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Em Abril de 1900, Adolf Loos publicou o texto Vom armen reichen Manne (Sobre um pobre homem rico), uma sátira à produção arquitectónica austro-húngara das últimas décadas do séc. x1x. Neste texto, Loos conta a história de um próspero homem de negócios que desejando acolher a arte em sua casa chamou um arquitecto que o pudesse fazer. Com efeito, não procurava transformar a sua casa num museu ou numa galeria de arte, mas numa obra de arte per se. Livre de quaisquer restrições de custo e de programa e contando com um verdadeiro exército de artistas e artesãos, o arquitecto empreendeu uma profunda reforma que incluiu a casa, a mobília, os utensílios domésticos e as roupas dos moradores, desenvolvendo um projecto minucioso no qual tudo estava em perfeita harmonia. Depois da reforma o homem rico ficou contentíssimo.

Havia arte onde quer que ele olhasse. Em todas as coisas e em cada uma delas. Pegava em arte quando pegava na maçaneta da porta, sentava-se em arte quando se sentava numa poltrona, apoiava a sua cabeça em arte quando, cansado, a apoiava nas almofadas, o seu pé afundava-se em arte quando caminhava pelos tapetes.60

Contudo, viver no meio de tanta arte era difícil e exigia sacrifícios. Primeiro, o homem rico foi obrigado, com grande pesar, a desfazer-se de todos os seus pertences, mesmo daqueles de que mais gostava, como o relógio e as fotografias. Em seguida, para que a harmonia da casa não ficasse

comprometida, a posição de cada objecto deveria ser rigorosamente mantida, de modo que não era permitido, nem ao homem rico, nem à sua família, qualquer momento de desatenção.

Não obstante, o homem rico ainda estava contente. Certa vez, porém, depois de ter comemorado o seu aniversário e de ter recebido muitos presentes, o homem rico foi duramente repreendido pelo arquitecto:

60 Adolf Loos, Vom armen reichen Manne, in Adolf Loos. Escritos I, 1897/1909, Madrid: Biblioteca

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Como lhe ocorre deixar-se presentear alguma coisa? Eu não lhe desenhei tudo? Eu não pensei em tudo? O senhor não precisa de mais nada. O senhor está completo.61

Nesse momento, o homem rico percebeu o trágico destino que o assolava. Na medida em que não podia consentir que lhe dessem coisas novas, também não as poderia comprar e isso significava que, tal como a casa, ele estava condenado a existir apenas como obra de arte, ou seja, completo, acabado e alheio às mudanças do tempo e da história.

Loos escrevia num momento de grandes mudanças na cultura arquitectónica. No final do séc. x1x a atenção desviou-se de Inglaterra e Paris para Viena, onde começou a desenvolver-se um panorama arquitectónico bastante

heterogéneo; Otto Wagner, um dos mais importantes pioneiros da arquitectura moderna, ganhou visibilidade internacional quando, em 1896, publicou o seu livro Moderne Architektur (Arquitectura Moderna), no qual promovia uma renovação da arquitectura contemporânea defendendo que o único ponto de partida para o trabalho artístico era a vida moderna. Um ano depois alguns arquitectos, como Josef Hoffmann, Josef Maria Olbrich e Koloman Moser, visando atacar o historicismo até esse tempo dominante, fundaram a Secession. O edifício expositivo no Karlplatz, projectado por Olbrich, teria, durante algumas décadas, um papel central como montra do desenvolvimento da arte austríaca e das formas industriais. A linguagem formal tornou-se mais firme e requintada, desenvolvendo-se um carácter mais artístico e poético. O diálogo estético e social desenvolveu-se com o convite a arquitectos estrangeiros. O casal escocês, Charles Rennie Mackintosh e Margaret MacDonald, que em 1900 estiveram em Viena, influenciaram bastante a arquitectura e as artes vienenses desse período.62

A alegoria de Loos, apresentada no início deste texto, um dos incontornáveis documentos de combate que ele escreveu nas primeiras décadas do séc. xx, é um claro manifesto contra o movimento da Secession e, de forma mais ampla, contra a obra de arte total. De facto, é impossível não associar a figura tirânica do arquitecto que projectou a reforma da casa do homem rico, aos artistas da Secession, como Olbrich, ou ao belga Henry van de Velde, o qual, em 1895, desenhou as roupas que a sua mulher deveria vestir para estar sempre de acordo com as linhas da casa em que moravam.63 Loos acreditava

61 Adolf Loos, Vom armen reichen Manne, in Adolf Loos. Escritos I, 1897/1909, Madrid: Biblioteca

de Arquitectura El Croquis Editorial, 2004, p.247.

