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Um novo estilo humano2.4.

No mesmo ano da conclusão da Casa Beer (1930), Josef Frank publicou o seu livro Architektur als Symbol: Elemente deutschen neuen Bauens (Arquitectura como símbolo: elementos da nova arquitectura alemã), onde repete e desenvolve muitas das ideias que explorou no seu discurso Was ist modern? (O que é moderno?), realizado no Deutsches Werkbund, no mesmo ano. Este livro, dividido em vários capítulos, constitui um ensaio extenso sobre os problemas contemporâneos da arquitectura. No capítulo Unrast (Inquietação), Frank começa a explorar a relação do homem com o seu tempo: O europeu que pensa cientificamente tem um objectivo em mente: o

conhecimento e a sua exploração. Isto coloca-o num estado de permanente inquietação, porque a sua tarefa não tem fim. Qualquer um tem sempre a ambição de acabar aquilo que começou, pelo menos a pequena parte que lhe coube, porque a sua vida não é infinita e o conhecimento e a ciência nem sempre têm os mesmo objectivos. Ele não consegue deixar a finalização do trabalho que começou nas mãos de outra pessoa, porque se tornaria numa coisa completamente diferente, pois todas as gerações desprezam aquilo que as outras conseguiram. Elas fazem isto do ponto de vista racional e com razão, uma vez que (por exemplo) as armas da Guerra Mundial serão em breve inúteis.138

Josef Frank explica que o homem está sujeito à constante mudança da tecnologia, sendo constantemente provocado a agir. A inquietação permanente que assombra o Homem e da qual ele não consegue fugir é provocada e influenciada pelos avanços das ciências naturais sobre o conhecimento do próprio Homem. Este termo traduz o motor impulsionador causado pela ansiedade de não conseguir ser capaz de tornar o seu ponto de vista compreensível aos outros, ou então, com o desenrolar dos avanços, de perdê-lo por completo. A incerteza que diagnostica nos seus contemporâneos 138 Josef Frank, Architektur als Symbol, in Josef Frank. Schriften - Band 2, Viena: Metroverlag,

93 significa que o Homem tem problemas de orientação, porque apenas uma

base firme consegue proporcionar uma posição sólida, necessária para que consiga construir uma posição sustentada a partir da qual pode desenvolver o seu trabalho e, num nível pessoal, desenvolver-se a si próprio.

No final deste capítulo, Josef Frank explica que a consciência de viver numa época que procura mudar constantemente, levou-nos toda a sensação de conforto e sossego.139 (...) Sossego significa (...) não estar de momento ocupado

com nada mais que aquilo que roda em torno do nosso bem estar; esta tarefa seria a consequência dos objectivos dos admiradores das máquinas, porém, temos muito tempo e pouco sossego. Portanto, sossego significa realizar uma actividade sem qualquer objectivo produtivo pois somente uma tarefa sem qualquer produtividade, ou seja, uma tarefa independente do ganho ou da especulação, nos pode trazer de volta o sossego que separa o mundo do trabalho do mundo real.140

O sossego ao qual Frank se refere, pode ser interpretado tanto no patamar do viver como no patamar existencial. A forma como o Homem interage com o seu entorno, pode ser descrito como um comportamento que engloba tanto as actividades diárias como também a sua situação no mundo, sendo que o Homem procura um lugar no qual pode descansar da inquietação que permanentemente sente. Para Josef Frank, o lugar que permite isto é a habitação. A casa serve ao Homem como o lugar no qual pode estar em sossego, no qual se pode estabelecer e encontrar a base firme a partir da qual se pode orientar. Este comportamento, explica ele, não se relaciona directamente com uma tarefa específica, sendo que se compreende como uma tarefa sem um propósito produtivo:

O propósito de uma casa não pode ser explicado por palavras. Não é para cozinhar, comer, trabalhar nem dormir, mas para viver.141

A crítica que Frank elabora à corrente principal do movimento moderno (como igualmente aos preconceitos da habitação burguesa do séc. x1x), também se apoia nesta ideia. Segundo ele, a habitação contemporânea não incorporava em si um sentido mais profundo do habitar, observando que ela era desenhada, correntemente, apenas como um lugar onde se podiam realizar tarefas diárias.

