiras de casinha ou de pegar, coleta de folhas e sementes, jogos com bola e utilização dos brinquedos (balanço, escorregador) e é inviável observar todas ao mesmo tempo: a partir da minha temática de pesquisa, precisava focar naquilo que estava relacionada a ela, sem deixar de estar atenta para notar algo que poderia passar despercebido, como a permanência de algumas crianças na lateral desse espaço para acessar uma torneira pingando que lhes fornecia um pouco de água para incrementar a sua brincadeira (Registro de observação, 21/09/2018).

Ao observar, portanto, é necessário considerar a criatividade e a dinamicidade nesse processo: não basta escolher um local de observação e permanecer somente nele. É preciso movimento para enxergar a partir de vários ângulos, buscando as estratégias necessárias para tal. Embora eu tivesse, por motivos de saúde, um pouco de dificuldade em me manter abaixada na altura das crianças por muito tempo, mudar o ângulo de observação foi importante também para viabilizar o seu registro, pois, conforme detalharei na sequência, por um compromisso ético, as fotografias divulgadas não poderiam mostrar os rostos das crianças. Então, precisava conseguir ver as suas expressões, mas ter registros que também pudessem mostrar as suas ações com a natureza, sem divulgar os seus rostos.

Observar, nessa perspectiva, também significa participar. A participação, como aponta Brougère (2012), possui diferentes níveis e modalidades. O pesquisador não

participa com tamanha propriedade como um integrante do campo, mas esses diferentes níveis e modalidades vão lhe permitindo conhecer melhor o grupo, ser aceito no contexto e contribuir com a sua dinâmica. Em alguns dias no momento do lanche, as professoras me convidavam para experimentar algum alimento que havia sido colhido ou chá que seria servido. Esse convite me fazia sentir mais parte do grupo e aceitar o convite também era uma maneira de incentivar as crianças a experimentarem o que estava sendo oferecido.

Da mesma forma, por parte das crianças dos Grupos 2 e 3, foi especialmente por meio da participação em brincadeiras, a convite delas, como no “Episódio nº 1 – A brincadeira de lobo” e no “Episódio nº 2 – Brincando de ir à praia”, que fui conseguindo me aproximar e ser aceita. Com relação ao G1, o convite para participação era menos verbal, mas, não por isso, menos intencional. Os bebês me procuravam tanto mostrando brinquedos, um convite para brincar com eles, como me escolhendo para dar a mão nos momentos de passeio, reconhecendo-me como participante do grupo – na condição de adulta.

As crianças dos três grupos também participaram de forma frequente dos registros que eu fazia. Meu bloco de registro era um pequeno caderno com folhas coloridas, acompanhado de uma caneta inserida em seu espiral, os quais eu carregava debaixo do braço. Ao me verem escrevendo, passavam a se aproximar, interessando-se pelo que eu fazia. Algumas vezes, as crianças dos Grupos 2 e 3 perguntavam o que eu estava fazendo. Como eu havia explicado para elas anteriormente, de forma coletiva, que estava fazendo um trabalho registrando o que elas faziam com a natureza para poder escrever sobre isso depois (e que ilustraria com fotografias) (Registro de observação, 28/06/2018), eu retomava essa minha intenção e elas, então, pediam para desenhar.

Outras já se aproximaram de forma mais direta solicitando para desenhar, seja por já conhecer esses instrumentos para escrita, seja por terem observado os colegas fazerem esse movimento. Do Grupo 1, Patrícia era a bebê que mais me procurava para desenhar. Inclusive, de todas as crianças, ela era uma das mais interessadas. Quando me via já apontava para o caderno, dizendo “d~, d~, d~, d~”. Essa possibilidade de poder desenhar foi, junto das brincadeiras, uma grande abertura para aproximação das crianças, pois eu era a única pessoa que andava o tempo inteiro com papel e caneta e ainda podia emprestar para elas de vez em quando.