62 Hedvig Hedqvist, Rechteckige Sitze - totalitäre Gedanken, in Josef Frank - Eine Moderne der

Unordnung, Viena: Pustet Anton. 2008, p.11/12.

63 Kenneth Frampton, Historia crítica de la arquitectura moderna, Barcelona: Editorial Gustavo

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que a arte se revelava terrivelmente autoritária quando misturada com o mundo doméstico. Isso não quer dizer que condenasse a arte ou o fazer artístico, pelo contrário, ele reconhecia o seu valor e a sua importância, mas repudiava que se intrometesse, tal como na história do homem rico, em todos os domínios da vida humana - entre eles a arquitectura e o mobiliário.

Por esse motivo os arquitectos da Secession eram alvo constante das críticas de Loos. Ainda que ele e os secessionistas tivessem compartilhado a revolta contra os estilos históricos, que no final do séc. x1x tinham escondido a modernidade dos edifícios da Ringstraße de Viena sob fachadas que imitavam os edifícios antigos, os arquitectos da Secession continuavam a empregar ornamentos e enfeites artisticamente concebidos que visavam revestir a utilidade dos objetos e da construção com um estilo que consideravam moderno, porque era novo.64

Seguindo um caminho distinto, Loos procurou simplificar o estilo da arquitectura, eliminando qualquer elemento estranho à sua constituição, como a decoração. Para ele, a modernidade era caracterizada, entre outros aspectos, pela definição clara dos domínios de ação de cada disciplina, no caso, da arte e da arquitectura.

Esta concepção de modernidade, formulada por Loos no texto Vom armen reichen Manne (Sobre um pobre homem rico), foi reafirmada, dez anos mais tarde, no seu ensaio Architektur (Arquitectura), no qual explica que enquanto a obra de arte responde somente ao artista, é revolucionária e nos tira da nossa comodidade, a casa responde a todos, é conservadora e deve oferecer conforto.

Josef Frank partilhava estas opiniões com Adolf Loos; abordou explicitamente estes mesmos assuntos nos seus textos, sendo que também ele era da opinião que a forma e o seu conteúdo pouco têm a ver uma com a outra,65 referindo-se

à separação da arte e da arquitectura, aludindo à separação da arquitectura e do mobiliário. Para ele isto significava a liberdade de desenvolvimento pessoal dos seus habitantes, encontrando-se esta ideia em todo o seu trabalho.

Como Loos, também Frank se via como um representante do movimento moderno e também ele, anos mais tarde, se tornou cada vez mais crítico do modo como a arquitectura de desenvolveu.

O final dos anos vinte e o início dos anos trinta marcaram o período de maior prestígio e influência de Josef Frank. Apesar de ter realizado apenas 64 Kenneth Frampton, Historia crítica de la arquitectura moderna, Barcelona: Editorial Gustavo

Gili, 1981, p.91.

65 Josef Frank, Fassade und Interieur, in Josef Frank. Schriften - Band 1, Viena: Metroverlag, 2012,

61 alguns projectos até 1927, o seu trabalho alcançou reconhecimento no contexto

Europeu. Fotografias do seu trabalho, frequentemente acompanhadas por textos seus, foram publicadas na maior parte das mais importantes revistas de língua alemã sobre arquitectura. A maior confirmação deste reconhecimento internacional surgiu quando foi convidado para participar na exposição do Deutsches Werkbund, que se realizou em Estugarda no Verão de 1927: a Weissenhofsiedlung. Para esta exposição, na qual participaram, entre outros, Le Corbusier, Walter Gropius e Mies van der Rohe, Frank não foi convidado sem controvérsia. O seu nome não aparecia na proposta feita por Mies e Hugo Häring, os quais o achavam demasiado conservador.66 Não obstante, a

organização considerava a participação de um arquitecto vienense importante, pelo que Frank foi finalmente incluído como substituto de Adolf Loos, uma vez que a hostilidade que este demonstrava com a organização fez com que Mies e muitos outros membros do Werkbund se opusessem ao seu convite; mais ainda que ao de Frank. A hostilidade de Loos, começou em 1908, quando comentou: Os objectivos são bons. Porém, precisamente o Deutsches Werkbund nunca os conseguirá alcançar. (…) Os membros desta federação são pessoas que tentam substituir a nossa cultura contemporânea por uma outra. Porque é que eles fazem isto eu não sei, mas sei que não vão ser bem sucedidos. (…) As pessoas da federação confundem causa e efeito.67

