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Interiorização, Apropriação e Reprodução

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4.2 PRINCÍPIOS DE ORGANIZAÇÃO DA ATIVIDADE DE APRENDIZAGEM

4.2.5 Interiorização, Apropriação e Reprodução

A teoria do ensino desenvolvimental enfatiza a ideia de que a base está no seu conteúdo, e é dele que se origina o método necessário à sua organização. É esta organização que auxilia na formação do pensamento teórico necessário ao desenvolvimento cognitivo. Decorre daí que:

A atividade de aprendizagem dos alunos se estrutura, segundo nossa opi- nião, em correspondência com o procedimento de exposição dos conhecimen- tos científicos, com os procedimentos de ascensão do abstrato ao concreto. O pensamento dos alunos no processo de atividade de aprendizagem tem algo em comum com o pensamento dos cientistas, que expõem o resultado de suas investigações por meio de abstrações e generalizações substanciais e os conceitos teóricos que funcionam no processo de ascensão do abstrato ao concreto. (DAVÍDOV, 1988, p. 173)

Se, por um lado, o desenvolvimento das operações mentais se dá por meio da apropriação dos conceitos científicos, ou seja, do desenvolvimento do pensamento teórico, por outro, o desenvolvimento das operações mentais empíricas se desenvolvem a partir do pensamento empírico. A partir dessa compreensão, o ensino que intenciona desenvolver o pensamento cognitivo deve ser organizado a partir dos conceitos das disciplinas escolares de tal modo que o aluno percorra, de forma condensada e abreviada, o processo histórico da origem e desenvolvimento daquele conhecimento. Por isso é que, para Vygotsky:

O processo de formação de conceitos é irredutível às associações, ao pen- samento, à representação, ao juízo, às tendências determinantes, embora todas essas funções sejam participantes obrigatórias da síntese complexa que, em realidade é o processo de formação de conceitos. (VYGOTSKY, 2001, p. 169)

Essa dinâmica permite revelar a essência, ou como afirma Davídov, a “célula, o nuclear” e o desenvolvimento dos objetos do conhecimento, além de permitir a aquisição de métodos e estratégias cognitivas próprias de cada ciência. É nessa situação que: “o pensa- mento teórico do aluno se forma pelo domínio dos procedimentos lógicos do pensamento, que, pelo seu caráter generalizador, permite sua aplicação em vários ambientes da aprendizagem”. (LIBÂNEO, 2004, p. 16)

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Nesse processo, o mediador, mais velho e/ou mais experiente, acaba sendo funda- mental para auxiliar o aluno na identificação da relação geral principal, a fim de que perceba que ela se manifesta em outras situações particulares. Quando o aluno percebe o vínculo dessa relação com as diversas manifestações particulares, consegue fazer generalizações dos temas em estudo. O fragmento que se segue refere-se à aula do dia 25 de outubro de 2008, quando se discutia a ação 01 da unidade 05, referente à didática na pedagogia crítica. Essa discussão resultou do texto: “Um episódio na vida de Joãozinho da Maré10”.

Líbia: Ele (Joãozinho) questionava a professora.

Vivy: Ele questionava e ela não tinha respostas capazes de satisfazê-las. Pesquisadora: Como a professora reagiu aos questionamentos de Joãozinho? Líbia: Ficou nervosa, irritada e foi perdendo a paciência com Joãozinho. Pesquisadora: Como ele reagia?

Vivy: Com insistência, queria saber por que as coisas se davam daquela forma e a professora não conseguia dar explicações que o convencessem.

Líbia: A professora se estressou com tantas perguntas. Vivy: Está, mas qual o principal objetivo do texto?

Viane: Bom, a professora é tradicional e nunca pensou sobre o que ensinava. Vivy: O objetivo é fazer uma crítica à pedagogia tradicional com suas verdades. O conhecimento dela era fragmentado.

As alunas identificaram que a professora possuía um conhecimento fundamentado na lógica formal e que era insuficiente para lidar com os questionamentos de um de seus alunos, uma vez que detinha apenas o resultado/produto daquele conhecimento. Como o aluno insistia em querer compreender o processo que resultou no conhecimento, o conflito se instalou, pois a professora se sentia incapaz de resolver a questão, por desconhecer o processo de produção do que vinha ensinando, há tantos anos, sem que fosse necessário se questionar a respeito. Disso resultava uma reprodução mecânica do conhecimento lógico formal também por parte de seus alunos, pois quem deveria orientar a formação do pensamento teórico para a apropriação de conceitos também teóricos, desconhecia essa forma de ensinar e de aprender.