A casa existe apenas para as pessoas, para que elas possam viver; este termo é um termo vago, que pode significar coisas diferentes para pessoas diferente, por isso é que também temos tantas variações. Este “viver” pode, como acontece 139 Josef Frank, Architektur als Symbol, in Josef Frank. Schriften - Band 2, Viena: Metroverlag,

2012, p.148.

140 Ibidem, p.158. 141 Ibidem, p.146.

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tão frequentemente nos dias de hoje, para se chegar a uma forma de habitar científica, repartir-se nas diferentes actividades primárias do homem; elas são o comer, dormir, trabalhar e descansar; a casa moderna, como nos é dito tantas vezes, tem que responder a todas estas tarefas e de as realizar da melhor maneira possível. Porém, aquilo a que quero chamar de “viver”, vai muito além do cumprimento destas necessidades; é algo que dificilmente podemos definir e é aquilo que dá sentido e nos liberta de realizar estas tarefas de forma burocrática. Um conjunto de compartimentos que se adaptam bem a estas necessidades não criam por si só uma casa boa, bonita e confortável. Uma pessoa que pode realizar todas estas tarefas de forma satisfatória não se torna necessariamente mais feliz, mesmo que ela não exija mais que isso.142

Assim sendo, o entendimento do habitar de Josef Frank desdobra-se em

diversos patamares. Por um lado, compreende a importância das tarefas diárias do Homem, por outro não concorda que estas tarefas devam ser analisadas independentemente, isto é, de maneira a que no projecto apenas se cumpram as exigências de cada uma delas. Frank discorda da forma analítica e funcionalista de pensar que reduz o desenho da arquitectura exclusivamente ao cumprimento destas tarefas. Ele compreende o habitar em relação com a percepção e a experiência física do Homem, esperando que seja mais abrangente e completo. Para Josef Frank, o habitar inclui aquilo que dá sentido à vida, algo que não pode ser definido - uma tarefa que (na verdade) ninguém pode explicar.143

A casa, como o lugar para o viver, torna-se na tarefa principal do seu tempo e, como defende, é com ela que o Homem mais se relaciona numa época em que a escala absoluta começa a deixar de fazer sentido:

Desde que existem dirigíveis as torres tornaram-se mais pequenas, a experiência com a escala, válida até agora, foi ultrapassada. Já não precisamos mais do tamanho absoluto e visto que reconhecemos que a medida de todas as coisas deve ser o Homem, voltamos a procurar a dimensão dele. Assim, a habitação torna-se no edifício mais essencial e menos funcional do nosso tempo. A primeira característica já foi muitas vezes reconhecida, mas a classificação da habitação como “edifício funcional” não permitiu reconhecer a segunda característica. A habitação é a casa que existe, não para servir qualquer coisa distante, construir cidades ou ser a fonte de rendimentos para alguém, mas para ter uma finalidade própria, devendo, pela sua existência, fazer as pessoas felizes e contribuir, com todas as suas partes, para o seu prazer.144

142 Josef Frank, Architektur als Symbol, in Josef Frank. Schriften - Band 2, Viena: Metroverlag, 2012,

p.160

143 Ibidem, p.158.

144 Josef Frank, Architektur als Symbol, in Josef Frank. Schriften - Band 2, Viena: Metroverlag, 2012,

95 A habitação é o lugar genuíno da escala humana, a partir do qual o Homem

pode considerar a sua posição no mundo e em conformidade se pode instalar. O sentido mais profundo da habitação é permitir que isto aconteça; ela deve permitir que os seus habitantes encontrem equilíbrio para além das tarefas essenciais que necessitam de realizar. A casa não deve nem distrair nem concentrar, mas permitir todas as expressões da vida. Ela deve estar aberta a novas situações para as quais, como não são previsíveis, não existe qualquer tipo de preparação possível. Não pode estar orientada para um dado número de tarefas rígidas, devendo por isso ser inútil. Desse modo, a casa deve ser confortável, deve atrair-nos e ser um lugar ao qual se está acostumado e no qual decorre a vida quotidiana; um lugar pessoal para uma vida plena e visto que estas exigências devem durar uma vida toda, em todos os humores e em todas as situações para as quais não há preparação, ela é o epítome de todos os elementos construídos que condicionam a nossa vida real.145

