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A Job Demands-Resources Theory ou Teoria de Demandas e Recursos do Trabalho, em português, foi inicialmente apresentada como um modelo, o JD-R Model, há mais de quinze

anos a partir do artigo seminal de Demerouti, Bakker, Nachreiner e Schaufeli (2001). Após estudos em várias organizações, o que resultou centenas de artigos empíricos (Bakker, Demerouti, Taris, Schaufeli, & Schreurs, 2003; Llorens et al., 2006; Bakker & Demerouti, 2007, 2008, 2017;Demerouti & Bakker, 2011), foi que o JD-R Model ganhou corpo científico suficiente para ser apresentado como uma Teoria em 2013 por Bakker e Demerouti (2013).

Segundo a Teoria JD-R, as demandas do trabalho referem-se aos aspectos físicos, psicológicos, sociais ou organizacionais que requerem esforço físico e/ou psicológico sustentado e, portanto, estão associados a certos custos fisiológicos e/ou psicológicos (Bakker & Demerouti, 2013, 2014). Exemplos disso são uma alta pressão de trabalho e interações emocionalmente exigentes com clientes. Embora as demandas do trabalho não sejam necessariamente negativas, elas podem se transformar em obstáculos, exigindo um alto esforço do qual o empregado não tenha se preparado adequadamente (Bakker & Demerouti, 2013, 2014).

Os recursos de trabalho são classificados em dois tipos. Primeiro, os recursos externos às pessoas que se relacionam ao trabalho enquanto conjunto de atividades, tarefas e processo, às equipes em que os colaboradores estão inseridos e à organização onde atuam. O segundo tipo são os recursos intrínsecos (ou internos) à pessoa, denominado recursos pessoais (Schaufeli et al., 2013).

Os recursos do trabalho referem-se aos aspectos físicos, psicológicos, sociais ou organizacionais do trabalho que são: (i) funcionais para atingir os objetivos do trabalho; (ii) reduzir as demandas de trabalho e os custos fisiológicos e psicológicos associados; ou (iii) estimular o crescimento pessoal, a aprendizagem e o desenvolvimento (Bakker & Demerouti, 2007, 2013, 2014). Portanto, os recursos não são apenas necessários para lidar com as demandas do trabalho, mas também são importantes por si mesmos.

Os recursos pessoais são autoavaliações positivas que estão ligadas à resiliência e se referem ao senso individual da capacidade de controlar e impactar com sucesso seu ambiente. Tem sido argumentado e mostrado que tais autoavaliações positivas predizem a definição de metas, motivação, desempenho, satisfação no trabalho e na vida, e outros resultados desejáveis (Bakker & Demerouti, 2013). A razão para isso é que quanto maior os recursos pessoais de um indivíduo, mais positiva é a autoestima da pessoa e mais autoconcordância é esperada (Judge, Bono, Erez, & Locke, 2005). Indivíduos com autoconcordância de metas são intrinsecamente motivados a perseguir seus objetivos e, como resultado, desencadeiam maior desempenho e satisfação (Bakker & Demerouti, 2013, 2014).

A Tabela 4 apresenta uma visão geral das principais demandas e recursos pessoais e do trabalho.

Tabela 4. Exemplos de demandas e recursos pessoais e do trabalho

Fontes de estresse Recursos potencializadores do engajamento

Exemplos de Demandas do Trabalho  Pressão por prazos curtos;

 Horas extras;

 Pressão por quantidade elevada de trabalho

 Exigências emocionais, tais como: negociação com clientes difíceis, alunos problemáticos e chefes ausentes;

 Atividades que exigem esforço físico;

 Exigências intelectuais, tais como: tomada de decisão que envolve elementos diversificados ou atividades com elevada necessidade de memorização;

 Conflito entre demandas de trabalho e a vida pessoal;

 Insegurança no trabalho;

 Conflitos interpessoais no trabalho;

 Conflito de papéis, tais como lidar com tarefas contraditórias, informações ambíguas ou atividades diversas incompatíveis com seu trabalho;

 Ambiguidade de papéis, quando as expectativas não estão claras;

 Rotinas de trabalho.

Exemplos de Recursos do Trabalho

 Liberdade para definir como e quando trabalhar (autonomia/controle do trabalho);

 Suporte/apoio psicossocial dos colegas;  Feedback construtivo;

 Bom relacionamento com seu gestor direto;  Oportunidade para se desenvolver

profissionalmente na organização;

 Bom ambiente de trabalho (clima organizacional);  Valorização;

 Espírito de equipe;  Diversidade de tarefas;  Clareza de tarefa;

 Participação na tomada de decisão;  Oportunidades de carreira;  Responsabilidade no trabalho.

