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4. INCENTIVOS FISCAIS EM ESPÉCIE E FIGURAS AFINS

4.5 Isenção tributária definição e natureza jurídica

Os autores nacionais mais tradicionais não têm definido a isenção, modalidade de exclusão do crédito tributário, de forma uniforme. Rubens Gomes de Sousa refere-se à isenção como “favor fiscal concedido por lei, que consiste em dispensar o pagamento do

       440

CATÃO, Marcos André Vinhas. Regime jurídico dos incentivos fiscais. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 98.

441

Idem, ibidem, p. 72.

442

SILVA, Américo Luís Martins da. Introdução ao direito econômico. Rio de Janeiro: Forense, 2002, p. 239- 240.

tributo devido.”443 Ruy Barbosa Nogueira conceitua a isenção como “dispensa de pagamento do tributo devido, feita por disposição expressa em lei e, por isso mesmo, excepcional.” 444

Walter Barbosa Corrêa, com fundamento no CTN, define a isenção fiscal “como fenômeno tributário que impede, por expressa disposição normativa, o surgimento do crédito tributário decorrente de obrigação que tenha por objeto o pagamento do tributo.” 445

Diante da isenção, Luiz Emygdio F. Rosa Jr. explana que, inicialmente, entendia que o fato gerador ocorria, e a relação jurídico-tributária se instaurava, ratificando a existência da obrigação tributária, mas entendia que inexistia o crédito tributário por ausência de lançamento, posição agasalhada pelo Supremo Tribunal Federal anteriormente. Num momento posterior, este reformulou seu entendimento, baseado numa corrente doutrinária mais moderna.

Ele passou a entender que, na isenção, não há incidência e, assim, não se instaura a relação jurídico-tributária, e o tributo não é devido. A lei tributária contém norma impositiva, determinando que, se a situação abstrata prevista vier a acontecer, a relação jurídica nasceria, mas, do outro lado, a lei isencional contém norma que suspende a eficácia da norma tributante. E arremata que “se a lei isencional vier a ser revogada, a lei de incidência readquire sua eficácia.” 446

A conjugação de duas leis que versem sobre o mesmo fato, uma determinando que há relação jurídica, a outra determinando que não há, resultaria na inexistência de correlação entre a hipótese de incidência e o fato gerador, correspondendo a um fato sem relevância para o mundo jurídico.

No mesmo sentido, Ricardo Lobo Torres explica que “com a isenção, o fato abstrato deixa de existir, e assim não pode nascer nenhuma obrigação tributária.” 447 Isso leva a concluir que a lei isencional invade o campo de incidência do fato gerador da obrigação tributária, impedindo que esta surja, correspondendo à não-incidência da lei tributante.

O lusitano Manuel Henrique de Freitas Pereira afirma que a isenção é um benefício em virtude do qual, embora exista o pressuposto previsto na lei como fonte de tributação, por razões extrínsecas, de conveniência política ou econômica, a tributação é afastada, temporária

       443

SOUSA, Rubens Gomes. Compêndio de legislação tributária. São Paulo: Resenha Tributária, 1975, p. 97.

444

NOGUEIRA, Ruy Barbosa . Curso de direito tributário. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 171.

445

CORRÊA, Walter Barbosa. Comentários ao Código Tributário Nacional, vol. 2. Coordenador Ives Gandra da Silva Martins. 3 ed. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 456.

446

ROSA Júnior, Luiz Emygdio F. da. Manual de direito financeiro e direito tributário. 18 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 676.

447

TORRES, Ricardo Lobo. Curso de direito financeiro e tributário. 11 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 304.

ou definitivamente. A isenção tem natureza de fato impeditivo, autônomo da incidência tributária. Porém, segundo o autor, nem todas as isenções podem ser qualificadas como benefícios fiscais; por vezes, usam-se as isenções por razões técnicas, para, por exemplo, evitar uma dupla tributação.448

José Souto Maior Borges leciona que a isenção é uma hipótese de não-incidência qualificada, decorrente de lei ordinária, pois a pessoa ou o objeto isento poderia ser alcançado pela tributação, se excepcionalmente a lei isencional não o tivesse colocado fora do seu campo de incidência. Não é que o fato jurídico sujeito à tributação e concomitantemente sujeito à isenção não exista no mundo jurídico, como querem alguns. Na verdade, a conjugação de duas regras, uma incluindo, a outra excluindo o fato do enquadramento de tributação, transforma o fato gerador em fato isento.449

Como a regra de isenção é de direito excepcional, a norma tributante não incidiria, pois seria um equívoco admitir a existência de obrigação tributária insusceptível de produzir efeito jurídico. Na relação jurídica da isenção, não existe sequer obrigação tributária principal, porque ocorreria uma hipótese de não-incidência tributária legalmente qualificada.

