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4. INCENTIVOS FISCAIS EM ESPÉCIE E FIGURAS AFINS

4.8 Isenção, remissão e anistia 152

Como nos institutos anteriores de exoneração tributária (não-incidência e imunidade), isenção tributária, remissão dos débitos tributários e anistia fiscal mantêm entre si uma certa relação de afinidade, porém não se confundem. Embora, aparentemente, possuam objetivo similar, exonerar o sujeito passivo do pagamento da obrigação principal, na verdade, esses três institutos possuem natureza diversa e , no ordenamento jurídico, funções inconfundíveis.

       470

ELALI, André. Tributação e regulação econômica: um exame da tributação como instrumento de regulação econômica na busca da redução das desigualdades regionais. São Paulo: MP, 2007, p. 138.

471

As imunidades, neste ponto de vista, podem ter tratamentos jurídicos diferentes, sujeitando-se a possíveis revisões ou não. “No futuro, portanto, a imunidade concedida às receitas de exportações poderia ser revista, de modo a atender às preocupações nacionais. Todavia, o mesmo não poderá ocorrer com as imunidades dos templos, dos partidos políticos e com os demais casos do texto originário, pois relacionadas à formação da República e da própria Democracia.” Cf. ELALI, André. Tributação e regulação econômica: um exame da tributação como instrumento de regulação econômica na busca da redução das desigualdades regionais. São Paulo: MP, 2007, p. 139.

472

SCHOUERI, Luís Eduardo. Normas tributárias indutoras e intervenção econômica. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 320.

José Souto Maior Borges observa que a conceituação equivocada de isenção como dispensa legal do pagamento de tributo devido induz à confusão entre isenção e remissão. Isso porque a lei que isenta impede que nasça a obrigação tributária, configurando hipótese de não- incidência e não se realizando concretamente o fato gerador da tributação. Contrariamente, a lei de remissão de débito tributário dispensa o pagamento de tributo, mesmo ocorrendo a realização concreta do fato gerador da tributação. Na isenção, não há tributação, enquanto a remissão supõe anterior incidência da regra jurídica de tributação. 473

Remissão, do verbo remitir, significa perdão, indulgência, indulto,474 diferente de remição, do verbo remir, que significa resgate. Aquela se processa no contexto de um vínculo de índole obrigacional tributária, enquanto a anistia diz respeito a liame de natureza sancionatória, podendo desconstituir a antijuridicidade da própria infração.475

Aliomar Baleeiro dividiu as exonerações tributárias em dois grandes grupos, exógenas e endógenas. As exonerações exógenas não alteram a estrutura da norma tributária, não negam a tributalidade da hipótese de incidência, havendo o nascimento da obrigação tributária, que depois se extingue pela ocorrência de causa superveniente a seu nascimento, prevista em lei, como na remissão, na compensação, na transação, na prescrição e na decadência, ou ainda, pressupõem o cumprimento do dever tributário, anulando-lhes os efeitos, como na devolução de tributo pago indevidamente.476

As exonerações endógenas são normas, que atuam na estrutura interna de outra norma, denominadas por esta razão, por Paulo de Barros Carvalho, de normas de estrutura. Contrariamente às normas exógenas, não existe o nascimento sequer da obrigação tributária, tampouco do crédito tributário, como acontece na isenção, em alíquota zero, na redução de base de cálculo ou alíquota, e em deduções diversas autorizadas em lei.477

No tocante à isenção, não nasce o dever de pagar, nem a obrigação nem o direito de crédito da Fazenda Pública. A norma que isenta não é superveniente. Ocorrendo o fato isento, inexiste fato gerador, exclui-se o crédito, que nunca nasceu, nem poderia.478

José Souto Maior Borges observa que, quando a remissão, norma de exoneração exógena, se aplica às infrações e penalidades tributárias, ela se chama de anistia (arts. 180 a

       473

BORGES, José Souto Maior. Teoria geral da isenção tributária. 3 ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 211.

474

Os penalistas designam indulto para o perdão da pena cominada para o crime, enquanto anistia corresponde ao perdão do delito. Cf. CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 501.

475

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 467.

476

BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. 11 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 916.

477

Idem, ibidem, p. 918 e 956.

478

182, CTN), “uma particular causa de exclusão da pena fiscal”,479 embora as penalidades pecuniárias possam ser extintas por remissão. Assim, a anistia é uma subespécie do instituto da remissão, que se aplica, exclusivamente, a infrações e penalidades.

Na linha de raciocínio de Aliomar Baleeiro, na anistia, não se altera nem a estrutura interna da norma tributária nem a estrutura interna da norma sancionatória, daí, sua classificação como norma de exoneração exógena. Ocorre que a norma sancionatória atua com a prática da infração, mas a norma de anistia a anula. 480

A norma que concede anistia exclui o crédito tributário que anteriormente se constituíra. Diferentemente da remissão, a anistia não visa atenuar ou eliminar os efeitos desencadeados pelo dever de pagar tributo, mas extingue os efeitos já nascidos por atuação da norma sancionatória.

