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A Visão das Alunas sobre Ensino e Aprendizagem no Curso de Pedagogia

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4.5 MUDANÇAS QUALITATIVAS NA APRENDIZAGEM DA DIDÁTICA

4.5.2 A Visão das Alunas sobre Ensino e Aprendizagem no Curso de Pedagogia

Um dado significativo que permite compreender a tentativa de as alunas apren- derem empiricamente os conteúdos escolares foi revelado nas entrevistas, quando 19, de um total de 24, afirmaram que ’aprendiam’ os conteúdos ministrados pelos professores, deco- rando. Para isso se utilizavam de diferentes estratégias que iam da elaboração dos próprios questionários, até as leituras que se repetiam por várias e várias vezes, mas sem qualquer reflexão que permitisse compreender os conceitos.

As falas trazidas para este estudo são reveladoras, uma vez que mostram o trata- mento dado pelas alunas em relação aos conteúdos ensinados pelos professores. Esses dizeres são importantes para que os docentes reflitam a respeito da didática utilizada e da forma como os conceitos estão sendo ensinados, principalmente, no Curso de Pedagogia.

Eu sempre entendi decorando, eu ia estudar e só na base [pausa] ficava ali horas e horas estudando e tentando decorar aquilo daí. Aí quando chegava na hora da avaliação se esquecesse uma palavrinha o resto já ia tudo. (ANA, aluna, entrevista realizada no dia 03-12-2008)

A gente aprendia daquele jeito que a gente aprendeu mesmo lá na escola não é, decorar. Eu pegava um livro desse aqui e ia lendo o que achava mais importante, ia riscando e lia, lia, lia, eu ficava naquilo ali, ’trocen- tas’ vezes, parava e ficava até não decorar cada vírgula daquilo ali eu não parava. (LAINE, aluna, entrevista realizada no dia 03 de dezembro de 2008) Antes era tudo decorado não é [· · ·] eu decorava e a aprendizagem era só para aquele momento. (PRETA, aluna, entrevista realizada no dia 17 de novembro de 2008)

Aprendia só decorando, por isso que eu disse que tenho muita dificuldade porque eu aprendia assim decorando. Então nas provas eu tinha que deco- rar. (MARY, aluna, entrevista realizada no de 01 de dezembro de 2008)

Se, por um lado, as alunas aprendiam decorando para reproduzir mecanicamente o conteúdo nas avaliações, por outro, 5 alunas das 24 demonstravam uma preocupação em apreender os conteúdos, mesmo que de forma fragmentada, superficial, imediatista e sem conseguir estabelecer relações com outras disciplinas. A fala de algumas expressa essa forma de aprender:

A gente tem o costume de olhar a disciplina cada uma por si, não é?. Tanto é que a gente não associava planejamento com currículo, sendo que os dois

estão totalmente ligados. (LILI, aluna, entrevista realizada no dia 26 de novembro de 2008)

Antes a gente aprendia de uma forma, assim, superficial não é, uma coisa que era lançada pra gente, era praticamente uma coisa que era jogado e a gente pegava aquilo dali e achava que era uma verdade, a gente não ia atrás para pesquisar, para analisar, de ter uma visão mais crítica. (SARZINHA, aluna, entrevista realizada no dia 24 de novembro de 2008)

Agora eu vejo que eu preciso fazer essa relação que enriquece mais minha aprendizagem, antes eu era uma coisa meio imediatista, isso é isso e pronto e acabou. Não que eu tive facilidade pra decorar. Eu prefiro entender e escrever, escrever a forma que eu compreendi do que está lá escrito. (LUÍSA, aluna, entrevista realizada no dia 01 de dezembro de 2008)

Os depoimentos a respeito de seu processo de aprendizagem ratificam a tese de Davídov de que a forma tradicional de organização do ensino contribui pouco para o desenvolvimento cognitivo dos alunos.

4.5.3 A ZDP Inicial em Relação ao Conceito de Didática

Para se ter uma ideia inicial das zonas de desenvolvimento real das alunas, em relação ao conceito de didática, optou-se por realizar uma produção escrita para saber que compreensão tinham a respeito dos conceitos relacionados ao objeto de estudo da didática, mais especificamente do ensino e da aprendizagem, a fim de que, no decorrer da realização do experimento didático, se pudessem identificar possíveis mudanças nas ZDPs, quando as alunas estivessem em atividade de aprendizagem. É importante lembrar que somente as alunas presentes no primeiro encontro realizaram essa tarefa e que todas as participantes já haviam cursado a disciplina de didática. Feitos os esclarecimentos, passa-se à análise da produção escrita das alunas.