Cozinhar, comer, dormir e trabalhar são, para Josef Frank, termos coloquiais que o arquitecto utiliza em relação ao habitar, sendo entre estes termos que se situa aquilo a que chamamos Arquitectura.146 Estes termos são um

reportório que pode ser transposto na realização concreta da casa; por

exemplo, a ideia de dormir transporta-nos, geralmente, para a ideia do quarto de dormir, com as dimensões consideradas necessárias. Contudo, estes termos não representam o habitar na sua plenitude. Frank coloca o habitar separadamente, ao seu lado, pois segundo ele a arquitectura situa-se entre os diferentes patamares das tarefas diárias e do viver, tanto no sentido de retiro como no sentido de lugar no qual o habitante se pode ocupar com as suas preocupações existenciais. Desta forma, a arquitectura deve estimular as pessoas, facilitando e tornando possível que elas encontrem o sentido da sua existência e o seu lugar no mundo.

Josef Frank considera a arquitectura segundo os efeitos que esta tem sobre o Homem e as reacções deste em relação à mesma, desenvolvendo o desenho dos seus projecto baseado nestas observações. Ele reconhece as interacções entre o comportamento do habitante e a forma construída; o Homem é

confrontado com os edifícios e reage em conformidade. Este comportamento é incorporado em situações específicas, isto significa que o comportamento do Homem se enquadra sempre num contexto tempo-espacial. Porém, reconhece que o construído é essencialmente estático e não dinâmico; a arquitectura é duradoura e os edifícios continuam a existir muito depois da duração da vida 145 Josef Frank, Architektur als Symbol, in Josef Frank. Schriften - Band 2, Viena: Metroverlag,

2012, p.168.

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dos seus habitante.

O Homem está exposto a estímulos que influenciam o seu comportamento, ele desenvolve-se e modifica-se continuamente, recolhendo informação e ganhando conhecimento. Ele habitua-se ao seu entorno e cria uma estreita relação com alguns objectos que o envolvem. Consciente deste

comportamento Josef Frank via como objectivo da arquitectura permitir que a personalidade do habitante se possa desenvolver livremente.147 Este princípio

é essencial na concepção arquitectónica e filosófica subjacente ao seu trabalho. Dessa maneira, a par da diversidade e imprevisibilidade da vida, ele encontra outra dinâmica:

Visto que ao longo de uma vida se acumulam muitas experiências e objectos, a casa tem que permitir a oportunidade de receber todas estas coisas.148

O Homem e o seu desenvolvimento encontram-se no centro do seu trabalho. Ele reconhece a personalidade do Homem e a vontade, que daí nasce, de querer configurar o ambiente no qual habita. Frank permite aos seus habitantes que se desenvolvam livremente, modificando a organização do espaço das suas casas.

Os seus textos dão uma indicação daquilo que deve ser o desenho da casa: ela deve servir funcionalmente como também enriquecer e envolver o

habitante de maneira a que possa viver além das suas necessidades básicas, podendo dessa forma desfrutar de toda a casa, independentemente do seu humor ou situação.

A casa moderna deve proporcionar aos seus habitantes o máximo de liberdade, isto é, a quantia necessária de liberdade de modo a que não seja forçado, através de compartimentos, a uma maneira de habitar rígida. (...) A casa não vai criar através da sua forma nenhuma sociedade nova, mas, certamente, pode ajudar as pessoas a pensar de maneira mais livre. Se entender como as convenções e os preconceitos podem ser quebrados e se a sua abolição lhe puder trazer vantagens, o Homem poderá ser influenciado, de tal modo, que poderá considerar desejável que isso aconteça noutras áreas. É por isso que precisamos de perder a crença na necessidade dos símbolos rígidos utilizados pelos arquitectos históricos, para de seguida implantarmos novamente e imediatamente uma nova ordem.149

Com sua arquitectura Josef Frank pretende que os seus habitantes possam 147 Josef Frank, Das Haus als Weg und Platz, in Josef Frank. Schriften - Band 2, Viena: Metroverlag,

2012, p.206.

148 Josef Frank, Die moderne Einrichtung des Wohnhauses, in Josef Frank. Schriften - Band 1,

Viena: Metroverlag, 2012, p.340.

