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4. REALIZAÇÃO DA PRÁTICA PROFISSIONAL

4.1. O Processo de Ensino Aprendizagem

4.1.7. Perfil de Liderança e Aprendizagem em Grupo: O Poder das

4.1.7.2. Introdução

Por promover experiências desportivas autênticas alicerçadas no trabalho de grupo, o Modelo de Educação Desportiva (MED), é comummente mencionado nos estudos no âmbito das interações sociais. Segundo Vygotsky (2003), estas podem ser educativas na medida em que potencializam condições para a aquisição de conceitos, habilidades e estratégias cognitivas que afetam o desenvolvimento social e a aprendizagem. Neste enquadramento, Cohen (1984) reporta evidências que remetem para perfis de participação díspares no seio de grupos heterogéneos. Por sua vez, Brock et al (2009), ao indagarem a influência do estatuto do aluno nas interações sociais e experiências durante uma época desportiva, destacaram a importância de compreender o papel do estatuto na realização do grupo de trabalho, no reconhecimento dos impactos negativos que daqui podem advir, bem como a necessidade de os prevenir.

Atendendo a este enquadramento, e face ao facto de ao longo do primeiro período do estágio, no âmbito da lecionação das modalidades desportivas coletivas, termos percecionado que as dinâmicas grupais nos vários grupos formados dentro da turma funcionavam de modo muito distinto

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afetando o modo como os alunos aprendiam, assumiu-se como pertinente investigar esta problemática.

Neste sentido, com o objetivo de otimizar o processo de ensino aprendizagem proporcionado aos alunos, definiu-se como objetivo do presente estudo explorar a influência dos perfis de liderança (estatuto académico, de pares (popularidade), motor e de liderança) na aprendizagem no seio dos grupos de trabalho.

Importa ainda referir que o tema do presente estudo foi comum às três estagiárias da Escola Cooperante. Confrontadas com a mesma problemática e guiando-se pela mesma metodologia, cada estagiária conduziu o processo de investigação de forma autónoma na sua turma.

Face à temática em foco, a contextualização teórica reportar-se-á a três grandes temas: Modelo de Educação Desportiva, interações sociais e estatuto do aluno.

Contexto teórico

Modelo de Educação Desportiva

Siedentop (1987) procurou, através do Modelo de Educação Desportiva (MED), recolocar o aluno no centro do processo de ensino-aprendizagem, rompendo com os formatos tradicionais e descontextualizados de ensinar o Desporto em contexto escolar (Siedentop, 1994). Assim, o MED assumiu-se como uma resposta à necessidade de se encontrarem meios mais educativos de abordar o desporto no currículo escolar (Marinho-Araújo, 1995). Desta forma, e através da implementação de ambientes de prática apropriados a experiências desportivas autênticas (Graça & Mesquita, 2007), este modelo visa a formação, no âmbito desportivo, de um indivíduo culto, competente e entusiasta. Culto, na medida em que “conhece e valoriza as tradições e os rituais associados ao desporto e que distingue a boa da má prática desportiva” (Mesquita & Graça, 2011, p. 59). Competente, pelo facto de dominar as habilidades necessárias para um desempenho satisfatório na competição e assumir um comportamento adequado ao nível de prática em que se enquadra. Por fim, entusiasta, já que é motivado pelo desporto e se preocupa em

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promover uma prática desportiva de qualidade, garantindo a sua autenticidade (Siedentop, 1994).

Com o objetivo de defender esta contextualização desportiva na escola, Siedentop (1994) integrou neste modelo curricular seis caraterísticas estruturais do desporto institucionalizado: a época desportiva, a filiação, a competição formal, o registo estatístico, a festividade e os eventos culminantes. Pelo exposto, as unidades didáticas são substituídas por épocas desportivas, de pelo menos 20 aulas (Jones & Ward, 1998), estando implícita a filiação em pequenas equipas que se mantêm coesas durante toda a época desportiva. Espera-se que estas tenham uma identidade própria, marcada pelo nome, símbolo, grito, cor, entre outros aspetos. Na sua organização privilegia-se, não só o equilíbrio competitivo, mas também o desenvolvimento das relações de cooperação e de entreajuda na aprendizagem. Neste sentido, são atribuídas funções específicas a cada elemento da equipa, designadamente a de jornalista, jogador, árbitro, dirigente e treinador (Mesquita & Graça, 2011). Independentemente de existir rotatividade das funções, o papel de capitão/treinador deve ser desempenhado por um aluno reconhecido pelos pares, quer ao nível do desempenho desportivo, quer enquanto líder (Mesquita, 2012).

O MED prevê a implementação de um quadro competitivo formal, “efetivada logo no início da época pela constituição de equipas, através do estabelecimento de mecanismos promotores da igualdade de oportunidades para participar nomeadamente pelo premiar da colaboração na aprendizagem e pelo treino no seio de cada equipa (…) simultaneamente a competição constituiu um elemento de autoavaliação importante e um incentivo para o trabalho de preparação” (Mesquita & Graça, 2011, p. 62). Durante toda a época, evidencia-se o fair play e não se apresenta a vitória como objetivo único.

Com vista à valorização da competição, são registadas e divulgadas as estatísticas individuais e das equipas, os resultados e os comportamentos que, por sua vez, conferem importância ao percurso cumprido.

Pretende-se que cada época seja marcada por um espírito de festividade, findando no evento culminante. Este figura-se como o momento mais favorável para que as conquistas, as performances e os desempenhos

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dos alunos, nos papéis que lhes foram previamente atribuídos, sejam reconhecidos publicamente (Wallhead & O' Sullivan, 2005).