Uma leitura mais aligeirada e superficial das produções permite pensar que a maioria tem uma compreensão significativa dos conceitos em estudo. No entanto, quando se faz uma análise mais cuidadosa dos textos, identifica-se certa precariedade em lidar com os conceitos fundamentais à compreensão da disciplina de didática. De certa forma, o que algumas alunas reproduzem expressa uma compreensão que, provavelmente, tenha sido me- morizada mecanicamente, a partir da realização de leituras e/ou de discursos presentes no meio acadêmico e, principalmente, no decorrer da disciplina de didática. Essas questões podem ser percebidas nos fragmentos que seguem:

A aprendizagem é tudo aquilo que me foi transmitido e, com isso, consigo entender, argumentar e questionar. Ou seja, aquilo que já consigo ter certo domínio diante do que me foi ensinado. Ensino seria a forma de como foi transmitido algo e como consegui internalizá-lo. Didática é a metodolo- gia usada para ensinar. (PRETA, produção textual realizada no dia 09 de

188 agosto de 2008)

A aprendizagem é o que se assimilou a partir de algo que foi ensinado [· · ·]. Ensinar significa passar conhecimento, é ajudar no desenvolvimento de al- guém e a didática vem pensar na melhor forma de ensinar para provocar um desenvolvimento progressivo no ser humano. (BELA, produção textual realizada no dia 09 de agosto de 2008)

A aprendizagem se dá de várias formas, pode ser formal, ambiente escolar, informal e não-formal, que não necessariamente na escola, mas também no cotidiano. Ensinar está ligado em como o conhecimento é transmitido aos outros e internalizado como conteúdo que terá sucesso se bem aplicado. A didática é a arte de ensinar, é flexível e muda com o passar do tempo. É a forma de como se dá o ensino, como ele é organizado. (LAINE, produção textual realizada no dia 09 de agosto de 2008)

Os textos produzidos revelam uma compreensão pontual e superficial dos conhe- cimentos, ou seja, uma produção em que cada conceito é definido de maneira pontual e fragmentada, parecendo-se mais com um jogo de palavras sem muita articulação, consistên- cia e coerência teórica.

Além disso, as alunas se colocam como sujeitos receptores, passivos e prontos para receber e reproduzir mecanicamente as informações que foram sendo recebidas. Essa forma de conhecimento, para Davídov (1988), se caracteriza como um saber empírico, importante, mas que contribui pouco para o desenvolvimento do pensamento cognitivo. Como se pode perceber, tal forma de ensino acaba contribuindo pouco para o processo de aprendizagem, uma vez que o aluno dificilmente consegue fazer generalizações teóricas com o que aprendeu, e usá-lo, inclusive em diferentes situações de sua vida.

Outra situação bastante presente na produção das alunas refere-se à compreensão da didática como método e/ou metodologia de ensino utilizados pelo professor para “pas- sar/transmitir” o conhecimento e/ou informações aos alunos, como se observa nas produções que seguem:

O ensino e a didática estão interligados, pois a didática é o método que utilizo para alcançar o conhecimento e o ensino é como vou fazer para que alguém adquira um conhecimento. (KETLELEN, produção textual reali- zada no dia 09 de agosto de 2008)

Aprendizagem é tudo que aprimora o conhecimento adquirido no dia a dia. Ensino é transmitir o conhecimento historicamente produzido e didática é o método como eu vou ensinar. A forma em que eu vou ensinar (LÚCIA, produção textual realizada no dia 09 de agosto de 2008)

Embora apareçam, nessas produções, conceitos importantes da teoria histórico- cultural, da teoria da atividade e da teoria do ensino desenvolvimental, como internalização, integração, mediação, conhecimento historicamente produzido, apropriação, entre outros reforçam-se as ideias de que esses conceitos são citados em forma de ´jargão’ que foram

sendo memorizados e reproduzidos mecanicamente sem muita compreensão do seu signifi- cado. Essa percepção foi sendo confirmada, ao longo do desenvolvimento do experimento didático, quando se percebeu que a maioria das alunas não conseguia falar a respeito do significado e, muito menos, realizar generalizações teóricas com esses conceitos.

Outra questão que merece destaque refere-se à avaliação que as alunas fazem a respeito da organização do ensino e do domínio dos conceitos por parte dos professores. Além disso, as produções que seguem possibilitam reflexões significativas sobre a concepção de ensinar e de aprender, do significado de apropriação e desenvolvimento da autonomia de pensamento, bem como a interação e a mediação que também aparecem como importantes:

Quanto ao ensino o professor deve planejar e entender bem o conteúdo para que ele explore e transmita ao aluno com segurança, fazendo com que o aluno internaliza o conhecimento passado. E a didática está relacionada para arte de ensinar, ou seja, fazer com que os alunos pensem criticamente e se apropriem do poder da autonomia de pensamento. (BAIXINHA, pro- dução textual realizada no dia 09 de agosto de 2008)