Anos mais tarde, Frank utilizaria as mesmas palavras que Loos para criticar os funcionalistas, dizendo também ele que infelizmente, (…) causa e efeito são frequentemente confundidos.68

Na Weissenhofsiedlung, Frank construiu duas casas geminadas que, apesar de terem sido construídas com sistemas construtivos e tecnologia inovadores, não conseguiram escapar às críticas negativas da ala mais radical do movimento moderno. Nos seus interiores sobressaía, como esperado pelos seus colegas, um conservadorismo (aparente). Ao contrário de outros arquitectos, Frank diferenciava nitidamente o tratamento do desenho do exterior e do interior, argumentando no seu texto Fassade und Interieur (Fachada e Interior): As necessidades da fachada e do interior são totalmente diferentes. (…) O entendimento do exterior e do interior como uma unidade total é uma visão que pertence ao passado.69

Segundo Frank, o habitante deveria poder descansar do trabalho na sua casa; a 66 Cristopher Long, Josef Frank Life and Work, Chicago: University of Chicago Press, 2001, p.104. 67 Adolf Loos, Kulturentartung, in Adolf Loos. Escritos I, 1897/1909, Madrid: Biblioteca de

Arquitectura El Croquis Editorial, 2004, p.342.

68 Josef Frank, Fassade und Interieur, in Josef Frank. Schriften - Band 1, Viena: Metroverlag, 2012,

p.346.

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utilização de mobiliário em metal lembraria às pessoas, de maneira excessiva, o local de trabalho - as fábricas - e, uma vez que a casa representa, para ele, o contrário daquilo que é o local de trabalho, este mobiliário em metal não consegue corresponder ao desejo do habitante de se poder regenerar: O Homem moderno, cujo trabalho se está a tornar cada vez mais árduo e cansativo, precisa de uma casa muito mais acolhedora e confortável que aquelas de outros tempo, para que possa descansar, de maneira concentrada, num curto espaço de tempo. A habitação é, por esta razão, o oposto do local de trabalho.70

Desta forma, Frank assumiu uma posição absolutamente oposta à de muitos dos seus colegas, no que diz respeito à utilização de mobiliário, apresentando, nos seus interiores, mobiliário da sua empresa Haus und Garten. Na zona de refeições, agrupou quatro cadeiras, com um desenho muito leve, com uma mesa com os cantos arredondados. Encostado à parede estava uma mesa de madeira. Se na cozinha o mobiliário e o desenho ainda eram modestos, na sala de estar e nos quartos, utilizou mobiliário volumoso e revestido com tecidos. O sofá e a cama, de um dos quartos, por exemplo, foram revestido com um tecido que acabava em folhos. No chão colocou tapetes persas ornamentados. Estas escolhas tornaram o aspecto dos seus interiores muito mais conservador e muito mais tradicional que o aspecto dos interiores do resto das casas expostas na Weissenhofsiedlung, acabando por ser a razão das críticas negativas que as suas casas receberam.

70 Josef Frank, Die moderne Einrichtung des Wohnhauses, in Josef Frank. Schriften - Band 1, Viena:

Metroverlag, 2012, p. 340. 43 Josef Frank, Weissenhofsiedlung, Estugarda, 1927. Vista da fachada principal. 44 Josef Frank, Weissenhofsiedlung, Estugarda, 1927. Quarto da senhora. 45 Josef Frank, Weissenhofsiedlung, Estugarda, 1927. Cozinha.

63 Alguns críticos apontavam exactamente isso, dizendo que enquanto Mies

e outros arquitectos funcionalistas conseguiram criar casas com a máxima neutralidade e austeridade, os interiores de Frank eram femininos, obstrutivos e demasiado burgueses.71 Outros diziam que ao andar pelas casas de Frank

se sentiam acariciados por almofadas e centenas de artigos do arrebique (Gschnas) vienense.72 No entanto, por entre todas as críticas, aquela que mais

afectou Frank foi a de que os seus interiores representavam o seu bordel.73

Foi com um artigo integrado numa das publicações oficiais da exposição que respondeu às críticas. Evidentemente, o título deste artigo, Der Gschnas fürs G’mut und der Gschnas als Problem (O arrebique para a alma e o arrebique como problema), era uma provocação clara às críticas que lhe haviam sido feitas. Às acusações que os seus interiores eram femininos, burgueses e fora de moda, respondeu que o estilo funcionalista da esquerda radical não correspondia às necessidade psicológicas da maioria das pessoas, pois, como explicou, todas as pessoas têm uma certa necessidade por sentimentalidade, à qual temos de responder.74

O arrebique, longe de ser desnecessário ou de estar fora de moda, continuou 71 Theo van Doesburg, Die Wohnung, in Het Bouwbedrijf 4, Novembro de 1927, p.556-59; in Josef

Frank Life and Work, Chicago: University of Chicago Press, 2001, p.104.