Para desenvolver o pensamento cognitivo dos alunos era necessário fazer com que seu pensamento se movesse, orientando-se do geral ao particular, para identificar o nuclear da disciplina em estudo, para, depois, deduzir as diversas particularidades do que está sendo estudado. De posse do essencial, os alunos conseguiriam explicar as condições de origem do conteúdo que foi sendo internalizado ao se apropriarem do nuclear do objeto em estudo.

A fim de que os alunos adquiram o conhecimento teórico, o método de ensino

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também precisa caracterizar um conhecimento teórico, adquirido por meio da atividade investigativa, ou seja, da resolução de problemas que contenham os conflitos fundamentais dos fenômenos. Hedegaard (2002) diz que a instituição de ensino tem a tarefa de ensinar os conceitos científicos, de um modo teórico, aplicando procedimentos epistemológicos, também teóricos, não empíricos, para que os conhecimentos espontâneos sejam ampliados para incluir conceitos científicos.

Caso os conceitos científicos sejam apreendidos como empíricos, os alunos terão dificuldades em relacionar criticamente o que aprendem na escola com as situações concretas da vida. Situação bastante comum no meio escolar/acadêmico em que as alunas questionam seus professores a respeito da validade/utilidade daqueles conhecimentos para a vida prática. Exemplo disso aparece na discussão desencadeada no dia 25 de outubro (ação 01 da unidade 05), quando se iniciava o conceito de didática na pedagogia crítica.

Pesquisadora: A professora dominava o processo de produção do conhecimento? Sandy: Não, ela não sabia explicar o porquê que acontecia daquela forma. Vivy: Na verdade ela tinha decorado, tinha só o produto e não o processo de produção do conhecimento.

Pesquisadora: Por que a professora perde a tranquilidade?

Rosa: Porque as perguntas desestruturam as verdades que ela vinha reproduzindo há vários anos.

Bela: Tudo porque ela aprendeu assim e nunca se questionou a respeito dessas suas verdades. [· · ·]

Yasmin: Por isso é importante pensar sobre o que se está fazendo. O professor precisa se perguntar sobre as verdades que ensina para poder ajudar o aluno pensar também. Os estudos de Rubtsov indicam que a generalização formal consiste em: “valori- zar as propriedades comuns e externamente semelhantes de uma variedade de objetos, no momento em que é feita uma comparação, enquanto que a generalização teórica supõe uma análise das condições de construção iniciais de um sistema de objetos por meio da sua trans- formação”. (RUBTSOV, 2003, p. 131). Assim, na medida em que as alunas desenvolvem o pensamento teórico, conseguem fazer uma leitura generalizadora do conceito.

Antes, como eu falei, didática seria só ensino, mas o que faz parte do ensino?. Então, isso que mudou, eu não sabia. Faz parte do ensino o conhecimento, a aprendizagem, os métodos e técnicas que vão ser utilizados, o currículo, a metodologia que faz parte, a avaliação da aprendizagem que seria a forma de avaliar as atividades [· · ·] a didática tem relação com a pedagogia, com as teorias de aprendizagem, com os métodos de produção do conhecimento e isso eu não entendia. (VIANE, aluna, entrevista realizada no dia 17 de novembro de 2008)

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mação do pensamento cognitivo das alunas. Isso significa dizer que não é qualquer ensino que se deve propor. Se se ensina por meio de métodos que privilegiam o formalismo e o dog- matismo, a probabilidade é ficar somente no desenvolvimento lógico formal do pensamento, como bem se pode observar na fala a seguir:

Eu pensava que não tinha que fazer relação de uma matéria com a outra; que seria tudo fragmentado mesmo e que era desnecessário. Porque era tudo separado [· · ·]. Agora eu vejo que não, que uma coisa está ligada a outra e para entender não pode ser uma coisa fragmentada [· · ·]. (PRETA, aluna, entrevista realizada no dia 17 de novembro de 2008)

4.3 CONCEITOS BÁSICOS PARA O DESENVOLVIMENTO

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