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5.2 ANÁLISE DO MÉTODO DE RORSCHACH

5.2.5 Interpretação psicodinâmica

5.2.5.1 Modo de relações de objeto

O examinando deu apenas uma resposta de conteúdo humano (H%= 10%), resultado abaixo do esperado tanto para adultos quanto para adolescentes, o que indica inibição e ansiedade no relacionamento com as pessoas e a evitação das relações que implicam proximidade, também tendo em vista o anonimato das personagens: “[...] Duas pessoas querendo se beijar [...]” na prancha VII, que mostra a relação com a feminilidade e a figura materna. Por outro lado, essa é a única resposta de movimento (K= 1) dada em todo o teste, demonstrando vitalidade e certa determinação frente às demandas internas e externas, mas denotando agressividade a partir do mecanismo de formação reativa ao Juliano dizer “[...] querendo se beijar [...]”. Seria possível supor que houve choque ao vazio pelo sujeito não ter feito menção ao espaço em branco, o que pode indicar complexo de abandono materno, também tendo em vista a crítica ao objeto, “[...]

Que porra é essa? [...]”, ratificando certa agressividade, além da negação do outro

e da indiferenciação quanto à identificação: “[...] Duas pessoas [...]”.

Na prancha II, que mostra a segunda etapa na elaboração de objeto, o examinando apresentou crítica ao objeto “[...] É uns desenho (sic) muito esquisito

vermelho, trocando de resposta “[...] Não, vou falar onde que tá (sic) a língua [...]”, indicando certa perturbação por causa da cor, representativa de ameaça e/ou excitação, fazendo surgir resposta CF, indicativa de descontrole das emoções e agressividade. Por se referir ao vermelho no inquérito, “[...] O vermelho [...], também pode haver indicador de sentimento de culpa em relação à sexualidade, com dificuldade relacionada à figura materna e a uma identificação pessoal e sexual, exigindo mais de suas condições afetivoemocionais, mobilizando sentimentos de perda e afetos relativos aos primeiros anos de vida.

Na prancha III, que mostra a integração do casal parental e a relação com o humano, o participante mostrou tempo de reação curto (1 segundo), mas não deu resposta de conteúdo humano, além de ter sido mal vista (F-) indicando perturbações em relação às interações com as figuras parentais e dificuldades de identificação e teor sexuais, ou seja, inibição referente à virilidade e, em relação às pessoas, há indício de sentimentos de ódio e raiva reprimidos e dirigidos às mesmas. Uma hipótese é que tenha tido choque, já que as manchas não são contínuas nessa prancha, sendo indicativo de desestruturação e/ou medo dessa, tendo em vista que o sujeito, no inquérito, foi parcializando a resposta, “[...] Um

sapo [...]”, dada na associação livre: “[...] Pareceu aquelas patas do sapo [...] É, as pernas e aqui, um pouco, a cabeça [...]”, caracterizando uma resposta de duplo

conteúdo (A/Ad).

Na prancha VIII, a sociabilidade mais superficial e a relação com o mundo externo parecem estar preservadas, tendo em vista que o adolescente conseguiu dar uma resposta banal e bem vista, apesar de elevar o seu tempo de reação (21 segundos), provavelmente devido aos estímulos pluricromáticos dessa prancha, podendo também indicar certa perturbação em relação a suas emoções e afetos, diante da expressão colocada por Juliano antes de formular uma resposta: “[...]

Sei que porra é essa aqui não [...]”.

Na prancha IX, o examinando deu a única resposta de conteúdo distinto dos conteúdos humano e animal, “[...] Uma árvore [...]”, podendo indicar certa preservação da capacidade de relacionamento profundo e maduro com o outro, tendo também em vista a interpretação da prancha VIII, mas denotando a existência de conflitos, tensões e angústias existenciais que não está conseguindo elaborar e/ou conviver de maneira satisfatória, com controle parcial da afetividade (resposta CF) e certa dificuldade na socialização e identificação do

sujeito, tomando a interpretação da prancha III como referência, já que as figuras parentais são as primeiras que propiciam a possibilidade de socialização e identificação.

Por fim, na prancha X, o participante parece ter demonstrado cansaço, dando apenas uma resposta imprecisa (F+), “[...] Um monte de inseto [...]”, demonstrando dificuldade para projetar, fantasiar e imaginar, isto é, de apresentar uma construção simbólica, denotando aspectos dos estados limites. Entretanto, conseguiu elaborá-la melhor no inquérito: “[...] duas aranha (sic) [...]” (F+ e Ban). Nessa prancha, parece repetir o choque, tendo em vista que Juliano foi parcializando sua resposta: “[...] duas aranha [...] as perna (sic) [...]”. Frente ao exposto, certa perturbação parece existir quanto ao simbolismo familiar, ao desligamento e às tensões atuais, já que o sujeito não elevou o número de respostas nessa prancha, demonstrou-se fatigado, dando uma resposta imprecisa, posteriormente conseguindo elaborá-la de melhor maneira, tendo em vista a banalidade no inquérito.

Em suma, parece existir problemática quanto a identificação com as figuras parentais, apresentando superficialidade no relacionamento com o outro, inibição e ansiedade, o que influencia o modo de ser e agir do sujeito no meio social. Além disso, não é possível falar na operação psíquica de recalcamento da castração, tendo em vista que a personalidade de Juliano está próxima dos funcionamentos limites. Parece existir uma angústia ligada à ausência ou perda de objeto, dessa forma, problemática quanto à permanência das representações desses objetos no interior da psique do sujeito (CHABERT, 1998).