Paulo de Barros Carvalho, procurando fugir das definições que primavam pela negativa, partiu da divisão das normas jurídicas em normas de comportamento ou de conduta e em normas de estrutura, inserindo, nestas últimas, as regras de isenção. Para ele, o preceito da isenção subtrai parcela do campo da abrangência do critério antecedente ou do consequente da norma tributária, paralisando a atuação da regra-matriz de incidência para certos e determinados casos.450 Demonstra assim que a norma de isenção diminui o campo de incidência da norma tributante, mas não a elimina.

Como bem observa Roque Carrazza:

Como quer que seja, os dois conceitos (o de Souto Maior e o de Barros Carvalho) não se excluem; antes, se completam. Apenas captam o fenômeno da isenção tributária por ângulos diversos. Conjugados, permitem uma melhor visualização deste interesse e ainda tão pouco explorado assunto. 451

       448

PEREIRA, Manuel Henrique de Freitas. Fiscalidade. 3 ed. Coimbra: Almedina, 2009, p. 395.

449

BORGES, José Souto Maior. Teoria geral da isenção tributária. 3 ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 155 e 159.

450

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 17 ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 490.

451

CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 21 ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 817.

Sacha Calmon Navarro Coêlho discorda dos conceitos de dispensa legal do tributo devido (Bernardo Ribeiro de Moraes, Amílcar de Castro Falcão, Rubens Gomes de Sousa, José Washington Coelho, Cláudio Martins, Walter Paldes Valério e Fábio Fanucchi). 452

Nesse sentido, concorda com José Souto Maior Borges, quando justifica o equívoco na natureza jurídica do instituto em que se posicionaram os doutrinadores nacionais supracitados, quando se basearam em conceituações similares na doutrina estrangeira.

Em contrapartida, Sacha Calmon Navarro Coêlho discorda de José Souto Maior Borges em sua conceituação de isenção como hipótese de incidência legalmente qualificada. Aquele acrescenta à doutrina deste que a norma tributante é resultante de uma combinação de leis ou artigos de leis existentes no sistema jurídico. As leis que definem os fatos tributáveis “se conjugam com as previsões imunizantes e isencionais para compor uma única hipótese de incidência: a da norma jurídica de tributação.” 453

A visão de Sacha Calmon Navarro Coêlho a respeito do fenômeno da tributação criou uma regra de que a hipótese de incidência da norma jurídica de tributação é o resultado de uma expressão matemática, representada pela existência dos fatos tributáveis subtraídos de fatos imunes e fatos isentos. E por fim, volta a concordar com José Souto Maior Borges, embora não expressamente, quando afirma que é incorreto afirmar que a incidência da norma de tributação precede a incidência da norma de isenção, ou seja, que elas existissem autonomamente, pois tal sucessividade inexiste no plano lógico-jurídico.

Concluem José Souto Maior Borges454 e Sacha Calmon Navarro Coêlho que as incidências das normas jurídicas tributária e isencional ocorrem num mesmo momento, criando uma situação jurídica única, em que uma norma não excluiria a outra, mas apenas empresta à outra uma nova feição. Nesse sentido, bem observa Roque Carrazza que “a lei isentiva confere uma nova fisionomia à norma jurídica tributária, que, assim, deixa de alcançar certos fatos.”455 E arremata que “a lei isentiva e a lei tributante convivem harmonicamente, formando uma única norma tributária (diferente da que existia antes de a isenção ser criada).” 456

       452

COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Teoria geral do tributo e da exoneração tributária. 2 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1999, p. 150 e 151.

453

Idem, ibidem, p. 154.

454

BORGES, José Souto Maior. Teoria geral da isenção tributária. 3 ed. São Paulo: Malheiros, 2001, p. 155.

455

CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 21 ed. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 818.

456

Demonstrada a controvérsia em relação à natureza jurídica da isenção, a permanência ou não da obrigação tributária, o que se pode concluir é que, mesmo íntegra, esta se mostra esvaziada e anulada devido à impossibilidade de se efetuar o lançamento. Mas, uma coisa é certa: na isenção, o tributo não é devido, total ou parcialmente, estando o contribuinte desobrigado de recolhê-lo aos cofres públicos.

A isenção tributária não se confunde com outros institutos exonerativos, como a não- incidência, a imunidade, a não-sujeição, a anistia, a remissão e a alíquota zero, conforme será examinado a seguir.

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