72 Hans Bernoulli, Die Wohnungsausstellung Stuttgart 1927, in Das Werk 14, n.9, 1927, p.265; in

Josef Frank Life and Work, Chicago: University of Chicago Press, 2001, p.104.

73 Carta de Paul Meller para J.J.P. Oud, 31 de Agosto de 1927, Arquivo Oud, Roterdão; in Josef

Frank Life and Work, Chicago: University of Chicago Press, 2001, p.104

74 Josef Frank, Der Gschnas fürs G’mut und der Gschnas als Problem, in Josef Frank. Schriften -

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ele, forneceu a sensação necessária de conforto e bem estar. No passado, explicou, os artesãos construíam as suas peças uma por uma, produzindo múltiplas versões de um objecto específico, o que servia as necessidades variadas das pessoas; a introdução da produção industrial levou à

substituição da diversidade pela estandardização. O desejo por sachlichkeit (objectividade) não só enfraqueceu a importância de muitos objectos tradicionais de uso diário, desenhando-os em conformidade com o novo standard racional, como também criou muitos objectos que não eram nem confortáveis nem práticos (tanto num sentido psicológico como fisiológico). Para aqueles que reivindicavam que a máquina exigia uma abordagem completamente nova de desenho, Frank ripostava, dizendo:

A máquina não é nada mais que uma ferramenta que consegue produzir qualquer coisa. Contudo, mais e mais, as formas têm sido sacrificadas pelas máquinas, as quais se tornaram no novo Deus.75

Neste artigo, realçou ainda que enquanto a industrialização trouxe inúmeras mudanças, muitas das formas antigas mantiveram a sua utilidade e que a vida moderna era rica o suficiente para assimilar muitas das coisas dos tempos antigos pois podemos utilizar tudo o que ainda é utilizável.76

Assim, Josef Frank acreditava que não havia necessidade de alguém decidir o que ainda é funcional, explicando que tudo o que se torna inútil elimina- -se por si só. Hoje em dia não se pode conduzir a carruagem de Aquiles como 75 Josef Frank, Der Gschnas fürs G’mut und der Gschnas als Problem, in Josef Frank. Schriften -

Band 1, Viena: Metroverlag, 2012, p.296.

76 Ibidem, p.298. 46 Josef Frank,

Weissenhofsiedlung, Estugarda, 1927. Sala de estar.

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também não se pode conduzir a carruagem de Napoleão, mas pode-se sentar nas suas poltronas decoradas e, acrescenta ele, quem é mais moderno no seu pensamento: aquele que aceita estas coisas como elas são, ou aquele que perpetua aquilo que é transitório em si, modernizando-o?77

Apesar das reacções críticas às suas casas em Estugarda, Josef Frank

recebeu, no Outono do mesmo ano, o convite para se juntar ao recém formado Congrés Internationaux d’Architecture Moderne (CIAM).

O primeiro encontro realizou-se nos finais de Junho de 1928, em La Sarraz, na Suíça. Mais uma vez, Frank foi o único representante austríaco; entre os outros participantes estavam Siegfried Gideon, Hendrik Berlage, Ernst May, Hannes Meyer, Gerrit Rietveld e, mais uma vez, Le Corbusier.78

Frank manteve-se silencioso durante quase todo o congresso. Durante a segunda sessão, sobre novos métodos construtivos, falou. Exaltando as possibilidades das habitações estandardizadas, mencionou, em particular, a generalizada utilização de estruturas em madeira nos Estados Unidos da América:

Ninguém nega a necessidade de estandardização; ao longo do tempo, arquitectos utilizaram sempre componentes estandardizados, é apenas senso comum. A questão é como e em que medida os arquitectos devem utilizar esta tecnologia.79

Josef Frank concordou com os funcionalistas mais radicais sobre a

importância de explorar novas tecnologias construtivas, porém continuava preocupado com o modo como se deveria relacionar a estandardização com as considerações estéticas.