Outro diferencial que não passava despercebido era a câmera que eu carregava. Optei pela utilização de uma câmera digital semiprofissional, que levava pendurada ao pescoço. Embora as professoras também fizessem registros das atividades com as crianças, eu me destacava por andar sempre acompanhada da câmera. E as crianças elaboravam de diferentes formas essa percepção. Em um dia no parque, algumas crianças me convidaram para brincar de casinha, solicitando que eu assumisse o papel de mamãe, a partir do que Rodrigo (G3) então anunciou: “você pode ser uma mamãe com uma câmera!” (Registro de observação, 30/08/2018). Ele sabia que carregar uma câmera não é um dos atributos para representar o papel de mamãe. Por outro lado, como era algo inerente à minha presença, não foi o fato de eu estar com uma câmera que inviabilizaria a possibilidade de eu participar da brincadeira, eu só seria, então, “uma mamãe com uma câmera”, como ele disse.

No dia seguinte, brincando com Rafaela (G3) também no parque, ela acha um pequeno plástico e começa a utilizá-lo para desenhar na areia, fazendo uma representação que também destaca a minha especificidade enquanto pesquisadora, de alguém que carrega uma câmera:

Episódio nº 3 – Desenhando a pesquisadora: alguém “bem grandinha” e com uma câmera

No parque de trás, após a brincadeira de montar um bolo de diferentes ingredientes com areia, feito por Rafaela (G3), ela vê o potencial de uma pequena peça plástica para desenhar na areia, dizendo que tinha encontrado algo bom para desenhar. Primeiro faz uma forma ovalada fechada, indicando ser uma banana (seguindo na temática de ingredientes de bolo), e depois diz que vai me desenhar: ‘eu vou desenhar você, Carol’. Inicia o desenho com um círculo, que representa a cabeça e pergunta: ‘como você é?’ e então eu pergunto de volta: ‘como é que eu sou?’ Ela vai respondendo, enquanto desenha uma perna: ‘assim, bem grandinha’. Ela desenha a outra perna e me mostra seu desenho: ‘viu, olha você bem grandinha’. Eu respondo que ele parece muito comigo. Ela, então, desenha dois braços. Quando os finaliza, levanta, olha para o desenho e volta para ele para fazer olhos e boca. Olha para mim novamente e questiona, para si mesma e em voz alta, o que mais falta desenhar. Faz um traço na cabeça próximo ao braço, cuja descrição é inaudível, mas que aparenta ser o pequeno caderno que levo debaixo do braço, pois, na sequência, ela olha para mim e diz: ‘vou desenhar a sua câmera’, que sempre carrego pendurada ao pescoço. Observa-a por um instante e comenta que não sabe desenhar uma câmera, mas digo que ela pode desenhar como ela souber. Ela finaliza e eu comento que adorei o desenho e que iria fotografá-lo. Na sequência, ela volta para o desenho anterior para continuar a brincadeira de ingredientes para fazer alguma comida com a areia. Rodrigo (G3) e Douglas (G3) se aproximam e os três começam a fazer um bolo com areia(Registro de observação, 31/08/2018).

Figura 1 – Fotografia do desenho da pesquisadora feito por uma das crianças. Fonte: A autora.

O desenho e a fala das crianças, além de terem contribuído para que eu me sentisse mais parte do grupo, pois elas me acolheram nas suas brincadeiras e representações, demonstrou que mesmo crianças tão pequenas não são indiferentes à presença de uma câmera, elaborando de variadas formas a diferença que marcava a minha participação enquanto pesquisadora da atuação dos demais adultos com quem conviviam na escola. Não podemos pensar que, embora sejam crianças bem pequenas, elas não percebam ou se importem com a entrada de pesquisadores e/ou de seus instrumentos. Por isso, precisamos respeitar e estar atentos às suas manifestações, considerando as suas legítimas formas de expressão, de aproximação e de convites para participação.

Foi necessário, então, encontrar o equilíbrio entre participar, observar e registrar no caderno, afastando-me um pouco da atividade para poder registrar dados que não poderiam ser esquecidos. Já o uso da câmera diferencia-se pela sua

peculiaridade de implicar um registro do e no presente. Assim como acontece com os nossos olhos, não é possível fotografar ou filmar uma cena que já passou. Cada segundo vai, concomitantemente, se transformando em passado. Portanto, é necessário estar sempre atento ao utilizá-la, pois, diferentemente do papel, que permite o seu registro posterior, a câmera depende do instante presente. Uma fração de segundo e uma cena pode já não ser registrada.