Resumindo, o MED dá a conhecer o elevado protagonismo atribuído aos alunos no processo de ensino-aprendizagem, incentivando-os a tomar decisões e a resolver problemas. Deste modo, os alunos passivos passam a aprendizes ativos.

Interações Sociais

As interações sociais consistem em processos de “mútua construção do sujeito e do ambiente social, um vai-e-vem que modifica o meio e promove, concomitantemente, o desenvolvimento do indivíduo” (Rocha et al., 2009, p. 239). Assim, estas preconizam espaços de construção e de experimentação, onde os sujeitos têm possibilidade de compreender o contexto social em que se inserem e de assumirem uma posição face às situações com quês e deparam, (re)construindo os seus conhecimentos e desenvolvendo o seu pensamento e comportamento. Todavia, as interações sociais que contribuem efetivamente para a construção do saber e que, por este motivo, são consideradas educativas, são aquelas que exigem agregação dos conhecimentos, articulação das ações e superação das contradições (Davis et al., 1989). Ou seja, são aquelas que permitem o diálogo, a cooperação e a troca de informação recíproca, pelo confronto de pontos de vista divergentes, implicando uma divisão de tarefas, em que um assume uma responsabilidade, que congregadas, resultam no alcance de um objetivo comum (Vygotsky, 1991).

Com base neste contexto, a aprendizagem cooperativa, ao potenciar o confronto entre pares e pequenos grupos, é promotora de interações sociais, já que os alunos são levados a “explicar uns aos outros a maneira como resolvem um problema; a explicitar oralmente o seu raciocínio, partilhando-o, e a clarificar as suas ideias para si próprios e para os outros” (Alarcão, 1996, p.76). Em contraponto, Vygotsky (2003) afirma que as atividades realizadas em grupo proporcionam benefícios impossíveis de adquirir em ambientes de aprendizagem individualizada. O mesmo autor explícita que o desenvolvimento do indivíduo, a sua aprendizagem e os processos de pensamento são

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mediados, precisamente, pela interação com outros indivíduos. Esta produz modelos referenciais que sustentam comportamentos e raciocínios, assim como os significados que são atribuídos às coisas e às pessoas.

A heterogeneidade é uma característica intrínseca a qualquer grupo humano e é considerada fundamental ao nível das interações sociais que decorrem na sala de aula. É esta diversidade que potencia a troca de vivências e conhecimento e que, consequentemente, fomenta o desenvolvimento das capacidades cognitivas pelo esforço partilhado, na procura de soluções comuns (Davis et al., 1989).

Estatuto do Aluno

É frequente defender-se que o trabalho de grupo é uma estratégia de ensino que promove/fomenta a aprendizagem; contudo, Cohen (1984) atestou que a participação e o desempenho dos alunos nestas circunstâncias diferem de acordo com o estatuto de cada um dos elementos. Neste contexto, Cohen (1994) define estatuto como um conjunto de atributos socialmente reconhecidos que levam a assumir que o ideal é ter um estatuto elevado. Deste modo, se um indivíduo possui as caraterísticas reconhecidas como superiores, tende a ser associado ao facto de possuir um estatuto elevado. O mesmo autor identificou vários tipos de estatuto. Em primeiro lugar, refere o estatuto académico, considerando-o o mais poderoso, devido ao seu relevo na execução de atividades de natureza cognitiva. Por este motivo, os alunos com um estatuto académico mais elevado são, normalmente, mais participativos e mais interventivos e mais influentes; dominam as interações e auferem de mais oportunidades para liderar (Webb, 1982). Depreende-se, portanto, que a este estatuto estão inerentes as habilidades e/ou competências cognitivas reconhecidas na sala de aula. Em segundo lugar, Cohen (1994) identifica o estatuto social do estudante, referindo que as variáveis que o compõem (o género, a raça e a etnia) influem nos padrões de interação e nas taxas de participação. No entanto, há que referir que a investigação desta autora foi realizada nos E.U.A, ambiência em que se justifica trabalhar temáticas ligadas à raça e à etnia.

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Na Escola Cooperante, local onde decorrerá o presente estudo, as questões raciais e étnicas não se justificam, pelo que este tipo de estatuto não será considerado, sendo compaginado ao estatuto socioeconómico.

Em terceiro lugar, Cohen (1994) define o estatuto de pares, remetendo-o às “diferenças de atratividade ou popularidade” e identificando-o como causador de desigualdades no seio dos grupos de trabalho. Cohen (1998, p. 19) reforça esta perspetiva, afirmando que “students who are popular are generally expected to be competent at a wide range of important tasks. Similarly, students who are social isolated are generally expected to have nothing to contribute to many tasks.”

Em suma, o estatuto do aluno exerce uma grande influência nas interações sociais no seio dos grupos do trabalho e, consequentemente, na produtividade dos mesmos (Cohen, 1994). Deste modo, é visível que as expetativas dos elementos de um grupo de trabalho estão diretamente ligadas aos alunos que usufruem de um estatuto elevado. De acordo com Cohen (1998), estes discentes destacam-se pela qualidade e quantidade de intervenções e as suas sugestões/opiniões tornam-se, frequentemente, as decisões do grupo. Por oposição, os alunos com um estatuto considerado baixo intervêm raramente e as suas opiniões não são, normalmente, reconhecidas pelos outros elementos.