5.2.5.2 Dinâmica psíquica

Em relação à dinâmica psíquica, os impulsos do id parecem ser parcialmente controlados (K:Kan+Kob= 1:0), já que em relação ao controle social (∑C:∑E= 2>0) há indício de perda de controle e agressividade. Além disso, o índice de estabilidade emocional (FC:CF+C= 0<2, sendo duas respostas CF) aponta e reforça essa agressividade, irritabilidade e descontrole das reações emocionais do sujeito.

Quanto ao ego, o percentual de formas (F%= 70%) denota índice de rigidez elevado. Tomando como referência a prancha I, a qual demonstra como o

sujeito se apresenta, há certa perturbação, tendo em vista que Juliano parcializou a resposta dada na associação livre, “[...] Um morcego [...]”, durante o inquérito: “[...] porque parece as asas [...] parece as asas do morcego [...]”, configurando uma resposta de duplo conteúdo (A/Ad).

Nessa perspectiva, o ego se mostra frágil, tendo em vista os valores rebaixados de F+% (57,1%), de G% (20%), de K (1) e de Ban (2). Por outro lado, está integrado, tendo em vista que a única resposta de cinestesia (K) é de boa qualidade, além de haver banalidade na prancha V, “[...] Uma borboleta [...]”, expressando certa adaptação à realidade exterior. Entretanto, parece existir fuga quanto à representação de si mesmo, do eu ideal, ou seja, além da banalidade, o TA foi do tipo D (fuga demasiada ao concreto).

Quanto ao superego, é perceptível certo conflito no que diz respeito à Lei, tendo em vista a prancha IV, que representa o simbolismo paterno e a constituição do superego, pois o sujeito apresentou um tempo muito baixo (7 segundos), além de reiterar a parcialização de sua resposta dada na associação livre, “[...] Um touro [...]”, no inquérito: “[...] Os chifres [...] Tô (sic) vendo só o chifre

[...]”, configurando uma resposta imprecisa (F+) e de duplo conteúdo (A/Ad).

Tomando a proporção ∑C:∑E, é possível supor que Juliano não apresenta controle de seus impulsos e agressividade, tendendo a não se subordinar a leis, estando predisposto à passagem ao ato, o que é reforçado pelo índice de estabilidade emocional (FC:CF+C= 0<2), embora a proporção K:Kan+Kob (1:0) indique certo controle interno, com equilíbrio, ponderação e intuição bem orientada.

Em relação à representação da sexualidade, sua integração e o relacionamento homem-mulher, a partir da prancha VI, é perceptível a ausência de resposta de esfumaçado, o que indica problemática, também tendo em vista que o sujeito parcializou sua resposta dada na associação livre, “[...] Um gato

[...]”, durante o inquérito, “[...] parece um gato [...] Só a cabeça de um gato [...]”,

configurando uma resposta de duplo conteúdo (A/Ad).

Quanto aos mecanismos adaptativos do ego, é possível que o psiquismo de Juliano busque não permitir que a consciência seja invadida por aspectos que provocam mobilização afetiva, tendo em vista que nas pranchas I, III, IV e VI o tempo de reação está diminuído e as respostas dadas na associação livre foram parcializadas no inquérito, como se o sujeito negasse o que viu primeiramente,

não chegando a ser uma recusa completa, apreendendo somente parte do objeto, para depois tentar reelaborar e lidar com os conflitos e/ou ameaças causadas pelos estímulos das pranchas. Dessa maneira, parece evidente a tentativa de proteção da consciência contra afetos mobilizadores de angústia.

É perceptível também o mecanismo da inibição, tendo em vista a fragilidade do ego do examinando ao não conseguir lidar com sua agressividade, tendendo a agir ao invés de passar pela elaboração do pensamento, isto é, o controle formal acaba sendo excedido por uma fantasmática deformante ou pelo excesso emocional, seguido de descargas explosivas e desorganizantes, que dificultam a capacidade de simbolização e sublimação (CHABERT, 1998).

5.2.5.3 Incidência de narcisismo

Em relação ao narcisismo, há alguns indícios, tendo em vista que o examinando: obteve um valor acima da média de F% (70%), embora o seu F+% (57,1%) tenha sido baixo; deu respostas de reflexo ou duplo, “[...] Duas pessoas

querendo se beijar [...]” na prancha VII, “[...] Aqui parece dois cachorros [...]” na

prancha VIII, “[...] duas aranha (sic) [...]” no inquérito da prancha X, apresentando a negação do outro, isto é, indiferenciação; e expressou na maioria do teste qualificativos negativos, tanto na associação livre quanto no inquérito, por exemplo, “[...] Porra, véi (sic) [...]” na prancha I, “[...] Sei lá que porra é essa [...]” na prancha II, “[...] Que porra é essa? [...]” na prancha VII, “[...] Sei que porra é

essa aqui não [...]” na prancha VIII, ratificando o mecanismo da inibição.

Nessa perspectiva, Juliano apresentou modo de defesa do tipo narcísico ao tentar apagar qualquer diferenciação do outro e ao desqualificar o teste e a situação clínica, evidenciando mecanismos de projeção que buscam expulsar representações negativas do próprio sujeito (CHABERT, 1998).

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