Por isso, não basta confiar a função do registro aos instrumentos. Relembrando Bogdan e Biklen (1994), o pesquisador é o principal instrumento da investigação, que encontra no uso da câmera o diferencial de poder retornar ao que foi visto, rever a imagem ou a cena e, inclusive, ver até aquilo que pode não ter sido visto. Nesse sentido, a câmera é um instrumento que permite ao pesquisador ver o mundo com outros olhos.

Sontag (2004) aponta outros riscos de considerar a câmera como soberana na relação entre quem fotografa e quem ou o que é fotografado. A autora alerta-nos o quanto as fotografias – e vejo que hoje, cada vez mais, também os vídeos – estão sendo utilizados como substitutos daquilo que é vivido (SONTAG, 2004). O registro fotográfico ou audiovisual acaba sendo um meio de comprovação de participação, embora, muitas vezes, essa participação ocorra de forma superficial e com interesse voltado não para o processo, mas para um produto final.

Não é – ou não deveria ser – esse o sentido da utilização da câmera na pesquisa, pois, dessa forma ocorre um afastamento da situação e das pessoas que nela estão envolvidas. Como a visão e, consequentemente, o uso da câmera, dispensa contato, aproximação, presença real, quem a está utilizando pode acabar se escondendo atrás desse aparato que parece isentar da necessidade de estabelecer relação com a(s) pessoa(s) fotografada(s) [ou filmada(s)] (SONTAG, 2004).

Ao contrário disso, fazer pesquisa com bebês e crianças, em especial com aquelas bem pequenas, é estar em constante relação, pois elas mesmas buscam aproximação, seja para serem fotografadas, para olharem pela câmera ou, também, para fotografarem. Os seus colegas eram os principais interesses das crianças ao olharem pelo ecrã e indicarem o desejo de fotografar, o que me parece bastante compreensível pelas relações que as crianças estabelecem entre elas. O que me chamou a atenção foi o interesse em olhar a lua e fotografá-la, como o fez Luís (G2). Não foi possível descobrir a origem do seu interesse (se já havia acompanhado algum adulto fazendo esse movimento de fotografar a lua), mas o fato de querer fotografá-la

faz bastante sentido em um grupo de crianças que frequentemente anunciava a sua chegada quando a enxergava no céu.

Fotografar a natureza – para além da necessidade atual de fotografar por fotografar – é forma de registrar a sua efemeridade, que parece cada vez mais acompanhada da raridade com que é encontrada no cotidiano ocidental. O próprio Daguerre afirmou que a fotografia serve para retratar a natureza e também dá a ela a capacidade de se reproduzir (SONTAG, 2004). Mas até as fotografias da natureza entram no círculo de consumo e compartilhamento a ponto de que, como analisa Sontag (2004) as pessoas cheguem a achar piegas os pores-do-sol, pois agora eles foram banalizados, se parecem demais com fotos.

Contudo, cada fotografia é única, de um tempo-espaço também único e tanto as crianças quanto a natureza expressam força e sutileza muito particulares a cada milésimo de segundo. As fotografias, enquanto uma ética do ver, possuem gramática própria (SONTAG, 2004) e é a sensibilidade do fotógrafo na interação com o sujeito (ou objeto) que permite a existência de uma beleza que só a câmera revela, mesmo através de um instante muito rápido (SONTAG, 2004). Nesse sentido, concordo com o fotógrafo Lewis Hine quando diz que se pudesse contar a história em palavras, não precisaria carregar uma câmera (SONTAG, 2004).

Apostando nesses elementos, a fotografia me permitiu abrir os olhos para detalhes da natureza que não seriam tão valorizados somente com o uso da observação, ou mesmo com a gravação em vídeo. Da mesma forma, amplificava as ações que as crianças desenvolviam: uma brincadeira na areia com potes, pás, baldes e peneiras era, também, a montagem de uma estrutura em que Hugo (G3) e Douglas (G3) se engajavam para erguer, mas que acabou sendo derrubada (Fotografias feitas pela pesquisadora, 27/09/2018).