Exemplos de Recursos Pessoais  Otimismo;

 Resiliência;

 Estratégias ativas de coping;  Autoeficácia;

 Extroversão;

 Estabilidade emocional;  Autoestima;

 Atitude proativa e iniciativa pessoal;  Flexibilidade e adaptação;

 Assertividade;

 Crença de que tem controle sobre seu futuro. Fonte: Adaptado de Schaufeli et al. (2013, p. 40).

A teoria pode ser flexibilizada, ou seja, todos os ambientes de trabalho ou características do trabalho podem ser modelados usando duas categorias diferentes: demandas do trabalho e recursos pessoais e do trabalho (Bakker & Demerouti, 2014). Assim, a JD-R pode ser aplicada a todos os ambientes de trabalho e pode ser adaptada à ocupação específica em consideração. Enquanto que variações significativas nos níveis de certas demandas e recursos do trabalho específicos (como pressão de trabalho, autonomia) podem ser encontradas em quase todos os grupos ocupacionais, outras demandas de trabalho e recursos são únicas. Por exemplo, enquanto as demandas físicas ainda são demandas de trabalho muito importantes para trabalhadores da

construção civil e enfermeiras, as demandas cognitivas são muito mais relevantes para cientistas e engenheiros.

A Figura 9 apresenta as relações definidas pela JD-R Theory. A teoria propõe que os recursos pessoais e do trabalho influenciam particularmente no engajamento no trabalho quando as demandas de trabalho são altas (Bakker & Demerouti, 2007).

Figura 9. JD-R Theory

Fonte: Adaptado de Bakker, Demerouti e Sanz-Vergel (2014, p. 400).

Demandas e recursos do trabalho iniciam diferentes processos, mas também têm efeitos conjuntos e interagem na previsão do bem-estar ocupacional (Bakker et al., 2014). Existem duas maneiras possíveis pelas quais demandas e recursos podem ter um efeito combinado no bem-estar e influenciar indiretamente o desempenho.

A primeira interação é aquela em que os recursos do trabalho amortecem o impacto das demandas do trabalho sobre a tensão. Segundo Bakker et al. (2014), vários estudos já apontaram que os recursos de trabalho, como suporte psicossocial, feedback construtivo de desempenho e oportunidades para desenvolvimento profissional, podem minimizar o impacto das demandas do trabalho, mitigando a exaustão e evitando a síndrome de burnout (por exemplo,

Xanthopoulou et al., 2007). Empregados que têm muitos recursos de trabalho disponíveis podem lidar melhor com suas demandas diárias de trabalho.

A segunda interação é aquela em que as demandas do trabalho amplificam o impacto dos recursos do trabalho sobre o engajamento. Os recursos do trabalho se tornam atenuantes e têm o impacto positivo mais forte no engajamento no trabalho quando as demandas de trabalho são altas. Particularmente, quando um empregado é confrontado com demandas de trabalho desafiadoras, os recursos do trabalho se tornam valiosos e promovem a dedicação às tarefas em questão (Bakker et al., 2014).

Os recursos do trabalho também iniciam um processo motivacional que podem levar a um alto nível de desempenho e envolvimento (Bakker & Demerouti, 2007; 2017). Estudos anteriores demonstraram consistentemente que os recursos do trabalho, como o apoio social de colegas e supervisores, feedback de desempenho, variedade de habilidades, autonomia e oportunidades de aprendizagem estão positivamente associados ao engajamento no trabalho (Bakker & Demerouti, 2007; 2017; Schaufeli & Salanova, 2007).

No âmbito dos recursos pessoais, Tims, Bakker e Xanthopoulou (2011) verificaram que os supervisores transformacionais não só melhoram os recursos dos funcionários e o engajamento no trabalho, mas também podem melhorar seu desempenho no trabalho. Isso, por sua vez, pode contribuir para uma organização inovadora em termos de capital humano e produtividade.

Os recursos do trabalho também atuam como preditores de recursos pessoais e engajamento no trabalho, assim como os recursos pessoais e o engajamento no trabalho, por sua vez, também atuam como preditores de recursos do trabalho (Bakker et al., 2014). Tal aspecto foi apontado por Xanthopoulou et al. (2007, 2009) que observaram que os recursos pessoais não conseguiram compensar a relação entre demanda de trabalho e burnout. No entanto, verificou-se que os recursos pessoais mediaram parcialmente a relação entre recursos de trabalho e o engajamento no trabalho, sugerindo que os recursos do trabalho estimulam o desenvolvimento de recursos pessoais. Assim, observa-se que há efeitos recíprocos entre recursos pessoais e do trabalho e o engajamento no trabalho ao longo do tempo (Bakker et al., 2014).