A aprendizagem é feita através de um mediador que tenha um conhecimento maior e queira que seu aluno também o tenha, independente da sua forma de ensinar, ou melhor, de sua didática. Dessa forma, a didática é planejada através das práticas educativas e aplicada, tendo como objetivo a aprendi- zagem. Por isso, seu objeto de estudo é o ensino, uma vez que ele é a forma na qual o aluno aprende. (YASMIN, produção textual realizada no dia 09 de agosto de 2008)

Assim, a didática, ao mesmo tempo em que expressa a compreensão da ´arte de ensinar’, na perspectiva de Comênio18 (1985), aparece como uma necessidade de organizar

o ensino, para que o aluno se aproprie, não da autonomia de pensamento, como a aluna se refere, mas dos conceitos historicamente produzidos para que desenvolva o pensamento cognitivo, tornando a autonomia de pensamento uma realidade. Enfim, o que as alunas escrevem em seus textos deixa perceptível a pouca clareza dos conceitos, porém não se pode negar a tentativa de ampliar a compreensão a respeito deles.

Na sequência, as produções pontuam conceitos da teoria histórico-cultural, como apropriar e interagir que, no entanto, precisam de uma maior clareza teórica; exemplo disso: “o ensino é apropriação do conhecimento adquirido; a educação é historicamente construída; para construir e aperfeiçoar cada vez mais seus conhecimentos”. As produções indicam certa precariedade conceitual, por parte das alunas, uma vez que conceitos importantes da teoria histórico-cultural acabam sendo ´confundidos’ com os conceitos da teoria construtivista.

A aprendizagem vem junto com a educação que é historicamente constru- ída, juntamente com o ensino que é apropriar do conhecimento adquirido e a didática e achar uma melhor maneira de fazer com que o aluno aprenda

18

João Amós Comênio. Didática Magna. (Trad. Joaquim Ferreira Gomes). 3. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1957.

190 no seu contexto social, ajudar a achar soluções. (MARY, produção textual realizada no dia 09 de agosto de 2008)

Didática tem como objetivo ensinar. É a maneira que o professor ensina, orienta, ou seja, dirige o ensino para haver uma boa aprendizagem, in- teragindo com os alunos, respeitando suas experiências para construir e aperfeiçoar cada vez mais seus conhecimentos. (HÁLI, produção textual realizada no dia 09 de agosto de 2008)

Os fragmentos das produções, considerando suas particularidades, representam o pensamento das demais alunas e permitem afirmar que, de maneira geral, elas se apro- priaram de uma visão reduzida, fragmentada e individualizada dos conceitos básicos que envolvem a didática. A pouca compreensão das diferentes concepções de conhecimento, de aprendizagem, de pedagogia e de didática foram visíveis durante a realização do experi- mento didático-formativo e isso aparece, de forma significativa. Vale lembrar que as alunas estudaram alguns desses conceitos nas diferentes disciplinas do curso: princípios da ciência da educação, iniciação à pesquisa, história da educação, filosofia da educação, introdução à psicologia, psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem, entre outras.

Inicialmente, pode-se dizer que há uma sobreposição de senso comum e/ou de conhecimento empírico em relação ao conhecimento científico e uma tentativa de ´definir’ cada conceito, a partir das percepções que foram sendo elaboradas com os textos e/ou com os estudos realizados nas disciplinas, e, ainda, com a concepção dos professores. Na leitura das produções textuais percebe-se um esforço das alunas em articular esses conceitos, mas a carência conceitual impediu uma elaboração mais consistente, pois ainda carecem de conhecimetnos para relacionar os conceitos necessários a uma produção mais elaborada.

Depois de analisar as entrevistas realizadas, no final do experimento didático- formativo, pode-se afirmar que as produções textuais, realizadas no início do experimento refletem um discurso pronto e sem muita reflexão. Dessa forma, o aluno reproduz uma definição que foi transmitida e que conseguiu memorizar mecanicamente, sem ter construído significado para aquele determinado conceito que utiliza.

Nesse sentido, é possível dizer que as alunas ainda precisam internalizar e se apropriar do significado dos conceitos, uma vez que vêm de um ensino escolar que induz à memorização mecânica, no qual as definições são frágeis e superficiais. Com isso, sentem-se incapazes de empregar conscientemente tais conhecimentos, fazendo com que tenham pouco sentido em seu processo de aprendizagem.

Em relação à ZDP inicial, a avaliação que se fez era a de que as alunas apresen- tavam elaborações mecânicas, sem explicitar sua compreensão, como se a produção escrita fosse ‘coisa do outro’. Assim, se colocam como sujeitos passivos e prontos para receber e repetir as informações transmitidas pelas professoras.

das quais os professores se utilizam para transmitir as informações/conhecimentos que são recebidos como verdade absoluta a serem memorizadas e reproduzidas mecanicamente.

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