Sontag explica que o momento apropriado da captura de uma imagem é quando se consegue ver coisas (especialmente o que todos já viram) de um modo novo (2004). Esse é o exercício de pesquisar as relações das crianças com a natureza: ver com um novo olhar aquilo que parece banal e sem aprofundamento.

Uma fotografia, então, “permite ter acesso a um infra-saber” (BARTHES, 1984, p. 51), um saber que ocorre dentro de um grupo, ao qual o pesquisador tenta ter acesso para poder compreendê-lo. Por isso, não foi possível fotografar enquanto estava no campo e depois somente armazenar as fotografias para incluí-las na tese: foi preciso – e importante – analisá-las, compreendendo-as também como dados

gerados na pesquisa. Percebi que as fotografias foram extremamente relevantes nos momentos em que os grupos saíam da escola, pois, caminhando, ficava difícil fazer registros no caderno. E elas ainda facilitaram a visualização dos agrupamentos que as crianças faziam nas suas brincadeiras na e com a natureza, ajudando-me a perceber que, mesmo na relação com a natureza, as crianças interagiam e brincavam umas com as outras.

O vídeo também é uma ferramenta que permite esse mergulho. Embora seja muito potente para análise das ações e relações das crianças, como pude perceber em experiência anterior de pesquisa (CASTELLI, 2015), até o utilizei nesta presente investigação, porém, pelo fato de as crianças estarem muito ao ar livre, onde o som da gravação não era captado com nitidez, e em interação com muitas crianças de outros grupos que também ocupavam esses espaços conjuntamente e que não participavam da pesquisa, encontrei na fotografia melhores possibilidades de registro. Compartilho algumas delas na tese lembrando, a partir de Sontag (2004), que cada fotografia traz consigo determinadas margens, um enquadramento, uma fatia fina de espaço e de tempo, isto é, cada fotografia é fruto da interpretação e da escolha de quem os produziu. Novamente: se fosse outro pesquisador em campo, outras fotografias seriam tiradas e, possivelmente, outros dados poderiam ser gerados (GRAUE; WALSH, 2003). Por isso, a importância da triangulação entre instrumentos, de modo que permitam ver com olho de descobrir (BARROS, 2010), assim como as crianças fazem, para uma melhor compreensão dos dados.

Então, além da recolha de dados (documentos) e observações (registradas por escrito, fotografias e vídeos), também convidei as professoras dos três grupos que participaram da pesquisa para entrevistas. Spradley (1979), ao discorrer sobre a entrevista etnográfica, pontua que ela é um pouco mais formal que uma conversa amigável, uma vez que o entrevistador tem um pouco mais de controle sobre a situação, sendo importante que o faça sem ser autoritário. Desta forma, o autor relembra a importância de apresentar a finalidade da entrevista, explicando como a mesma se dará e questionando sobre a possibilidade de gravação da conversa.

As três professoras participantes concordaram em participar das entrevistas, bem como que as mesmas fossem gravadas. Spradley deixa claro que o interesse da etnografia não é estudar as pessoas em si, mas aprender a partir delas a fim de entender a categoria humana e contribuir com as suas necessidades (1979). Isso significa que o objetivo do pesquisador ao propor esse tipo de entrevista não é cair

em um julgamento sobre o que é dito, mas, como propõe Michelat (1982), a partir da interpretação daquilo que é individual, poder alcançar o sociológico, o cultural – ao menos no que se refere ao contexto em questão.

Michelat (1982) escreve sobre a entrevista não-diretiva em Sociologia, sendo possível aproximar seus escritos ao que é proposto na etnografia, especialmente porque o autor defende que perguntemos não no sentido de descobrir o que o informante sabe, mas de compreender, a partir de interpretação, o que pensa e o que sente. Por esse motivo, as questões norteadoras (Apêndice E) foram encaminhadas previamente ao momento da entrevista para as professoras.