Quando o congresso chegou ao terceiro dia, Frank encontrou-se cada vez mais isolado. Por um lado, estava preocupado com a crescente insistência dos radicais, maioritariamente alemães, sobre como equacionar a relação entre arquitectura e tecnologia, por outro, também estava preocupado com aquilo que entendia como a evolução de um novo formalismo: a tendência para ver o movimento moderno como um estilo. Começou, então, a ter dúvidas sobre se deveria, ou não, assinar a declaração final. Por fim decidiu, como todos os restantes membros, assinar, contudo, apenas depois da persuasão por parte de Gideon, que também lhe pediu para continuar o trabalho dos CIAM na Áustria e que participasse nos eventos futuros.80

Apesar do aspecto de cooperação, que parecia existir para quem visse o 77 Josef Frank, Der Gschnas fürs G’mut und der Gschnas als Problem, in Josef Frank. Schriften -

Band 1, Viena: Metroverlag, 2012, p.298.

78 Christopher Long, Josef Frank Life and Work, Chicago: University of Chicago Press, 2001, p.110 79 Ibidem, p.112.

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congresso do exterior, Frank, como um número de outros delegados, deixaram La Sarraz com uma sensação de profunda insatisfação. Rapidamente,

começou a ter dúvidas sobre a participação nos CIAM e numa carta escrita a Gideon revelou que considerou o congresso um falhanço:

Sou da opinião, partilhada por muitos outros (membros), que a nossa atenção estava demasiado dividida e que estamos ainda demasiado afastados da nossa tarefa real, nomeadamente, (examinar) problemas arquitectónicos.81

Josef Frank aludia ainda a outros problemas, incluindo a divisão crescente dentro dos CIAM, a qual atribuía às diferenças geracionais e nacionais dentro do grupo:

Aquilo que temos são na realidade duas gerações que nunca serão capazes de pensar da mesma forma. Além disso, existe aquilo que não podemos expressar de maneira diferente, a visão alemã e não-alemã, uma que se fundamenta, aparentemente, numa base racional, a outra que age dentro de uma fundação artística, as quais, para mim, parecem estar cada vez mais afastadas.82

Apesar das crescentes reservas, Frank ainda participou no congresso em Frankfurt, em Outubro, o qual se dedicou a examinar a questão da habitação mínima (die Wohnung für das Exzistenzminimum). Porém, voltou a escrever a Gideon, desta vez anunciando a sua demissão dos CIAM. Os motivos, escreveu ele, são duplos… o clima de intriga no congresso, mas também… os seus resultados finais deploráveis.83 Mencionando a superficialidade dos

discursos por parte de Walter Gropius e Hans Schmidt, também condenou a falta de seriedade nas discussões:

Eu considero a atitude geral do congresso completamente desonesta. Se é suposto estarmos a discutir arquitectura moderna… é compreensível que surgirão diferentes opiniões.84

Depois da saída dos CIAM a sua arquitectura cai um pouco em esquecimento. Afastou-se da corrente principal do movimento moderno, focando a sua

crítica, especialmente, na Alemanha funcionalista e na Bauhaus, a qual, como a Secession, defendia um desenho que proponha conformidade entre o edifício, o interior, o mobiliário e os utensílios domésticos.

Josef Frank caracterizava o trabalho da Bauhaus como absorvente da vida das pessoas.85 É necessário, no entanto, esclarecer que esta crítica se direcionava

81 Marlene Ott, Josef Frank (1885-1967) - Möbel und Raumgestaltung (texto policopiado), Viena:

[s.n.], 2009. Tese de doutoramento, p.95.

82 Ibidem, p.96. 83 Ibidem. 84 Ibidem.

85 Josef Frank, Architektur als Symbol, in Josef Frank. Schriften - Band 2, Viena: Metroverlag, 2012,

67 principalmente para o trabalho e ideologia da Bauhaus sob a liderança

de Gropius e sobretudo para o interior das casas - a sua organização e o desenho do mobiliário. É neste sentido que também dirige a sua crítica aos arquitectos funcionalistas que, segundo ele, transferiram, forçosamente, o sistema sachlich (objectivo) do desenho exterior, para o desenho dos espaços interiores e o seu mobiliário, de maneira a conseguir um todo harmonioso. Frank equiparava o sentido moderno com a total liberdade e a total isenção de quaisquer restrições obsessivas, rejeitando dessa forma, categoricamente, qualquer concepção projectual que visasse um desenho unificador do espaço doméstico. Considerava a procura por um projecto homogéneo, feita pelos arquitectos alemães, tão profundamente desatualizada que a comparava com os estilos artísticos antigos. Foi neste sentido que, em 1934, no seu texto Raum und Einrichtung (Compartimento e mobiliário), escreveu:

A procura, que voltou a estar na moda, de forçar em todos os objectos uma forma geométrica cúbica, não é moderna, uma vez que apenas pretende alcançar novamente uma unidade entre a casa e o seu mobiliário, cujos

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