149 Josef Frank, How to Plan a House, in Möbel, Geräte und Theoretisches, Viena: Löcker/HAK,

97 viver a habitação dentro de uma sensação de liberdade. Esta liberdade

relaciona-se com a individualidade de cada pessoa, com a sua maneira de viver, as suas necessidades, a sua personalidade, o seu entorno e as suas preferências. Para além disso, com a afirmação que a casa pode incentivar o pensamento livre, Frank também estabelece uma relação directa entre a arquitectura e o pensamento do Homem.

A arquitectura moderna que Josef Frank representa promove o pensamento livre. Do seu ponto de vista, o pensamento deveria ser libertado do

pensamento irrefletido do passado que ainda prevalecia no período do pré-guerra. Frank articula o pensamento do Homem com o contexto no qual vive, de tal forma que acredita que num contexto moderno mais facilmente o habitante se consegue ocupar com os problemas da época moderna, para que possa encontrar um pensamento mais moderno e consequentemente libertar--

-se dos preconceitos e constrangimentos do pensamento tradicional. Assim, o termo liberdade tem múltiplos significados. A liberdade moral também é relevante. Com isto é referida a liberdade do Homem poder decidir supostos morais, ou seja, a liberdade de decisão para fazer aquilo que é supostamente correcto. A pessoa age livremente quando a causa das suas próprias acções se encontra nela própria.150 Liberdade não significa libertar---

-se de todas as normativas, mas sim tomar a liberdade (e poder tomá-la) para julgar e decidir sobre o que fazer.

Muitos dos seus contemporâneos ainda estavam presos a uma habitabilidade que pertencia ao período pré-guerra, demasiado burguês. Para estas pessoas - os seus potenciais clientes - a compreensão de liberdade moral aplicada por Frank significava abrirem-se ao que se tinha tornado fundamental - às melhorias em muitos aspectos da habitação - e de deixar para trás os preconceitos e constrangimentos do passado.

Aquilo que lhe interessa é libertar as pessoas das suas casas, do fardo criado pelo habitar tradicional e libertá-las também dos seus pontos de vista que entretanto haviam perdido o seu significado. Isto diz respeito não só à organização da habitação como também, de maneira geral, às formas arquitectónicas e aos objectos nelas contidos. Nesse sentido, o objectivo de Josef Frank é permitir às pessoas uma habitabilidade livre, sem influências dos despojos do passado, para que possam viver e pensar livremente, encontrando-se a si mesmas partindo de um ponto de vista pessoal sobre o mundo. Este pensamento livre deve idealmente ser possibilitado e encorajado por uma habitação que acomoda toda a vitalidade da vida e que não restringe 150 Josef Frank, How to Plan a House, in Möbel, Geräte und Theoretisches, Viena: Löcker/HAK,

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os seus habitantes. Nesse sentido, entende como necessário a revogação do desenho dos espaços “tipo caixa”, pois, como explica, as salas rectangulares são as menos apropriadas para se viver nelas; são muito úteis para arrumar mobiliário, mas para mais nada servem.151

Frank aborda a ortogonalidade da arquitectura moderna no seu texto How to plan a house (Como desenhar uma casa). Este texto, uma das principais fontes sobre a sua arquitectura residencial, foi escrito entre 1940 e 1945, possivelmente como uma aula sua enquanto se encontrava emigrado nos Estados Unidos da América. Na sua opinião, a planta rectangular é provavelmente a mais simples mas também a pior, sendo apenas superada, nestas característica, pela planta quadrada. Isto é uma exigência imposta por um símbolo de ordem, que constrange a utilidade dos compartimentos, ou seja, o seu conforto; elas, realmente, são impessoais e adequadas, por isso, para toda a gente, como celas de prisão.152 Liberdade, em contraposição

às celas de prisão, é um valor que Josef Frank coloca como uma regra da arquitectura. Para ele as formas rectangulares exercem um efeito coercitivo sobre o habitar dos seus habitantes. Estas formas foram forçadas pela necessidade de satisfazer uma justa subdivisão da cidade, uma necessidade do interesse geral pela ordem. Para Frank, o ângulo recto, a forma rectangular e a sequência de formas regulares surgiram de forma forçada na habitação, explicando:

Não acredito que a regularidade rectilínea surgiu por tais espaços serem especialmente adequados para habitar, pois o ângulo recto exerce desde logo uma obrigação; estas formas rectilíneas surgiram pela necessidade de colocar as casas na cidade, umas ao lado das outras, criando ruas.153

Uma habitação assim não é pensada a partir do ponto de vista do habitar e do seu habitante, de dentro, mas sim a partir de influências e restrições, que actuam a partir do exterior.