Remissão e anistia apresentam outros pontos em comum. As duas figuras encerram em perdão,481 e ambas têm caráter retrospectivo, pois só se aplicam a fatos que se compuseram antes do termo inicial da lei que as introduz, sejam de natureza tributária ou relativos às infrações cometidas.482

Luiz Emygdio F. da Rosa Jr. apresenta os pontos que diferenciam a remissão da anistia: a) a primeira é causa de extinção do crédito tributário, enquanto a segunda é causa de exclusão; b) a remissão pressupõe a existência de lançamento, e a anistia é concedida antes da constituição do crédito tributário; c) remissão compreende tributos e penalidades, e a anistia só se refere à infração à legislação tributária, subsistindo o débito quanto ao valor do tributo e d) a remissão ocorre quando a penalidade já foi aplicada, enquanto que na anistia o Fisco ainda não tem ciência da infração.483

A respeito dos dois últimos itens, no que se correlaciona ao evento lançamento para constituição do crédito tributário, Roque Antônio Carrazza observa que, na anistia, o legislador extingue a punibilidade do sujeito passivo, impedindo a constituição do crédito. Se já houver crédito constituído, o legislador não pode mais dispensá-lo pela anistia,484 mas apenas pela remissão, que engloba dispensa de penalidades e, também, de tributos.485

       479

BORGES, José Souto Maior. Teoria geral da isenção tributária. 3 ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 213.

480

Idem, ibidem, 2001, p. 213.

481

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 501.

482

Idem, ibidem, p. 502.

483

ROSA Júnior, Luiz Emygdio F. da. Manual de direito financeiro e direito tributário. 18 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 658.

484

Em sentido contrário, Cf. AMARO, Luciano. Direito tributário brasileiro. 11 ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

485

CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 21 ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 852.

Observe-se, ainda, que isenção, anistia e remissão só poderão ser concedidas por lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente cada uma das matérias, nos termos do artigo 150, § 6º, da Constituição da República.

Assim, a isenção impede que o tributo nasça, a remissão dispensa o pagamento do tributo devido e das penalidades relativas a infrações com créditos efetivamente constituídos, e a anistia exclui o crédito tributário relativo a penalidades pecuniárias. A lei que isenta é anterior ao nascimento do tributo, enquanto a lei que remite e a que anistia é posterior ao nascimento da penalidade. Ou seja, a remissão atinge o tributo, a anistia não, mantendo-o íntegro.

4.9. Isenção e alíquota zero

Nos impostos de competência da União, como os impostos de exportação e importação, IPI e IOF, o texto constitucional permite que o Poder Executivo possa alterar as alíquotas destes, sem que seja necessária a edição de lei ordinária para tal. É uma exceção ao princípio constitucional da reserva legal (art. 153, § 1º, CR/88). A finalidade extrafiscal dos referidos impostos por motivos de política econômica justifica essa flexibilidade, proporcionando a qualquer tempo o aumento ou a redução de alíquotas.

Em virtude dessa peculiaridade, muitas vezes, costuma-se adotar o sistema de alíquotas zero ou tarifa livre, que corresponde à exoneração completa do pagamento do tributo, equiparando-se, de imediato, em seu efeito, à isenção. Assim, isenção tributária e alíquota zero se confundem, apenas, quanto ao efeito.

Luiz Emygdio F. da Rosa Jr. entende que, se a alíquota é zero, trata-se de hipótese de não-incidência provisória do tributo. Explica que, em virtude da obrigação tributária ser estruturada com base em hipótese de incidência, sujeitos ativo e passivo, base de cálculo e alíquota, no caso da tarifa livre, falta-lhe um dos elementos quantitativos. O caráter de provisoriedade proporciona que, a qualquer momento, a neutralidade possa ser quebrada, dando lugar a uma alíquota superior a zero. Isenção e alíquota zero não se confundiriam, pois, enquanto a isenção afeta todos os elementos da estrutura obrigacional tributária, não havendo constituição do crédito tributário, na alíquota zero, somente ocorre supressão de um dos elementos quantitativos, a alíquota. 486

       486

ROSA Júnior, Luiz Emygdio F. da. Manual de direito financeiro e direito tributário. 18 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 686.

Aliomar Baleeiro entende que a ideia de alíquota zero, representando a existência de tributo, não concilia o conceito legal de tributo do artigo 3º do Código Tributário Nacional. Assim, isenção e alíquota zero seriam a mesma coisa. Embora se posicionando contrário, ele noticia que o STF firmou entendimento no sentido de que a alíquota zero é inconfundível com a isenção, pois pressupõe alíquota positiva. Dessa forma, alíquota zero não é intributabilidade nem atipicidade; ao contrário, ela apenas nulifica o dever, incidindo a norma tributária e surgindo o dever, embora quantitativamente nulo.487

Posteriormente, o mesmo autor se posiciona no sentido de que alíquota zero não pode ter característica de tributo, pois não tem caráter de dever, não é compulsório nem pecuniário. Assim, a caracterização da tarifa livre como incidência tributária seria negar o conceito de tributo do Código Tributário Nacional, concluindo que alíquota zero é o mesmo que isenção, regras de exoneração endógenas.488

José Souto Maior Borges segue o mesmo raciocínio, afirmando que, em caso algum, existe tributação nem dispensa legal do tributo. Isenção e alíquota zero são a mesma coisa que não tributação. E arremata, dizendo que, neste caso, a quantificação matemática é frustrada.489

Acatando um posicionamento ou outro, o que de certo se sabe é que, em ambos os casos, ocorre exoneração do pagamento do tributo ao contribuinte. O que diferencia os dois institutos é que a isenção só pode ser concedida por lei específica (art. 150, § 6º, CR/88), enquanto, no sistema de alíquota zero, as alíquotas podem ser alteradas a qualquer tempo, por motivo de política econômica pelo Poder Executivo.

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