No outro extremo, as demandas do trabalho possuem relação positiva com o burnout, caracterizado pela exaustão, cinismo e falta de realização, conforme ilustrado na Figura 9. A síndrome de burnout é um estado de esgotamento físico e mental cuja causa está intimamente ligada à vida profissional. É precedida pelo esgotamento emocional (exaustão), cinismo e falta

de realização profissional o que, em consequência, gera impacto negativo no desempenho (Maslach & Leiter, 2001).

No tocante à performance, estudos demonstram que pessoas engajadas no trabalho têm melhor desempenho do que colegas, inclusive os workaholics, mesmo que estes trabalhem por mais horas (Bakker, Hakanen, Demerouti, & Xanthopoulou, 2007; Schaufeli et al., 2008), e, trabalhando melhor, aumentam a produtividade de imediato e em médio e longo prazo.

O engajamento no trabalho também tem efeito no aumento da rentabilidade de uma organização. Isso foi demonstrado por um estudo de larga escala nos Estados Unidos desenvolvido por Schaufeli et al. (2006), que incluiu mais de oito mil unidades de negócios de 36 empresas. Foi calculado o score médio de engajamento dos funcionários de cada unidade de negócio, o qual foi associado aos resultados financeiros e de negócios das empresas e percebeu- se que os mais engajados nas unidades de negócio eram os mais produtivos e, consequentemente, os que geravam mais lucro. As diferenças entre os mais engajados e os menos engajados foi significativa. Observou-se que a produtividade relativa dos funcionários mais engajados rendeu ao mês para as unidades de negócio pesquisadas de 80.000 a 120.000 dólares a mais do que os menos engajados (Schaufeli et al., 2013).

No Brasil, Nascimento (2018) realizou um estudo qualitativo utilizando a teoria JD-R e a Dinâmica de Sistemas para identificar como ocorre o engajamento em uma equipe de projeto no contexto de um Parque Tecnológico de uma instituição pública de ensino superior. Observou-se que a estrutura física, as práticas de gestão de projetos, contribuição para uma meta estratégica e apoio e reconhecimento dos superiores foram os principais recursos do trabalho identificados. Por outro lado, impedimentos diversos, demandas externas ao projeto, dificuldade de utilização das práticas de gestão e falta de apoio dos superiores foram tidas como as principais demandas do trabalho. Os resultados indicaram que o engajamento está ligado a enlaces causais de crescimento relacionados ao reconhecimento do trabalho da equipe e a execução das práticas de gestão de projetos, que demonstraram promover coesão entre os membros da equipe.

Amaral e Oliveira (2017) utilizaram o modelo JD-R para investigar os desafios enfrentados por jovens gestores na transição para a primeira função gerencial e as formas encontradas para superá-los. A partir de uma pesquisa qualitativa com 15 jovens gestores, entre 25 e 32 anos, foram analisados recursos pessoais e do trabalho como meios para lidar com os desafios. No tocante aos recursos pessoais, foram analisados os seguintes aspectos: adaptabilidade, capacidade analítica, capacidade de aprendizado, dedicação, perseverança e

orientação para resultados, relacionamentos e sensibilidade ao outro. Em relação aos recursos do trabalho foram analisados: aprendizado on-the-job, experiências prévias, programas formais de desenvolvimento e processos de feedback e avaliações. Os resultados apontaram que as experiências on-the-job e as vivências anteriores, ainda que limitadas pela pouca idade, foram fundamentais para enfrentar os desafios. Outra importante fonte de suporte foram os relacionamentos com gestores, ex-gestores, amigos, pares ou a própria equipe. Também foi observado que a maior parte das organizações colocaram os jovens gestores em situações desafiadoras sem oferecer apoio formal.

Chinelato (2016) utilizou a JD-R Theory para aprofundar a rede nomológica do engajamento no trabalho em amostras brasileiras. O trabalho buscou identificar diferentes preditores e resultados relacionados ao trabalho desse construto, mediante a realização de quatro diferentes estudos. Foi observado que o engajamento é um construto motivacional influenciado por variáveis contextuais e pessoais, as quais podem atuar também como variáveis moderadoras, condicionando a força de suas relações (aumentando-as ou diminuindo-as) com resultados do trabalho. Os resultados também apontaram que o engajamento exerceu influência direta sobre o desempenho, além de ter atuado como mediador entre variáveis contextuais e pessoais e tais resultados.

Sabendo-se que a JD-R Theory apresenta os recursos pessoais e do trabalho como promovedores do engajamento no trabalho, a próxima seção apresenta um mapeamento desses recursos a partir de pesquisas empíricas encontradas na literatura que relacionaram algum recurso pessoal ou do trabalho enquanto mediador do engajamento no trabalho.