Como consequência substantiva dos pensamentos desenvolvidos ao longo deste texto, pode dizer-se, pelo menos no que diz respeito à estrutura do habitar, ou seja, à organização do espaço dentro de uma habitação, que Josef Frank considera que deve ser desenvolvida através de uma estreita relação entre o habitante e o espaço que deve habitar - a partir do interior e não de restrições externas ao projecto.

Para Frank, a concepção do interior da casa também está relacionada com 151 Josef Frank, Das Haus als Weg und Platz, in Josef Frank. Schriften - Band 2, Viena: Metroverlag,

2012, p.200.

152 Josef Frank, How to Plan a House, in Möbel, Geräte und Theoretisches, Viena: Löcker/HAK,

1981, p.163.

99 as ideias que desenvolveu, décadas mais tarde: as ideias fundamentais do

termo, escolhido por ele, Akzidentismus (Acidentismo). A teoria apresentada neste texto, fundamentada na observação de que a nossa envolvente

construída deve ocorrer de forma natural e por acaso, começa a ser

desenvolvida desde 1931 no seu texto Das Haus als Weg und Platz (A casa como lugar e percurso) onde explica que a habitação moderna surgiu do telhado boémio de mansarda, o qual, tendo ocorrido do acaso, contém tudo aquilo que os arquitectos procuram no desenho das suas casas completamente planeadas e racionalmente mobiladas: vida, espaços amplos, janelas grandes, muitos cantos, paredes tortas, degraus e diferenças de cota, colunas e vigas; de forma sucinta, toda a variedade que procuramos nas casas novas com o objectivo de fugir ao lúgubre aborrecimento do compartimento recto.154

Em 1958, no seu texto Akzidentismus, continua a desenvolver estas ideias, explicando:

A sala de estar na qual podemos viver e pensar livremente não é nem bonita, nem harmónica, nem fotogênica. É o produto de coincidências, nunca está acabada e consegue acomodar tudo aquilo que preenche as necessidades em mudança dos seus habitantes.155

O resultado de tais coincidências, nas quais nos sentimos bem, observa Josef Frank, são as ruas e as cidades do passado.156 Ele propõe um carácter

inacabado para a habitação, nem harmónico nem fotogênico, restando

apenas, ao arquitecto, desenhar aquilo que ele não conhece, não é previsível nem concreto. Os vestígios do habitar resultam por acaso; as coisas vão-se espalhando e organizando naturalmente. A posição de algum mobiliário e dos tapetes, a luz dentro dos espaços, a sua ventilação, a música (ou o barulho), os cheiros e muitas outras coisas, determinam a atmosfera real dentro de uma casa, sem que possa ser controladas pelo arquitecto. Contudo, Frank considera que são exactamente estas reminiscências que permitem uma vida livre e confortável.

Para que se tenha em atenção as ideias da vitalidade e do acaso no momento de desenho, Josef Frank propõe alguns passos, ou seja, algumas regras importantes para desenhar uma boa casa:

Como se entra para o jardim? Qual o aspecto do caminho que nos leva até à entrada? como se abre a porta de entrada? Qual é a forma do hall? como se consegue ir do hall, através do bengaleiro, para a sala de estar? Qual a 154 Josef Frank, Das Haus als Weg und Platz, in Josef Frank. Schriften - Band 2, Viena: Metroverlag,

2012, p.198.

155 Josef Frank, Akzidentismus, in Josef Frank. Schriften - Band 2, Viena: Metroverlag, 2012, p.376 156 Ibidem.

100

relação das portas e janelas com as pessoas sentada?157

As regras para uma boa casa envolvem, de facto, o costume de se interrogar sobre os hábitos do habitar. Estas regras, que também se podem compreender como o espelho dos aspectos essenciais do habitar, permitem ao arquitecto incluir os hábitos do habitantes no desenho arquitectónico.

O culminar destas ideias, desenvolvidas ainda durante as décadas de 1920 e 1930, foi a sua última casa construída: a Casa Wehtje, em Falsterbo, na Suécia, de 1936.

Esta casa, marca uma viragem crucial no desenho de Josef Frank, uma

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